- Mas então... O que você está fazendo em Paris? - Perguntei olhando para Scott. Nós dois estávamos andando logo um ao lado do outro pelas ruas da cidade, e Ares estava bem perto de mim também.

- Eu trabalho aqui agora. - Comentou ele dando de ombros - Nada demais.

- Nada demais? É Paris! Isso é demais. - Falei sorrindo animada - Mas com o que você trabalha? Não em diz que faz video games.

- Eu faço sim. Mexo com os gráficos e tudo mais. Mas... No momento eu só concerto coisas. - Falou ele sorrindo torto.

- Que coisas? - Perguntou Ares.

- Ahm... Coisas. Todos os tipos de coisas. - Respondeu ele dando de ombros novamente - Se quebrou, eu concerto.

- Isso é legal. Combina com você. - Falei rindo - Lembra? Você já concertou muitas coisas para mim.

- Bons tempos. - Comentou ele sorrindo para mim, mas Ares me puxou novamente para perto dele, e lançou um olhar de raiva para o Scott - Por exemplo... Antigamente você não tinha nenhum guarda-costas.

- Isso não é verdade. - Falei lembrando do sonho que eu tive sobre a cena do passado - Eu tinha você.

- Que ajuda, hein? - Comentou ele rindo.

- É... Dava para o gasto. - Retruquei dando de ombros. Scott riu, e de repente parou de andar.

- Bem... É esse aí? - Perguntou ele apontando para o hotel. Era aquele mesmo. Scott colocou as mãos dentro dos bolsos do casaco, e sorriu sem jeito para mim - Eu posso não ter grana para ficar aí, mas a minha humilde residência temporária é do outro lado da rua.

Scott apontou para uma pequena casa comprida do outro lado da rua.

- Sério? Que legal. Nós podemos... - Estava prestes a dizer que podíamos nos ver novamente, quando Ares me interrompeu.

- Nem vem! Você ainda tem que terminar o dia comigo, esqueceu? Se despede desse otário e vamos entrar logo. - Reclamou Ares cruzando os braços - Anda, Kelly!

Scott olhou para mim e eu fiquei um pouco sem graça por causa do jeito grosseiro de Ares, mas logo me lembrei de uma coisa.

- Eu ainda lembro de uma coisa. Você salvou a minha vida. - Disse para ele com um leve sorriso. Scott riu ao lembrar daquilo - Ainda estou te devendo uma, Pilgrim.

- Não foi nada demais... - Comentou ele coçando a nuca - Mas se você quiser, pode me pagar um café e estamos quites.

Coloquei as mãos na cintura e ergui uma sobrancelha para ele.

- Você está dizendo que a minha vida vale um café, Scott Pilgrim? - Perguntei fingindo estar ofendida.

- Não, é claro que não! - Exclamou ele entrando na minha brincadeira - Estou dizendo que aceitaria se você convidasse para um café.

Sorri ao ouvir aquilo, e Scott também. Ares estava resmungando atrás de mim, mas não liguei. Eu só liguei mesmo para um grande suspiro vindo do nosso lado.

- Oooown! Mas não são lindos?! - Exclamou Afrodite. Olhei para ela junto de Scott, e nossos rostos ficaram inteiramente vermelhos. Afrodite apertou as bochechas dele, e depois as minhas - Vocês dois são uma fofura juntos! Ainda bem que apareceu, Scott Collins!

Arregalei os olhos para Afrodite. Como ela sabia do Scott?!

- Ahm... Então a gente se vê, certo? A casa da frente. Vou me lembrar disso. - Disse tentando escapar de Afrodite. Scott olhou para mim com o rosto ainda vermelho e assentiu, mas depois voltou a olhar para Afrodite.

- Espera... Eu te conheço? - Perguntou ele.

- Não! Não conhece não. - Interrompi - Scott... Ela... É da minha família. O nome dela é... Ela é...

- Samanta Scarlet. - Inventou Afrodite com um sorriso deslumbrante.

- Samanta Scarlet! É esse o nome dela! - Confirmei com um sorriso nervoso - Agora... Ah, é! Ares, nós já vamos! Tchau, Scott! Tenha um bom dia, e cuidado ao atravessar a rua.

- Tchau, Alice. Nós nos vemos! - Exclamou ele se afastando.

- Mas vocês nem se beijaram? - Perguntou Afrodite chocada, alto o suficiente para Scott ouvir - Nem na bochecha?!

- Afrodite! - Exclamei com o rosto vermelho - Ele é... Só um amigo.

- Você quer tentar dizer isso para mim? - Ela cruzou os braços sem acreditar, e eu revirei os olhos entrando no hotel. Ares me seguiu, mas não estava me incomodando. Só Afrodite é que estava - Aaaawn, vamos Alice! Você tem que me contar tudo sobre o que vocês conversaram!

- Não conversamos quase nada! - Respondi depois que o elevador abriu as portas. Eu segui para o meu quarto, e entrei nele. Afrodite me seguiu.

- Mentira! Pode ir contando, querida. Dessa conversa eu faço questão de saber! - Insistiu ela sentando-se no sofá da sala. Ela cruzou as pernas e olhou para mim - Então...?

Ares fechou a porta, e pude ver que ele me olhava sem entender muito bem o interesse de Afrodite.

- Então nada! Não falamos nada demais! - Exclamei - E como você conhece o Scott?!

Para piorar mais ainda a minha situação...

- Quem é Scott? - Quis saber Apolo aparecendo do nada. Meu queixo caiu. Será que eu nunca teria paz?!

- Eu posso contar, querida, ou você conta? - Perguntou ela, sorrindo de seu jeito maldoso disfarçado para mim.

- Apolo, Scott é um amigo meu da California. Por acaso, ele mora em Paris agora. - Contei para ele.

- Fale a verdade, mocinha. - Falou ela.

- Essa é a verdade! - Exclamei. Afordite sorriu maldosamente para mim, e meu rosto ficou vermelho. Ares e Apolo olhavam para nós duas sem entender nada, mas ela fez o favor de explicar do maldito jeito dela.

- Scott Collins foi o primeiro namorado da Alice, quando ela tinha 12 anos! E agora ele está em Paris! Não é romântico? - Perguntou ela com uma carinha comovida, como se o meu passado fosse um filme romântico e meloso.

- Então ele era o seu namoradinho?! Por que não me contou isso quando estávamos na rua?! Se você pedisse com muito amor, eu poderia até virar para o lado para vocês darem uns beijinhos! - Riu Ares. Meu rosto estava vermelho de vergonha, mas ignorei isso, peguei uma almofada e joguei nele com força.

- Cala essa boca! - Exclamei irritada - Ele não era o meu namorado! Ele...! Nós éramos crianças! Não foi nada demais.

- Opa! Mas vocês dois saíram juntos hoje de manhã? - Perguntou Apolo chegando perto de mim.

- Nós nos encontramos por acidente! Não saímos juntos! - Respondi revirando os olhos - Vai ter um ataque de ciúmes agora?

Pude notar Apolo respirando fundo para se controlar, mas ele sorriu para mim e negou com a cabeça com grande naturalidade.

- Não. Eu não tenho ataque de ciúmes. - Respondeu ele calmamente.

- Você tinha que ver eles juntinhos na rua! Que casalzinho meigo! - Disse Ares apertando a minha bochecha. Odiava quando ele fazia isso...

- Eles tinham que ter se beijado! - Reclamou Afrodite de um jeito mimado - Ia ser muito fofo!

- Ei, ei, ei! Se você quer que alguém beije a Alice, eu estou aqui para isso, obrigado. - Disse Apolo apontando para si mesmo.

- Nós não íamos e nem vamos nos beijar. - Falei rangendo os dentes.

- O que?! Vocês têm que se beijar! Até mesmo na bochecha! - Pediu ela.

- Não! E... Como é que você sabe sobre o Scott?! - Perguntei sem entender.

-  Ah, Alice. Eu conheço o primeiro amor de todo mundo. É o meu trabalho, querida. - Respondeu ela. Afrodite abriu outro sorriso torto para mim - E é justamente por saber disso que eu quero que vocês se beijem. Acho que você sabe do que eu estou falando.

Meu rosto ardeu novamente.

- Do que? - Quiseram saber Ares e Apolo.

- Posso contar? - Perguntou ela para mim - Poooosso?

Revirei os olhos ao ver que os três estavam olhando para mim cheios de pespectativa, e soltei um suspiro pesado.

- Você vai contar de qualquer jeito, não vai?! - Exclamei com raiva. Marchei em direção ao corredor, mas antes que chegasse á metade dele...

- Foi com ele o primeiro beijo da Alice! - Exclamou ela alto o suficiente para eu ouvir. Pude ouvir Ares rir bastante, e Apolo protestar dizendo que nós não íamos no beijar de novo - Alice, querida! Por que você não conta os detalhes?

- Você não tem mais ninguém para incomodar?! - Perguntei envergonhada e com raiva.

- Alice! Volta aqui! - Exclamou Apolo - É sério! Eu quero falar com você sobre esse cara! Nem pense em se esconder de mim!

Parei de andar e virei-me para olhá-los. Ares estava rindo, Afrodite estava sonhando acordada com uma cena romântica minha e Apolo estava tentando controlar outro ataque de ciúmes.

Não me deixariam ir embora sem mais informações, por isso resolvi enfrentar logo a droga do problema.

- Tudo bem... Quer me perguntar alguma coisa? Pergunte. Eu respondo. - Falei revirando os olhos - Menos você, Ares. Porque você é um idiota.

- Como ele é? - Perguntou Apolo cruzando os braços.

- Ele é mais ou menos da sua altura, cabelo castanho bagunçado, olhos escuros, jeito simpático... Um cara legal. - Contei com o rosto vermelho.

- Acho que vamos ter que dividir os dias em três agora, Apolo. - Comentou Ares rindo. Fiz uma careta para ele - E que história é essa de Alice Cooper?

- Awn! Eu posso responder? Por favor! Por favor! - Pediu Afrodite e eu neguei.

- Não! Eu respondo, e acabou. - Falei.

- Mas você tem que resonder do jeito fofo, e romântico! Eu nem acredito que ele ainda te chama assim! Oooown, que amor! - Falou ela me olhando como se eu fosse algum tipo de bichinho de pelúcia.

- Não tem um jeito fofo e romântico! É... É só o jeito normal. - Meu rosto estava cada vez mais vermelho, por isso fixei meus olhos no chão - Ele... Ele me chama assim porque... Quando a gente se conheceu ele...

- Ah! Tive uma ideia melhor! Por que nós não vemos isso? - Sugeriu ela sorrindo animada. Franzi o cenho para ela, mas logo entendi o que ela quis dizer.

- Não! - Exclamei com o rosto mais vermelho ainda. Ela tinha feito aparecer na tela da TV da sala um tipo de flashback do passado. Ares se jogou no sofá apressado para ver, e Apolo não perdeu em termos de velocidade também - Ah, qual é?! Eu ia contar! Não precisam...!

- Sh! Cala a boca e assiste! - Exclamou Ares - Eu vou rir muito com isso...

Gemi um pouco e rastejei até o maldito sofá.

Lá estava em com apenas 12 anos de idade na tela da TV. No começo não era muito romântico, até porque... Eu estava fugindo. Eu corria o máximo que podia pelo meio de várias árvores, sempre olhando para trás, checando se estava sendo seguida. Tinha algo atrás de mim, e dava para notar isso só de ouvir os barulhos.

Em certa hora, um galho acertou o meu rosto com força enquanto eu estava correndo, e eu acabei caindo no chão. Levantei a cabeça rápido e olhei em volta. Eu estava em um tipo de clareira, um espaço de grama cercado por árvores altas cheias de galhos.

Olhei, então, para frente. Podia ver uma sombra negra se aproximando, o que fez os meus olhos se arregalarem. me coloquei de pé, mas não tinha para onde correr. Estava encurralada, e achava que seria o meu fim (você já deve estar cansado, não? Eu sempre penso que vai ser o meu fim), mas para a minha surpresa...

- Ei! Sobe rápido! - Exclamou uma voz. Eu olhei para cima e vi que tinha um garoto da mesma idade da minha no topo de uma árvore. Lá tinha um tipo de “casa na árvore” feita de madeira clara, mas era alta.

- Como eu...?! - Não precisei nem mesmo perguntar. Ele jogou uma corda, o que auxiliaria o trabalho de escalar a árvore. Como o animal estava atrás de mim, eu corri até a árvore sem pensar duas vezes e a escalei com certa dificuldade.

Assim que cheguei quase ao topo, senti algo mordendo o meu tornozelo. Por sorte pegou só a calça jeans.

- Ah! - Gritei pensando que iria cair, mas para a minha surpresa, o garoto me puxou para cima. Sentei-me ao piso de madeira da casa da árvore, e olhei para o animal com atenção. Ele tinha a mistura de um lobo com um cachorro. Era bem grande mesmo, e eu podia jurar que nunca tinha visto algo parecido antes. Ao menos naquela época... Pois no futuro eu sabia muito bem que era um cão infernal.

- Pronto. Ele não vai te pegar. Está alto demais. - Disse o garoto. Eu respirei um pouco e me levantei. Virei para vê-lo.

- Obrigada... - Franzi o cenho ao ver que ele sumira. Olhei em volta. A casa da árvore tinha um tipo de telhado em certas partes, e outra era sem cobertura nenhuma, só das folhas da árvore mesmo. O lugar era um grande círculo de madeira que rodeava o tronco grosso da árvore - Onde está você?

- Aqui! - Exclamou ele. Olhei para a direção de que a voz tinha vindo e o olhei. Era o Scott quando tinha também 12 anos. Andei até ele, já que estava sentado jogando videogame.

- O que...?! Tem um animal estranho e perigoso lá embaixo, e você está jogando video game?! - Perguntei incrédula - Você realmente não se importa?

- Não. - Respondeu ele simplesmente - Eu vejo esses bichos o tempo todo. Estou acostumado.

- Foi por isso que construiu essa casa? - Perguntei olhando em volta, e ele confirmou - Impressionante. O que acha que são aqueles bichos?

- Uhm... Algum tipo de lobo... Ganhei! - Exclamou ele dando um pulo animado. Eu ri e ele sorriu para mim. Ainda era mais alto que eu naquela época - Você está bem? O seu rosto...

- O que? Ah. Isso... - Passei a mão sobre o machucado - Não é nada. Eu estou bem. - Scott se aproximou e passou a mão sobre o machucado. Eu franzi o cenho com um pouco de dor - É... Só acho melhor não tocar.

Pensei que ele fosse fazer algum comentário inteligente sobre o machucado, mas ao invés disso ele riu para mim.

- Seu cabelo tem cheiro de morango. - Comentou ele rindo. Eu franzi o cenho de novo, mas acabei rindo.

- Obrigada, eu acho. Você... Você é o garoto que me ajudou na escola. Eu ia ser expulsa, sabia? - Perguntei. Ele disse que não foi nada demais - Não precisava. Você nem mesmo me conhece.

- É, mas você é legal. E... Bonita. - Disse ele sorrindo. Meu rosto ficou vermelho, tanto no video da TV quanto na vida real. Ares e Apolo olharam para mim, cada um com uma cara diferente, e eu desviei o olhar - E qual é o seu nome mesmo?

- Alice. - Respondi sem graça.

- Alice?! Tipo... Alice Cooper! Que engraçado. - Riu ele.

- Não é Cooper! - Reclamei, mas ele continuou com aquele nome - É Kelly. Alice Kelly! E qual é o seu nome?

- Scott. - Respondeu ele voltando ao video game. Eu olhei para ele e lembrei do nome do personagem do video game.

- Scott Pilgrim. - Falei e ele fez uma careta para mim - Se me chamar de Alice Cooper, eu te chamo assim, Pilgrim - Scott riu do que eu disse e assentiu.

- Ok, Cooper. Fechado. - Disse ele. Scott se levantou e foi até mim novamente. Seu rosto estava um pouco vermelho - Você... Sabe? No video game, quando você salva alguma garota... Você ganha um beijo.

Ares e Apolo olharam para mim novamente, mas eu fingi não ver.

- Quer um beijo? - Perguntei - É por isso que me salvou?

Ele encolheu os ombros, mas eu sabia que não tinha sido só por causa daquilo. Eu assenti dizendo que daria o beijo, e Apolo mordeu a almofada do sofá. Ares começou a rir, e Afrodite fez “Ooown”. Mas a Alice de 12 anos deixou o Scott de 12 anos parado de olhos fechados, enquanto pegava saia da casa da árvore.

- Até mais, Pilgrim! O lobo já foi embora! A gente se vê por aí! - Exclamei descendo da árvora. Scott abriu os olhos e correu até a beira da casa para poder me ver.

- Ei! Vai ficar me devendo uma, hein Cooper! - Exclamou ele rindo.

- É! Um dia eu te pago! - Exclamei de volta rindo. Assim que meus pés tocaram o chão, eu saí correndo de lá para a minha casa, e Afrodite desligou a TV.

- Ok... Eu odeio vocês. - Falei desviando o olhar deles.