Giuliet Volturi - Dark Side Of The Earth escrita por G_bookreader


Capítulo 13
Híbrida




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"Tu eras também uma pequena folha
que tremia no meu peito.
O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo."

(Pablo Neruda)

Tanto tempo se passara desde aquilo que eu nem acreditava que havia passado por aquele momento. E, no fundo, não havia mesmo. Uma pessoa completamente diferente havia passado por aquilo, e eu era o que tinha sobrado. Nos últimos cinco dias aquele anel havia pesado quilos no meu dedo. Ele era a última coisa que sobrara intacta daquilo tudo.

Nada acontecera naqueles dias. Nem um rastro sequer de vampiro, nem uma informação, nem um nada. Talvez eu tivesse mesmo me precipitado e devesse ter esperado para voltar no tempo certo. Mas vamos ser realistas, eu não ia conseguir ficar presa no Rio de Janeiro com uma informação daquelas. Comecei a desejar chegar logo em casa. Assim que pensei nisso, meu celular tocou no banco ao lado. Era Hecate.

-Oi. – Atendi.

-Onde você está? – Ela perguntou no mesmo instante, e eu bufei.

-Saindo do Texas. Desisto de tentar encontrar alguma coisa. E aí, algo novo?

-Não, nada se aproximou do território, nem mesmo os lobos. Acho que eles levaram a sério o tratado.

-Ainda bem. Acho que me precipitei.

-Não é a primeira vez que nos enganam.

-Dessa vez foi diferente, mas acho que foi um erro mesmo. No máximo em dois dias eu devo chegar em casa.

-Ligue se as coisas se complicarem. E toma cuidado, você sabe como é o Sul dos Estados Unidos.

-Eu sei, mãe, já estou saindo da área de perigo. Tchau.

-Até mais.

Desliguei e joguei o aparelho novamente no banco. Estava saindo da parte mais seca do país e, aos poucos, a vegetação da estrada se tornava mais densa. Liguei o rádio e procurei uma estação descente. Eu não sabia o que havia acontecido com os músicos depois dos anos 80, mas o rádio havia se tornado uma extensão da lixeira. Músicas barulhentas, com sons estranhos ao fundo, vozes eletronicamente trabalhadas e artificiais, letras repetitivas e, em muitos casos, promíscuas. Raras as exceções. Quando tinha que ouvir músicas atuais, sempre recorria para o Rock Alternativo ou Metal Progressivo, que apesar de ser um pouco barulhento, o barulho era menos falso. Ainda era horrível perto do que a música mundial fora um dia, mas pelo menos as letras eram boas.

O Sol agora era uma linha fina no horizonte e logo não existiria mais. Abri os vidros do carro – que eu havia pego emprestado sem a menor intenção de devolver – e deixei que o vento entrasse, sentindo a liberdade que os 300 km/h tentavam proporcionar. Eu podia atingir muito mais do que isso correndo, mas não era a mesma coisa que dirigir.

A noite avançou. O céu estava limpo e estrelado, a Lua Cheia iluminava o caminho praticamente sozinha. Era uma região vazia, sem cidades por perto e, pela falta de manutenção, os postes de iluminação estavam apagados e esquecidos, a única luz vinha dos carros que ocasionalmente passavam e da própria Lua. A vegetação que beirava a estrada já estava mais alta, com árvores de três metros ou mais. Eu gostava da vegetação fechada, me sentia bem nela, como uma espécie de refúgio. Especialmente a Tundra Norte-Americana. Mais um motivo para eu voltar mais rápido para casa.

Meus devaneios foram cortados por um som nada habitual, vindo da mata. A princípio não identifiquei, mas conforme se aproximava e eu diminuía a velocidade, foi ficando mais claro. Estranhei muito a princípio, mas era um choro infantil, alto e histérico. Estava longe da estrada, mas eu podia ouvir perfeitamente. Não era para eu ter me preocupado, deveria ser só uma criança humana que se perdeu dos pais durante uma trilha, eu não deveria interferir na vida deles. Não mais do que eu já fazia. Mas aquele som me angustiou de tal  forma que, quando dei por mim, o carro estava parando no acostamento esburacado. Desci do carro e comecei a entrar na escuridão do lugar, atenta a qualquer movimento estranho. O tom arroxeado que a escuridão tinha para os meus olhos tornava o ambiente um pouco sombrio, mas eu tinha plena visão do que acontecia ao redor. Resolvi corre ao invés de simplesmente caminhar, perseguindo o choro. Então o primeiro sinal de que algo muito errado estava acontecendo surgiu. Eu havia encontrado dois rastros de vampiro, rastros frescos. Mas eles iam na direção oposta do choro e, decidindo entre busca-los e seguir o som, preferi continuar no plano anterior. Uns três minutos depois achei, encostada em um tronco de árvore, encolhida e chorando. Era uma menina, pelas roupas e pelo cabelo longo. Não deveria ter mais de três anos de idade, e não pareceu me notar. Então eu senti o seu perfume, mas já havia me preparado para isso. O perfume do sangue infantil é muitas vezes mais impressionante do que o adulto por ser, de certo modo, ainda puro e fresco. Mas não foi o que eu senti. Enquanto ele me causava o desejo comum, tinha um cheiro diferente. Eu não sabia explicar como nem porquê, mas o cheiro lembrava... vampiro? Não, eu tinha absoluta certeza de que aquele cheiro não vinha só do corpo dela, era o sangue. O cheiro era algo entre o doce humano e o agradável dos vampiros. Eu não fazia a menor idéia de como isso acontecia. Mantive a compostura e me abaixei na frente dela.

-Ei... Está tudo bem, o que foi?

Ela levantou a cabeça para me encarar. Se antes eu hesitei a respeito da humanidade dela, agora eu tinha certeza de que totalmente humana ela não era. Era de longe a criança mais incrivelmente bonita que eu já tinha visto. Só perdia para as extintas crianças vampiras.  A pele era muito pálida, quase tanto quanto a minha, exceto pela coloração avermelhada nas bochechas, e um pouco no rosto, causado pelo choro.. Os cabelos castanhos claríssimos, quase loiros, caíam cacheados ao lado do rosto. Os olhos azuis me encaravam com uma curiosidade um pouco precoce demais. E tinha as olheiras. E essas olheiras eu conhecia muito bem, não eram simples olheiras de quem não dormiu bem de noite. Eram as mesmas olheiras presentes nos olhos de cada um de nós conforme a sede ia crescendo. Ela era tudo, menos humana. Mas também não era uma vampira. E nem em um milhão de anos seria uma loba. O que diabos era ela?

-Calma, eu vou te ajudar. Você se perdeu do seu pai?

Ela continuou a me encarar por um tempo, enquanto lágrimas continuavam a encharcar seu rosto. Nenhuma criança comum poderia me enxergar naquela escuridão, as árvores tapavam a maioria da luz da Lua. Me dei conta de que estava sem lentes, mas meus olhos provavelmente estariam em um vermelho muito escuro, quase negro. Já fazia mais de uma semana desde a última vez que eu me alimentava. De qualquer forma, ela não pareceu se importar e, depois de me analisar estranhamente por mais um tempo, resolveu falar. Sua voz era quase tão macia e melodiosa quando a nossa, mas tinha um pouco da rouquidão humana.

-Pegaram o papai... – disse entre soluços. – vão matar ele... vampiros ruins... vão matar ele...

Espera um momento. Ela disse vampiros? Ela sabia?

-Não fica nervosa. – Eu disse enquanto pensava no que fazer. – Olha, eu vou te tirar daqui, te levar para um lugar melhor, e então eu volto para procurar o seu pai, certo? Não vou deixar nada te acontecer, fica calma.

Ela assentiu com a cabeça e a peguei no colo, pegando logo depois a mochila rosa das Princesas que estava caída do lado dela. Ajeitei ela nas minhas costas para que fosse mais fácil correr, e fiquei segurando a mochila. Ela ainda soluçava, mas parecia mais calma.

-Segura firme.

Ela passou o braço pelo meu pescoço e se segurou. Em nenhum momento pareceu estranhar a temperatura ou a solidez da minha pele, parecia até familiarizada demais com a situação. Comecei a correr no caminho de volta e, quando já quase chegava, ouvi o som de luta próximo. Inevitavelmente eu teria que passar por ela, não havia mais como desviar. Não sem deixar um rastro óbvio. Eu poderia silenciosamente passar pela beirada, escondida no topo das árvores, sem que eles notassem. A última coisa que eu poderia fazer era levar aquela criança para o centro de uma luta. Margeei o que calculei ser o campo de alcance da audição deles, pelo menos o que eles ouviriam de passos extremamente leves. Anos de batalhas e vivências me fizeram andar de um jeito que eu nunca quis porque eu havia visto Hugh andar assim. Eu e Hecate andávamos tão levemente que, segundo alguns humanos desavisados, parecíamos flutuar. Eu odiava isso com todas as minhas forças, mas agora veio a calhar.

A menina acabou adormecendo, mas ainda se segurando em mim. O que me preocupava era o som dos seus batimentos cardíacos, tão rápidos quanto os dos lobos. A diferença é que ela estava dormindo, talvez isso fosse natural.

Quando cheguei no ponto mais próximo da luta, subi nas árvores. Lá de cima, eu podia ver o que acontecia enquanto pulava de galho em galho em silêncio. Haviam três vampiros juntos, atacando um solitário. O solitário lutava muito bem, mas os outros também, e por isso ele já começava a perder. Quando olhei bem no rosto dele, quase soltei uma exclamação de espanto. Seu rosto era, praticamente, igual ao da menina. Diferentes só por alguns traços. Ele seria o pai dela? Ele não lutava como um recém-criado, não é possível que tivesse a tido enquanto humano. Mas havia aquela invariável e crua verdade: vampiros não têm filhos. Nunca. De nenhuma maneira.

Os outros estavam tão distraídos quando o derrubaram que nem sequer me notaram. Mas ele, enquanto lutava, olhou de relance na minha direção. Me peguei parada assistindo a luta, inconseqüentemente. Seu rosto não esboçou nenhuma reação quando viu o rosto da filha, mas seus olhos sim. Eu podia sentir o coração apertado dele de onde eu estava. Então ele me viu e um segundo reconhecimento. Agora eu via o pavor transbordar dele, enquanto os outros nem sequer notavam. O que ele achava, que eu ia mata-la? Não, eu não faria isso. Mas, se ele estivesse morto, o que eu ia fazer? Eu já sabia a resposta antes mesmo de me questionar. Gesticulei com a boca a minha resposta, sem emitir som. “Vou protegê-la. Eu prometo.” Seus olhos ganharam paz e, quando eu comecei a me apressar para sumir dali, eu sabia que ele havia se entregado.

Cheguei ao carro e coloquei ela no banco do lado do motorista, apertando o cinto. Ela nem sequer se perturbou no sono. Arranquei com o carro e logo o ponteiro se apertava na velocidade máxima. Dei uma checada na garota e percebi que seu estado era muito pior do que eu havia percebido. Ela estava suja e suas roupas estavam rasgadas. Ela parecia ser bem cuidada, mas algo acontecera para reverter a situação. A mochila estava aos pés dela e, usando os joelhos para controlar o volante me estiquei para pegá-la, ponto no colo.

Dentro havia mudas de roupa no fundo, dobradas, um urso de pelúcia marrom e duas cartas. Peguei-as e, na frente, uma estava escrita com uma letra corrida mas desenhada: “Para Roberta.” Na outra, com a letra mais corrida ainda, lia-se “Para quem quer que seja.” Deixando meus joelhos fazerem o trabalho no volante, abri a segunda e comecei a ler.

Olá para quem quer que se encontre lendo essa carta.

Se você está com ela nas mãos, eu provavelmente não estou mais nesse mundo. E provavelmente você tem a coisa mais importante do meu mundo em suas mãos. Mas primeiro, deixe-me explicar o que aconteceu.

Para começar, eu sou um vampiro. Estou dizendo isso porque, se você é um humano e encontrou-a, você precisa saber da verdade.

Há cinco anos conheci uma humana e, como costuma acontecer conosco, a amei desde a primeira vez. Tentando proteger meu segredo, me escondi dela o máximo que pude, mas não foi tão simples assim. Eu não conseguia. Eu tinha a necessidade de estar no mesmo ambiente que ela. Dizem que é isso que acontece conosco quando encontramos ‘a pessoa’. Os Volturi – algo como nossos líderes, que nos proíbem de contar a verdade a humanos -  que me perdoem, mas eu não consegui por muito tempo. Acabamos ficando juntos por alguns anos, pretendíamos nos casar e, logo após, eu a transformaria, conforme ela queria. Porém, algo inesperado aconteceu. Ela estava grávida, contrariando a informação de que vampiros poderiam ter filhos. Era obviamente uma criança minha pela necessidade de beber sangue, mesmo enquanto humana, de minha mulher. Apenas um mês depois, depois de passar por muito sofrimento, o parto foi realizado. Para sair, a criança causou ferimentos fatais e não consegui transforma-la a tempo. Eu havia perdido a única mulher que amara em toda a minha vida, mas eu não me senti tão vazio como eu sabia que outros vampiros se sentiam quando acontecia. Eu tinha a minha filha, recém nascida. Dei a ela o nome de Roberta, minha mulher já havia escolhido. Era dia 14 de Agosto de 2009.

Beta, como eu a chamava, crescia muito rapidamente. Com um ano, ela parecia ter quase dois. Também demonstrava uma inteligência superior, parecendo entender coisas que só adultos conseguiriam. Comia comida humana, tive que aprender a cozinhar, mas também precisava do sangue para se manter forte. A necessidade era apenas um pouco menor do que a minha.

Ela é muito rápida, quase como nós, vampiros. Também ganhara nossa habilidade em escaladas e saltos, e uma boa parte da nossa visão. Porém, o olfato e a audição são fracos comparado a nós, quase humanos. Buscando sobre eles – e descobrindo que se sabe muito poucos, os que existem estão escondidos – descobri que alguns nascem com veneno e outros não. Beta nasceu sem, descobri quando uma vez ela, sem querer, me mordeu e não senti o pinicar que o veneno causa. Não sei como é seu desempenho em caçadas, pois nunca a levei. Quando ela queria algo fresco, trazia animais já mortos e, quando a sede realmente apertava, dava-lhe sangue de bolsa, ou qualquer bebida derivada do sangue que há hoje em dia.

Vivíamos felizes até que eles apareceram e começaram a nos perseguir. Vampiros do clã que me transformou, com ódio por terem sido abandonados. Cada grupo de nós tem uma característica diferente, e eles eram de um orgulho por si mesmos quase doentio. Ser amigo de outro clã já significava traição. Por isso fui embora. Mas eles me acharam e eu sei que não vou conseguir fugir ou escapar. Por isso estou escrevendo isso pois, mais cedo ou mais tarde, terei que abandona-la. Então, você, que a encontrou, tem tudo que eu lutei há uma escolha de distância.

Você pode dar um fim a ela, mas lembre-se, nada é culpa dela. Mas, se você escolher deixa-la viver, fará a melhor escolha da sua vida, porque escolhe-la foi a melhor da minha. Estou sendo sincero, se não quiser a responsabilidade, faça qualquer coisa que a deixe bem.

Deixei outra carta na mochila, esta é para ela. Eu gostaria que ela pudesse ler quando tivesse idade para entender tudo que eu disse aqui, com mais alguns complementos que interessam a ela. No pescoço dela há um cordão com uma foto dentro de mim, dela e da mãe. Tire-o e entregue junto com a carta. Eu gostaria que ela lesse antes de receber. É a única herança de família que pude passar a ela.

Não te conheço, mas muito obrigado. Mesmo. Não tenho como definir. E bem, acredito que essas sejam minhas últimas palavras.

Noah Vanilla.”

Guardei a carta e coloquei no bolso do casaco, junto com a outra, e coloquei a bolsa no lugar. Com os braços novamente no volante, eu não sabia o que pensar. Uma híbrida. Haviam mais, escondidos. E eu nunca soube de nada.

O problema da minha falta de informação poderia esperar. Agora eu tinha que decidir o que fazer com aquela criança, Beta. Mas, no fundo, eu já sabia muito bem. Mesmo não tem tempo, disponibilidade e, principalmente, habilidade. O que eu sabia sobre crianças? Eu havia crescido na Idade Média, vamos dizer que não tinha o melhor exemplo de criação do mundo. Eu era uma soldado, não alguém preparado para conduzir a vida de uma criança. Bem, pelo menos ela crescia mais rápido do que as normais. Por mais que eu não quisesse admitir, pensar nisso ouvindo o som da respiração e das batidas do coração dela ao lado me fez começar a gostar da idéia.

A menina só foi acordar novamente quando o Sol já havia se levantado. Milagrosamente, eu estava apenas a 300 km de casa, o que deveria demorar uma hora mais ou menos. Talvez um pouco mais.

Ela se espreguiçou, e olhou ao redor. Depois, meio que tomando um susto, olhou para fora, olhou para mim, olhou para fora de novo e ficou nisso, tentando se achar. Dei a ela um tempo. Ela acabou parando o olhar em mim, assustada. Era melhor eu falar alguma coisa.

-Tudo bem, você está bem. Não vou te fazer nenhum mal.

-Cadê o papai?

-Seu pai... ele... ele está fazendo uma viagem longa.

-E quando ele volta?

-Ele não sabe ainda.

-Quem é você? – Ela falava bem demais para uma criança tão nova, isso era um pouco assustador.

-Pode me chamar de Giuliet. Você é Roberta, certo?

-Aham. Papai pediu pra você cuidar de mim?

-De certo modo sim.

-Aonde estamos indo?

-Um lugar seguro, tem umas pessoas legais lá. – Umas pessoas que vão querer me matar, mas tudo bem.

Silêncio no carro, só o som baixo do rádio. Ela havia se aceitado a idéia meio cedo demais, talvez ainda não conseguisse se dar conta de que eu era um perigo em potencial. E a única coisa que eu conseguia pensar era em como eu ia contar para ela que o pai estava morto. As informações daquela carta ainda estavam girando na minha cabeça.

Faltavam apenas alguns quilômetros para chegar em Forks quando, olhando pelo retrovisor, eu os vi. Distantes, mas se movendo na floresta, nos alcançando. Eu havia diminuído a velocidade achando que não nos achariam tão cedo, mas havia os subestimado. Voltei a correr, torcendo para que a velocidade do carro fosse o suficiente para que, pelo menos, eu chegasse em um lugar seguro, onde os outros ouviriam meu chamado caso eu precisasse de ajuda. Continuei pela estrada, passando da entrada de Forks, na direção da minha casa. Eles estavam muito próximos agora, nos alcançariam antes que eu entrasse na área segura. Juntei a bolsa de Roberta, tirei o cinto dela, a segurei pela cintura, arrombei a porta do meu lado e saí para a estrada, o carro batendo nas árvores logo à frente. Entrei na floresta, no território que eu conhecia, e comecei a correr o mais rápido que eu podia, com ela nos braços, desviando dos galhos. Eu era rápida, mas eles também eram. Talvez se eu conseguisse manter a velocidade por mais um tempo, ou talvez confundi-los. Eu tinha que encontrar uma forma de sair daquilo.

Com a menina nos braços eu tinha que tomar mais cuidado e não poderia correr exatamente como deveria. Eu estava quase chegando, só mais um pouco. Eu podia senti-la assustada nos meus braços, mas não havia nada que eu pudesse fazer por ela. Mais uns poucos quilômetros e eu estaria no meu território, meu clã já poderia me ouvir de lá. Eu podia ouvir os passos deles atrás de mim, se aproximando, mas eu já estava na maior velocidade que eu poderia atingir me preocupando com Roberta.

Tarde demais, um me atingiu pelo lado e caí de costas, tentando protege-la da queda. Arrastei no chão por uns cinqüenta metros até parar em um tronco, quase quebrando-o. Me levantei rápido, botando uma assustada criança atrás de mim, na frente do tronco, protegendo-a com o meu próprio corpo. Teriam que passar por mim primeiro.

Eu os vi melhor pela primeira vez. Um era baixo e de cabelos cor de palha, claros demais para serem considerados normalmente loiros e mais escuros do que branco. O outro era mais alto de cabelos castanhos claros. Ambos tinham uma espécie de olhar psicótico e assassino.

-Agora nos passe a menina e fica tudo certo. – Disse o loiro, estendendo a mão.

-Vocês vão embora agora e eu finjo que isso não aconteceu, então fica tudo certo. – Respondi, sem a menor chance de entregar a menina.

-Carl, você não está reconhecendo? É a Volturi, se a gente matar ela vamos mandar em todo mundo! – Disse o castanho me fazendo revirar os olhos.

-Para isso você tem que matar o clã todo, acéfalo.

-Cala a boca, Patrick. – O outro falou, fazendo o maior se encolher. – Você está em desvantagem, vamos evitar um problema. Não quero desestabilizar a ordem das coisas, só quero resolver meus problemas. Me dê a menina.

-Não. Vai ter que passar por cima de mim.

Ele sorriu sarcasticamente.

-Não seja por isso.

Eles fizeram menção de se aproximar, mas fui mais rápida e montei meu poder, criando uma barreira entre nós e eles. Eles pararam por um instante, trocaram um risinho debochado e começaram a avançar. Atravessaram a névoa sem nem sequer se abalar, acabando com meu último trunfo. Escudos mentais, se eu pudesse aniquilar com um poder, seria esse.

-Vai precisar mais do que isso para escapar dessa.

O maior avançou e eu me abaixei rápido, levantando quando conseguiria atingir o meio do corpo e arremessando longe, a tempo de jogar Beta para longe, ela provavelmente se machucara, mas eu conseguiria manter ela longe deles mais alguns segundos. Ouvi-a choramingar em algum ponto atrás de nós, mas não poderia fazer nada nesse ponto. Consegui afastar o loiro a tempo de chegar novamente no grande, que ia correndo na direção da menina. Porém, enquanto me atracava com ele, o outro chegou e me segurou por trás firme, antes que eu pudesse realmente reagir. Ele era mais forte do que eu e nenhuma técnica para me soltar funcionou. Não com o outro voltando para mim e me acertando socos na barriga, fazendo a dor irradiar pelo meu corpo todo.

-Você pediu, Volturi. – Disse o loiro. – Vai demorar para morrer para aprender a não ser tão    soberba.

E o armário continuou a aplicar golpes na barriga e no rosto, enquanto eu tentava arrumar uma forma de me soltar. Pelo menos eles estavam focados em mim. Mas não havia muito a se esperar, uma hora eles iriam se cansar e seria o meu fim. Eu já havia encontrado inimigos muito piores, mas sempre foi assim. O ciclo se fechava mais cedo ou mais tarde. E era isso.

Ele parou de bater, e eu sabia que era o momento. Mas ele começou a se demorar demais, e o outro atrás de mim pareceu vacilar no aperto. Foi então que eu consegui voltar ao normal e ouvir.

Primeiro o som de passos, depois o ruído gutural. Quando o cheiro me alcançou, eu não tinha mais a menor dúvida. Clearwater, a loba alfa. Abri os olhos e a vi se aproximar, aparentemente sozinha. Ela avançava lentamente para o grande, medindo-o. Os dois estavam totalmente sem ação, não sabiam o que era aquilo. Eu sabia e estava comemorando por não estar avançando para mim. Quando o outro começava a pensar em ter uma reação, ela pulou, mordendo perfeitamente no pescoço do vampiro. Aproveitei a deixa para dar um impulso para trás e conseguir me livrar do aperto, aproveitando para agarrar um de seus braços e arrancar. O grito se unia com o do outro, que tinha uma parte qualquer arrancada. Depois que ele perdera a confiança, ficara mais fácil fazer o resto. Logo ele era um bolo de massa no chão. Peguei um isqueiro que carregava no bolso e joguei sobre ele. Ela aproveitou e jogou os restos do outro no fogo, em absoluto silêncio, até porque, estava em forma de lobo. Depois ficou olhando para o fogo, sem fazer nada. Aquilo era estranho, mas eu estava agradecida por não ter tentado acabar com todos os vampiros da cena. Até que Beta choramingou lá atrás, e a harmonia acabou.

A loba olhou para trás e eu pude ouvir os batimentos ficando mais rápido do que o normal. Era raiva, ela tinha tirado suas próprias conclusões. Eu ignorei, andando em direção a menina, agachando ao seu lado e a levantando para checar os estragos. Só alguns arranhões nas pernas e nos braços, nada demais. A outra ainda estava no mesmo lugar, a respiração ficando irregular.

-Eu posso explicar. Ela não é humana. Por favor, fique humana.

Ela controlou a respiração e sumiu na mata. Consegui acalmar Beta, que aos poucos voltava ao normal e começava a brincar com um graveto ali perto, sentada em um tronco caído. Alguns minutos depois Camily reapareceu, humana e vestida. Quase parecia normal de novo.

-Tudo bem, me dê uma razão razoável para essa criança estar com você no meio disso.

-Vem comigo.

Andamos até um lugar fora do alcance auditivo de Roberta. Então eu comecei.

-Ela é híbrida. Vampiros pode ter filhos, só os do sexo masculino, desde que a parceira seja uma humana. Descobri isso ontem, mas tudo bem. A mãe dela morreu no parto, o pai não conseguiu transformá-la a tempo. O pai faleceu ontem nas mãos daqueles dois, não pude fazer nada por ele. Ela não tem ninguém, eu não tinha o que fazer além de trazê-la comigo.

-E você pretende criá-la?

-Não sei direito ainda. – Disse olhando para a direção da menina. – E... obrigada por ter me salvo hoje. Se você não tivesse aparecido, eu não sei o que teria acontecido.

-Eu tinha uma maldita dívida com você. Agora acabou. Só por isso.

-Ainda assim, obrigada.

Ela deu de ombros e caminhou na direção da menina, parando longe e observando.

-E ainda tem uma última coisa que eu acho que você tem o direito de saber.

-O que? – Ela perguntou distraída.

-Provavelmente é um alarme falso, mas há uma espécie de ameaça me cercando, um vampiro que provavelmente quer a minha posição. Pode ser que o território sofra um ataque.

-Vamos estar prontos se eles vierem.

-Não estou falando para vocês se prepararem. É para se protegerem. Isso é culpa minha, vocês não tem que correr risco por algo que não é da conta de vocês.

-É nosso território.

-É nosso também. Cada um cuida das próprias confusões.

-Veremos.

Ela começou a andar em direção a floresta, mas antes de sumir se virou por um momento.

-Sobre aquele dia com aquele vampiro... valeu, eu quase fui mordida. – Ela falou com um tom de voz preso, como se fosse a coisa mais difícil do mundo falar aquilo.

-Não foi nada. Eu fiz o que gostaria que fizessem comigo.

Ela deu de ombros e sumiu. Ouvi os dois passos se tornarem quatro mais à frente. Peguei Beta, botei nas minhas costas e comecei a andar para casa. Ela já estava bem.

-Quem é ela? – Perguntou distraidamente.

-Uma amiga. – Menti. Ou, talvez, depois de hoje, nem fosse tão mentira assim.


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