Pokémon: Ano Sombrio escrita por Linkusu


Capítulo 29
Capítulo 28: Fim do prelúdio sombrio.


Notas iniciais do capítulo

Ninguém está lendo mais, mas ainda vou terminar por obrigação mesmo haha.



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A situação dos reféns havia levado a batalha a um impasse. Se fizéssemos uma troca, seria possível salvar Pup mas eu perderia minha única vantagem contra Fioletovy e seria derrotado em segundos. Tentar tomar o controle da situação era inviável em minha posição. Em uma ocasião normal eu poderia tomar proveito da negociação e prolongá-la ao máximo possível, mas com o incêndio se alastrando pelo depósito a uma velocidade alarmante aquela não era uma boa escolha. Morreríamos asfixiados ou carbonizados.

—Vou te dar dez segundos — ele se pronunciou. — Se não o devolver no tempo estipulado, pode dar adeus ao seu bichinho.

E com esse ultimato, ele me tirou quaisquer esperanças de comprar tempo.

—Ei, calma aí. Se você fizer isso, seu pokémon vai morrer também. —Não podia deixar a situação fugir ao meu controle. Precisava ser nos meus termos.

—Acha que eu sou idiota? Tenho certeza absoluta de que você não sacrificará seu bixinho pelo meu Sandslash. Não há mas, porém ou entretantos. Você vai aceitar minha oferta. Ou vai assistir seu pokémon agonizar de dor enquanto todas as fibras de seu corpo são reduzidas a cinzas. Você tem mais cinco segundos. —Ele estalou os dedos e, no mesmo instante, Arcanine usou seu lança-chamas em Pup que começou a soltar grunhidos de dor, pressionado contra a parede, sem possibilidades de escapatória. —Caso contrário, não vou mandar Arcanine parar.

Ruffly soltou um brado de guerra. Pude sentir o sangue saltar das veias, inundar meus olhos, fazer-me ranger os dentes e tremer de fúria. Fioletovy estava irredutível. Eu não tinha mais escolhas. Não valia a pena sacrificar a vida de meu amigo por nada.

—SEU FILHO DA PUTA! EU ACEITO! EU ACEITO A MERDA DA SUA PROPOSTA! MAS SE VOCÊ NÃO PARAR EU VOU MANDAR VOCÊ, SANDSLASH E TODOS OS SEUS MALDITOS POKÉMONS PRO INFERNO!

Ele levantou a mão direita e deu um sinal para Arcanine cessar fogo. Pup ainda estava vivo, com queimaduras ao redor de todo o corpo, caído no chão de tão exausto. Precisava levá-lo a um centro pokémon antes que fosse tarde demais.

—Mas primeiro você vai ter de aceitar os meus termos — adicionei logo em seguida. Ele não ficou nem um pouco satisfeito com o adendo.

—Você ainda não entendeu. Não estou fazendo uma negociação. Você não está em condições de me exigir nada, não confunda a porra de sua situação. Eu dou as ordens e acabou. É você que está em cheque, não o contrário. A partir do momento que o ataque de sua Volcarona falhou, quem tomou controle da situação fui eu.

Ele estava absolutamente correto. Por mais que eu odiasse admitir, ele tinha minha vida em suas mãos. Por mais artimanhas que eu pudesse elaborar, qualquer plano ardiloso que eu conseguisse engenhar naquela situação não iria me salvar dessa simples verdade: estava encurralado, com menor poder de fogo e me equilibrando entre a vida e a morte em cima de um truque desesperado para ganhar tempo. Era impossível vencer sem utilizar fatores externos. Eu precisaria de pelo menos mais cinco minutos, e do jeito que a situação estava andando, aquilo ia acabar bem mais depressa.

—Por favor —tentei apelar, dessa vez não como um adversário, mas como uma pessoa à beira da morte fazendo um último pedido ao seu algoz. —Pup está comigo desde que me conheço por gente. Ele é um dos únicos que sempre esteve ao meu lado em todos os momentos difíceis de minha vida. É um pokémon... Não, é um amigo muito importante para mim. É minha vida que você quer, não a dele. A de nenhum deles.

Eu peguei as pokébolas de todos os pokémons presentes ao meu lado e, um a um, fui retornando-os. Ruffly olhou para mim desamparado. Tinha percebido minhas intenções e queria me parar. Ainda confiava que eu pudesse contornar aquela situação como eu sempre fazia. Não acreditava que as coisas terminariam daquela forma. Confiava em mim como uma criança confia em seus pais. Mas meu espírito já estava quebrado. Em meio aos seus gritos de protesto, ele foi o ultimo a retornar à pokébola.

Feito isso coloquei todas elas no chão e, como numa súplica, ajoelhei-me com a cabeça próxima ao solo. Lágrimas começaram a cair no piso e pude sentir meus ombros tremerem com meu soluçar.

—Por favor. —Supliquei mais uma vez, com a voz trêmula. —Deixe-os vivos. É só isso que eu te peço.

Fioletovy me encarou em descrença. Por algum motivo, senti que ele estava hesitante. Não era o tipo de reação que um psicopata demonstra à sua vítima. Alguma coisa não estava certa. Mas o que quer que fosse, ele assentiu com a cabeça, mandou seu Arcanine recuar e pôs Pup em seu colo.

—Tudo bem. Aceito os seus termos.

—Obrigado. Muito obrigado. —Uma onda de alívio me invadiu.

Peguei o Sandslash em meus braços, tomando cuidado para não me espetar, e fui andando na direção de Fioletovy. As chamas do depósito agora ardiam por aproximadamente metade do perímetro e a fumaça tomava conta do ar. Comecei a ter um acesso de tosses e atrasei um pouco os meus passos. Eventualmente, nós dois ficamos cara a cara, cada um segurando o pokémon do outro.

Os pusemos no chão e, quase ao mesmo tempo, fizemos com que retornassem às suas pokébolas. Encarei Fioletovy e ele me encarou de volta. Era o fim da batalha. Agora, o golpe de misericórdia.

—Preciso te matar e ir embora daqui. Para bem longe. —Ele disse. —Não me leve a mal. Nada pessoal.

—Eu sei — respondi sem emoção.

—Você lutou bem. Seu pai teria ficado orgulhoso.

—Não preciso de sua compaixão.

Ele acenou. Preparou-se para dar a ordem de ataque... Não. Não, não, não, não.

Uma estranha dúvida me atingiu como uma flecha. Ela cutucava no cantinho de minha cabeça, tentando desviar minha atenção a alguma coisa. Nada estava se encaixando. Tem algo errado.

—A foto de Mary que eu achei próxima ao local onde você nos atacou naquele dia... Você a deixou lá de propósito, não foi?

Fioletovy parou e me contemplou com uma expressão confusa.

—Do que está falando? Foi um acidente de minha parte. Depois de lutar com vocês, tive de fugir e acabei deixando a foto cair. Sempre a carrego comigo para me lembrar de Mary.

—Não. —Eu disse, agora com um caso crescendo exponencialmente em meus pensamentos. As peças iam se encaixando numa velocidade que eu próprio não conseguia acompanhar. —Eu tinha teorizado isso, mas não fazia muito sentido. Não era consistente com seus outros assassinatos. Você sempre foi cauteloso ao extremo, nunca deixou nenhum traço de sua existência na cena do crime. Não tinha como você ter deixado passar um detalhe tão grosseiro assim.

—É verdade. Quando notei a ausência da foto em meu bolso, corri de volta para os arredores da rota 8 e a procurei. Vasculhei todos os lugares por onde passei e nada de encontrar a foto, então decidi deixar pra lá. Era improvável que aquilo sozinho servisse de muita coisa de qualquer forma.

—Isso faz menos sentido ainda. Aquela foto era uma prova absoluta de que você e Mary se conheciam. Um assassino tão frio e calculador não teria deixado uma pista daquelas passar tão fácil assim.

—Aquela foto só “prova” que nos conhecíamos porque agora você tem conhecimento desse fato. Um assassino não precisa ser alguém próximo da vítima para ter uma foto dela consigo.

—Talvez não seja estranho um assassino carregar uma foto de sua vítima antes de executar o serviço. Mas semanas depois do ocorrido, sendo que você já havia feito mais duas vítimas nesse período de tempo, partindo para uma terceira e atentando uma quarta? Não. Do ponto de vista de alguém atento, aquela era uma prova de que Mary era especial para você. Talvez por ter sido a primeira? Mas então, por que você escolheu exatamente ela? Era o suficiente para, no mínimo, fazer alguém questionar se vocês tinham algum tipo de relação. Deixar um detalhe assim escapar seria impensável para alguém tão cauteloso quanto o Assassino Fantasma. Se você mesmo diz ter refeito seus passos, ao descobrir que alguma outra pessoa havia achado a foto isso deveria ter te alarmado. Nesse caso, seus suspeitos naturais deveriam ter sido eu, Simon, Angelo, Clara e Catarine, que fomos as últimas pessoas interessadas em você que sabiam o que havia ocorrido àquela noite. Ainda assim, você não fez sequer um esforço de revistar a minha casa em busca da foto, mesmo tendo ido lá como visita várias vezes e tendo tido a oportunidade. Infernos, você conseguiu pegar fios de cabelo do meu pai, procurar uma foto seria como roubar um doce de criança para você. Mas não. Sem buscas, sem ameaças, sem nada. Era como se você quisesse que aquela foto fosse descoberta. Por quê?

Ele ficou calado por algum tempo. Previ sua próxima resposta nesse pequeno intervalo. "Eu queria que alguém soubesse".

—Certo, eu deixei passar de propósito —ele deu de ombros. —Não liguei muito pro fato de ter perdido a foto. O motivo você mesmo já disse mais cedo, não? Eu queria me gabar. Queria ser descoberto. Precisava que alguém soubesse de minha grandeza. Que importa isso agora?

—Isso também não é verdade. Era o que eu queria acreditar mais cedo. Seria tudo muito fácil se fosse dessa forma. Explicaria todas as suas ações como devaneios de uma mente doentia. Uma situação simples de vilão e herói. Mas você não é um psicopata. —Afirmei com veemência. —Um psicopata jamais demonstraria empatia da forma como você fez. Suas atitudes hoje e seu suposto modus operandi não batem. Não faz sentido —fixei meu olhar no dele. —Você quase perdeu o controle quando viu que seu Sandslash estava em perigo. Aceitou meu ultimo pedido de misericórdia e poupou Pup e todos os outros pokémons. Hesitou me matar em diversas oportunidades.

Pausei por alguns segundos para organizar minha linha de raciocínio e comecei a reconstruir algumas cenas na minha cabeça.

—Talvez seja exatamente esse último detalhe que me incomode tanto. Você hesita demais. Há uma notável insegurança nas suas ações que simplesmente não são características que você havia demonstrado como o Assassino Fantasma. O Assassino Fantasma é implacável, meticuloso, calculista e manipulador. Já você parece... Desamparado. Me lembro de uma instância em particular que havia me passado em branco até há pouco. Na delegacia, no dia em que eu joguei todas aquelas acusações sobre você. Teve uma hora que você simplesmente parou e olhou ao redor, como se estivesse buscando por algum amparo, um sinal. Na hora ignorei como uma simples reação nervosa por ter sido encurralado, mas sempre depois de fazer isso você ficava mais calmo, como se algo ou alguém o tivesse assegurado de que a situação estava sob controle. Agora eu entendo. Você estava buscando pela orientação de alguém.

Fioletovy permaneceu calado. Havia algo de diferente em sua expressão. Pude sentir sua hesitação em me matar mais uma vez. Isso me deu a certeza de que eu necessitava.

—Pensando novamente, sempre me pareceu estranho que os pokémons de Red o obedecessem. Por mais que você seja filho do antigo treinador deles, pokémons tão bem treinados não obedeceriam às ordens de alguém mal intencionado. Há um motivo maior por trás dessa obediência —dessa vez dirigi meu olhar a Venusaur. —Ou estou errado?

O nobre titã verde permaneceu em silêncio. Seu olhar não demonstrava quaisquer sinais de antagonismo. Reconheci aqueles olhos. Os olhos de alguém clamando por ajuda. Um arrepio me subiu a espinha à medida que as fichas caíam. Angelo, Clara, Catarine, Simon, eu, meu pai, a mídia de Kanto, até mesmo Fioletovy. Estávamos todos dançando como marionetes nas mãos do verdadeiro criminoso.

—Agora mesmo você parece estar conflitado. Cheio de dúvidas sobre como prosseguir, inseguro se me matar é mesmo ou não a melhor opção. Essas não são atitudes de alguém dono de suas próprias ações, mas as de um peão —decidido, vociferei a conclusão lógica daquele dilema. Uma conclusão que eu lutava a aceitar alguns momentos atrás, mas que agora me parecia a única explicação natural para aquele caso inteiro. — Você, Fioletovy, não é o verdadeiro assassino fantasma.

Ele estava atônito com minha percepção de sua situação. Era como se um tremendo peso tivesse sido levantado de suas costas. Alguém finalmente descobriu. Imaginei ser isso o que se passava em sua cabeça naquele momento.

—O motivo de sua hesitação é porque você segue ordens contra sua vontade, e os pokémons de Red o obedecem porque o verdadeiro Manda-Chuva por trás de todos os assassinatos está usando algum tipo de termo que põe todos vocês em cheque —lembrei-me imediatamente da situação com Sandslash há poucos minutos. —Um refém...?

Ponderei alguém que pudesse ser importante o suficiente para obrigar a submissão de Fioletovy e os pokémons de seu pai. Apenas uma pessoa veio à minha mente.

—A esposa de Red. O verdadeiro assassino está usando a vida de sua mãe como garantia de que você o obedecerá e não deixará vazar nenhuma informação a respeito dele. Você deixou a foto de Mary cair de propósito como um pedido de ajuda. Você queria que alguém o descobrisse, queria parar de matar todas aquelas pessoas. Não é de sua natureza, mas você não tinha escolha. Por outro lado, você também não podia deixar transparecer que estava deixando rastros óbvios, pois poderia colocar a vida de sua mãe em risco caso afrontasse a vontade do seu mandante, então você deixou uma isca sutil. Queria ser pego sem comprometer a identidade do verdadeiro Assassino Fantasma. "Se eles me pegarem sem que eu o entregue, então não tem problema, não seria minha culpa". Mas eu demorei demais para entender.

Fioletovy demonstrou genuíno espanto ao ouvir aquilo. Eu sabia demais. Se ele me deixasse escapar estaria pondo tudo em risco. Seu "contrato" estaria em cheque e a razão de ele ter aguentado tantas coisas no decorrer daquele ano teria sido em vão.

O fogo se alastrava para perto de nós e podia sentir a fumaça me sufocando. Voltei a tossir.

—Não posso mais te deixar vivo —disse, com a voz trêmula.

—É isso mesmo que você deseja fazer? —respondi, rouco e com dificuldades para respirar.

Silêncio.

—Venusaur —ele ordenou. Sua expressão estava vazia. —Eu sinto muito, Neil.

—Não precisa —coloquei a mão no bolso. Ainda faltava um minuto. —Eu é que me desculpo. Isso provavelmente vai doer.

Retirei a mão do bolso e num movimento horizontal rápido com o meu braço dei uma bofetada no lóbulo de sua orelha esquerda segurando meu celular. O aparelho rachou ao colidir com o crânio e Fioletovy perdeu o equilibrio. Dei uma investida com meu ombro esquerdo no seu tórax fazendo com que ambos caíssemos no chão. Os pokémons de Fioletovy entraram em estado de frênesi e tentaram me atacar, mas não conseguiram. Eu estava próximo demais do líder deles e qualquer ataque direcionado a mim também o acertaria.

Recuperando um pouco os seus sensos e força, Fioletovy revidou com uma joelhada no meu estômago, fazendo com que eu perdesse o ar e dificultando ainda mais minha respiração em meio a toda a fumaça. Arremessou-me para o lado e se jogou como um animal selvagem em cima de mim, me cobrindo com uma tempestade de socos em meu rosto. Seus golpes eram fracos, sem vigor. Suas mãos tremiam e ele ofegava. A cada soco era como se sua alma recuasse ainda mais. Fazer aquilo era tão torturante para ele quanto era para mim. Cada ataque desferido vinha carregado de conflito, culpa e pesar. O som de sirenes se aproximando do lado de fora anunciaram o fim do embate. Olhei para ele com um de meus olhos inchado.

—Você não precisa mais matar ninguém.

Uma chamada anônima há aproximadamente 10 minutos havia chegado à delegacia de polícia. "Está tendo uma confusão perto do depósito na Rota 8, alguém está pedindo por socorro". A última garantia que eu havia preparado antes de adentrar aquele local caso nenhum de meus planos desse certo. Minha cartada final.

Fioletovy parou seus ataques e olhou para fora. Lágrimas brotaram de seus olhos e ele pôs as mãos manchadas de sangue em cima do rosto.

—Acabou. Finalmente acabou. —foram as últimas palavras que ouvi dele.

A fumaça gerada pelas chamas ardia em meus pulmões como fornalhas. Aos poucos a luz sumia dos meus olhos. Pude sentir os pensamentos se esvaírem e a consciência me abandonar. Minh ’alma foi imersa em uma negritude intensa e fiquei sonolento. Não sentia mais nada além de uma infinita e doce paz. Fechei meus olhos e dormi.


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