Memórias de Bellatrix Lestrange escrita por Shanda Cavich


Capítulo 8
Mau Começo




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"Os seus olhos só se fecharão, se antes os meus já estiverem fechados.", disse Tom Riddle, não alto, mas suficientemente claro para que eu pudesse ouvir, na noite em que houve uma reunião no palácio Malfoy. "Chegará o dia em que todo o sangue sujo irá secar, toda a boca irá calar. Palavras não são eternas, Bella. Mas você é."

Quantas pessoas morreram por esta causa. Quanta tragédia eu fiz acontecer. Eu sou culpada. Todos nós somos. A dor e o talento para fazer o mau ainda faziam crescer a minha vontade de lutar. Pessoas fracas diriam que o sofrimento foi em vão. Nós, sangues-puros e virtuosos de guerra, ainda queríamos vitória. Não importava mais quem iria morrer ou sofrer. Somente o tão esperado triunfo nos fazia ter esperanças de um futuro melhor e mais digno.

Os Comensais da Morte foram encarregados de encontrar ninguém menos que Harry Potter e trazê-lo vivo até o Lord das Trevas. Com Pio Ticknesse sendo controlado pela maldição Imperius, foi fácil obrigar o ministério todo a se rebelar contra os porqueiros nascidos trouxas.

A Ordem da Fênix fazia o possível e o impossível para proteger o garoto. Reconheço o que é chamado de força de vontade. E também reconheço o medo, com a mesma facilidade. Nenhum dos integrantes ousou nos atacar. Será que apenas o tão famigerado Dumbledore achava que estava à altura de Lord Voldemort? Afinal, os malditos da Ordem se esconderam por muito tempo. Então a idéia de transformar o nome de Milorde em tabu foi muito bem desfrutada. Diante disso, a morte se tornou algo sutil e apropriado.

Haviam bruxos que se recusavam terminantemente a obedecer o novo governo, gerando revoltas e manifestações contra Ticknesse, que nessa época, já havia se tornado Ministro da Magia. Eu estava morando junto de minha irmã. Deixei a Mansão Lestrange assim que saí de Azkaban, a pedido de Tom. Todos da família de Rodolfo, assim como eu, eram foragidos da prisão. Narcisa era a única de nós que não possuía a Marca Negra. Não tendo a marca, ela jamais poderia ter sido presa por seguir a Lord Voldemort. Ciça era engenhosa. Poucas pessoas conheceram seus verdadeiros crimes. Crimes excepcionalmente trágicos.

"Senhora Bellatrix Black... Lestrange, – disse Lord Voldemort crispando os dentes, assim que entrei no salão. Nagini serpeava sobre seu corpo. – "Rodolfo fez o que eu mandei?"

"Está tentando, Milorde." – respondi com a voz rouca.

Tom se aproximou seriamente, deixando a cobra na poltrona. Seus olhos demonstravam profunda aflição. Naquele exato momento tive certeza sobre o que ele estava tentando fazer. Quando finalmente desistiu de usar Legilimência contra mim, sorriu desdenhoso.

"Eu previ isto. Você uma ótima oclumente. Ainda não consegui descobrir o que está pensando a meu respeito." – Tom segurou uma de minhas mãos. Eu dei um passo para trás, imaginando o pior. – "Você teme a mim, Bella?"

"Não. Eu não temo ao senhor." – desta vez, minha fala retornara forte – "Eu temo pelo senhor. Temo que morra, que seja vencido de algum jeito..."

"Não!" – Tom gritara. – "Isto é impossível, Bella, sabe disso. Você precisa de uma vez por todas aprender a confiar em mim."

Dito isso, abracei-o com vontade, sem receio algum. Tom não se esquivou. Pelo contrário, pareceu estar esperando por aquilo. Quando pensei em soltá-lo, seus lábios finos e pálidos se juntaram aos meus. Então nos beijamos pela primeira vez. Se naquelas condições, a palavra felicidade de alguma maneira pudesse fazer sentido, seria naquele instante, onde todo o meu ódio e angústia puderam ser esquecidos.

"Bella..." – Tom suspirou, em seguida pronunciou algo incompreensível aos meus ouvidos, utilizando ofidioglossia. Nagini rastejou até nós, em seguida se inclinou para cima, de modo que sua cabeça ficasse na altura de meus ombros. – "Eu preciso lhe contar uma coisa. E ordeno que você aceite."

Meses depois, os Malfoy e eu recebemos uma visita inusitada. Os seqüestradores do ministério apareceram na mansão trazendo em seus braços o indesejável número um e seus leais dois amigos. Por mais que a notícia parecesse formidável, foi pior do que eu imaginava. Se aquele maldito elfo não tivesse interferido, a guerra poderia ter acabado mais cedo. Milorde teria vencido. Tudo teria sido diferente. Depois de minha segunda e verdadeira falha ao deixar que o garoto Potter fugisse de minhas próprias mãos, eu pude ver Tom inteiramente enraivecido.

A fúria de Lord Voldemort foi bárbara. Oito pessoas foram assassinadas naquela noite apenas pelo seu mórbido desejo de matar. Depois que contei sobre o roubo de minha varinha, ele enlouqueceu. Mandou que eu ficasse com a varinha de Rabastan Lestrange, que muito se assemelhava a minha. Nogueira, pelo de unicórnio, 33 centímetro. Contudo, jamais teria o poder de substituí-la.

Chegou o momento em que conseguimos invadir a escola. Hogwarts tentava de todas as maneiras se defender de nossos ataques. A Ordem da Fênix estava reunida com o mesmo propósito que o de todos os presentes. Vencer a guerra.  O Lord das Trevas propôs que entregassem o garoto em troca de sua misericórdia. Mais tarde, Harry Potter viria até ele.

Quando mais da metade dos combatentes foram mortos, recebi a notícia de que Severo Snape havia morrido. Apesar de eu ter ficado surpresa, a notícia foi à melhor da vez. Pois quando a guerra acabasse, eu mesma tinha a intenção de matá-lo. Como minha mãe sempre dizia, "Traidores devem morrer ainda antes da escória que chamamos de sangues-ruins."

Lúcio e Ciça ficaram ao meu lado o tempo todo. Assim como eu, impedidos de participar da batalha. Pelo menos, por ora. Os dois estavam sem suas varinhas, desesperados para saber do paradeiro de Draco. Após a curiosa ressurreição de Potter a guerra deu continuidade. Ainda mais sangrenta e impetuosa do que no início. Desta vez, eu lutaria com vigor. Desta vez, eu tinha minhas requisições definidas. Mataria mais do que qualquer um dos Comensais.

"Vai morrer, mestiço!" – gritou Antônio Dolohov ao lobisomem Lupin, enquanto duelavam furiosamente. – "Seu corpo apodrecerá sobre o sangue sujo que você tanto defende."

Segundos depois, Remo Lupin caíra morto. Então um grito agudo vociferou ao meu lado. Ninfadora Tonks, a quem eu recusava terminantemente a reconhecer como sobrinha deitara sobre o corpo do marido, jorrando lágrimas de desgosto.

"Avada Kedavra!" – gritei prazerosamente, imaginando naquela mulher o rosto imundo de Andrômeda. Ninfadora morrera através de minha maldição. O orgulho que eu sempre preservei acabou servindo enfim para alguma coisa. Os males de meu passado conferiam meu estado de demência. Então minha risada tornou a assombrar os corredores daquela escola. As pessoas corriam de um lado para o outro, desnorteadas, tentando se afastar do som de minha voz. Quando finalmente dei por minha notável agilidade, mais de uma dúzia de bruxos já haviam sido mortos. Eu sou culpada.

Os céus se tornavam cada vez mais rubros à medida que o Sol irradiava, e os gritos cada vez mais padecentes. Crianças e adultos clamavam por seus entes queridos atirados sem vida sobre a grama seca. Crucio. E a maldição me escoltava sempre fiel. Murmúrios confirmavam que as Horcruxes de Tom haviam sido destruídas. Ainda assim, jamais desisti da guerra. Diz-se que ela destrói os fracos e era essa a minha vontade.

Lutei ao lado de meu mestre por tempo indeterminado. Sua energia construía a minha força. Até que uma bruxa traidora do sangue, Molly Weasley, se propôs a me derrotar. Por inúmeras vezes esquivei-me de seus ataques. "Que vai acontecer com seus filhos depois que eu matar você?", provoquei. Minha risada sufocava-me, exultante. Então inesperadamente seu feitiço estuporante atingiu-me no peito. Tom deu um grito em meu nome quando me viu cair. Algo nele enfraqueceu.

Senti um grande impacto. Começou a escurecer. A única coisa que eu podia ver era Tom duelando com Potter, fazendo ocultar toda a sua fúria e consternação. Sua vida dependia daquele duelo, e eu nada podia fazer para ajudá-lo. A esperança de que eu ia acordar e tudo ficaria bem, permanecia. Mas aprendi a não subestimar. Senti a dor cruciante que é ser derrotada. Porém, algo estava muito errado. Eu estava viva. Inerte, lívida e indefesa, com o coração reduzido a escassas e desordenadas batidas. Mas estava viva.

Naqueles instantes de pleno afogamento, as pessoas que de alguma forma tiveram importância em minha vida fixaram-se em minha mente. Lembrei-me de quando Tom Riddle acariciava meus cabelos, sussurrando cantigas ofídicas em meus ouvidos até que eu pegasse no sono. Ou então quando Ciça me pediu às lágrimas para abraçá-la quando Lúcio foi preso. Lembrei-me também da mão de Roldofo segurando a minha quando fomos levados à Azkaban. Sirius, há mais de vinte anos, quando confessou que já me amara um dia. Andrômeda tentando me ensinar a tocar flauta irlandesa. Lembrei-me até mesmo de minha mãe, balançando-me em seus braços, cobrindo-me de meiguice, quando chorei. As risadas desdenhosas de meu pai. As brigas de minhas irmãs. O cheiro da Mui Nobre e Antiga Casa dos Black.  Os beijos de Tom.

Quando Milorde foi morto, eu queimei por dentro. Por mais que tudo isso me provocasse a loucura, o delírio, o maldito ódio mais forte que se pode existir neste mundo, de modo que meu desejo de levantar e matar o garoto fosse quase que indomável, eu apenas sorri de modo demente e sussurrei: "Eu duvido!". Lord Voldmort não se foi. Apenas pude rir desta certeza. Eu estava viva. E esta era minha prova. Ainda podia sentir sua alma latejando ao meu lado.

Cheguei à conclusão de que o amor não se divide entre o benigno e o maligno. O que realmente importava era o amor perfeito e imortal que tínhamos um pelo outro.

"...Respire por mim, Bella. Este será o nosso segredo."

Tom Servolo Riddle. Meu amado, minha horcrux.


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