Sangue Puro escrita por Shanda Cavich


Capítulo 14
Capítulo 13 - Filho Único




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A sala de estar tinha paredes claras, combinando com as almofadas postas sobre a espreguiçadeira. O garoto pálido de treze anos, cabelos cor de palha, tinha olhos tão fundos e cobertos de olheiras que parecia estar com insônia há pelo menos três dias. Segurava uma varinha preta nas mãos, detalhada em prata. Apontou cuidadosamente o objeto para o vaso de flores em frente à janela, pouco antes de pronunciar o feitiço.

Incendio! – disse o garoto, então as flores foram incineradas. O vaso de porcelana caiu sobre o chão, estilhaçando-se.

O estalo provocado pelo vaso se rompendo chamou a atenção do pai, que acabara de chegar em casa após um exaustivo dia de trabalho.

– Francamente, Júnior! Que bagunça! – disse Bartolomeu Crouch, vice-presidente do Departamento de Cooperação Internacional em Magia. – Guarde essa varinha agora mesmo!

– Mas, pai, eu só estava praticando!

– Não vou deixar que destrua a casa toda. Foi por causa de atitudes como essa que você foi expulso de Hogwarts! Agora sossegue!

Bartolomeu Crouch Júnior, também chamado de Bartô, colocou a varinha dentro das vestes. Mostrou a língua a seu pai, repetidas vezes, até se virar para o outro lado e sentar na poltrona. O menino sofria de uma doença conhecida como "Síndrome de Tourette", tendo como sintoma mais acentuado a Cropopraxia, um tique nervoso que se manifesta pela emissão involuntária de gestos obscenos.

– Pegue seus livros, moleque. O professor deve estar chegando. – disse o Sr. Crouch, subindo as escadas da antiga casa. – Quando sua mãe chegar, diga que estou esperando no meu escritório.

– Sim, papai. – Bartô retirou os livros da estante e os pôs sobre a mesa de jantar na sala ao lado, ansioso para que a aula começasse. Desde que foi expulso de Hogwarts, onde sua casa era Sonserina, passou a ter aulas particulares dentro de casa.

Não demorou muito e já foi possível ouvir a campanhinha tocar. O garoto correu até a porta para receber o professor Carrow, e logo notou que o mesmo carregava uma gaiola consigo, que abrigava uma coruja cinza. O animal parecia agitado, embora mal pudesse se mover.

– Olá, Bartô. – disse o professor, colocando seus pertences na bancada. – Hoje é um belo dia, não acha?

O garoto olhou porta a fora e visualizou a neblina cercando o quintal. O céu estava cinza, prestes a trovejar.

– Mais do que isso, professor. Hoje é um dia perfeito pra estudar magia negra. Sabe por quê?

– Ora, por quê?

– Por que exatamente hoje se completam quatro anos desde o início da guerra.

– É assim que se fala, campeão. Vejo que andou estudando. – Carrow deu dois tapinhas no ombro do aluno, que lhe retribuiu com um sorriso. – Que acha de começarmos a falar sobre... Maldições Imperdoáveis?

O garoto ficou quieto, lembrando do que seu pai dissera sobre tais maldições. Amico Carrow já teria lecionado em outras escolas como professor substituto, mas no último ano seu único aluno passou a ser Bartô. O professor era alto e magro, usava roupas desleixadas. Tinha olhos profundamente negros, contrastando seus cabelos claros.

– Acho uma boa idéia. – respondeu o garoto, ansiosamente. – Minha mãe disse que são absolutamente ilegais. Tenho um fraco por irregularidades.

– Não se trata de irregularidade, meu caro. Irei lhe ensinar para fins acadêmicos. – Amico abriu sua maleta, e dela retirou um livro vermelho. – Sou um professor. E meu lema é "ensinar e abrir caminhos".

Bartô rapidamente pegou o livro e começou a folheá-lo. Amico fez um gesto com sua varinha de modo que a página esperada fosse encontrada rapidamente. "Maldições Imperdoáveis – conceito e prática" era o título da matéria. Havia um símbolo abaixo da introdução, semelhante a um triângulo de cabeça para baixo.

Seu pai, sendo um grande mestre defensor do bem estar na comunidade mágica, certamente lhe alertou sobre as maldições que mais causaram transtorno ao ministério nos últimos anos.

Bartô fez que sim com a cabeça. O professor sorriu audacioso.

– Meu pai disse que Imperius é a mais preocupante. – acrescentou o garoto, ainda olhando para o livro.

– De fato. Faz com que os amaldiçoados por ela pratiquem coisas que eles jamais pensariam em fazer normalmente. Veja só. – Amico abriu a gaiola de modo que a coruja saltasse para cima da mesa. – Imperio!

O pássaro foi atingido por uma leve fumaça amarela vinda da varinha. O professor fez com que o animal voasse em círculos, dançasse, e até mesmo bicasse o ombro do aluno, que logo começou a rir.

– Agora você ri, meu jovem! Mas se eu quisesse poderia mandar esta linda ave se matar. Poderia mandá-la atirar-se na lareira, por exemplo.

Bartô ficou mudo. O sorriso em seu rosto se desfez imediatamente. A maldição teve fim quando a coruja, cansada, pousou sobre a mesa.

– Maldição muito útil, não? – prosseguiu Amico, em seguida apontou para o livro. – A próxima é a mais perturbadora. Cruciatus. Causa uma dor tão grande na vítima, que dependendo da intensidade, pode levá-la à loucura permanente.

Bartolomeu Júnior colocou a língua para fora, ligeiramente, demonstrando empolgação. O professor novamente apontou a varinha ao animal:

Crucio! – e a coruja começou a se contorcer, soltando ruídos semelhantes a gritos. O sofrimento durou cerca de um minuto, até que o professor finalmente parasse. A coruja ficou imóvel. – Não se preocupe, ela está viva.

– Interessante. – acrescentou Bartô. – Posso tentar?

– Pegue a varinha. – Amico Carrow ainda sorria. – Aponte a varinha para a parte do corpo dela onde você acha que irá doer mais. Eu geralmente escolho entre os pulmões, mas a escolha deve ser apenas sua.

Bartolomeu retirou a varinha do bolso, e apontou para as assas do animal. Pensou mais alguns instantes, então apontou para a cabeça. Sua mão tremia de ansiedade, e constantemente demonstrava seu tique nervoso com a língua.

Crucio!

A ave se contorceu novamente, debatendo as penas. O garoto cessou a maldição, percebendo que a coruja estava prestes a morrer.

– Muito bem, Crouch. – aplaudiu o professor, erguendo as mãos. A manga de sua capa escorregou, de modo que seus braços tornassem visíveis.

– O que é isso no seu braço? – disse Bartô, reparando uma espécie de mancha preta na pele pálida do professor.

– Nada. Nada importante. – Carrow se recompôs, nervosamente. – Bem, acho que devemos deixar a última maldição para a próxima aula. Antes é necessário que o senhor estude a teoria.

– Mas professor, eu...

– Na-na-não! Chega de maldições por hoje. – cantarolou Amico, colocando a ave dentro da gaiola. – Pegue o livro de herbologia, vamos estudar plantas aquáticas.

Passaram-se cerca de duas horas, e os dois ainda estavam na sala de jantar. Uma mulher alta de aproximadamente 35 anos, vestindo roupas elegantes, adentrou a casa carregando uma maleta azul.

– Oi, mãe. – disse Bartô, sorrindo intensamente. – Papai está esperando a senhora no escritório.

– Olá, filho. – a mulher acenou, em seguida olhou para Amico. – Professor Carrow, deixei seu pagamento na bancada do Hall. Agora devo subir.

– Mãe, já decidi o que quero de aniversário semana que vem. – o garoto encarou os olhos do professor, em seguida olhou para sua varinha.

– E o que vai ser? – Miranda Crouch parou na escada, impaciente.

– Um elfo doméstico.

A mulher ergueu uma de suas sobrancelhas.

– Pra que quer mais um elfo, meu filho? Já temos a Winky.

– Quero um que seja só meu. Me ajudará... a senhora sabe... a por meus estudos em prática. – Bartolomeu mostrou a língua.

– Nesse caso, não vejo problemas. Falarei com seu pai. – Miranda voltou a subir as escadas, até virar no corredor.

Bartô devolveu a pena de escrita a Amico e, depois de lhe entregar a sacola com os sicles de prata, o acompanhou até a porta.

– Até Segunda, Crouch. No mês que vem você fará os testes necessários para obter o certificado do ministério de conclusão do terceiro ano.

– Até. – o garoto acenou, transmitindo um último olhar a coruja, que se encolheu dentro da gaiola.

Oito da noite, e a pacata rua estava vazia. Era uma avenida suburbana, isolada, contendo cerca de seis casas rodeadas apenas por arbustos e árvores. Casas de bruxos. Bartolomeu Crouch Júnior estava parado em meio a uma clareira, a pouco mais de um quilômetro de sua casa. A clareira era um dos lugares que ele mais gostava. Silenciosa e escura como era, parecia um bom lugar para se ver livre de preocupações.

O silêncio foi subitamente interrompido por vozes, ecoando por detrás do mato. Bartô se abaixou imediatamente, e meteu-se atrás de uma grande pedra.

Avada Kedavra! – disse uma voz masculina incrivelmente grave, e um jato de luz verde acertou um dos homens em cheio. – Isso é o que acontece com sangues ruins metidos a heróis!

– Satisfeito, Macnair? Você matou o velho! Você matou o velho, bosta! – reclamou uma voz jovial. – Temos que ir embora agora! Minha mãe é louca, vai me matar se eu chegar tarde em casa! Amanhã volto pra Hogwarts, esqueceu?

– Você tem muito que aprender ainda, moleque! E não é a sua escolinha ridícula que vai lhe ensinar o que de fato é importante!

Aos poucos os dois homens foram se aproximando da clareira onde Bartô estava, discutindo alguma coisa relacionada a "experiências passadas". Ambos seguravam suas varinhas, apressados. Bartô deu alguns passos para trás e acabou pisando em um graveto. Os dois bruxos vestindo capas pretas ouviram o estalo, e rapidamente notaram a presença de uma terceira pessoa – viva – no local.

– Quem está aí? – perguntou Aldo Macnair, olhando em direção a pedra, com a varinha erguida.

Crucio! – disse Bartô, apontando a varinha ao homem mais velho com cavanhaque.

Atingido pela maldição, Aldo Macnair deu um grito e caiu sobre o barro.

*Bartô novamente se escondeu atrás da pedra, como se a mesma fosse um forte de guerra e sua varinha fosse uma arma de fogo.

Bartô? É você? – disse o homem mais jovem, que pareceu ainda mais jovem quando a luz do luar iluminou o seu rosto. Rosto tão liso quanto o de uma criança.

– Rég? – Bartolomeu deu alguns passos a frente. – Régulo Black?

– Pera aí, vocês se conhecem? – Macnair ainda se contorcia. Bartolomeu ofereceu-se para ajudá-lo a levantar, estendendo-lhe a mão.

Aldo segurou no braço do garoto e levantou, irritado. Régulo abaixou a varinha.

– Nós estudamos juntos no primeiro e no segundo ano, até Bartô ser expulso por explodir a sala de Feitiços. Nossos pais se conhecem, e...

– Vocês são Comensais, não são? – interrompeu Crouch, ligeiramente preocupado, encarando o rosto do bruxo mais velho.

– S-sim, mas... – Régulo olhou para seu braço esquerdo. – Não vai contar a ninguém, vai?

– Não, mas com uma condição!

– Você não está em situação adequada para exigir condições, menino! – disse Macnair, encostando a varinha no queixo de Bartô. – Somos dois, e você é um! Se não te matei ainda, foi por causa da confusão.

– E também por causa do Crucio que ele te meteu nas fuças! – acrescentou Régulo, dando uma risada.

Bartolomeu também riu. Aldo continuou sério.

– Quero ver o crânio verde no céu! Aquele que vocês conjuram quando matam alguém. Com a cobra! Não sei quem vocês mataram agora, mas por se tratar um sangue ruim, não estou nem aí! – os olhos de Bartô se ascenderam, visivelmente empolgados. Mostrou a língua, em seguida olhou para seu anel. – Sabem... sou filho único de uma família puro sangue. Não vão querer que o sobrenome Crouch decaia, afinal somos muito influentes no Ministério. Apenas eu em minha família sou a favor do Lorde. Se eu morresse, a linhagem acabaria, e os Crouch se tornariam traidores pra sempre.

Os três bruxos ficaram quietos. Uma fina chuva começou a cair, seguida por trovões. Régulo Black transparecia incômodo, embora estivessem sozinhos. Macnair bufou conformado, tirou a varinha do queixo do garoto e apontou-a para o céu negro. Os dois jovens o encararam, e sorriram ao ouvirem a pronúncia farpada de um dos feitiços mais polêmicos que o mundo bruxo já viu:

Morsmordre!


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