Descemos do jatinho e uma voz dentro de mim dizia que nada mais na minha vida seria normal. 

Entrei na limusine que nos esperava, certamente iríamos para o tal palácio. No caminho, eu pude olhar a paisagem, que devo confessar, era de um verde majestoso. Eu não queria conversar a respeito do que eu supostamente seria, eu só queria digerir tudo aquilo dentro de mim sem ninguém me importunare acho que Vincent captou isso, pois ele me deixou quieta em meus pensamentos. 

- Princesa, chegamos. – falou Vincent.

- Prefiro que me chame de Gabriela, se não incomodar. – falei saindo do carro.

Nós caminhamos até uma fileira de mulheres com uniformes, a maioria era jovem. Quando me viram, reverenciaram. Tudo era tão estranho.

- Cada uma delas trabalha no palácio. Se estiver precisando de alguma coisa, a responsável nessa área, Mary, lhe ajudará no que for preciso. – Vincent disse, procurando entre as demais a mulher.

- Porém, ela teve que se ausentar por agora. Mas mais tarde irá vê-la, minha senhora. – falou uma garota alta de uniforme. Acho que Vincent não gostou disso, porque pelo canto do olho vi um rosto de surpresa. Percebi que ele não gostava das coisas fora do seu controle.

Montou seu rosto inexpressivo de novo e nós seguimos para a porta. Ele a segurou para mim até eu passar, algo que fez no carro e até na porta da minha casa. Como se eu não pudesse abrir uma simples porta.

- Vou lhe mostrar seu quarto. – o loiro disse.

Era tudo muito luxuoso. Sentia-me deslocada e com raiva de ter tido tudo aquilo omitido pelo bobo do meu irmão. Continuava calada, esperando que fosse Vincent que começasse uma conversa. Até que, de repente, alguém passou correndo me fazendo tropeçar e cair de bunda no chão. Eu soltei um grito de menininha quando está na montanha russa, que fez a pessoa parar. Foi aí que pude notar que era uma garota.Devia ter uns dezoito ou vinte anos, estava com seu cabelo castanho um tanto desgrenhado e com o mesmo uniforme que eu vi as outras garotas vestidas, só que esse tinha um broche com um brasão.

- Essa é a Mary? – perguntei por intuição, me levantando e ignorando a mão de Vincent para me ajudar a ficar de pé. 

- Sim, e como você sabe? – perguntou me olhando desconfiada.

- Vincent me contou. – respondi retribuindo seu olhar. Até que como se alguém tivesse contado um piada, perguntou:

- Você não é a princesa, é?

E antes que eu pudesse responder, Vincent exclamou:

- Não dirija a palavra assim para a princesa, entendeu!?

- Sim, senhor. - respondeu Mary, se retirando.

- Você está bem? – Vincent perguntou, agora com seu tom normal.

Assenti. Ele pediu para continuarmos e acabamos entrando num corredor onde Vincent parou de frente para duas portas alvacentas e, sem hesitar, as abriu. E, bom, o que posso dizer? Era grande, muito grande e muito branco. Tão branco que só pude saber onde estava a cama porque as minhas malas estavam em cima dela.

Ele me perguntou se precisava de mais alguma coisa e como eu respondi que não, foi embora. Peguei meu celular e vi que havia oito chamadas perdidas de Lucas e sem querer falar com ele desliguei. Estava realmente cansada, então decidi pegar meu pijama. Abri minha mala peguei a camisa e o short pretos e fui me molhar na suíte. Depois de vestida fui em busca do meu Mp4. E enquanto arrumava o meu novo guarda-roupa que mais parecia um closet, fiquei escutandoStop Crying Your Heart Outdo Oasis em alto e bom som. 

Quase levei um susto quando Vincent tocou o meu ombro do nada e depois fiquei com vergonha por causa da roupa que estava usando. Ele não sabia bater na porta, não? E ao superar isso, tirei o fone e fiz a pergunta mais óbvia:

- O que é?

- Não tive a intenção de lhe atrapalhar, mas como já sabe que é uma princesa, agora tem deveres e coisas a aprender. Então, primeiro, terá que acordar cedo amanhã para conhecer o parlamento. E, gostaria de saber se a princesa tem vestidos para ocasiões como essas e para os bailes.

- Vestidos? Não, na verdade não tenho nenhum.

- Então providenciarei o mais rápido possível. – e antes que pudesse ir embora, perguntei:

- Aonde poderia encontrar Mary? 

- Precisa dela? Vou mandar que venha, deve estar na cozinha. 

- Não. Poderia me levar até ela? Seria uma boa chance também para conhecer a cozinha de um palácio. – eu falei. Precisava perguntar umas coisas a ela e queria sair daquele quarto que já estava me sufocando.

- Como quiser. – respondeu abrindo as portas.

- Poderia esperar um pouco? – falei. Tinha que me trocar. Eu não sairia daquele jeito nem morta. Ele assentiu fechando as portas e se recostou na parede com os olhos fechados. O olhei por alguns segundos. Ele achava mesmo que eu iria me trocar ali? Fui ao meu closet e peguei uma calça jeans e uma camisa dos Rolling Stones, me vesti na suíte, soltei o cabelo, calcei as minhas sandálias e voltei à atenção a Vincent, que me observava.

- Vamos? – perguntei, indo em direção a porta. 

Não demorou muito para encontrarmos a cozinha, que era bem extensa. Podia ver todas aquelas louças de porcelana cuidadosamente desenhadas, talheres de prata e os aromas deliciosos de comida. Vincent pediu para uma pessoa chamar Mary e foi embora alegando ter serviços a fazer. Mary logo veio:

- Princesa. – me cumprimentou respeitosamente. 

- Sinto muito pelo que aconteceu. – falei.

- Eu que lhe devo desculpas, minha senhora. 

- Não foi nada. Mas, mesmo assim, eu queria lhe perguntar por que você achou que eu não era a princesa?

- Sem querer lhe ofender, mas, não é óbvio? 

- B-bem, talvez minhas roupas não sejam apropriadas para uma princesa, mas isso vai ser resolvido e...

- Você já viu sua postura? E aquele grito que você deu? Suas roupas são os menores problemas agora, sua atitude é inadequada como nossa futura rainha. – me interrompeu, olhando-me com desdém. As pessoas não deveriam ser mais gentis com as princesas, não? 

- Ok, obrigada pelas dicas. – falei indo embora. Quando reparei que eu podia me perder naquele palácio sem ajuda, voltei e disse, estragando minha saída dramática:

- Poderia me ajudar a procurar Vincent? – Mary se surpreendeu e depois se mostrou divertida.

Guiando-me pelo palácio, nos deparamos com o jardim. Ele era lindo, dividido em cores. Continuei seguindo Mary até chegarmos a uma fonte onde, para meu espanto, Vincent estava beijando uma mulher. Abaixei a cabeça tentando em vão esconder o sangue quente em meu rosto já que podia ver o sorriso estampado de Mary.

Mary, sem pudores, foi até o “casalzinho feliz” e falou:

- Com licença, mas a princesa precisa falar com Vincent.

E eu, sem saber onde me enfiar andei até Mary.

- Se estiver ocupado – com a línguadentro da garganta dela –podemos nos falar depois. Eu gostaria mesmo de explorar o castelo sozinha. – para me perder, claro. E não iria com Mary, algo me dizia que ela não gostava de mim.

E saí, com meu rosto ainda fervendo. Entrei no palácio e procurei meu quarto abrindo portas. Foi assim que encontrei um aposento, que mais parecia um ateliê se não tivesse uma cama. 

Deitei na cama, cansada de andar e acabei adormecendo. Quando acordei, já era à noite. Sem intenção de voltar, levantei e fui em direção a uma das telas brancas. Em baixo de um pano bordado perfeitamente, havia tubos de tinta e pincéis do lado. Comecei a desenhar aquela última cena que tinha presenciado: Vincent beijando outra mulher. Eu sabia que não era da minha conta, mas me senti mal com aquela lembrança. Tentei ignorar e continuei a desenhar, mas um sentimento estranho crescia dentro de mim. 

Cobri a tela com um dos lençóis da cama e sai daquele quarto.