Acorde, acorde, acorde...

Eu a vi correndo em meio aos destroços, estava desesperada chamando por seu pai. O céu vermelho e flocos de neve que queimavam a pele anunciavam o desastre.

Eu a vi falando palavras sobre seu pai, sua mãe e Max. A Vi reconhecer o acordeão de seu pai e lutar para carregá-lo. Notei sua feição de susto assim que me viu.

Me reconheceu pelos cabelos tenho certeza. Ouvi seu sussurro chamando meu nome. A vi soltar o livro que escrevia no chão, em cima dos destroços. Ela correu até mim.

Ela chorou sobre mim.

Não sentia suas lágrimas me molhando, mas eu via e se possível eu sentia a sua dor.

- Rudy, acorde – ela soluçava agarrando minha camisa e me sacudindo incrédula - Acorde, Rudy – pedia desesperada.

Eu queria tocá-la.

Queria respondê-la.

Queria acordar, mas simplesmente não conseguia.

- Rudy, por favor – lágrimas e mais lágrimas caindo de seu rosto – Rudy, por favor, acorde, que diabo, acorde, eu amo você. Ande, Rudy, vamos,

Jesse Owens não sabe que eu amo você? Acorde, acorde, acorde...

Como eu queria atender seu pedido e acordar.

Como eu esperei para ouvir essas palavras: “Eu amo você”.

Porque isso agora?

Tudo parece tão injusto.

E o céu vermelho e o chão empoeirado com o ar “envenenado” para fazer jus a esse final devastador.

- Vamos, Jesse Owens...

Eu quero acordar Liesel acredite.

Ela agarrava meu corpo incrédula, chorando e suas lágrimas era o que mais doía em mim.

Eu queria abrir os olhos dar uma boa gargalhada a xingar e dizer que isso era uma piada sem graça só para ela confessar que me amava e lhe roubar o beijo que tanto esperada.

Mas a realidade é tão devastadora.

Acho que agora entendo o porque dela viver no mundo dos livros.

A realidade simplesmente acaba com você.

- Meu Deus, Rudy...

E então aconteceu, vi ela se inclinar e me beijar. Pelo menos beijar o meu corpo sem vida no chão. Ela me beijava calma, era tão real e impossível, queria tanto sentir esse beijo. Porque não o sentia? Ele finalmente estava acontecendo e eu não o sentia.

Lembrei de uma tarde em que ela prometeu que jamais me beijaria em vida.

Nunca pensei que essa promessa seria tão real.

Ela cessou o beijo e tocou meus lábios com as mãos ainda sem querer acreditar que eu não estava correspondendo. Ela tremia e não se controlou lançando-se pela segunda vez em minha direção me beijando mais ferozmente. Se afastou novamente, mas ficou ao lado de meu corpo ainda chorando.

Não sei como funciona esse negocio de morte sabe?

Eu estava dormindo até agora a pouco com minha irmã, agora estou aqui presenciando a menina que mais amei desesperada ao lado de meu corpo.

Queria chorar ao seu lado desesperado pelo que o destino nos reservou.

Queria tocar seu rosto a confortando.

Queria xingá-la perguntando porque não teve coragem de fazer isso antes.

Queria corresponder ao beijo empoeirado em meio aos destroços.

Queria entender esse negocio de morte. Simplesmente queria entender.