Porta 54 escrita por That Crazy Lady


Capítulo 9
Morte




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Dois dias antes

Uma garota, de não mais de 17 anos, caminhava apressada pelos corredores do castelo. Carregava uma pequena pilha de roupas coloridas; azuis, verdes, douradas, e principalmente vermelhas. Sua grossura denunciava o tipo: vestidos. Provavelmente mais decorados que o dela, de cores pastéis e simples que batia em suas pernas a cada passo.

Então, parou. Estava em frente à uma porta de carvalho pesado, com uma tocha acesa ao lado direito que deixava sua sombra oscilando assustadoramente. Bateu três vezes com o nó dos dedos e entrou.

- Milady – chamou. – Eu trouxe os vestidos que a senhorita pediu.

Uma garota, ainda mais nova que a primeira, desceu da cama. Tinha cabelos loiros, leves e ligeiramente cacheados que deixariam babando qualquer cabeleireiro de supermodelo, mais o rosto branco um pouco sardento e os olhos cor de mel. Sorriu ao ver a pilha de roupas.

- Ah, Pek! Você conseguiu consertar o branco? Conseguiu? – perguntou excitada enquanto corria até a criada. Não mexeu nas roupas – afinal, isso era trabalho de Pekkala –, mas parecia cobiçosa para fazê-lo.

- Não foi nada muito complicado, milady, precisava apenas de um remendo.

Por sorte, a menina não tinha nenhuma noção de costura e não desconfiaria de como o túnel que tinha conseguido abrir na manga sumira misteriosamente. Magicamente.

- Agora vamos, temos que te preparar para a festa. Não se faz 15 anos todo dia, certo? – Pek disse animada, levando as roupas até uma penteadeira entalhada com flores no canto do quarto. – Que vestido vai querer usar hoje? Também temos que desenterrar sua tiara do baú e encontrar aquele cordão que seu pai lhe deu. Fiquei sabendo pelo Grib que ele espera que você o use hoje.

A menina se sentou na cama, parecendo irritada.

- Eu sei por que ele quer que eu o use. Quer impressionar Duque de Fior, aquele rabugento que vive me encarando.

Pek quase sentiu pena da menina.

- Seu pai está apenas procurando um bom noivo para você, e tenho certeza de que o Duque será ideal. – Ela passou a remexer no pequeno baú com um Clysse entalhado. – Pode acha-lo rabugento agora, mas não sabe como ele é na vida íntima. Ele pode se mostrar um cavalheiro, e ótimo marido. Além disso, não terá que sair do castelo para se casar, como sua irmã.

- Eu não ligo em sair do castelo. Na verdade, eu não ligo em sair de Kae. Odeio esse lugar, Pek! Odeio! – com essas palavras, Clysse levantou-se e começou a andar pisando forte pelo quarto. Foi até a maior janela, em frente à sua cama, e observou o céu noturno com olhos faiscantes.

Pek suspirou alto e baixou com cuidado as joias que tinha tirado de dentro do baú. Caminhou calmamente até a menina e apoiou a mão direita em seu ombro, o maior gesto de afeição que poderia fazer sem ficar mal-educado.

- O mundo é maior, não é, Pek? – perguntou. – O céu e a terra não podem se juntar ali no horizonte. É perto demais.

Pekkala sorriu. Já respondera àquela pergunta mais vezes do que podia contar.

- Claro que não, milady. O céu e a terra encontram-se muito longe daqui, ao sul, pouco depois do fim do mundo. Dizem que, lá, surgiu uma porta que leva a outro mundo.

- Criada pela magia? – a princesa perguntou, virando-se de repente para observar Pek. Tinha, nos olhos, a arrogância, o medo e a raiva acumulada pelos 15 anos de sua vida em que tinham martelado em sua cabeça: Magia é ruim. Magia é ruim.

- Não, milady. A magia surgiu muito depois da porta. – Pekkala sorriu e olhou sonhadoramente para as estrelas. – Não, a porta é do tempo em que esse mundo foi criado, antes mesmo de o primeiro grão de areia se instalar no deserto. Antes de a primeira estrela brilhar no céu! Mas essa é uma história para um dia em que você não tiver um aniversário para ir. Aniversário para o qual está atrasada!

Clysse sorriu travessamente, obviamente se sentindo melhor, e deixou Pekkala vesti-la e enfeita-la como se fosse uma boneca.

As duas caminharam juntas, Clysse na frente e Pek atrás, por todo o percurso até o Grande Salão. Na porta, separaram-se; Clysse entrou e Pek seguiu pelo corredor, a caminho da cozinha. Trabalharia até tarde, limpando restos de comida do chão. Esse pensamento empolgante a fez suspirar de desgosto.

Então, foi como se tivesse batido em uma parede invisível. Seus pelos se arrepiaram e seus sentidos se aguçaram, mais do que ela estava acostumada há algum tempo. Subitamente, sua cabeça se virou para a direita e seus olhos se encontraram com os de um vulto encapuzado.

Não procure teu adversário, dizia uma voz severa em sua cabeça. Saiba onde ele está.

- Não acha que estás te aventurando em terras hostis demais, Saphur? – Pekkala perguntou em voz baixa.

- Há uma festa no Grande Salão. Não preciso me preocupar – respondeu uma voz masculina, no mesmo tom.

- Justamente por isso deves dobrar tua preocupação. A guarda espera que algo aconteça. Vão anunciar o noivo de Clysse hoje, e o rei está decidido a deixar a ocasião ser... perfeita.

Saphur riu. Inicialmente baixo, e, depois, com vontade. Pekkala olhou alarmada para os lados e sibilou:

- Ou te calas ou eu me vou!

- Então é melhor que te vás, Pekkala. Deves ter um álibi para não ser considerada suspeita.

A garota abriu a boca para começar a discutir, mas ouviu – e sentiu – passos duros vindo em sua direção. Com um último olhar fulminante para Saphur, continuou seu caminho para a cozinha, dessa vez bem mais rápido.

Foi a conta de chegar. Gritos vieram do Grande Salão, e os empregados em massa saíram para socorrer seus amos.

- Está morto! Duque de Fior está morto! – gritava uma voz do meio da multidão. Pek olhou em volta, alarmada, então seu braço foi tomado por mãos pequenas, macias e urgentes. Encontrou Clysse agarrada a ela com o rosto em pânico, à beira das lágrimas.

- Um mago o matou – ela sussurrou. – Ouvi meu pai dizer. Um mago o matou, Pek.


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