Little Princess escrita por Emmy Black Potter


Capítulo 22
Vermelho e branco




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Capítulo 24 – Vermelho e branco

(1940, Vancouver, Canadá)

Pov's Bella:

         Com a Guerra Mundial, Vancouver era como um porto seguro. Florestas de pinheiros altíssimos, mais extensas do que qualquer um poderia imaginar. Coberta, quase sempre, com um manto branco que era a neve fofinha.

         Carlisle tinha achado uma casa grande o suficiente para todos nós no meio da floresta, longe o suficiente dos humanos, mais perto o suficiente para irmos de carro, rapidamente, a escola – que, infelizmente, era o único problema na cidade: era dividido em Elementary, Middle e High, o que significava que eu estava na Elementary, sem meus irmãos.

         Por mais que fosse indesejado, os Cullens eram uma família conhecida, Carlisle – como sempre – era o melhor médico da cidade, o que lhe dava créditos. Esme era sua mulher que, após o primeiro parto, não podia mais ter filhos. Adivinhe? Sim, eu era a única filha real do casal de trinta anos (eu fingia ter nove). Rosalie Hale era sobrinha de Carlisle – o que era facilmente visto, pois também era loira. Edward e Emmett eram dois "adolescentes problemáticos" que foram adotados.

         Não sei por que as pessoas faziam questão de decorar essa história para contar aos novos moradores da cidade.

         Era uma sexta-feira, tecnicamente para humanos, fria. Como morávamos ao norte, eu não podia usar meus vestidos, ou seja, hoje eu vestia calças jeans azuis, uma blusa de botões branca, um casaco felpudo preto e botas sem salto bege. Não, eu não conseguia ser linda como Rose.

         Eu caminhava pelos corredores de Grove Elementary School – surpreendente não ter somente uma escola, não? – indo em direção a minha aula de cálculo, a última do dia. Graças a Deus. Amanhã, eu, Eddie, Rose e Emm iríamos num final de semana somente nosso, e seria perfeito. Entretanto, antes, eu tinha que aturar a escola. Excelente.

         Já estava para virar o corredor, estranhamente vazio, quando sinto alguém me segurando o pulso com força – odeio o fato de eu ser a vampira mais distraída do mundo, quero dizer, eu viajo nos meus pensamentos como ninguém – e me puxando na direção contrária a minha sala.

         Freando do jeito mais humano possível, vi um garoto. Era da "Bad Gangster" como seu grupinho – tííííípico – gostava de se intitular. Ele tinha uma aparência quase psicótica, ou seja, não sei como o deixavam entrar na escola. Cabelos pretos compridos, pele coberta de pó branco, olhos castanhos pintados com um forte lápis pretíssimo. Gótico – Rose tremelicaria.

         Ele me puxou sem nada comentar, como se a coisa fosse normal.

- Me solta, seu doido! – chiei. Caramba. Soltem-me problemas, por que vocês me perseguem? Quanto estresse.

         E sabe qual é o pior de ter uma força super-hiper-mega gigantesca no meio de humanos normais? Não poder usufruir dela nessas horas. Meus livros espalharam-se pelo chão quando praticamente fui arrastada pelas escadas e saímos pela porta de trás.

         O sinal tocou e já não havia mais um aluno sequer no corredor. Pensei em Penny Laemmmert, na aula de cálculo, sentada em nossa mesa esperando minha ajuda para a avaliativa – ela era péssima na matéria. E eu era absurda em ficar pensando nisso nessas horas.

         Eu quase desisti e usei minha força vampiresca quando Damen me puxou em direção a floresta – lugar perfeito para se esconder. Não fingi uma vez sequer que tropeçava nos galhos, pulando agilmente quando o gótico insistia em apertar meu pulso com mais força, achando machucar de verdade.

         Ele parou. Tínhamos chegado a uma mísera clareira, coberta com a neve, com passos e, claro, com o meu problema. A – nossa que medo... – Bad Gangster estava ali, todos os integrantes que eu já tinha tido o desprazer de ver.

         Eu não liguei muito, encarei acidamente o "líder" – humanos estúpidos – Louis de La Flour, nome ridículo, para um garoto ridículo. Entretanto, famosamente conhecido como "Luch", não, eu não entendo por que. Era um garoto do último ano da Elementary, 5º grau. Na verdade, já tinha quatorze anos – no último deveria ter, tecnicamente, onze – e repetia sempre de ano. Era um ser estúpido de músculos e sem cérebro.

         E foi esse ser estúpido que sorriu maldosamente para mim.

- Ah, que bom que veio com ela, Damen, muito bom – Damen, de onze anos, quase parecia um cachorrinho gótico.

         Os garotos atrás de Luch, outros repetentes ou garotos do último ano, gargalharam quase sarcásticos.

- O que você quer, Louis? – eu resmunguei alto o suficiente para ouvirem, enquanto Damen me largava na neve. Levantei limpando as mãos na calça jeans.

         Ele pareceu incomodado com o nome, entretanto disse: - Ora, Srta. Riquinha Cullen, não podemos convidá-la para um passeio agradável?

         Eu revirei os olhos para sua pergunta, os idiotas problemáticos sempre começavam assim. E eu os odiava, muito.

- O que você quer? – eu retruquei, irritada – Dinheiro? Sinto muito, vai ficar sem. Inteligência? Bom, a coisa complica mais ainda – admito, quase ri na ironia da última parte.

- Há, há, há – Melvin (nomes bizarros) riu sarcasticamente ao lado de Luch, ele era "tipo" o sub-líder – Parece que a Cullen não é tão inocente, né não, galera?

         Estúpidos, lamentei mentalmente vendo a Gang-Tá-Me-Cansando-Dessa-Porra concordar – saco. Resmunguei palavras inaudíveis a ouvidos humanos quando Luch, Melvin e outro grandalhão que imagine ser Roman aproximaram-se.

- Então, Cullen – começou Luch, num tom quase malicioso, o que me fez quase revirar os olhos. Melvin e Roman seguraram meus braços, mantendo-me de frente para o estúpido Luch – nossa lista é longa, sabe, já passamos das mais velhas, e, agora, é você.

         E eu odiava o fato de eu ser um imã para problemas – especialmente desses.  Eu nem sou bonita!, pensei com ceticismo.

         Luch aproximou-se, o rosto a milímetros do meu. Vi Damen tremer lá trás, como se nunca tivesse estado com a Gang-O-Nome-Não-Importa – e vi em seus pensamentos que ele realmente não tinha estado, era a primeira vez que fazia algo do tipo.

         Melvin apertou meu braço, alisando-o. Luch sorriu de lado arrogantemente, pegando em meus cabelos com ferocidade e, prestes a me dar um beijo – o mais nojento da minha vida, não que eu tivesse recebido algum além do, iiiirc, Alec – quando, com as pernas livres, chutei seu rosto.

         Ele, furioso, colocou a mão no olho, e indicou a mais dois grandalhões a segurarem minhas pernas – e odiei mais ainda o fato de ter de manter o disfarce da força. A verdade era que com esses humanos tão pertos eu estava enloquecendo em sede, a raiva praticamente excluía o dom de Carl, fazendo minha boca salivar, sedenta pelo sangue que pulsava nas veias próximas.

         Quando Luch veio perto novamente, virei o rosto, recebendo um tapa furiosíssimo na bochecha direita – não, não ficaria vermelha. Não, eu não era masoquista. Então, por que fico aturando isso?, praguejei na minha cabeça.

- Obedeça, Cullen, se não vai ver só – irritou-se mais ainda Luch.

         Os grandalhões apertaram mais suas mãos, e eu fingi uma careta de dor. Fala sério!

         Arregalei os olhos com a visão seguinte – eu poderia, definitivamente, absolutamente, indubitavelmente, viver sem ela. Luch tinha tirado a camiseta, achando-se sarado e bonito – quando na verdade era feio.

         Tá. Sei que parece besteira, mas, em minhas condições, aquela visão era muito nojenta. Sério. E, quando Luch se aproximou tão perto de mim, mas tão perto, eu estava no ápice da sede, raiva e estupor.

         Seu cheiro, diferente de suas atitudes, era ótimo, cheirava a canela e dias de chuva, e tão próximo, vi sua veia praticamente pulsando no pescoço e o coração martelando numa altura absurda. Não raciocinei direito.

         Um escudo físico foi feito a nossa volta, de toda a Gang e eu, impedindo-os de sair. Chutei e jogueis os grandalhões que me seguravam com uma força "enorme" e saltei feroz e sedenta em Luch, que retrocedeu assustado.

         Ele nem mesmo teve tempo de lutar, rasguei suas garganta, sugando o sangue vermelho com avidez, o gosto explodindo deliciosamente em minha boca – eu nunca provara algo tão bom assim. Limpei o rastro que escorria no meu queixo e lambi o dedo, o gosto de sangue humano.

         E sorri, ainda irracional com o gosto e os cheiros, para os humanos que restaram, apavorados. Num segundo, quebrei o pescoço de Melvin, sugando seu sangue tão rápido que no minuto seguinte, sugava do pulso de Roman, que amoleceu em meus braços – morto.

         Quebrei mais dois pescoços, empanturrada de sangue, quando cheguei a Damen. Ele era do último ano da Elementary, mas era mirrado e fraquinho, com sua aparência gótica e franja cortada em navalha. Vi seus olhos castanhos, circulados de um forte preto, piscarem aterrorizados para mim. Instintivamente se encolheu quando eu sorri torto para ele, passando a língua nos meus caninos banhados a sangue.

- P-Por f-f-favor – ele gaguejou.

         Por uns poucos segundos, me vi ali, no lugar dele, com Alec e Jane sorrindo maleficamente para mim. E depois me morderam.

         A racionalidade não voltou a tona e o fraco cheiro do sangue que restara na grama – dos mortos, é claro – me fez apertar os olhos e pular em Damen, ignorando seus pedidos, lamurio e chorinhos – exatamente como os gêmeos tinham feito comigo.

         Eu, Bella, que tinha me sentido injustiçada quando Jane e Alec morderam-me, tinha acabado de fazer a mesma coisa que eles, e isso fez minha visão clarear. Os meus sentidos voltaram, percebendo o estrago que eu tinha feito.

         Os corpos de, praticamente, "crianças" estavam no chão, Damen estava aos meus pés! Eu... Eu era pior que Jane e Alec, eu não só matara um, mas sim, muitos. Eu era perigosa, um monstro, uma... Pessoa sem alma – me vi pensando nas palavras de Edward.

         A neve que escorria próxima a mim tinha um tom vermelho, rosa e, pouco, branco. Era uma neve de sangue – do sangue das pessoas que eu matara. Eu, a que tentava ser boa.

         Cambaleei como uma humana bêbeda até o centro da clareira que estava, caindo numa posição fetal contra o solo rosado de sangue, sem me importar em sujar as roupas – afinal, eu já era suja.

         Só soube que chorava quando o veneno escorreu da minha bochecha para o lado, caindo nos meus cabelos que, estranhamente, ao contato com o veneno pareceram ganhar mais vida – como se, o que pudesse matar, os fortalece-se. Como eu, quando tiro as vidas, fico mais forte. Como eu, um monstro.

         Limpei o veneno em lágrimas, no entanto, ele insistia em voltar. Solucei, meus ombros tremendo fraquinho com as lágrimas que eu tentava impedir, mas, mesmo assim, caiam. Cocei os olhos e, quando me toquei que estariam vermelhos, chorei mais ainda.

         Solucei num, finalmente, choro seco, correndo e pegando os corpos, colocando-os numa mesma pilha. Debulhei-me em lágrimas de veneno, novamente, ao ver o corpo do mirrado Damen no topo do montinho, arrependida de não ter escutado suas suplicas.

         E, foi nessa hora, que ouvi o que menos queria: - Princesa?

         Olhei para o céu, de olhos fechados, sentindo a brisa do crepúsculo batendo contra meu rosto. Eu preferia mil vezes que fosse outra pessoa, dizendo "Maninha", "Bella”, "Filha". Na verdade, preferia que ninguém me visse nessa situação, mas, não queria que fosse, especificamente, Carlisle a me achar.

- Quem matou esses garotos? – ele perguntou já do meu lado, checando-me se eu não tinha lutado contra um vampiro ou algo do tipo, percebi.

         Ainda de olhos fechados, impedi as lágrimas. Meu pai confiava o suficiente em mim para acreditar que outra pessoa e, não eu – que estava na cena da carnificina –, tinha matado aqueles garotos.

         Percebi uma movimentação, quase chorando ao fato de que toda a família estava ali, provavelmente me procurando, já que não voltei da escola – claro, estava matando, pensei com ironia. E não era matando aula.

- Pai – comecei cuidadosa, quase medrosa – eu... Eu... – gaguejei, sentindo as lágrimas pigarem dos meus olhos fechados.

- Bella! – Carlisle ficara tão surpreso que nem me chamou de Princesa, o apelido parecia distante com o que eu ia contar.

         Alguém as secou, e, mais culpada ainda, senti a minha volta um preocupado Edward, uma atenta Rose, um confuso Emmett e uma amorosa Esme.

- Você está... Chorando? – chocou-se meu pai.

         Negativamente balancei com força a cabeça, mas ainda derramando veneno.

- O que foi, Princesa? O que aconteceu? – aconteceu, pai, que matei muitos garotos somente porque me irritei com eles, somente porque seus sangues, de repente pareciam deliciosos.

         Funguei baixinho, completamente desnecessário, vampiros não soluçam, não fungam, não espirram, nem choram. Ou quase isso.

         Apertei com força os olhos e, repentinamente, os abri, chocantes. Pelo teor dos pensamentos de Esme, de maneira rápida, vi uma imagem minha, de olhos vermelhos sangues chocantes e horripilantes.

- B-Bella – gaguejou Emmett, surpreso. Seus olhos já dourados fizeram-me sentir pior.

         Eu levantei, ficando de costas a minha família, os braços caídos flácidos ao lado do corpo, a cabeça baixa. Envergonhada. Culpada. Arrependida.

- Eu sou isso – apontei levemente com a cabeça em direção aos corpos –, um monstro. Minha alma, concordo com Edward, não está mais aqui. Sou somente uma carcaça vazia, oca. Triste.

- Princesa, não... – começou Carlisle, querendo tocar meu ombro. Eu desviei dele.

- EU SOU ASSIM, CARLISLE! – gritei, irritada que não entendessem, apontando para mim mesma – UM MONSTRO, UM SER QUE TENTA COM DESESPERO SER FELIZ, MAS QUE SABE QUE NUNCA, NUNCA E NUNVA VAI SER!... – respirei fundo, dizendo mais baixo, porém não menos irritada – E hoje eu percebo que, enquanto tentava ser uma pessoa normal, alegre, eu só estava enganando a mim mesma. Fingindo ser quem eu não sou.

- Não é não, Bella – discordou Edward, dando um passo a frente para me abraçar, confortando-me. Mas eu desviei.

- Os olhos são a janela para a alma – citei mediocremente – e, acontece que não tenho alma... Por isso eles são vermelhos.

         Eu não chorei.

         Carlisle suspirou, e ignorei seus pensamentos, não queria saber o que ele pensava de sua primeira filha – não queria saber dessa história nunca mais, só queria sumir!

- Bella, todos já matamos alguém, acidentes acontecem... – começou Esme amorosamente. Num amor que eu não merecia.

- Não foi sem querer, isso eu lhes garanto – murmurei sombriamente – eu matei Luch, Melvin, Roman e seja lá quem mais porque quis. Ignorei completamente os pedidos de vida de Damen. Eu os matei, não foi um acidente.

         Esme ainda olhava para mim amorosa, completamente alheia as bombas dentro de mim.

         Suspirei. Eles, simplesmente, não entendiam. Deixei-me ser abraçada por Emmett, que me rodopiou no ar, dizendo que todos cometiam erros. Deixei Rose me dar um abraço, delicado e apertado ao mesmo tempo, somente dizendo um "Eu te amo, maninha" – e não sei por que parti meu coração. Deixei Esme acariciar minha cabeça, beijando-me na bochecha e dizendo que também me amava, eu era sua filha. Deixei Carlisle se agachar e beijar minha testa levemente, não me culpando.

         E olhei para Eddie de longe, vendo que ele olhava para mim profundamente. Percebi que ele também me entendia, sabia como eu me sentia e, isso, estranhamente, me fez sentir melhor.

         Como se, o fato de ter alguém tão igual a mim fosse bom.

         Quando ele me pegou no colo para irmos para casa, eu simplesmente coloquei meus braços em volta de seu pescoço e enterrei a cabeça em seu pescoço, derramando as minhas últimas lágrimas.

         Aliviada em saber que a melhor família do mundo era aquela.

         E eu era incluída nela.


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