Outono em G Maior escrita por Blue Dammerung


Capítulo 1
Capítulo 1: Du willst mich ficken?




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A porta do pequeno quarto se fechou com força, o dono do cômodo com as costas encostadas na mesma, a respiração acelerada. Roderich ainda não acreditava naquilo, não acreditava que tinha conseguido e que tinha falado tanto e...

As pernas vacilaram e ele foi deslizando até o chão lentamente, os olhos violetas perdidos no escuro, a boca semiaberta ainda procurando por ar, as lembranças voltando lentamente.

“Você gosta de música clássica?”

“Um pouco... Sei lá, gosto mais de rock, sabe? Heavy Metal, algo mais emocionante...”

“Entendo...”

“Você então é aquele cara que ficava tocando lá em cima... Agora que você falou, eu lembro que ouvia umas músicas de piano vindas daquela janela... Você toca bem.”

“Obrigado.”

“Mas acho que não toca melhor do que o awesome Gilbert aqui.”

“E você sabe tocar?”

“Não, mas quando eu aprender, certamente serei melhor!... O que há com essa cara? Por que está olhando assim pra mim?”

“É bom saber que você não está mais triste”.

Roderich nunca diria aquelas palavras para ninguém, quem sabe nem mesmo para seus falecidos pais, mas de alguma forma ele conseguia dizê-las com tamanha convicção para Gilbert, o albino, o estudante da área de física, o rapaz de cabelos brancos.

E, céus, tinha que dizer aquela outra frase? “Eu estou apaixonado por você”? E estava mesmo apaixonado? Como poderia saber, já que nunca sentira algo assim antes? Mas só podia ser paixão, certo? Aquela obsessão, não, não obsessão, mas aquela necessidade em saber tudo sobre o de cabelos brancos e ficar extremamente feliz com cada pequeno gesto dele... Isso não era paixão? Amor?

Ou seria algum problema mental?

Tomara que não, Roderich não queria passar meses num hospital...

A questão era que o nosso querido pianista nerd de olhos violetas metido a cavalheiro finalmente tinha falado com aquele que “vigiava” fazia meses, e agora estava surpreendentemente feliz pelo fato de não ter gaguejado quando falou com o outro.

Se levantou do chão, ligou a luz do quarto e andou até a cama começando a se despir, sentindo aos poucos o cansaço lhe tomar, sensação esquecida por algum tempo depois de tanta euforia.

Foi até o banheiro, tomou um banho rápido, vestiu seu pijama, desligou as luzes e se deitou na cama, ainda se lembrando do que conversaram.

“Eu tenho que voltar, tenho um trabalho enorme para fazer...”

“Ah...”

“O que há com esse ar desapontado? Kesesese, não é como se eu fosse sumir!”

“Então... Nos veremos amanhã?”

“Amanhã? Sim, pode ser, só não de dia. O sol me deixa com dor de cabeça, além de todas aquelas frescuras porque eu sou albino e blá blá blá, então você só vai me poder ver a noite... Hey, não tente fazer aquilo de novo, okay? Estou falando de se matar, não cometa uma burrice dessas.”

“Tudo bem.”

“Ótimo, então nos veremos amanhã... Qual seu nome mesmo?”

“Roderich Edelstein.”

“Kesesese, que nome de nerd! Sou Gilbert Weillschmidt, o ser mais incrível deste mundo...”

“Eu já sabia.”

“Que eu era incrível?”

“Não, do seu nome.”

“Mas sobre ser incrível também.”, pensou, revirando na cama então, só então lembrando-se de tirar o diário de debaixo da cama junto com uma caneta. Aproveitando a luz que vinha da janela sobre aonde estava deitado, escreveu o primeiro parágrafo desde a falha tentativa de se matar.

“Eu não sei o que há, só sei que não consigo parar de pensar nele e tampouco parar para pensar nele porque quando não penso nele, penso em mim com ele e tudo se torna um tanto confuso... Só torço para que eu não tenha desenvolvido uma espécie nova de doença mental.”

No dia seguinte, Roderich passou a manhã com o olhar perdido, tanto que até seus professores notaram, mas quando perguntaram a ele o que havia, ele respondia um fraco e baixo “não sei”, sem estar mentindo.

Já Gilbert estava dormindo em seu quarto. Por ser albino, Gilbert detestava o sol que machucava sua pele e seus olhos, e por isso, ele tinha que usar óculos para ler e para assistir às aulas, uma vez que qualquer luz lhe doía a cabeça.

A universidade, sabendo disso, permitiu que ele estudasse apenas à noite e transferiu os cursos que faria também para a noite, o que acabava lhe deixando com apenas 6 horas de aula até a meia noite de cada dia, inclusive nos finais de semana.

Mas veja bem, Gilbert não dormia cedo, na verdade, só conseguia dormir quando o sol nascia e só acordava quando o mesmo se punha, e era por esta razão que Roderich nunca o tinha visto na faculdade, já que o pianista só andava pela mesma de dia e a noite estava muito bem dormindo em seu quarto. Também era por esse motivo que Gilbert só jogava futebol de madrugada, junto com seus insones amigos que, mesmo não sendo albinos, não conseguiam dormir cedo.

Enfim, quando o sol se pôs e as aulas de Roderich acabaram, o mesmo saiu da sala levando consigo sua mochila e desceu as escadas do prédio com certa expectativa. Iria encontrar o albino naquela noite, de alguma forma.

Caminhou pelo campus sempre de olho em tudo, até que decidiu passar na cantina do mesmo, um enorme espaço cheio de mesas de metal e gente conversando e comendo, claro. Em meio a tanta gente, Roderich sempre se sentia um tanto desconfortável, senão deslocado, mas apertou as alças da bolsa com força e saiu caminhando por entre as meses, os olhos violetas determinados.

E não deu outra, ele encontrou uma cabeça com cabelos brancos ali, o albino comendo sozinho numa mesa mais afastada do lugar. O pianista se aproximou, mais aliviado por não ter que esperar e nem ficar procurando, e se sentou em frente ao outro, atraindo seu olhar e logo vendo um sorriso zombeteiro.

-Hey! E aí, o que há?-Perguntou o albino, voltando a comer o que parecia ser um sanduíche com salsichas.

-Não há nada, vou bem... Aonde estão seus amigos?-O austríaco perguntou, estranhando por alguém como Gilbert estar sozinho.

-As aulas deles só terminam daqui há uma hora, então eu venho comer sozinho... As suas já acabaram? Que sorte, viu... Não vai comer nada? Não me venha com uma história de que “quero emagrecer” porque eu já ouvi essa merda de umas quinze pessoas...

-Não estou com fome.

-Porra, cara, você devia colocar outra cara... Sei lá, sorrir mais, todo mundo acha que você está com raiva e...

-Todo mundo? O que quer dizer com isso? Alguém fala de mim?

-Você me entendeu, eu quis dizer que você parece abusado... Enfim, eu ainda tenho uma hora antes da aula começar, então...

-Se você achar que eu estou incomodando, sinta-se livre para dizer, por favor. Eu temo que tenho agido que nem um stalker ultimamente, então...

-Olha, cara, não vou mentir que quando você me apareceu do nada, me assustou, mas tá tudo bem... Tenho amigos bem mais loucos que você.-O albino sorriu, terminando de comer.-Olha, você sabe, eu sou hetero e tudo o mais, então contanto que você não tente passar a mão nas minhas pernas ou na minha bunda, acho que está tudo bem... Sem preconceitos com sua escolha sexual, claro.

-Minha escolha sexual? Está insinuando que eu sou gay?

-E você não é?

-Não, eu não sinto atração por outros homens, só por você.

-E eu não sou um homem?

-É sim, mas o que eu quis dizer é que...

-Tá, tá, tá, tudo bem, dá tudo na mesma, mas enfim...-Gilbert se pôs de pé, espalmando as mãos nas calças e limpando a boca com as costas das mãos, jogando sua mochila sobre as costas.-Quer andar por aí?

Então cinco minutos depois ambos saíam dali conversando sobre coisas simples. Mesmo não sendo lá muito sociável, Roderich sabia conversar e era fácil manter uma boa conversa com ele, ao contrário de Gilbert que sempre estava rindo de uma piada interna ou “frescando” com alguma coisa.

Na metade da ida para o prédio de física, Roderich perguntou algo que vinha lhe cutucando a cabeça.

-Quantos anos você tem, Gilbert?

-Eu? O incrível eu tem 23 anos.-O albino respondeu, fitando o outro sem entender direito.-Por quê?

-E você estuda física mesmo?

-Sim... Se eu não me engano, é sim.

-Como você pode gostar de física?

-Hey, física é a matéria mais awesome que existe, cara! Só os realmente awesomes conseguem lidar com uma matéria dessas e se formar na faculdade dela, cara! Ou seja, eu sou tão incrível que um dia serei físico e estudarei aquelas coisas de buracos negros e galáxias e essas coisas do espaço!-Gilbert riu, dando então um sorriso confiante.-Você tá na de música, né? Você tem cara de nobrezinho mesmo...

-Eu escolhi a faculdade de música porque era a matéria que eu sempre me dei bem... Ah, chegamos. Tenha uma boa aula.-Disse o de orbes violetas, vendo o outro acenar de leve e adentrar o prédio, mas parando enquanto abria a porta para exclamar:

-Hey, depois da aula sempre tem uns jogos atrás do prédio daqui. Por que não passa por lá?-E então desapareceu, rindo.

Naquela noite Roderich tocou em seu recém-adquirido teclado Inverno em G maior, que tinha aprendido a tocar com perfeição, tanto que se fechasse os olhos, acertaria todas as notas. Antes de dormir, escreveu em seu diário.

“Gilbert é mais convencido do que eu pensei, mas ele é... Feliz. Talvez seja por causa dessa felicidade que eu me sinto tão... Estranho perto dele, feliz também, mas ao mesmo tempo sentindo uma dor engraçada no peito. Não sei o que é, será que é amor? De qualquer forma, ele me convidou para jogar com seus amigos, mas eu não fui. Temo que se ele me ver e falar comigo todos os dias, logo vai enjoar de mim.”

Nos 4 dias que se seguiram, Roderich não viu Gilbert. Até uma hora em que estava voltando para seu dormitório assim que suas aulas acabaram de dá de cara com o albino bem na entrada do lugar, jogando algum joguinho em celular enquanto obviamente esperava por alguém.

-O que faz aqui?-Roderich perguntou, sem entender.

Gilbert levantou o rosto para o outro e deu um daqueles sorrisos confiantes de sempre, guardando o celular e pondo os olhos no outro.

-Ué, você sumiu então eu vim te procurar.-O albino respondeu, as mãos nos bolsos.-Você é meu amigo, e eu não abandono meus amigos tão facilmente, principalmente aqueles que caem de árvores para me ajudar!

-Mas...

-Mas nada. Hoje é sexta e precisamos sair, o que acha?

-Sair...? Mas e... Você não suspeita de mim em nada? Eu te vigiava e além disso, só te conheço faz uns poucos dias... Você não tem medo?

-Medo de quê? De você? Nem um pouco, até porque eu sei que você não vai me poder fazer mal nem física nem mentalmente, então para quê o medo? Além do mais, nem eu nem você temos muitos amigos, então o que há de mau? Vamos lá, Roddy, vamos sair!

-Ei, não me chame disso!

-De quê? De Roddy? Roddy, Roddy, Roddy ~~

-Pare com isso!

-Só paro se você prometer sair comigo.

-Tudo bem, eu prometo...-O austríaco suspirou, fitando o chão por alguns instantes mas então erguendo a cabeça e fitando o albino.-Mas não hoje.

-Eim?! Você prometeu!

-Eu prometi sair com você, mas não hoje e... Essa frase pareceu estranha.

-O quê? “Sair comigo”? Ah... Entendi, tem razão, mas qualé, Roddy! Aposto que você não tem nada para fazer!-Gilbert exclamou, cruzando os braços.

-Eu tenho... Eu preciso sair bem cedo amanhã.-Respondeu, sem mentir, embora mais desconfortável.

-Eh?! Sábado de manhã?! Que porra você vai fazer sábado de manhã?! Ninguém acorda cedo no sábado de manhã! É anormal! É contra os instintos da natureza de qualquer ser humano normal, principalmente se tiver nossa idade!

-Não é todo sábado que faço isso, é só amanhã... Tenho que dormir cedo hoje, desculpe.

-Hmpf... E o que você vai fazer? Posso saber?

-Vou fazer uma homenagem ao meu pai, já que amanhã seria o aniversário dele...-Roderich deu de ombros, como se não se importasse. Ou não quisesse demonstrar que importava.-Ele morreu, sabe? Então em todos os aniversários dele eu vou para um lugar calmo e toco as músicas que ele tocava para mim quando eu era pequeno... Por que está me olhando assim?

-Como eu poderia não olhar?! Porra, seu pai morreu e você fala tão friamente dele assim?!

-Não estou falando friamente, é só que ele não gostaria que eu chorasse no seu aniversário.-Respondeu o austríaco, fazendo com que o outro se calasse. Gilbert fez uma cara mais compreensiva e desviou o olhar, as mãos ainda nos bolsos.

-Então nós sairemos depois...-Murmurou o albino, levando então uma das mãos até a cabeça, sem jeito.-Eu vou embora...

-Não, você pode ficar... Não gostaria de vir até meu quarto apenas para conversar?

-Hey, não é assim que se tenta seduzir alguém pra conseguir uma transa!-Gilbert exclamou, rindo tanto que abraçou o estômago, logo fitando o outro que por sua vez tinha uma cara entre irritação e vergonha.

-Não estou querendo uma transa com você! E não fale isso alto!-Disse o austríaco, entrando no dormitório de música enquanto Gilbert o seguia, ainda rindo. Tomaram o elevador em silêncio, Roderich fitando o chão como se tivesse acabado de sofrer uma terrível brincadeira de mau gosto e Gilbert com um sorriso brincalhão.

Quando o elevador parou e o pianista saiu do mesmo com o albino lhe seguindo, caminhou até a penúltima porta do corredor, tirou uma chave do bolso interno do casaco e a abriu, revelando um pequeno mas arrumado e confortável quarto, tendo como mobília uma cama de solteiro bem embaixo da janela, um criado-mudo ao lado da cama e sobre este, um abajur, tudo isso bem de frente para a porta, ou seja, no lado norte. No lado leste tinha uma porta que levava ao banheiro, no oeste uma escrivaninha com prateleiras e prateleiras repletas de livros cuidadosamente organizados em ordem alfabética, assim como o teclado sobre o suporte, e por fim, no lado sul tinha uma cômoda ao lado da porta de entrada do quarto, aonde Roderich guardava roupas e afins.

O austríaco adentrou o quarto, deixando as coisas sobre a escrivaninha e puxando a cadeira da mesma para que Gilbert sentasse enquanto o mesmo olhava maravilhado para o quarto. Roderich estava tirando os sapatos e colocando-os ao lado da cômoda quando Gilbert finalmente falou:

-Seu quarto é tão... Organizado... Acho que você ficaria surpreso com o meu porque eu nem consigo mais saber a diferença entre ele e um campo de guerra... Mas não se engane, meu quarto continua tão awesome quanto seu dono mesmo assim.

-Se você diz...-Roderich comentou, sentando-se na cama e tirando o casaco para dobrá-lo propriamente.

-Claro que é, não importa o que eu faça ou deixe de fazer, sempre serei eternamente awesome!... Hm... Você não tem nada para beber aí?

-Beber..? Acho que só água e chá...

-Ah, qualé, Roddy! Vai dizer que você não tem cerveja escondida debaixo da cama... Nem um vinho? Rum? Vodca? Qualquer coisa? Puta merda, seu caso é pior que eu imaginei.

-Só não perco tempo com essas besteiras...-Suspirou o austríaco, um tanto emburrado.

-Não são besteiras! Nós somos jovens, podemos aproveitar enquanto nosso corpo ainda aguenta o rojão... Se eu ou você tivéssemos 50 anos, aí sim eu ficaria calado.-Gilbert revirou os olhos.-Então... O que tem pra fazer?

-Nada, só conversar.

-Cara, acho que você nunca iria conseguir seduzir uma mulher na sua vida.-O albino riu.

-E-Eu não p-penso nisso!-Exclamou o austríaco, subitamente indignado.-Por que está sempre tocando nesse assunto?!

-Que assunto? Porra, cara, vai dizer que você não pensa em sexo!

-N-Não penso!

-Está mentindo.

-Não estou!

-Está sim!-O albino riu alto, batendo na sua própria perna e abraçando o estômago com a mão livre, exagerado.-E por que está com raiva? Não faz mal pensar nisso, nós somos humanos e é biologicamente normal ficar pensando em sexo o tempo todo!

-Não, isso é um distúrbio mental conhecido como “ninfomania”.

-Está me dizendo que eu gosto de fazer sexo o tempo todo?!

-Não estou dizendo nada...

-Olha, você não pode dizer isso porque a minha namorada nada awesome me deixou faz uns meses e eu desde então fiquei... Ah, porra, eu contei para alguém... Ignore o que eu disse, okay?

-Sobre o quê?

-Sobre minha namorada ter me deixado! A vadia me deixou uns dias depois que o meu irmão foi embora! Aquela vaca!-Gilbert se levantou, levando ambas as mãos até a cabeça.-Eu nem tive culpa! Ela chegou do nada e disse “Gilbert, precisamos conversar e blá blá blá” e olhe que eu nem tinha dado em cima de garota nenhuma!

-Er... Você está falando sobre o assunto...

-Eu disse para mim mesmo que não ia contar para ninguém porque seria muito unawesome se alguém descobrisse que eu, logo eu, fui deixado! Mas agora você sabe, então guarde segredo!

-Eu não falo com muitas pessoas, se você não notou.

-Mas você poderia dizer isso na internet.

-Não gosto de internet.

-... Você é um mutante. Só pode ser, é impossível um jovem ser tão velho assim!

E assim a conversa continuou até tarde da noite, e mesmo Gilbert tendo insistido em comprar pelo menos uma cerveja, o pianista ficou contra até o fim e ambos acabaram sóbrios. Por volta das 12 da noite, o albino foi embora e Roderich foi dormir, colocando apenas uma pequena nota em seu diário:

“Não sei o porquê, mas fiquei feliz quando ele me contou algo que ninguém mais sabe, e como não posso contar a ninguém, não devo nem escrever aqui.”

Na manhã seguinte o nosso austríaco pegou um antigo violino que guardava debaixo da cama e saiu de casa ao amanhecer, deixando o campus e caminhando pela cidade até chegar a um parque, sentando-se sob uma árvore e começando a tocar, sozinho. Não tinha ninguém por perto graças ao fato que era demasiadamente cedo, então ele pode tocar sem incômodo algum.

E de leve, chorou. Algumas lágrimas caindo sorrateiras de seus olhos violetas, mas sem nada mais, sem lamúrias nem reclamações, apenas o som do violino, alegre, já que o pianista sabia que se tocasse algo triste, certamente desabaria ali.

Foi embora por volta do meio dia, e uma vez de volta ao campus, se trancou em seu quarto e não saiu nem recebeu visitas. Domingo passou rapidamente, assim como a semana que se seguiu. Dia sim dia não, Roderich conseguia ver e conversar com Gilbert antes de voltar ao seu dormitório, quando as aulas do albino estavam prestes a começar e as suas já tinham acabado.

Ele era uma boa pessoa, Gilbert. Descobriu que mesmo com um ego terrivelmente grande, atitudes impulsivas, uma educação não muito boa e uma tendência enorme a ficar bêbado e engravidar todas as meninas do campus, era sim uma boa pessoa, daquelas que tenta não te decepcionar e quer sempre te ver pra cima, nunca triste.

Logo tinha se passado um mês, dois meses e então três, os dois realmente amigos a essa altura. Gilbert tinha até encontrado outras namoradas nesse meio tempo, mas elas novamente o descartavam porque sempre o viam com outras, e sempre quem acabava dando tapinhas em seu ombro enquanto pagava uma caneca de cerveja apenas para o albino era Roderich, que mesmo tendo uma real consciência de que amava o outro, nada fazia.

Afinal, eles eram muito amigos para o pianista tentar alguma coisa e enfurecer o albino, e claro que Gilbert sabia da afeição de Roderich, tanto que várias vezes ele fazia piadas com isso.

Mas não naquela noite de sábado.

Gilbert adentrou o quarto do albino chutando a porta e chutando-a de novo para fechá-la, jogando-se então na cama, escondendo o rosto no edredom. Claro que Roderich já sabia o que aquilo significava.

-Hoje eu levei o 20° fora este ano...-Murmurou Gilbert, a voz abafada por causa dos tecidos que cobriam sua boca.

Roderich, que costurava alguma coisa, sentado na cadeira da escrivaninha, nem deu muita importância a aquilo. Dentro de alguns minutos o albino voltaria ao normal mesmo... Mas ergueu o olhar, fitando o amigo, e suspirou.

-Se você não fosse tão mulherengo, ela poderia ter continuado com você.-Disse, deixando as costuras de lado e apoiando a cabeça na mão, meio entediado. Não poderia dizer que aquilo tudo lhe deixava feliz e triste ao mesmo tempo, feliz pelo outro não estar com ninguém e triste pelo outro estar triste.

-Não me venha com lições de moral agora, não preciso disso. O que preciso é de uma boa transa!-Exclamou Gilbert, se sentando na cama, um sorriso maroto no rosto. Na primeira vez que tinha entrado daquela forma no quarto, quase fora morto pelo austríaco, mas aquele quarto era praticamente dos dois agora.

-Tem muitos bordéis na cidade...-Deu de ombros.

-Não quero ir até a cidade quando tenho gente mais nova e bonita neste campus! Isso me lembra que... Roddy, você gosta de mim, não é? Você me ama, é apaixonado por mim, certo?

-Você sabe que sim... Eu disse isso na primeira vez que nos falamos.-Disse o outro, virando o rosto, constrangido, estranhando pelo o outro tocar no assunto tão de repente.

-Então você tem fantasias sexuais comigo?-Sorriu Gilbert.

-O-O quê?! Não me pergunte algo assim!

-Por favor, Roddy! Estou com a autoestima baixa e preciso saber se alguém se excita comigo!

-E por que você vem perguntar logo para mim e não para todas as namorada que você já teve?!

-Porque você é o único que me ama pelo o que eu sou e que não ficou comigo porque sou diferente ou porque tenho os amigos mais populares da área de física mesmo que isso não me torne popular, além de que, logicamente, elas nunca me diriam a verdade e seria mais provável que eu ganhasse um tapa na cara. Por favor, Roddy?

-Eu...-O austríaco engoliu em seco, constrangido. Se mentisse, seria injusto, e se falasse a verdade seria o mesmo que... Ah, que seja.-Acho que... Às vezes.

-E como são suas fantasias?

-Aí você já está querendo demais...

-Vamos, Roddy! Me conta!

-Chega, Gilbert.-Roderich se pôs de pé, pegando seu casaco e o vestindo, puxando Gilbert de cima da cama e fazendo com que se levantasse também, puxando-o para fora do quarto.-Vamos sair e beber alguma coisa para que você se sinta melhor, e não conversar sobre essas coisas, sim?

-Nós? Nós bebermos? Mas, Roddy, você nunca bebe! Você só fica me olhando que nem peixe morto e provavelmente tendo fantasias comigo e...

-Está irritando, Gilbert. Pare de ser inconveniente porque não sou assim, você sabe. Está me magoando, pare de me tratar como um viado que sai comendo todos os homens por aí porque eu não gosto de nenhum homem e nem penso em transar com nenhum homem exceto você, por isso, pare de fazer piadas com isso porque eu nunca comentei sobre o quanto acho nojento homens que saem com várias mulheres apenas a custo de sexo, então olhe-se no espelho antes de falar de mim, por favor.

Gilbert fitou o outro por alguns momentos, percebendo que Roderich falava sério, mais do que jamais tinha visto ele falar. Desviou o olhar, fitando o chão, e assentiu, falando:

-Tá, foi mal...

-Foi péssimo.

-Tá, eu reconheço, desculpa! Estava só brincando, não quis te magoar, cara, foi mal! Eu não sei o que há comigo, desculpa.

-Hmpf... Vamos logo.-E ambos deixaram o dormitório de música, caminhando pelo campus até o que seria um bar aberto a todos, a música animada soando sem parar e dezenas de adolescentes dançando na pista ao centro.

O pianista pegou uma mesa afastada e pediu uma caneca de cerveja, sentando-se então com o albino e vendo-o coçar os olhos e mexer nos cabelos, estranho, logo tomando goles da caneca quando a mesma chegou.

-Você está bem?-Roderich perguntou, fitando o albino.

-Sei lá, não tô me preocupando muito com isso, sabe?

-Ficou com raiva do que eu disse?

-Não, você deve dizer isso antes de se afastar sem avisar... A maioria das pessoas se afasta sem aviso prévio ou sem pelo menos me dizer o que estou fazendo de errado, e dessa forma, como eu poderia melhorar? Estou parecendo muito filósofo agora? Porra, que saco.

-Não me afastaria de você sem avisar.

-Você é muito meloso, Roddy.-Gilbert riu, tomando mais um longo gole da caneca.-Eu gosto de você, sabe? Mas enfim, chega de falar coisas melosas... Eu queria ir para um lugar com menos barulho... Com menos gente... Conhece algum?

-Eu bem que... Conheço.

-Quero ir para lá com você, pode me levar? Quero levar algumas latinhas de cerveja também, você sabe, não posso perder o ritmo.

-Não tem medo de andar sozinho comigo?

-Se eu já passei horas sozinho com você no seu quarto e se você não tentou nada, não tenho o que temer.-O albino riu, se levantando da mesa.

Roderich comprou mais latas de cerveja e ambos saíram do bar, Gilbert perguntando aonde iriam enquanto a voz ficava mais e mais alta, os passos sem demorar a ficarem trôpegos.

Quando pararam, estavam bem na sala de música, aberta em todos os horários. Estava escura e ligar a luz naquela hora da noite certamente chamaria muita atenção. Não que fosse proibido estar ali, não era, apenas era suspeito demais e ser flagrado com um cara bêbado falando alto não deveria ser muito agradável.

-Ei, cara, que sala legal!-Gilbert exclamou, secando a 5° latinha de cerveja e já pegando outra no saco plástico enquanto se apoiava na janela, na mesma janela que tantas vezes Roderich observou o albino.

-É aqui que eu toco, se você não notou.-Disse o austríaco, se sentando ao piano e passando as mãos pela madeira maciça da base.

-Vai tocar pra mim?-Gilbert sorriu.

-Só se quiser.

-Toque, então.

Começou a deslizar os dedos pelo instrumento, tocando perfeitamente bem a melodia que antes lhe dera tanto trabalho, a partitura que, se fosse ver bem, começou tudo aquilo: Inverno em G maior. Mas aquela melodia ali conseguia ser mais calorosa, tendo o mesmo começo, mas diferente... Não sabia porque uma vez que jurava estar tocando da maneira correta, já que a tinha tocado tantas vezes que sabia suas notas decoradas na cabeça, tanto que nem tinha dificuldades em tocar no escuro, mas algo era diferente ali...

-Essa música é parecida com aquela que você tocava quando eu jogava ali fora.-Apontou para fora da janela, sobre o ombro.

-Parecida?-Perguntou.-Mas é a mesma música.

-Não é não, nunca ouvi essa aí, ela é mais... Quente, acho que triste, não sei... Me lembra o Inverno ao contrário e voltando ao Outono, isso, Outono... É triste mas é mais quente que o Inverno...

-Você está imaginando coisas...-Roderich sorriu, continuando a tocar e realmente percebendo que aquela era uma melodia diferente... Outono em G maior, é?

Tocou por mais vários minutos , quase esquecendo que o outro estava ali se não tivesse sido pego de surpresa com o barulho da latinha de cerveja caindo no chão, o cheiro do líquido no ar e então, ser puxado para trás e ter sua boca invadida por uma língua voraz e selvagem, investigando toda a sua boca e brincando com a sua própria língua enquanto duas mãos corriam por seu tórax e logo se enfiavam debaixo de seu casaco e de sua camisa, tocando seu peito e sua pele apenas para tudo de repente parar e ver dois olhos escarlates lhe fitando e um sorriso deveras sensual no rosto.

-Quer transar comigo, Roddy?

Fim da 2° Parte.


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Notas finais do capítulo

Enfim, sim, sairá uma terceira parte em dentro de no máximo um mês... Não me batam por favor!

Claro que vou mandar uma mensagem pra todos que mandarem reviews nesse meio tempo avisando da chegada da terceira parte, então não se preocupem e, ah, mesmo, mandem reviews. Morro de felicidade quando vejo uma.

Também acho que essa fanfic não pegou muito no emocional, sabe? Sinto como se ela tivesse sido mais uma continuação do que uma história em si, portanto, é preciso sim ter lido a primeira parte para entender...

Perdoem se ela não for tão boa quanto deveria ser, e enquanto aos erros que eu sei que tem, me perdoem. Não tive beta para esta fanfic e não tive tempo para betar eu mesma.

Kisses e espero que tenham gostado ~~