Porta 54 escrita por That Crazy Lady


Capítulo 6
Trivel


Notas iniciais do capítulo

Eu tentei colocar a língua do Trivel em Cambria, mas o Nyah não aceitou õ3o
Então ficou em itálico mesmo.



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Não é possível dizer por quanto tempo Catarina caminhou após conseguir pousar (aos trancos e barrancos). Sabe quando a noção de tempo fica totalmente confusa porque não se tem um relógio, e você não saberia afirmar se são duas da tarde ou quatro da manhã? A coisa ali era muito pior. Ela tinha a impressão de que os segundos não tinham a mesma duração do que na superfície, e talvez estivesse alguns anos mais velha quando fosse para casa – o que não seria muito interessante.

A não ser que ir e voltar dos mundos da Sala Redonda tivesse um Efeito-Nárnia e ela voltasse a ter a mesma idade. Aí tudo bem.

Quando estava começando a se sentir cansada, Catarina viu uma vilazinha ao longe. Não era mais interessante do que o resto daquele mundo, exceto pelo fato de que ela viu algum verde – muito tímido – pela primeira vez. Provavelmente havia algum rio ou oásis por ali e as pessoas aproveitaram para se estabelecer, apesar de que morar no meio do deserto não parecia ser muito animador para ninguém. (A não ser que não houvesse outra opção; talvez aquele mundo fosse totalmente tomado por um deserto sem fim! Nesse caso, era melhor repor as reservas de água. A garota apertou o passo ao pensar nisso.)

O mais importante é que, lá no fundo, Catarina começava a sentir sua autoestima voltar. Mesmo sem a ajuda de Chess, ela conseguira descer e agora acabara de encontrar uma aldeia. Só tinha que descobrir qual era o problema naquele mundo, resolver, e então poderia voltar para casa! Não devia ser tão difícil, oras.

Ou devia?, ela pensou ao parar abruptamente no meio do caminho, perto o suficiente para ver os habitantes da aldeia. “Eles nunca foram muito amigáveis...”, dissera Chess. E ela com certeza a entendia como poderiam surgir problemas naquele mundo.

Na verdade, o problema não estava nas pessoas. Algumas até pareciam ligeiramente simpáticas, mesmo que a maioria mantivesse uma cara de “vou te trucidar e colocar sua cabeça na minha lareira”. Não, o problema eram os bichinhos de estimação. Muita gente cria gatos, cachorros, pássaros, hamsters, tartarugas, e sempre tem os doidos que criam cobras. Mas eu duvido muito que você já tenha visto alguém que crie dragões de cinco metros de altura.

Bom, Catarina viu.

- Isso não pode estar acontecendo comigo – ela lamentou enquanto observava um particularmente grande soprar fogo para o céu enquanto era aplaudido por três rapazes. – Dragões não.

- Mas o que você esperava encontrar aqui, bichos de pelúcia? – uma voz masculina perguntou rindo. Por um momento animador ela pensou que fosse o Coelho, mas era apenas um garoto magricela de cabelos castanhos. Ele não tinha um dragão. Já era um avanço.

- Bom, dragões eu não esperava – ela rebateu cruzando os braços e o observando com atenção.

O garoto ergueu uma sobrancelha.

- Como assim? É o que mais se vê em Kae. Não esteve aqui antes?

- Kae? O que raios é Kae, meu filho?

Ele lhe lançou um olhar como se pensasse que ela era doida. Bom, não devia ser muito difícil concluir isso, levando em conta que Catarina tinha uma cartola na cabeça e usava o uniforme da escola.

- Kae – ele explicou lentamente – é o chão que você pisa. Desde o fim do mundo, ao oeste, até chegar no mar. E eu não sou seu filho.

- É modo de dizer – ela disse fazendo pouco caso. – Mas então chama-se Kae? Eu ouvi algo como mundo 54.

- Os comerciantes chamam de mundo 54. Você é comerciante? – Ele a observou atentamente de alto a baixo, como se procurasse um bolso desprotegido. Catarina subitamente se deu conta de que um garoto magricela no meio do deserto era provavelmente um ladrãozinho, e ajeitou discretamente a cartola na cabeça.

- Não – ela respondeu firme, mas com cuidado.

Ele franziu a testa. Parecia desconfiado.

- Como se chama?

- Catarina.

- Ca... Caphirina? – o garoto repetiu com dificuldade.

- Não, Catarina. Ca-ta-ri-na.

Ele mordeu o lábio, como se confirmasse suas suspeitas.

- Isso. Mas então diga-me, Cah. Como uma estrangeira completamente perdida, que chama Kae de mundo 54, tem um nome estranho e veio do fim do mundo – ele apontou a direção contrária à que a garota viera, onde ficava a porta – fala a nossa língua tão fluentemente?

Catarina abriu a boca para responder, mas as palavras não lhe vieram.

- Eu não... Eu não sou bilíngue.

- O quê? – O garoto perguntou. Prestando atenção, Catarina podia perceber como a sua língua e a língua dele eram completamente diferentes, e constatar muito assustada que entendia e falava-as perfeitamente.

- Isso é muito estranho – ela disse. Então repetiu para que ele entendesse. – Isso é muito estranho.

O garoto cruzou os braços e a observou atentamente.

- Meu nome é Trivel. Você parece perdida, precisa de um guia? Eu posso te levar aonde precisa ir... Por alguns contos.

Catarina deduziu que aquela era a moeda local.

- Não sei se tenho alguns contos. Preciso falar com Chess.

- Quem é Chess? – Trivel perguntou olhando para os lados.

- Ah, é só um gato irritante que vive desaparecendo quando não deve. Aliás, essa seria uma ótima hora para esse certo gato aparecer! – ela gritou a última parte para o nada. Iria se sentir extremamente ridícula caso ele não aparecesse, mas felizmente Chess teve o bom senso de atender ao chamado.

- Ah, você conseguiu descer – ele comentou sorrindo. Estava deitado de corpo todo no chão e mantinha seu pelo em um listrado de marrom e branco, provavelmente para não assustar Trivel.

- Consegui, obrigada pela preocupação – Catarina retrucou irritada. Trivel observava a conversa com uma mescla de espanto e curiosidade. – Escute...

Infelizmente, jamais saberemos o que ela queria que Chess escutasse, pois naquele instante puderam-se ouvir gritos finos e estranhos que Catarina jamais havia escutado antes. Chess sumiu em uma coluna de fumaça e Trivel quase teve um infarto quando olhou muito assustado para cima.

- Uma patrulha. Corra, Caphirina! – O garoto deu-lhe as costas e saiu correndo em uma velocidade espantosa; ser tão magro obviamente lhe dava essa vantagem. Nem ousando tentar encontrar a origem dos gritos, Catarina correu o mais rápido que podia atrás de Trivel, até chegarem a um amontoado de rochas. Retirando a do topo, os dois entraram em uma espécie de caverna sob a areia. Trivel repôs a pedra sobre eles e a escuridão tomou o local.


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