Shiroi Tsubasa escrita por Shiroyuki


Capítulo 14
Capítulo XIV




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/136935/chapter/14

Quem é Fujisaki Nagihiko?

Nadeshiko paralisou, segurando a bandeja de sanduíches no ar, com um olhar fixo e desesperado.

— F-f-f-f-uj-j-j-is… – ela começou a tremer incontrolavelmente, derrubando a comida sobre a mesa. Tentou sorrir tranquilamente enquanto arrumava a bagunça, com as gotas de suor frio que escorriam pela sua face delatando-a seu evidente nervosismo – É, bem... do que você está falando, Rima-chan? Não conheço ninguém com esse nome.

— Esse é o seu sobrenome.

— Ah… certo… é mesmo. – ela balbuciou vacilante, levantando-se e dando alguns passos para trás. Antes que pudesse se dar conta, tropeçou nos próprios pés e esbarrou na estante perto da parede. Vários objetos caíram, causando o ruído característico de vidro se despedaçando. Rima avançou, ajudando Nadeshiko a juntar os cacos, que antes eram porta-retratos e pequenas decorações.

— O que é isso? – Rima indagou com a voz soprada, e a pele mais pálida do que o normal. Nadeshiko viu a foto que ela segurava entre os dedos trêmulos, e sentiu uma onda gélida percorrer todo o seu corpo. Por que ele foi se esquecer de esconder logo aquela? Na foto, ela estava com seu antigo time de basquete, logo após um campeonato. Cercado por seus amigos, sorria enquanto segurava a bola entre as mãos, sem camisa.

— A pessoa dessa foto e da sua identidade é exatamente como você, mas se trata de um garoto. E… ele é perfeitamente idêntico ao garoto que aparece nos meus sonhos. – adicionou em voz baixa, ficando de pé – Você tem alguma explicação plausível? – inquiriu, com lágrimas teimosas beirando seus olhos. Uma única constatação gritava em sua cabeça, mas ela se recusava a aceitá-la tão facilmente.

— Isso… eu… - Nadeshiko hesitou, olhando para o carpete da sala. Estava decidido a fazer aquilo que tinha vontade, então agiu antes que a razão o fizesse mudar de ideia. Havia muito a perder com a verdade, mas ainda mais se continuasse com as mentiras.  – Esse sou eu. – disse finalmente no seu tom de voz masculino, soltando os cabelos, sem conseguir levantar os olhos e encará-la.

Os olhos de Rima arregalaram-se gradualmente, à medida que todas as conclusões a que pudesse chegar se instalassem e tomassem uma forma coerente. Ela continuou estática e inalterada durante vários minutos, sentindo-se como em um daqueles sonhos ruins, em que nada faz sentido, e o final feliz nunca chega. Piscou os olhos algumas vezes, atônita demais para conseguir dizer qualquer coisa. Não podia ser ele. Ele não podia estar aqui. Por um momento, sentiu como se estivesse vendo a cena pelos olhos de outra pessoa, como se aquela não fosse a sua história. Mas era. E tudo aquilo em que ela acreditava começou a ruir, a base de sua vida desapareceu em uma questão de segundos. Por mais que se esforçasse, só conseguia ver uma única explicação. Com os olhos quase transbordando ela encarou o vazio, evitando a todo custo olhar para a pessoa a sua frente.

Aquilo não foi um sonho. Esse era o único pensamento que ecoava em sua cabeça nesse momento, e a fazia corar levemente pelas lembranças. Apesar de se sentir desse modo, ela enterrou todo e qualquer sentimento bem fundo, querendo ser forte por apenas mais algum tempo.

— Rima… - ele levantou a mão hesitantemente, na direção do rosto da garota.

— Não me toque – ela disse secamente, voltando a sentar no sofá como uma boneca inanimada. Nagihiko continuou a fitá-la, com a preocupação tingindo seus olhos. Esperava pela sua reação apreensivamente, sem conseguir sequer piscar – Isso quer dizer que esse tempo todo… esse tempo todo, você mentiu para mim? – ela indagou com a voz falha, os olhos úmidos brilhando dolorosamente. – Você era um garoto desde o início. E me fez acreditar que eu estava…

— Não, Rima. Não foi assim. Ouça-me. – ele se ajoelhou na frente dela, tomando cuidado para não tocá-la de forma alguma.  – Eu não quis mentir para você, por favor, acredite em mim. Eu apenas… fui fraco. Eu… – Aquela não era a hora certa para falar dos seus sentimentos, Nagihiko mordeu a língua antes de dizer algo inapropriado para o momento. Sentou ao seu lado no sofá, e ela moveu-se minimamente para mais longe dele. Visto que Rima permanecia em silêncio, ele continuou – Quando seu pai procurou uma empresa de segurança, ele condicionou especificadamente que gostaria que fosse uma garota a proteger você. Como não havia uma segurança mulher disponível, e nenhuma com a idade que ele determinou, o diretor sugeriu que eu me vestisse desse jeito, e seu pai concordou.

— O meu pai sabia?

— Sim.  – Nagihiko disse, fitando suas mãos entrelaçadas em frente ao corpo, com os cotovelos apoiados nos joelhos – Eu quero que você tenha em mente que eu jamais, em momento nenhum, quis enganar você, Rima. Muito menos o seu pai. – ele pediu, em voz baixa e calma, com os olhos fechados. Parecia estar fazendo uma oração – Ele apenas quis zelar pela sua segurança.

— E porque mentiram para mim dessa forma? – ela indagou, sentindo seu coração martelar dolorosamente contra o peito, dificultando sua respiração. Colocou os pés para cima do sofá, abraçando as pernas e apoiando a cabeça nos joelhos. Nagihiko sentiu as batidas do coração falhando, ao vê-la com aquele olhar. Sentiu a vontade de abraçá-la naquele momento invadir seus sentidos, deixando seus braços fracos e trêmulos.

— Eu não sei bem qual a intenção do seu pai quando pediu que eu me vestisse de garota, mas acredito que sejam pelos motivos óbvios, que todos os pais se preocupam quanto às suas filhas. É natural que ele queira protegê-la dessa forma. Eu apenas fiz o que ele me orientou. – disse, com a voz rouca e soprada.

— Então foi meu pai quem o orientou a me enganar daquela forma? Foi ele quem disse para você fazer todas aquelas coisas enquanto eu acreditava que estava sonhando esse tempo todo? – Rima disse em voz baixa e ameaçadora, com um pouco de dificuldade em dizer aquelas coisas em voz alta.

— Não, Rima! Eu não quis te iludir, eu juro! – Nagihiko pediu desesperado, com os olhos marejados. Por um breve momento, ele quase segurou os braços de Rima, mas conteve suas mãos a tempo – Eu já disse, eu fui fraco. Eu acabei… me apaixonando por você. E estraguei tudo – ele admitiu por fim, com um sorriso melancólico disfarçando lágrimas que não caíram.

Rima continuou a encará-lo, não querendo esboçar reação, por mais que já estivesse com o rosto ruborizado e a boca entreaberta em surpresa.

— Eu amo você, Mashiro Rima. Nunca duvide disso. – ele disse decididamente, encarando Rima com furor. Ela corou mais ainda, olhando para qualquer lugar que não fosse ele – Tudo o que eu queria era estar perto de você, e protegê-la. Como um garoto. Eu só queria proteger a garota que eu amo, da maneira certa. Eu fiz tudo errado, sei disso. Meti os pés pelas mãos e acabei enrolado nas minhas próprias mentiras, mas eu nunca me senti dessa forma antes, e não sabia como agir. Eu não aguentei estar do seu lado esse tempo todo sem poder dizer como me sentia. Eu fui um idiota, um grande idiota, e tudo o que posso fazer agora é implorar que me aceite, e esperar que algum dia possa me perdoar.

— E você ainda acha que eu vou permitir que continue sendo minha… meu segurança? – Rima indagou, com um tom de sarcasmo falho na voz trêmula.

— Eu não acho. Tenho certeza. – Nagihiko disse determinadamente, desafiando Rima com o olhar. Ficou de pé, sem hesitar enquanto falava – Eu não vou deixar que você me afaste da sua vida como quer, não sou esse tipo de garoto. Vou permanecer do seu lado e cuidar de você como venho fazendo até agora. Você pode ficar sem falar comigo, pode me bater e me odiar, pode querer me demitir, mas eu não a deixarei mais sozinha. Eu prometi para você, não foi? Posso não ser um homem adequado ainda, mas sei manter a minha palavra.

Rima mirou-o, chocada.

— Você não vai ganhar nada agindo desse jeito.

— Sei disso, mas eu não vou mais hesitar, de agora em diante. Vou fazer o que quero, e ficar ao seu lado é o que eu mais quero agora.

— Pare com isso! – a garota gritou, levantando-se em um salto, segurando as mãos cerradas ao lado do corpo. Seu rosto ardia em brasas, era possível ver mesmo que a franja escondesse parte dele – Pare de dizer essas coisas embaraçosas!

Nagihiko colocou as mãos abertas na frente do corpo, em uma posição defensiva. Suprimiu um pequeno sorriso, quando percebeu que ainda causava tais reações em Rima.

— Tudo bem. – disse.

— Eu vou guardar seu segredo, por enquanto. Permitirei que você permaneça no cargo. Eu não quero mais viver presa como antes… - concluiu com a voz sussurrada. Nagihiko sorriu fracamente, se aproximando alguns passos.

— Obrigado, Rima-chan – ele disse, aumentando seu sorriso. Rima perdeu a linha de raciocínio, enquanto o observava. Ele tinha realmente que ser tão bonito?

— Eu não perdoei você. Só estou tentando preservar a minha recém-adquirida liberdade. Prenda de novo o seu cabelo, agora mesmo! – ela ordenou, sem olhar na direção dele.

— Por quê? – Nagihiko indagou, inclinando a cabeça para o lado, confuso.

— P-por que eu fico… eu… eu gosto mais da Nadeshiko!!!! – ela disse por fim, fechando os olhos.

— Você sabe que eu… e Nadeshiko somos a mesma pessoa, certo? – Nagihiko arriscou, sem entender.

— Eu entendi! Apenas amarre esse cabelo logo, e vamos embora! – Rima disse, no tom entediado que costumava usar quando queria esconder seus sentimentos. Rumou para a entrada, parando em frente à porta fechada. Nagihiko se apressou para abrir a porta rapidamente, amarrando os cabelos no caminho.

— Ah, espere, por favor! – ele pediu, deixando a voz o mais suave e feminina possível. Rima parou no meio do corredor, e Nadeshiko entrou de novo no apartamento, como um raio. Procurava por algo, revirando tudo o que havia lá dentro aleatoriamente. Finalmente encontrou embaixo da almofada do sofá, brandindo o pequeno objeto no ar, como símbolo da vitória. Depois de se recompor, ele voltou para onde Rima esperava – Aqui. – ele estendeu um pequeno aparelhinho preto e quadrado, com uma luzinha vermelha constante a vários botões embaixo da estreita tela escura.

— O que é isso? – Rima pegou o que Nagihiko a estendia, examinando-o com atenção de todos os ângulos.

— É um pager – ele respondeu o que considerava óbvio.

— Quantos anos você tem Nadeshiko?! – Rima indignou-se, chacoalhando o pager – Isso daqui se aposentou na mesma época da fita cassete! Será que você andou mentindo sobre a idade também?

— Isso é apenas uma medida de segurança. – ele esclareceu, com sua tranquilidade característica – Depois do que houve hoje, é evidente que você não está tão segura quanto imaginávamos, e caso o pior ocorra, quero que você tenha meios de me contatar.

Rima suspirou, disfarçando o tremor que percorreu sua pele, e guardou o pager no bolso do casaco. Nagihiko trancou o apartamento, tomando a frente no caminho para o elevador. Rima o seguiu, tão próxima quanto conseguia ficar sem tocá-lo de fato.

— Você não pretende mais dormir no meu quarto, eu presumo – ela afirmou, monotonamente.

— Não vejo qual seria a outra opção, Rima-chan – Nadeshiko rebateu calmamente, apertando o botão do térreo. O elevador começou a descer, causando a pequena vertigem costumeira.

— Talvez não haja, mas o seu futon vai ficar do outro lado do quarto – ela rosnou, sem se dar por vencida – E eu não quero que me chame de Rima-chan mais. É Mashiro-san, ou algo assim. Não somos mais amigas.  – Rima disse, erguendo a voz algumas oitavas – Nunca fomos de fato, certo? Amigos não mentem – sussurrou por fim, olhando para o chão.

— Entendido, Mashiro Ojou-sama – Ele utilizou seu tom mais solene, que parecia estranhamente desajustado na voz suave de Nadeshiko, recuperando a pose rígida e ereta, com as mãos nas costas.

Um estrondo cortou o ar. O elevador tremeu e então parou por completo, com as luzes vacilantes se apagando. Rima segurou um grito, enquanto Nagihiko ia inconscientemente para mais perto. Ela sentiu as pernas tremerem, e a familiar sensação de pânico tomou todos os seus sentidos. Esticou o braço fino no escuro, tateando até encontrar a superfície lisa e quente, que era as costas de Nagihiko. Ele arfou quando sentiu os dedos gélidos de Rima apertando com força a parte de trás da sua camisa. Ficou em silêncio por vários minutos, até ouvir os soluços abafados que ela deixava escapar.

— Vai ficar tudo bem, Rima – ele sussurrou, tocando brevemente a mão trêmula que ela mantinha junto ao peito. Puxou a mão dela para si, entrelaçando os dedos nos seus – Eu prometo, vou cuidar de você.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Háa! Ela descobriu! Vocês não esperavam por isso, ceeeerto?
De qualquer forma, isso ainda não acabou... e eu adoooro elevadores que quebram *--*
Espero os reviews!!! o/