POV Ares

O lindo jantar de noivado que Hera tinha programado estava virando um completo caos, mas não era o suficiente para que Alice atingisse seu objetivo. Por isso, ela correu até a mesa mais afastada do restaurante, onde a única pessoa que aprovava a cena estava.

- Isso está perfeito! É um trabalho de mestre, com certeza! – Encatava-se Éris. Assim que Alice parou na frente de sua mesa, ela abriu um sorriso maldoso – Então quer dizer que a musa de Apolo mudou seus padrões de diversão, é?

- Éris... – Alice estava tentando falar o que queria, mas eu a interrompi.

- Tem certeza disso mesmo? – Perguntei á ela. Apolo apareceu do outra lado dela, e parecia ter visto em algum tipo de visão exatamente o que Alice planejava. Deus das profecias tem suas facilidades...

- Tenho. – Alice olhou para Éris – Eu sei que você não deve gostar muito de mim depois do que eu fiz, mas...

- O que?! Está brincando?! – Éris riu e olhou para nós dois com um sorriso maldoso – Eu amo essa garota! Ela não é perfeita?

- Éris, tem que ser rápido. Eu preciso que... – Alice foi interrompida.

- Que eu torne esse lugar um caos ainda maior? – Perguntou ela completando a frase. Éris estalou os dois dedos ao mesmo tempo, e sorriu novamente – Eu já não disse que sou sua fã número um, Alice?

Nesse exato momento todos do restaurante se levantaram e jogaram tudo para o ar. Foi uma chuva de macarrão, camarão, sopas, caldos, peixes, filés, arroz, e milhares e milhares de verduras.

Homens elegantes de terno esfregavam molho nas caras uns dos outros como se de repente se tocassem que se odiavam. Algumas mulheres começaram a entrar para a guerra de comida também.

Ártemis tinha acabado de entrar com uma de suas caçadoras, e foi logo acertada por um prato de purê de batata. As duas morreram de raiva. A cabeça de vento, e a Apolo Jr começaram a rir dela falando “Se deu mal, Bruna!”. Bruna entrou para a luta, e Ártemis também. Apolo e eu rimos ao ver a cena.

- Alice, você perdeu a cabeça. – Disse ele rindo – Mas eu adorei a sua idéia!

- É... Espero que ela dê certo. – Murmurou ela tensa. Nós voltamos para a mesa onde os 10 olimpianos estavam brigando, e ficamos observando a cena. Atena tinha o cabelo loiro tingido de vermelho graças ao molho de tomate.

Hefesto tinha uma metade de ovo no lugar de um de seus olhos. Afrodite atacava o primeiro que aparecia na sua frente com os cabelos cheios de pedaços de peixe.

Demorou talvez alguns longos minutos, quase horas, para todos pegarem as sobremesas. A gota d’água que fez o copo transbordar foi quando uma torta de cereja acertou a cara de Zeus, e ele caiu sentado novamente.

Nesse momento, nós não estávamos nem mesmo notando isso. Eu, Alice e Apolo nos entreolhávamos rindo da cena toda, e esperando que tudo desse certo e meu pai perdesse a cabeça. Foi o que aconteceu...

- Cheeeeeeeeeeeeeeeega! – Rugiu ele fazendo o local inteiro tremer. Os mortais saíram correndo de lá o máximo que podiam, mas os outros semideuses e Deuses permaneceram imóveis – Eu sou o Deus dos Deuses, e exijo ordem!

Todos pararam. Os olhos castanhos de Alice desviaram para o rosto de Zeus, mas eu permaneci olhando para ela por um tempo. Tinha um sorriso no rosto. É... Ela podia ser chata, irriante, mimada, pirralha, idiota, mas se tinha uma coisa que eu gostava nela era a sua capacidade de me surpreender nas mais remotas ocasiões.

Eu continuei sorrindo torto para seu rosto. Ela não tinha sido poupada da guerra, é claro. Sua bochecha esquerda e a ponta de seu nariz estavam sujas de chantili. Senti uma imensa vontade de agarrá-la ali mesmo e limpar o chantili com a minha boca, mas me contive.

- Alice... Kelly! – Rosnou Zeus – Por que será que não me surpreende o fato de você ter que arrumar uma confusão quando tudo está indo bem?! Você não desaponta só a mim, mas ao seu pai também!

- Na verdade... Eu faria a mesma coisa que ela fez. – Hermes encolheu os ombros prendendo o riso, e depois piscou para Alice – Essa é a minha filha. Que orgulho.

- Calado, Hermes! Não perguntei nada á você! – Rugiu Zeus ao ver que não ganharia apoio dele – Acho que depois de tantas confusões, você já sabe o que vem agora, não é?!

Alice assentiu em silêncio, mas prendendo um sorriso. Olhei para Apolo, esperando que ele também estivesse sorrindo, mas senti o meu corpo gelar ao ver seu rosto um tanto triste.

- O que houve? – Perguntei para ele – Você... Viu alguma coisa sobre o que vai acontecer?

Apolo abriu a boca para responder, mas não agüentou falar. Ele só negou com a cabeça, e eu realmente esperava que aquilo significasse que ele não tinha visto nada, mas não era verdade. Ele vira o que aconteceria. Se tinha uma coisa que eu odiava em Apolo era a sua estúpida capacidade de ver o futuro quando ele queria. Maldito!

Zeus olhou para nós dois e depois para Alice.

- Eu já pensei em um castigo mais satisfatório dessa vez. – Disse Zeus com um sorriso maligno – Estou cansado de ter que aturar vocês três com todas as suas bagunças, e confusões! Para mim já chega. Já passou da hora de vocês terem uma lição. Como, pelo visto, os castigos anteriores não foram suficientes, eu pensei em algo melhor agora.

Ótimo. Então... Ele ia acabar com o casamento, não é? E depois seríamos obrigados a ficar juntos mais 100 anos. Pronto. Fim. Esse era o objetivo desde o começo. Mas não foi isso que aconteceu...

- Na última vez eu te dei a chance de escolher entre um deles. – Disse Zeus – Você escolheu os dois, porque quis, mas dessa vez não. O casamento acabou... Para pelo menos um dos dois.

Alice olhou para nós dois, e depois novamente para Zeus.

- O que? – Perguntou ela com uma voz fraca – Você não vai... Nos forçar a nos dar bem ou qualquer coisa parecida que você sempre faz?

- Não. Dessa vez já chega. Vocês nunca vão se dar bem, e eu estou farto de tantos problemas. – Negou Zeus – Ou você escolhe só um e se casa com ele, ou simplesmente não haverá casamento.

Alice engoliu em seco. Seus ombros caíram, e reconhecer aquela cena. Ela estava do mesmo jeito desanimado quando eu perguntei sobre o seu padrasto e sobre o porquê da briga entre eles. Sabia que naquele momento ela devia estar se sentindo péssima. Nada foi como ela planejou, tirando a guerra, é claro.

Alice queria que ele nos prendesse juntos, mas o que aconteceu foi o contrário. Aquilo eram ordens claras para nos separar.

Eu não me sentia tão mal. Principalmente se eu fosse o escolhido, é claro. Por que se não eu estava ferrado.

Acho que os outros Deuses também notaram que ela estava se sentindo mal, pois Poseidon deu um leve sorriso para ela.

- Bem, mas isso foi tudo muito legal. Não nos divertíamos tanto desde... Nem lembro mais. – Comentou ele.

- É! Foi... Muito legal. Um jantar ótimo. – Sorriu Hades encorajando-o.

- E ainda assim... Pode haver um casamento. – Disse Hera. Ver minha mãe tentando fazer Alice se sentir melhor, uma meio-sangue (espécie que ela odeia), me fez arregalar levemente os olhos – Eu posso até escolher um vestido bem bonito para você, é claro. Ou fazer um! O que acha?

- Você... Pode escolher. O que quiser. – Sorriu Afrodite sentindo-se culpada.

- Então... Alice. O que acha? – Quis saber Atena. Todos olhavam para ela com pena de vê-la triste ou algo do tipo, e eu e Apolo não éramos exceção.

- E-Eu... Eu acho que... – Alice ajeitou a postura e jogou o cabelo para o lado – Que o meu cabelo está com cheiro de peixe. – Todos riram um pouco, menos Zeus.

- Você está bem, filha? – Perguntou Hermes.

- Estou. – Sorriu ela, e depois olhou para todos os outros – Não se preocupem. Eu estou bem. Eu vou sobreviver. Só que acho que vou indo agora... Tomar um bom e merecido banho.

Ninguém a impediu. Alice saiu do restaurante e todos lançaram um olhar repreendedor para Zeus, que fingiu não ver como uma criança.

- A única semideusa interessante que aparece e ainda por cima com um casamento tão diferente e especial, você tem o prazer de estragar tudo, não é? – Comentou Hera fuzilando ele com o olhar.

- Foi ela quem pediu. – Replicou ele.

- Você é um velho ranzinza. – Comentou Deméter.

- E nessa... Eu concordo com ela. – Disse Hades – Você está se comportando pior do que Deméter, Zeus!

- É isso mesmo...! O que?! – Exclamou Deméter, mas não discutiu com ele.

- Ainda acho que deve desculpas á ela. Aquela garota nos ensinou muita coisa, de certa forma. – Disse Poseidon.

- Como se você aprendesse alguma coisa com qualquer pessoa. – Rebateu Zeus.

- Ele está certo, pai! – Exclamou Atena, deixando Zeus e todos de olhos arregalados. Ela reclamando com Zeus?! A filhinha do papai?! A queridinha dele?! Uau! Alice era realmente especial! – Se não fosse por ela, muitas coisas não teriam acontecido!

- Ah, é? Tipo o que? – Perguntou Zeus sem acreditar.

- Tipo o nosso namoro. – Respondeu Poseidon se levantando. Zeus arregalou os olhos, assim como todos da mesa.

- Namoro de quem?! – Perguntou Zeus pensando ter entendido errado.

- O meu com Poseidon. – Respondeu Atena firmemente. O Deus do mar foi para o lado de Atena – Desculpe, pai, mas é a verdade. Se não fosse por Alice nós nunca entenderíamos que mesmo nos odiando, nós não vivemos um sem o outro. Assim como ela e o Ares.

- O que?! Atena o que aconteceu com você?! – Exclamou Zeus chocado.

- Eu sabia que vocês estavam se pegando! Isso não foi um sonho! – Exclamei, mas Atena me deu um tapa no braço – Tá. Parei.

- E tem mais... Se não fosse por ela, não notaria que é muito melhor ficar com alguém que você ama e se importa com você, do que sair por aí tendo casos com qualquer uma. – Continuou Poseidon – Assim como ela e o Apolo.

- Amém. – Disse Apolo assentindo.

- Vocês só podem estar brincando... O que falta agora?! Hades e Deméter se casarem?! – Exclamou Zeus chocado.

- Não chega a tanto! Não chega a tanto. – Disse Hades apressado – Mas... Acho que podemos tirar uma lição muito feliz disso tudo, e tentar nos darmos bem.

Ele sorriu de leve para Deméter, e ela retribuiu o sorriso, mas logo depois os dois fizeram uma leve careta como se tivessem tomado suco de limão sem açúcar.

- Fiquem vocês sabendo que...! – Zeus foi interrompido.

- Fique você sabendo que mesmo dizendo o que bem entende, eu não ligo. Agora se me dá licença, eu tenho que ir atrás da minha musa. – Disse Apolo se levantando da mesa. Eu fiz o mesmo e sorri forçadamente para Zeus.

- Divirta-se levando broncas, papai. – Disse e saí com Apolo.

Alice não estava muito longe. Ela andava de ombros caídos em direção ao hotel, mas nós dois corremos e paramos do lado dela.

- Alice, calma... Está tudo bem. Nós podemos dar um jeito nisso tudo. – Disse Apolo calmamente. Ele parou de andar e segurou o rosto dela delicadamente.

- Eu estou bem. – Disse ela em um tom pesado – Mesmo. Deixa isso para lá.

- As coisas não foram como você quis, mas... – Tentei falar alguma coisa boa também – Nós podemos tentar outra coisa, se...

- Não. – Negou ela – Não, nós não podemos. Esqueçam. Eu... Já decidi o que eu vou fazer. Sei exatamente o que eu vou fazer agora. Já sabia antes, na verdade, mas esperava que não precisasse ser desse jeito. Mas tudo bem. Eu... Só preciso de um banho antes de falar com vocês.

Passei o dedo limpando seu nariz e depois sua bochecha. Alice de um meio sorriso desanimado, e suspirou se abraçando.

- Eu falo com vocês no hotel, certo? – Disse e saiu correndo. Eu e Apolo permanecemos lá parados, sem darmos nem um passo.

POV Apolo

Então... Aquele era o fim. Depois de tudo que nós passamos juntos, eu entendia perfeitamente o porquê de Alice não querer deixar um de nós. Nós três juntos somos até que bem divertidos. Em situações estranhas e bizarras, mas... Eu também não gostaria que as coisas mudassem.

Mas uma parte enorme de mim queria ter a certeza de ter Alice do meu lado para toda a eternidade como a minha musa, noiva, esposa, namorada ou qualquer outra coisa do tipo.

Por isso eu soltei um suspiro, assim que eu e Ares paramos na porta do quarto dela. Olhei para ele, que parecia completamente concentrado, e abri a porta.

- Alice? – Chamei. Eu andei até o meio do quarto junto de Ares, que fechou a porta atrás de si. Sentamos no sofá, mas segundos depois ela apareceu no corredor.

Alice estava usando um vestido branco normal. Ia até um pouco acima dos joelhos e não tinha nenhum detalhe em especial. Mesmo assim, estava linda. Seu cabelo ainda estava molhado do banho, e seu rosto não expressava muita felicidade.

- Então? – Perguntou Ares – Está pronta para falar agora?

- Estou. – Assentiu ela. O cenho de Alice se franziu em um sinal de pena, e seus olhos encontraram os meus – Apolo... Nós podemos conversar?

Ah... Droga. Odeio, odeio, odeio quando as garotas pedem para conversar. A não ser no outro sentido, é claro. Aí é sempre bom.

Mas naquele momento eu sabia que o assunto era outro. Eu me levantei.

- Claro. Podemos sim. – Respondi devagar. Alice olhou para Ares, que ia se levantar também, e negou.

- Só ele. Depois... Depois eu falo com você. – Ela desviou o olhar e foi para a metade do corredor, arrumando o cabelo para trás da orelha.

Meu coração se apertava a cada passo que eu dava, mas quando por fim paramos cada um encostado em uma parede de frente para o outro, ele começou a disparar rápido ansiando pela resposta de Alice.

POV Ares

- Só ele. Depois... Depois eu falo com você.

Aham. Isso quer dizer... Que ela me escolheu, não é? Que Apolo se ferrou, e eu me dei bem. Ou... Seria ao contrário? Nunca dava para adivinhar o que Alice pensava.

Acho que eu nunca entenderia o que se passava em sua mente. Não veria as coisas com os olhos dela. Claro que não. Ela era completamente diferente.

Em um acesso de curiosidade eu estiquei o pescoço para trás tentando ver o que se passava no corredor.

Alice falou alguma coisa para Apolo, e ele deu um sorriso torto. Ela não parecia tão animada quanto ele, mas só em vê-lo sorrir eu me sentia tenso. Ela tinha escolhido ele?! Isso era um sinal?!

Ela desviou o olhar para o chão depois de terminar de falar, e Apolo o segurou nas mãos. Ele puxou o rosto dela para o seu e lhe deu um beijo. Quando a boca dos dois se separam de um modo lento e suave, Apolo acariciou o rosto dela, fazendo-a sorrir de leve.

Alice abraçou o pescoço dele, e Apolo a puxou para perto de si.

Eu? Bem... Eu procurei pela sala quem tinha acabado de me dar um tiro no peito, mas estava mais do que óbvio que tinha sido ela. Apolo cochichou alguma coisa no ouvido dela, e Alice sorriu de novo, ainda abraçada á ele.

Voltei a sentar normalmente, e esperei que ela viesse. Eu me sentia magoado, lógico, mas grande parte de mim sentia raiva dela. Eu odiava aquela garota. Odiava gostar dela. Odiava saber que ela existia no mundo e que estava por aí com outro cara.

Assim que Alice apareceu na minha frente para falar comigo, eu não quis ouvir. Levantei a mão em sinal de “pare” e me levantei da poltrona.

- Antes de você começar a falar... Será que poderia devolver o meu anel? – Perguntei estendendo a mão para ela. Alice olhou um pouco surpresa para mim, mas estendeu a sua mão hesitante, e eu o puxei de seu dedo. Isso deve ter doído um pouco, mas essa era uma das intenções também – Obrigado. Só para constar... Eu sinto pena do seu noivo por ter que te aturar para a eternidade.

Alice olhou para mim sem se ofender. Acho que ela já esperava isso.

- Se você não tirasse... Eu mesma pediria para você tirá-lo do meu dedo. – Comentou ela calmamente – Até porque, eu não quero me casar com você.

Ele tinha deixado mais do que claro que eu não era o cara escolhido. Dei de ombros fingindo não dar a mínima e saí do quarto. Só que as minhas pernas só funcionaram até a parede do corredor ao lado de sua porta, de modo que eu me encostei respirando fundo.

Apolo fechou a porta atrás de si e caminhou devagar até mim.

- É engraçado em certo ponto, sabe? – Perguntou ele com um rosto controlado. Estava jogando na minha cara?! – Eu nunca esperava que ela fizesse essa escolha.

- Então vai lá dentro e comemora com ela. Se é que me entende. – Comentei com certo nojo, mas Apolo riu em um tom triste. Ele encostou-se na parede da minha frente, e mostrou para mim algo em suas mãos.

Eu franzi o cenho para o pequeno objeto brilhante, e meus olhos se arregalaram um pouco.

- Não sei se vou achar outra pessoa que sirva tão bem para esse anel. – Comentou Apolo mostrando o anel de noivado de Alice em suas mãos. Eu peguei o que eu tinha dado á ela e levantei-o no ar também.

- O que...? – Minha voz falhou – Isso quer dizer que...

- Pois é. – Riu ele triste novamente. Um certo sarcasmo preenchia o ar – Acho que nós dois discutimos tanto para acabar no empate, não é?