Giuliet Volturi - Dark Side Of The Earth escrita por G_bookreader


Capítulo 22
Os Quinze




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/148283/chapter/22

-Pelo amor de Deus Kratos! Primeiro meu território, minha segurança, meu clã e minha filha, agora você quer que eu abandone o meu bebê? – Falei, indignada, olhando para os lados do estacionamento bizarro de um McDonald’s bizarro que aquele ser insensível havia me feito parar.

-Ah, me poupe, isso é só um carro. – Ele disse, revirando os olhos.

Suspirei e olhei ao redor, ainda insatisfeita.

-Sério, não tinha um lugar melhor não?

-É o último estacionamento até lá. Daqui para frente não tem mais cidade, só um grande e extenso nada. – Ashley disse, tentando me convencer.

Liguei o alarme e me virei, prometendo mentalmente ao carro que eu ia lá busca-lo qualquer dia desses.

Estávamos na última cidade ao norte do Canadá até onde iríamos. O lugar tinha tanta neve que eu nem me sentia tão branca assim no meio daquela paisagem. Não me incomodava, claro, mas a temperatura estava muito baixa para ser confortável aos humanos. Corríamos, corríamos, corríamos, e parecia que nunca chegaríamos a qualquer lugar.

Então, tal qual acontecera quando fui até a Capital, séculos antes, de repente, lá estava o lugar. Porém, para minha decepção, não era nem um pouco grandioso como a mesma. Era uma casa, do tamanho da minha, porém mais fechada e nada simpática. Talvez o dito subsolo fosse maior, ou pelo menos era o que eu esperava. Eu havia esperado, no mínimo, uma casa murada ou coisas do tipo.

-Olha, o fato de você ser a governante não faz a menor diferença aqui, tudo bem? Trate-o com mais respeito do que me trata. – Kratos me avisou, inutilmente.

-Nossa, isso nem havia passado pela minha cabeça... – Debochei, e ele revirou os olhos. – Eu sei me portar como devo, não se preocupe. Eu não sou doida de bater contra um desses. Bem, não enquanto eu puder evitar.

-Giuliet... – Ele me deu um tom de alarme.

-Ei, calma, é brincadeira.

Andamos em uma velocidade mais humana quando nos aproximamos. Kratos bateu na porta, e eu assumi uma máscara séria e concentrada.

Na terceira batida a porta se abriu, mostrando quem estava por trás. Era um vampiro baixo, menor do que eu, com o corpo magro. Seus cabelos eram muito negros e longos, presos em uma trança que chegava até a cintura. As feições de seu rosto eram um pouco grosseiras e os traços eram fortes. Suas características físicas não condiziam com as roupas modernas que usava. Aparentava ter por volta de trinta e cinco anos de idade. Seus olhos, vermelhos injetados e pequenos, analisaram nós três em questões de segundo, apesar de terem se prendido mais tempo do que eu gostaria em mim.

-Eleazar, senhor, trouxe-a como havia me pedido. – Disse Kratos, todo respeitoso, o que, para mim, foi uma comédia.

-Obrigado, Kratos. Sempre me ajudando. – Disse o vampiro, em latim, com a voz grossa e potente, que me fez arrepiar até a alma. A voz era um misto de atrativo e repelente, ao mesmo tempo. Estava começando a me arrepender. Então, ele se virou para a parceira de Kratos, virando para o inglês. – Como vai, minha querida?

-Muito bem. Espero que o mesmo se aplique ao senhor.

-Com certeza. – Ele respondeu educadamente, só então se virou para mim. Seus olhos se cruzaram com os meus e eu me senti menor. – Você deve ser Giuliet Volturi. É uma honra conhece-la, senhora. – Ele disse, inclinando educadamente a cabeça para a frente.

-A honra é toda minha, senhor. – Respondi, igualmente diplomática.

-Bem, nossos caminhos nos separam aqui. Qualquer coisa, é só chamar senhor. – Disse Kratos, se afastando da porta. – Até mais, Giuliet. – Eu o olhei confusa, e ele riu. – Não esperou que nós ficássemos aqui, esperou? – Ele se virou, se falar mais nada.

Ashley me deu um tchau com a mão, discreto, e seguiu o parceiro pela imensidão gelada daquele lugar. Eu nunca me senti tão desconfortável na vida, e meu desejo mais forte era sair dali correndo sem nem olhar para trás.

-Você está segura comigo, não se preocupe. – Eleazar falou, calmamente, em inglês, provavelmente para me deixar mais confortável. Como se isso fizesse confiar nele. – Entre, temos muito que fazer.

Apesar de estar hesitando muito, eu obedeci. Sim, obedeci. Quando ele falava, todo o meu conceito de hierarquia e todo o meu instinto de liderança desciam descarga abaixo. Talvez certas coisas não se aplicassem a todos os vampiros, talvez apenas se aplicassem aos menos experientes. Era algo diferente do que eu sentia em relação a Hugh. Com ele era totalmente instintivo, meu corpo me obrigava a segui-lo. Com Eleazar eu não era obrigada, eu tinha pleno controle sobre mim mesma para virar e sair correndo, mas algo me dizia que eu tinha que acreditar nele. Algo mais virado para a intuição. No fundo, era uma droga do mesmo jeito.

Não havia muito luxo no interior da casa. Para ser mais exata, chegava a ser rústico. Os cômodos eram com móveis antigos de madeira envernizada e ligeiramente arranhada, e em todos os lugares, todos mesmo, havia uma estante abarrotada de livros. Os livros iam de enciclopédias a manuscritos históricos de escritores consagrados como Willian Shakespeare, que tiveram uma atenção especial dos meus olhos, até Gil Vicente e Goethe. Eu pagaria para me perder no meio daquelas obras, sinceramente. Mas livros eram a ultima coisa com que eu poderia me preocupar.

Ele me guiou até os fundos, onde havia um cômodo vazio, exceto por uma porta no chão. Ele se abaixou e a abriu, normalmente. A porta era de ferro e a espessura era considerável. Um humano não abriria aquilo facilmente nem em um milhão de anos.

-Onde estamos indo? – Perguntei, não conseguindo mais conter minha hesitação.

-Tenho razões para acreditar que você vá querer sair logo daqui, portanto é melhor que comecemos logo. Não se preocupe senhora, como já lhe disse anteriormente, não irei lhe fazer nenhum mal. Se eu fosse faze-lo, já teria feito e não me daria o trabalho de lhe mostrar minha cara. – Ele começou a descer as escadas que levavam para o subsolo. – Me acompanhe, por favor. Tudo que fizermos será feito aqui em baixo.

O segui para a escuridão que era o lugar. A escada era longa, mas assim que tive uma distância razoável do teto olhei para frente, analisando o lugar. O primeiro sentimento foi de surpresa, admiração, ou qualquer coisa semelhante a isso. Gigantesco era pouco para o espaço. A primeira visão que tínhamos era um grande galpão, cerca de dois quilômetros de comprimento e um de largura. Nos lados havia portas com distâncias consideráveis entre elas. De altura devia ter vinte metros, mas devido à grande dimensão do lugar, o teto parecia baixo.

Chegamos ao chão, a escada acabava logo em frente a uma das paredes, que não continha portas. Eleazar acionou um interruptor e luzes brancas iluminaram todo o galpão, tão fortes que, em um primeiro momento, incomodaram a vista.

-A porta que devemos entrar está longe, pode perguntar o que você quiser até chegarmos lá. – Ele disse, andando quase que humanamente para o meio do galpão. O segui, não tendo outra opção.

-Bem... eu não estou entendendo nada, então o número de perguntas é considerável. Mas a principal é por que eu estou aqui.

-Essa era a pergunta óbvia, vou responde-la dentro do possível. Eu tenho “olhos” por todos os lugares, sem sair daqui eu sei tudo que se passa lá fora melhor do que ninguém. Kratos é apenas um desses olhos. E esses olhos têm me mostrado certas coisas que me preocupam bastante.

-Que tipo de coisas?

-Ainda não. – Ele me cortou, antes de terminar. Como assim ainda não? – Como eu vou poder explicar em breve, você já é a décima quinta a assumir essa posição. E, apesar de você não saber disso, há um forte candidato para ser o décimo sexto. Só quero que você esteja preparada para isso.

-Você não ajudou os que vieram antes de mim. Por que eu? – Isso se ele queria realmente me ajudar, eu não estava certa disso ainda.

-Porque, ao contrário do que parece, eu não sou tão indiferente ao que acontece ao mundo. Não tenho o menor interesse no desequilíbrio do planeta.

-E o meu inimigo é tão detestável assim?

-Os planos dele são bem além do que eu chamaria de detestável.

-E posso saber quem é esse vampiro? – Talvez eu conhecesse, já poderia então calcular uma estratégia de batalha e terminar rapidamente com isso.

-Infelizmente não. Você não pode saber quem esse vampiro é. Ainda.

Olhei para ele, chocada.

-Então há um vampiro lá fora me ameaçando, ameaçando o meu clã, e eu não tenho o direito de saber quem é? Sinceramente, grande ajuda a sua.

-Há um motivo para tudo, criança. Ninguém está ameaçando seu clã ainda. E, se você tem alguma vontade de salva-los e vencer isso, é bom ter paciência.

Ache ridículo o quanto quiser, mas aquele “criança” me fez me sentir metade do que eu era. Eu não sabia o que me prendia ali ainda, eu devia me virar e ir embora.

-Você não me julga capaz de comandar uma batalha?

-Claro que a julgo capaz, senão nem estaria perdendo o meu tempo com você. Eu só quero impedir que você caia no mesmo erro dos outros quatorze.

-Que erro?

-Deixe-me explicar devidamente e depois você decide se vai embora ou não. Ouça-me primeiro, só então tome sua decisão.

-Espero que isso valha a pena. – Eu disse, decidindo dar aquela chance. A verdade era que ao mesmo tempo que eu queria sumir dali, eu também queria saber o que ele tinha a falar. Droga, porque meu corpo nunca conseguiu trabalhar como um só?

-Vai valer.

Continuamos em silêncio. Eu tinha milhares de perguntas na cabeça, tantas que eu mal conseguia organizar. Então, resolvi partir para a primeira coisa que me vinha à cabeça.

-Como surgimos? – Perguntei, quase que infantilmente.

-Agora estamos conversando. – Ele sorriu um pouco, um sorriso que parecia deslocado em suas feições ásperas. – Nossa espécie é bem mais nova do que a espécie dos humanos. Claro, viemos deles, mas viemos bem depois. Não se sabe explicar exatamente como nascemos, mas há duas teorias. A primeira é mais ligada à religião, e a segunda mais científica. Qual prefere primeiro?

-A religiosa. Essas costumam ser mais divertidas. – Fiz o possível para ficar no mesmo nível de descontração que ele havia chegado, mesmo me sentindo o ser mais bipolar do planeta.

-Boa escolha. Há quem diga que havia uma família, nos primórdios da humanidade, que dominavam as artes da magia. Usavam para guiar sua aldeia, ajudar em caçadas, ajudar na agricultura. Mais ou menos o que a tecnologia faz hoje. Porém, nesta família havia uma mulher muito gananciosa, que almejava muito mais do que ajudar seus compatriotas. Ela achava que, se usassem formas mais poderosas de magia, poderiam dominar as forças do mundo, decidir o futuro de todo o mundo. Ou, pelo menos, da idéia que eles tinham de mundo. O ancião da família, muito bondoso e sensato, e também temeroso por tais idéias, a proibiu de usar qualquer conhecimento de magia. Porém, era tarde de mais e ela já dominava o suficiente para utilizar como ela bem entendia. Ela e um rapaz, a quem ela amava, fugiram e foram viver em cavernas, enquanto ela se tornava cada vez mais poderosa. Ela não envelhecia, não adoecia, não se feria, nada podia lhe fazer mal. O mesmo não acontecia com seu amante. O tempo passava e, enquanto ela descobria novas formas de magia, algumas consideradas pouco ortodoxas, ele envelhecia. Ele não tinha nenhum domínio sobre magia, jamais poderia ser conservado daquela forma, mas ela não entendia isso. Juntou várias de suas magias e chegou a uma solução. Ele não envelheceria porque ela transferiria a vitalidade de alguns animais para ele, e assim faria eternamente, caso não fosse permanente. Os animais escolhidos foram um tigre, uma águia, um rouxinol, uma serpente e um cisne. Preocupada com a resistência do corpo de seu amado, ela buscou diamantes, que havia achado em uma jazida, alguns anos antes, para usar suas propriedades. Quando ela reuniu tudo, botou-o dentro da caverna e começou o ritual. Do tigre, retirou a força e a destreza, da águia, velocidade e precisão, do rouxinol, a voz bela, capaz de mover mundos, da serpente ela retirou o veneno, uma forma para que ele pudesse se defender, do cisne, a beleza e a graça. Então, por fim, do diamante, ela retirou toda a resistência. – Eu seria muito idiota em dizer que dei graças a Deus por não haver lobo nessa história? – Tudo isso ficou concentrado em seu corpo, e ele demorou três dias para voltar à consciência. Quando acordou, era o ser mais belo do universo, mais forte, mais rápido e também mais descontrolado. As lembranças de quem ele fora se perderam, ficaram vagas, e ele a atacou. O sangue dela o chamava, a única coisa que ele pensava era em se alimentar. Dentro dele haviam muitos seres famintos juntos. Ela, tentando se defender jogou feitiços e tentou reverter o processo rapidamente, mas sua pele pálida era puro diamante, nada ultrapassava. Ela morreu em seus braços, enquanto ele se alimentava. Nenhuma magia era forte o suficiente para protege-la do que ela havia criado. Inconsciente, ele dizimou aldeias, até finalmente começar a tomar consciência de suas ações. Há quem diga que ele falhou ao matar algumas pessoas, criando outros com seu veneno. O que acontece depois disso é indefinido.

-Isso é só uma lenda, afinal não existe isso de magia. – Ele não falou nada. – Não existe, certo?

-Existe apenas o que nós queremos que exista.

Isso não era um não. Tudo bem, ainda tinha a próxima teoria, talvez fosse mais certa.

-E a outra teoria? – Eu perguntei, enquanto ele parava na frente de uma porta. Não entramos imediatamente.

-A outra é bem simples. Seríamos frutos de uma alteração genética em um humano. Teoricamente, alguém nasceu assim e cresceu até certo ponto, e foi transformando os outros.

-Simples assim?

-Simples assim.

Para a minha decepção, a segunda teoria não havia convencido. Ele, pelo menos, parecia muito mais inclinado a acreditar na primeira. Decidi guardar as duas informações e deixar para pensar isso futuramente.

-Atrás dessa porta há um grande acervo de informações sobre seus antecessores, desde Baltazar até Andreas. E é utilizando isso que eu quero te explicar porquê quis te ensinar.

Ele abriu a porta, que dava para um grande e largo corredor, com aparência menos sóbria do que o galpão. Havia um tapete de cores avermelhadas e estampas que lembravam as estamparias do antigo oriente. Apesar de ser antigo, não estava desbotada, pelo contrário, suas cores permaneciam vivas. Esse tapete ia por todo o chão, fazendo a função de um carpete. Nas paredes da direita, revestidas de mármore preto, havia reentrâncias na parede, várias, mas eu só conseguia ver o conteúdo da primeira delas. Havia um pedestal negro, assim como a parede, e em cima dele uma estátua em outro de um homem, em tamanho real. Os detalhes impressos eram de assustar. Era alto e musculoso, vestindo uma túnica ornamentada que ia dos pés a base do pescoço. Os cabelos eram longos e desciam até a cintura, muito lisos. As feições eram endurecidas, semelhantes com as de Eleazar, e o olhar era tão penetrante como se houvesse alguém real ali, demonstrando todo o poder que ele tivera em tempos passados.

Do outro lado de cara reentrância, havia estantes repletas de livros.

Eleazar fechou a porta atrás de mim e caminho até ficar de frente para a estátua.

-Baltazar, primeiro governante da nossa espécie. Fui transformado por ele e, anos depois, transformei-me em seu braço direito. Tinha força de espírito e comandava como vi poucos comandarem depois. – Seu rosto ficou mais sombrio. – Morreu por tentar destruir um clã que aprisionou sua parceira. Ao invés de fazer um bom plano de batalha, ele se enfureceu e seguiu os instintos. Foi morto por Yalon, o nosso próximo da lista.

E assim ele seguiu, estátua por estatuo. Yalon, vampiro baixo e mirrado, mas de olhar sábio, morreu porque alguém influente em seu comando havia dado uma idéia errada quanto aos clãs adversários.

Veuliah, alto de olhar bondoso, desistiu por temer que seu clã, que ele via como uma família, fosse aniquilado, mas não conseguiu escapar a tempo e morreu, acusado pelos outros de traição à espécie.

Elemiah, conhecido como Bárbaro, Rochel, conhecido por uma intuição admirável, e Durstan, o primeiro europeu, viveram uma época turbulenta de guerras entre clãs. Essa guerra havia sido causada porque um clã influente havia matado um vampiro de outro clã de igual influência, causando uma guerra quase geral. Os governantes, no meio disso, tiveram a mente fraca para solucionar o problema e terminaram na fogueira.

Albion, o único inglês a governar antes de mim, teve pulso para acabar com as desavenças. Foi um dos governos mais prósperos, mas ele errou ao confiar demais em seus próximos. Foi morto pelo seu braço direito, que assumiu seu lugar. Lazaro tinha mais ambição do que talento para governar e não demorou muito a cair, derrotado por aqueles que juraram fidelidade a Albion.

Arturo foi escolhido como sucessor, a única sucessão escolhida por votação. Era um bom homem, de mente forte, mas se apaixonara. Foi morto pelo clã da mulher que amava, e o patriarca do clã assumiu o lugar. Há quem diga que a vampira teve de ser morta porque, ao contrário do que planejara, também se apaixonara pelo governante e não aceitou sua morte. Outros dizem que apenas se perdeu pelo mundo. Só se sabe que nunca mais foi vista.

O líder agora era Owen, um vampiro sedutor e de fala mansa, que conseguia dobrar qualquer um com suas palavras. Se fosse mais inteligente, teria movido terras e céus com sua lábia. Porém começou a querer ser controlador demais. Tomou vampiros como escravos e acabou morto por uma rebelião, marcando o fim da era mais violenta.

Cedric governara bem a rebelião, mas nunca foi bom governando uma espécie. Sua mente começou a ficar instável e não tardou a ser destronado.

Pierce fora muito parecido com Veuliah, tinha o coração muito grande, mas esse coração grande era muito frágil. Cercou-se de pessoas, fazia comemorações, ajudava a todos, tinha um espaço para o universo em seu clã. Acabou sendo traído por um grupo, liderado por Hugh.

Paramos em frente à estátua de Hugh. Era exatamente como me lembrava, as roupas refinadas, a barba e os cabelos presos em uma trança. Os olhos, porém, não exibiam a loucura que eu havia visto naquela vez. A estátua devia ter sido feita antes daquilo tudo.

-Hugh. – Ele anunciou, como se eu não soubesse. – Governou por muitos anos, mas viu sua vida ruir aos poucos. Perdeu seu clã, sua família, quem ele amava. Havia quem dissesse que fora castigo por ter traído Pierce, que tão gentilmente o acolheu. Porém, acho que o maior preço a ser pago foi sua sanidade. Como você viu pessoalmente, ele ficou louco, a ponto de ser tão violento e cruel quanto Owen. Eu nunca imaginei que a loucura pudesse atingir nossas mentes tão arduamente. Acabou morto por você e por Andreas. Agora, a última estátua.

Eu não queria chegar na última estátua, e eu torcia para que não houvesse. Eu não precisava de alguém relembrando aqueles tempos enquanto eu olhava uma imagem fiel dele. Mas não havia nada que eu pudesse fazer além de me segurar e seguir em frente.

A estátua era mais fiel do que eu planejara. Ele estava em roupas de gala, moda da época que fora morto, e se não fosse a coloração dourada do outro, eu poderia jurar que era ele em pé lá. Se eu focasse apenas no cabelo, que exibia o mesmo penteado bagunçado que ele usara em vida, essa certeza aumentava. Os olhos transmitiam a mesma energia e vitalidade que eu me lembrava.

-Eu não tenho muito que explicar aqui. – Ele disse, a voz menos impessoal um pouco. – Ele foi um bom governante, foram cem anos de paz. Ensinou a você bem como fazer as coisas, pelo que pude notar esses anos. Porém ele escolheu se sacrificar, se entregar, para que você sobrevivesse. – Não respondi nada. – Foi uma escolha nobre, apesar de tola.

Eu fiquei em silêncio, não havia nada para ser falado. Ele respeitou o silêncio por um tempo, até que eu mesma o quebrei.

-Por que você me trouxe aqui? Por favor, não me dê meias respostas. – Pedi sinceramente.

-Você percebeu o erro de todos eles? Todos, sem exceção, erraram quando deixaram os sentimentos vencerem a razão. Giuliet, eu não vou mentir, você vai ser testada. – Seu tom era um pouco sincero demais. – Mais do que foi até agora. Eu sei o resultado das ações erradas que você pode cometer. Eu sei como evitar isso. Por favor, me deixe ajuda-la. Eu imploro. – A urgência na voz me assustou.

-O que você vai fazer comigo?

-Eu vou ensiná-la a separar a razão dos sentimentos. Irei tornar sua mente resistente, nada poderá te abalar. E, nas horas vagas, irei fazer de você uma lutadora melhor. Mas aviso, para isso eu terei que explorar sua mente, e não vai ser agradável.

-E sabe fazer isso tudo? – Perguntei, cética.

-Entendo disso melhor do que ninguém. Somos mais parecidos do que você imagina, eu já tive meus testes.

-Como assim?

-Deixe isso de lado.

-Não. Eu preciso saber que você é para saber se posso confiar em você.

Ele suspirou, me encarando com impaciência.

-De todos eles, você é a mais teimosa. Deve ser coisa de mulher. – Ele disse, debochando, mas eu não falei nada novamente. Ele voltou ao estado sério. – Um dia eu conto. Agora vamos sair daqui, esse lugar é mórbido.

Dei uma última olhada na estátua de Andreas e o segui para a saída. Então me lembrei dos livros.

-E esses livros são o que?

-Cada estante é para um governante diferente. Contém todas as informações que eu te contei, porém mais detalhadamente. Um dia, se quiser ler, fique à vontade.

-E para que serve aquele galpão tão grande?

-Onde você acha que vai melhorar suas habilidades físicas?

-Naquele espaço todo?

-Se não ficar pequeno...

Quando dei por mim, já tinha aceitado a idéia de ficar lá uns tempos. Em algumas horas eu havia aprendido mais do que em séculos. Talvez ele realmente quisesse me ajudar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Giuliet Volturi - Dark Side Of The Earth" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.