Eldunari escrita por Valkiria


Capítulo 9
O Passado Vem à Tona!


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo está cheio de revelações!
Como sempre peço desculpas pela demora pra postar, mas esse daí saiu bem grandinho!
Espero que apreciem a leitura! ;D



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Adentrei a barraca após Eragon e depois de mim entrou Óbus. Dentro já estavam à espera lady Nasuada sentada e ao seu lado o subcomandante Jörmundur. Eu já o tinha visto perto dela outras vezes em meio ao acampamento e batalhas. Em seguida a cabeça de Saphira entrou na barraca ocupando um espaço enorme, sua coloração azul era fascinante olhando de perto.

– Finalmente estamos sendo apresentadas formalmente! – Falou Nasuada – Sente-se por favor – Ela indicou uma cadeira à sua frente.

Inclinei a cabeça levemente em sinal de respeito e então sentei-me. Em tempo! Relaxei imediatamente. Ah, finalmente sentei! Concentrei-me para prestar atenção em tudo! Olhei para Óbus em pé ao meu lado perguntando-me se não haveria uma cadeira pra ele também, mas ele notou o que eu estava pensando e negou com a cabeça.

– Tudo bem! Estou bem em pé! – Ele disse discretamente.

Assenti e virei-me de volta para Nasuada que por sua vez olhou impassível para Óbus.

– Desculpe, mas você é?

– Óbus Effinger da Vila de Liverpoo, minha lady – Apressou-se ele em dizer em uma postura ereta. Ele parecia bem acanhado de estar na presença de uma líder.

– Liverpoo... onde fica?

– Extremo sul da Alagaësia, é uma vila fora do mapa, fica localizada depois de Aroughs.

– Ah, certo... e você é Milena, estou certa?

– Milena Morgenster – Respondi enfaticamente.

– E vocês veem do mesmo lugar?

– Sim! Somos velhos amigos! – Cruzei as pernas – Nos conhecemos a muito tempo e casualmente acabamos de nos encontrar. Não tenho nada a esconder de Óbus, portanto ele pode permanecer comigo. – Esclareci rapidamente antes que ela o mandasse sair. Apesar de não temer ninguém, eu não queria ter que enfrentar o interrogatório que iria se seguir sozinha, não agora que eu podia contar com Óbus. Finalmente depois de muito tempo eu tinha a companhia de alguém que eu sempre conheci durante minha vida toda e podia contar verdadeiramente, eu não ia abrir mão disso.

– Está bem! – Nasuada respondeu enfim, olhando rapidamente para o corte em meu braço, porém sem perguntar nada a respeito, ela foi direto ao assunto – Sinto muito pela maneira como meus soldados devem tê-la abordado, eu não quero que se sinta uma prisioneira, pois não é! Eu apenas gostaria de alguns esclarecimentos.

Ela se calou por um instante e como eu não disse nada, ela continuou.

– Depois do último ocorrido em Belatona, eu soube que você já estava no acampamento há um tempo, porém tudo o que consegui foi informações de Dimitri, um rapaz que disse tê-la conhecido em uma missão de ataque a um comboio onde você foi disfarçada de homem, segundo ele. Confere?

– Sim – Eu respondi com um leve sorriso no rosto. Aquele garoto fala demais. Ri internamente, contente por ele estar vivo.

Nasuada acenou com a cabeça e continuou.

– Eu também consegui informações de guerreiros que regularmente iam à área de treinamento e disseram ter acompanhado suas lutas eximias; o próprio Fredric não faltou com elogios sobre você...

– Fredric está vivo? – Perguntei esbaforida

– Sim, está! Embora ele tenha escapado por muito pouco da morte.

– Mas como? Eu vi... vi ele sendo atacado, não tinha como sobreviver...

– Eu consegui chegar a tempo e fechar seus ferimentos com magia – Interrompeu Eragon – Embora ele tenha perdido muito sangue e tenha desacordado, ele está se recuperando bem agora.

Suspirei com alívio.

– Obrigada! – Dirigi-me ao cavaleiro – Fredric foi atacado daquela forma brutal por minha culpa. Eu nunca me perdoaria se ele tivesse morrido.

Eragon pareceu surpreso com meu comportamento de repente amigável, mas acenou com a cabeça em resposta.

Virei-me novamente para Nasuada que voltou a falar.

– Bem... o fato é que só consegui poucas informações e por terceiros. Não consta nenhuma informação de sua entrada para os Varden ou quando foi. Eu agradeceria se algumas coisas fossem esclarecidas aqui, Milena.

Então comecei a contar sobre a luta em Feinster e como devido à confusão dos Varden após a batalha, eu pude me infiltrar despercebidamente. Contei sobre todo o período em que estive com eles e até mesmo o que me levou ao galpão da luta principal em Belatona. Óbus também ouvia atentamente. No entanto não revelei a circunstância em que salvei Murtagh.

– Eu soube por Jeod que você o procurou logo após a batalha em Feinster, perguntando sobre alguns fatores históricos dos Varden e sobre os cavaleiros de dragão, você não citou isso em seu relato. – Soltou Nasuada.

– Sim, é verdade, eu o procurei!

– Ah mais alguma coisa que você tenha esquecido de contar? – Ela estreitou os olhos.

Droga. Seria melhor eu contar de uma vez. Se ela pedir para fazer uma vistoria mental, eu serei descoberta de qualquer jeito e será pior. Suspirei resignada.

– Na época em que procurei Jeod foi para obter informações em especial. Pouco antes eu tinha saído para uma caçada em uma floresta próxima e eu acabei encontrando o cavaleiro Murtagh e seu dragão, feridos. – Eragon soltou um arfar surpreso, já Nasuada procurou permanecer impassível, porém notava-se um pouco de tensão em sua face. - Murtagh havia caído ferido de seu dragão e estava inconsciente e eu ajudei ambos. Apesar de ter lhe oferecido auxílio naquele momento, posteriormente eu procurei Jeod para conhecer mais sobre eles e saber se eu não estava cometendo um erro. Entenda que eu havia acabado de entrar no acampamento dos Varden, por tanto não sabia todos os detalhes sobre quem eles eram, eu só tinha ouvido falar coisas por alto sobre eles.

– Se você se informou, por que não os denunciou para nós, mesmo sabendo que eram nossos? – Questionou Eragon em tom indignado.

– Em primeiro lugar quando me comprometi em ajuda-los, eu fiz uma promessa na língua antiga a Thorn de que mesmo voltando para o acampamento eu não os denunciaria. – Encarei Eragon, respondendo enfaticamente. – Em segundo lugar pelo que eu soube com Jeod, você e Murtagh já foram amigos, inclusive lutaram juntos, do mesmo lado, pelos Varden. Murtagh foi obrigado a obedecer Galbatorix, sendo dominado por sua magia. A meu ver ele não é culpado por estar sendo forçado a obedecer ao inimigo. Além do mais eu não tinha nada contra ele. Sabendo que recentemente ele matou seu mestre a mando de Galbatorix, imaginando sua raiva eu não quis denunciá-lo pensando no que você poderia fazer.

– Em suma, você o protegeu! – Eragon disparou – Protegeu um inimigo! Por que? Se você mesma disse que se aliou a nós por que acreditou em nossa causa, por que protegeu um traidor? – De repente Eragon parou com a pergunta no ar e recuou com a face alarmada. – Está do lado deles, é isso!? Você se infiltrou aqui, por isso não queria ser descoberta!

– Não é nada disso! – Disparei indignada. Como ele pode pensar isso? – Eu jamais estaria no mesmo lado que Mobilion!

– Se não, então por que defendeu Murtagh? – Disparou Eragon.

Olhei exasperada para Eragon.

– Vocês são irmãos, não é? – Soltei, olhando-o diretamente nos olhos.

– Hã? – Ele deu um passo pra trás confuso e começou a gaguejar até finalmente assumir. – Foi ele quem te contou isso? – Ele perguntou com a o cenho franzido.

Bingo! Minhas suspeitas estavam certas afinal! Eu dei um soco no ar de vitória em meu imaginário.

– Murtagh nem mesmo sabe quem eu sou! A menos que Mobilion tenha lhe contato, o que eu duvido muito, ele não é de revelar muitas coisas. Não, Eragon! Não foi Murtagh quem me contou! Ele nem mesmo sabe que fui eu quem salvou a vida dele naquela floresta. Em troca do meu silêncio eu pedi a Thorn para jurar não revelar minha identidade para ninguém, nem mesmo Murtagh. Eu não queria que Galbatorix encontrasse em sua mente algo sobre mim, embora isso agora seja inútil, se Mobilion está aliado a ele, qualquer informação sobre mim já não é mais segredo! – Respirei fundo e continuei. – Eragon, não é preciso muito para notar que vocês dois são parecidos. Em Belatona eu pude ver isso claramente. O quanto vocês são semelhantes não apenas em características físicas, mas também no modo de lutar. As pessoas do acampamento podem não notar por terem uma visão limitada de que ambos são inimigos, mas alguém de fora como eu pude perceber. Eu apenas não tinha certeza, mas você acabou de confirmar! – Esperei por um instante enquanto ele pareceu absorver o que eu disse. – Não se preocupe, se esse é um segredo de vocês eu não irei revelar a ninguém! – Finalizei enfática.

– Essa não é a questão no momento... você ainda não respondeu minha pergunta! Como podemos confiar em você, quando ajudou um inimigo em segredo?

Suspirei e quando eu estava prestes a responder o guarda do lado de fora interrompeu anunciando o nome de Angela, a herbolária. Nasuada permitiu a entrada e eu permaneci quieta. Angela entrou e olhou atentamente para a face de todos.

– Interrompi algo? Nossa, que clima pesado! – Ela virou pra mim. – Você! Eu virei as costas por um instante e você desapareceu da barraca. Que atitude impensada! Você não está totalmente recuperada!

Ergui o olhar para encará-la, indiferente. Ela continuou.

– E como se não bastasse já se estrepou novamente. – Ela se aproximou de mim ignorando a presença de Óbus ao meu lado. Estendeu as mãos para desamarrar o pano que eu coloquei no braço.

– Vai se recuperar sozinho, não é preciso se dar ao trabalho. – Eu disse meio encabulada com a atenção dela.

– Ah claro, se espera que seu poder de regeneração conserte isso, esqueça, qualquer um pode ver que você está sem energia e você perdeu muito sangue. Eu não me surpreenderia se você desmaiasse agora mesmo!

Engoli em seco. Merda! O pior é que ela tá certa! Concentrei-me em permanecer alerta. Eu não queria dar o gosto de sua hipótese se confirmar. Todos estavam horrivelmente em silêncio enquanto ela falava até Nasuada fazer um gesto para Jörmundur e começar a discutir sobre algo com ele, Eragon também voltou sua atenção para ela. Dei glórias, tudo menos a atenção voltada toda para mim naquele momento! Enquanto Ângela pegava um potinho no meio das roupas e tirava uma pasta verde passando no meu ferimento, fazendo um novo curativo, ela dirigiu-se a mim.

– Ei, garota! Você sabe que isso daí não foi solucionado definitivamente, não é? – Ela acenou para a mancha escura que havia em meu peito no lugar onde fui atingida pela flecha em Belatona. – Eu fiz o que pude para o veneno recuar, mas não tenho o antídoto, ele ainda pode voltar a se espalhar e eu tenho fortes suspeitas de que a próxima vez que você invocar aquele poder de novo, eu não poderei fazer milagres!

Como ela sabe sobre “aquele poder”? Eu não a vi no meio das pessoas que invadiram o depósito naquele dia. Quantos sabem sobre o que aconteceu em Belatona? Céus, a deduzir pelo estrago que eu fiz, colocando a baixo o depósito, meio mundo deve ter visto o que ocorreu.

– Eu sei! – Respondi, em seguida mudando de assunto. – Que repercussão teve o que eu fiz em Belatona?

– Não muita na verdade! A glória caiu sobre Eragon. Muitos ouviram o estrondo de longe quando o depósito desabou, mas como os cavaleiros de dragão estavam lá, o povo pensa que foram ambos que causaram o estrago.

– Melhor assim! – Eu tinha outras perguntas e tinha que aproveitar enquanto podia fazê-las sem restrições para Angela. No momento me ocorreu que eu ainda não sabia quanto tempo se passou desde a fatídica luta. Aliais onde estava o acampamento? Não muito distante de Belatona devo supor. – Quanto tempo eu permaneci desacordada?

– Dois dias – Respondeu ela, terminando de passar a atadura em meu braço.

– O que aconteceu a Murtagh depois?

– Ele está aqui! – Olhei espantada para ela – Ele está no acampamento sob observação! Está colaborando mais do que da última vez que esteve entre os Varden.

Perguntei-me se esta colaboração não estava sendo à base de tortura.

– Como prisioneiro ou como aliado? – Perguntei ansiosa.

– Está preocupada? – Ela estreitou os olhos e sem esperar minha resposta, continuou. – Eu diria que um pouco de cada, mas a princípio ele e Eragon fizeram um acordo. Murtagh estranhamente se libertou do controle de Galbatorix durante a luta no galpão, me pergunto se isso não é obra de certas pessoas. – Ela olhou para mim inquisitivamente.

– Obrigada! – Finalizei, agradecendo por suas informações e desconversando antes que esse diálogo perdesse o controle.

– Por que está respirando pausadamente? – Ela mudou facilmente de assunto. Angela colocou uma mão sobre minhas costas e a outra no meu peito, incitando-me a endireitar. – Duas costelas deslocadas... Já comeu carne de javali?

– Hã? – Eu ia me virar pra ela, desnorteada com sua pergunta repentina e desconexa quando ela deu dois empurrões colocando minhas costelas no lugar. Eu arfei curvando pra frente com a força que ela usou sem eu estar preparada. A dor durou um instante, mas por um momento minha visão escureceu e depois voltou devagar com vários pontinhos brilhando no ar.

– Está pronta pra outra! – Ironizou Angela e se afastou. – Aos poucos minha visão focou em Nasuada à frente me encarando com o cenho franzido. – Você devia comer algo, está pálida de dar medo! – Angela soltou a frase antes de ir para um canto da barraca e dali pareceu que não ia sair tão cedo.

Nasuada chamou sua criada e pediu-lhe que trouxesse frutas, depois voltou-se para mim.

– Bem, Milena... – Iniciou Nasuada – Em Belatona nós pudemos ver que aquele outro rapaz... Alrish tinha um nível de luta bem próximo ao seu e também poderes semelhantes. Eu gostaria que você esclarecesse se existem outros como vocês? E o que seria esse poder?

Por que ela está mudando de assunto? Essa não era a conversa antes de Angela aparecer!

– Provavelmente sim! – Respondi – Eu não sei muito sobre isso na verdade, Mobilion nunca foi muito esclarecedor a respeito... se bem que eu me lembro de uma história que meu avô contou quando eu era criança que pode ter haver com tudo isso... Sobre muito tempo atrás: Muito antes da Alagaësia ter esse nome, existia um vale no extremo leste do continente, onde vivia um povoado que convivia em harmonia com criaturas místicas. Onde havia fênix, grifos, seres das águas e outros que eram simplesmente animais que hoje pra nós são comuns, porém todos podiam se comunicar sem problemas entre si, inclusive o homem.

Porém um dia o vale foi atacado por uma tribo governada por um líder ambicioso que descobriu que as criaturas místicas daquele lugar eram dóceis, porém possuíam um poder inigualável. Desejando domá-las à força para tê-las sobre seu controle o líder daquela tribo invadiu o vale e destruiu tudo que era belo e vivo, inclusive provocou um grande massacre sobre o povoado. Os animais juraram jamais obedecer a um líder como esse. Não podendo controla-las o líder mandou matar todos, que por sua vez preferiram se render a morte a criar um confronto que gerasse mais caos. Foi um verdadeiro derramamento de sangue.

Muitos morreram, tanto o povoado como os animais até que percebendo que todos seriam extintos se continuassem sem reagir, a velha feiticeira da vila propôs um acordo secreto entre os animais restantes e o que sobrou do povoado. Por meio de magia e com o auxilio da energia de todos, ela faria uma junção para salvar a todos! O que o líder da tribo invasora desejava eram os animais, o povo estava no caminho dele. Então a solução seria que os animais restantes abdicassem de seus corpos e aceitassem que seus espíritos adentrassem o corpo dos guerreiros mais fortes que se subjugassem à união!

Assim a tribo invasora acreditaria que não havia mais nenhum animal no vale e unindo forças o povoado conseguiria expulsá-los. Ambas as partes aceitaram o acordo e em uma noite de lua cheia, com o poder dos animais e do povoado, foi feita a junção. No dia seguinte uma legião de guerreiros extremamente poderosos pôde enfim livrar o vale da desgraça e voltar a viverem em paz. A junção foi selada para sempre, não podendo ser revertida, os animais não mais poderiam retornar para seus corpos, mas seus espíritos se eternizaram no corpo de cada soldado. Sua sabedoria era compartilhada com o corpo em que eles habitavam. Pouco tempo depois a feiticeira já muito velha e cansada, faleceu. Seu nome era Esmeralda e em homenagem a ela que criou a nova raça – esses que eram humanos com essência de animais – foram chamados de Esmeraldinos, para que a memória daquela feiticeira poderosa que salvou um vale inteiro com seu poder e sabedoria jamais fosse esquecida!

Eles não deixavam de ser humanos e nem de serem eles próprios, apenas neles habitava o espírito de um animal místico, duas consciências em um só corpo. Porém esses que receberam o espírito animal viveram muito mais do que qualquer humano poderia sonhar. Suas existências foram estendidas por centenas de anos, pois a magia que havia em seus corpos era mais forte do que qualquer outra conhecida. Alguns dos filhos dos primeiros Esmeraldinos nasciam com o mesmo poder, continuando também a espécie mística, dizia-se que os que nasciam com o poder, traziam consigo o espírito dos antigos animais que morreram antes de haver a junção. Ainda hoje a linhagem dos Esmeraldinos continua, porém dispersada por toda a Alagaësia.

– Isso é o que eu sei! – Conclui. – Além disso, só sei que a resistência e nível de energia de um Esmeraldino são superiores ao de um humano normal.

– Então, você e Alrish são Esmeraldinos?

– Pela descrição do conto de meu avô, sim! É o único esclarecimento mais próximo que eu tenho! Mas nada garante que essa história seja verídica.

– De fato, isso esclareceu muita coisa e eu vou precisar de um tempo para absorver toda essa informação pra ser sincera! Você disse que vocês são mais resistentes, mas aquele ataque que você disparou sobre Alrish, o matou certo?

– Não! – Revelei contrariando suas expectativas – Aquele ataque na verdade foi uma distração... para Mobilion! É claro que eu quis atingir Alrish, mas ah mais de uma razão para eu ter feito aquele ataque! Primeiramente um grande nível de energia imposto a uma pessoa, dependendo das intenções do atacante, pode mudar a essência da pessoa atingida. O que eu quero dizer é que meu ataque em Alrish foi para libertar ele do domínio de Mobilion. Seria um grande desperdício matar alguém com tamanho poder. Obviamente ele também foi atingido fisicamente, mas quando ele acordar saberá o que é ser livre novamente, livre das manipulações de Mobilion. Então caberá a ele que destino ele quer escolher e se decidir ser livre, terá que ser esperto o bastante para driblar Mobilion!

– Você se sacrificou daquela forma apenas por isso? – Perguntou Eragon contrariado. – Você quase morreu!

– Essa era uma das minhas intenções! – O encarei com sinceridade – Mobilion é uma praga! Ele me persegue e está disposto a matar qualquer pessoa, a atingir qualquer um ao meu redor, para poder me dominar. A única forma de ele desistir de mim seria se eu morresse! Eragon eu já perdi muitas coisas para ter receio da morte! Ela me persegue e, no entanto nunca me leva, você não sabe o que é isso! Morrer seria um alívio para mim!

Nesse momento a criada foi anunciada e entrou com uma cesta de frutas muito bonita e atrativa. Ela estendeu pra mim e eu peguei duas maçãs agradecendo, ela deixou a cesta em cima da mesa e antes de sair Nasuada a deteve.

– Espere um momento Farica! – Nasuada voltou-se para mim. – Espero que não se importe, mas temos um procedimento aqui e para que eu possa confiar plenamente em você, Milena, eu precisarei que você permita uma vistoria em sua mente. É apenas uma prevenção. Posso chamar um mago meu para fazer isso agora?

A ideia não me agradava, mas não seria ético da minha parte recusar. Então quanto antes, melhor!

– Tudo bem! – Respondi.

Ela acenou satisfeita e voltou-se para Farica - Chame Trianna para mim, por favor! – A criada saiu em seguida.

Eu comi rapidamente uma maçã seguida da outra até a feiticeira ser anunciada e entrar. Era alta, tinha cabelos escuros e olhos azuis, me observou com um olhar superior que eu não dei a mínima. Nasuada a cumprimentou e deu a permissão para que ela seguisse com seu trabalho. Trianna virou-se para mim.

– Abra a sua mente!

Ela pareceu tentar amenizar o tom na hora de falar, mas não deu muito certo. Uma pontada de revelia ameaçou dentro de mim, mas eu me contive. Permaneci sentada e comecei a baixar as barreiras mentais.

– Tome cuidado por onde passar, não deseje ir muito fundo ou você pode não voltar sã. – Eu a comuniquei.

– Está me ameaçando?

– Não! Apenas te alertando!

Ela pareceu desconfiada, mas não disse mais nada. Eu baixei completamente as barreiras e ela entrou. Sua vistoria começou, eu permaneci impassível enquanto ela avançava fervorosamente. Eu pude notar sua sede por informações, qualquer coisa que pudesse me denunciar, que pudesse me comprometer. A inspeção durou longos minutos. Por fim ela estava perto de sair quando notou uma parte reservada em minha mente que ela ainda não tinha vistoriado. Trianna se direcionou para essa parte quando eu a alertei com um severo NÃO, ela pareceu ainda mais motivada a seguir em frente.

Eu comecei a subir a barreira da minha mente novamente. Trianna, não! dessa vez eu soltei as palavras com um misto de alerta e preocupação. Ela avançou obstinada e tentou entrar nessa janela de lembranças, mas eu fortaleci a barreira nessa parte específica impedindo-a. Ela então lançou um ataque mental e eu senti uma dor aguda em minha mente, porém não cedi. Ela continuou atacando e eu recuei minimamente. Droga. Não posso pedir o auxílio de Eruda, eu posso não medir devidamente o ataque e machucar Trianna mais que o necessário. A dor aguda continuou, eu tentei expulsá-la novamente com uma investida, mas ela estava em minha mente, não seria tão fácil tira-la dali. Trianna lançou outra onda de ataque mental e por fim acabei cedendo. Ela entrou.

Uma onda de profunda tristeza me invadiu, relembrando-me os dias vazios que passei antes de conhecer os Varden, antes, antes de perder tudo. Trianna silenciou, senti sua energia dominante começar a desaparecer. Não, Milena, agora não é hora para lamentar. Lembrei a mim mesma quando meus olhos começaram a marejar. Trianna saiu bruscamente de minha mente e voltei à realidade. A feiticeira estava à minha frente estática, com o olhar vazio, ela começou a arfar terrivelmente, seus olhos arregalados fitavam algo que ninguém mais via. De repente ela desabou ajoelhada, colocou as mãos sobre a cabeça e soltou um berro agoniante. – NÃÃÃOOO!!! – E as lágrimas começaram a escorrer de seus olhos.

Todos ficaram alarmados, eu levantei da cadeira e me ajoelhei em frente a ela. Eu tinha que reverter isso o quanto antes. – Droga! Eu te avisei! Droga! – Soltei as palavras desesperada mesmo sabendo que ela não estava me escutando. Eu sabia o que estava acontecendo, eu sabia exatamente o que ela estava vendo! Eram minhas lembranças, as malditas lembranças que atormentavam meus sonos todas as noites. Minhas lembranças dolorosas. Por um instante eu a observei, chocada. Aquela era eu, era exatamente o que eu fiz, as minhas emoções. Ela invadiu um pedaço de mim que eu me esforço tanto para manter isolado, para manter escondido. Toda minha dor, minha angustia estão lá. Quando ela adentrou essa parte isolada de meu ser que contém toda minha dor concentrada, eu sabia, eu sabia que ninguém poderia sair são dali. Isso é o que mais eu temia, saber o quão nociva eu posso ser. Isso doeu em mim. Ver meu próprio reflexo em sua atitude.

Tentei ignorar meus próprios sentimentos e levantei uma mão invisível para penetrar em sua mente, mas fui interrompida pela entrada brusca dos dois guardas da entrada e pelo elfo de pelagem azul, eles pararam bruscamente ao observar a cena. Virei rapidamente para eles, Trianna continuou com o surto de choro agoniado, voltei-me para ela, os guardas deram um passo adiante, mas pude notar o braço do elfo impedindo-os. Ignorando todo o resto eu continuei o que estava fazendo penetrando em sua mente facilmente, devido seu distúrbio, suas barreiras mentais nem estavam erguidas. Utilizando um método mental que aprendi há muito tempo, eu perscrutei sua mente até encontrar a fonte do problema – a minha lembrança perdida em sua consciência. Envolvi com minha mão invisível essa lembrança e a puxei comigo para fora de sua mente rapidamente. No momento em que sai da sua consciência, Trianna desmaiou, eu a segurei pelos ombros. Eu mal senti seu peso, já que ela estava ajoelhada. Eragon chegou por trás dela e a apoiou.

– O que você fez? – Ele questionou.

– Ela entrou fundo demais em minha mente e não suportou o peso da minha consciência. Eu apenas a tirei do choque, apagando algo que ela viu. Eu avisei para ela não avançar, mas ela não quis me escutar! – Eu levantei, e dei de ombros. – Ah coisas que não se deve buscar a fundo!

– Ela ficará bem? – Perguntou Nasuada preocupada.

– Sim, ela só desmaiou por que as últimas emoções foram fortes demais para ela. Foi uma reação auto defensiva da sua consciência.

– Quanto você apagou na mente dela? – Nasuada perguntou seriamente.

– Somente o que a alterou. Não se preocupe, toda informação que ela coletou ainda estará em sua memória quando ela acordar. Ela pode se sentir um pouco confusa a respeito do que aconteceu antes de desmaiar, mas só.

Nasuada pareceu desconfortável com a situação.

– Ela está dizendo a verdade! – Interrompeu o elfo de pelagem azul. Todos se viraram pra ele.

– Blödhgarm? – Disse Eragon.

– Eu entrei na mente da feiticeira e posso confirmar que a garota não retirou nada além do que uma lembrança que perturbou Trianna, nada que venha a acusa-la.

Eu arfei alarmada, ele viu? Ele devolveu um olhar rápido e desceu o braço que barrava a passagem dos guardas. Nasuada mais confiante, disse aos guardas para levarem Trianna a enfermaria, em seguida Blödhgarm se retirou e voltamos a ficar somente eu, Óbus, Eragon, Saphira, Angela, Nasuada e Jormundur. Eu decidi me manifestar.

– Bem, acho que tudo o que devia ser esclarecido está dito, posso ir embora agora? – Fiz menção de sair.

– Você ainda não respondeu a minha pergunta Milena – Eragon disparou – Por que ajudou Murtagh? Na verdade por que também interferiu em nossa luta em Belatona?

– As razões pessoais dela não são importantes, Eragon! – Interferiu Nasuada – Na verdade eu gostaria que você nos esclarecesse, Milena, quem é Mobilion? Que riscos ele representa?

– Eu responderei a ambos! – Respirei fundo – Eragon! Você quer saber por que ajudei Murtagh? A verdade é que naquele dia quando eu o vi desmaiado e ferido naquela floresta, eu pensei que Galbatorix é como Mobilion... Mobilion tem sede de me dominar, de me controlar e se eu não estivesse lutando até hoje contra isso, se eu já tivesse cedido... poderia ser eu! Eu também podia estar obedecendo contra minha vontade à Mobilion ou Galbatorix, ou sei lá quem! Quando vi Murtagh, o que pensei foi que ele não teve a mesma sorte que eu! Ele foi esmagado sobre o poder de um tirano que apenas vê seus interesses próprios em obter mais poder à custa dos outros. Eu não queria que isso acontecesse comigo e o mínimo que eu poderia fazer era ajudar como podia a ele que estava naquela situação! Foi por isso que eu ajudei Murtagh!

Quanto à luta de vocês em Belatona... quando eu notei a semelhança entre vocês e me questionei se eram irmãos, eu pensei que se um matasse ao outro, futuramente o que vivesse se sentiria culpado pelo resto da vida e não haveria nada que pudesse reverter o que qualquer um de vocês fizessem! Eu quis evitar, por que de alguma forma eu imaginei se a mãe de vocês tinha algum amor por vocês quando os pôs no mundo, ela se sentiria muito triste ao saber que ambos os filhos lutaram entre si e mataram um ao outro, apenas continuando o ciclo venenoso e destrutivo que Galbatorix... e Morzan iniciaram. Eu sei que a perda do seu mestre deve ter sido dolorosa Eragon, mas um dia até mesmo essa dor irá passar! Matar Murtagh não iria trazer seu mestre de volta!

Fez-se silêncio por um momento até Eragon falar.

– Você fala como se soubesse como é, como se já tivesse vivido. – Ele soltou.

– Eu sei! – Olhei para Eragon por um momento sem falar nada e então decidi contar. – Ah cerca de dois anos atrás quando eu... – Olhei para Óbus – quando todos em Liverpoo vivíamos nossas vidas tranquilas e felizes, em uma tarde como todas as outras, eu estava treinando esgrima com meu irmão mais velho. Ele havia se tornado aprendiz de um ferreiro muito conhecido em nossa vila por seu excelente trabalho e possuir habilidades razoáveis com o manejo da espada. Naquele fim de tarde apareceu um senhor de idade, forasteiro, ele surgiu do nada entre as árvores do bosque onde eu e meu irmão treinávamos e elogiando nossa habilidade com a espada, ele ofereceu mais... mais técnicas, mais destreza. Ele contou sobre suas proezas durante a vida e nós empolgados ouvíamos atentamente. Ao final do dia, tudo o que mais queríamos era ser tão bons quanto ele, queríamos um dia também poder nos orgulhar de nossas habilidades, desfrutar dos mistérios do mundo, contar nossas proezas assim como ele quando voltássemos para nossa terra.

Ele nos tomou por discípulos, seu nome era Mobilion. Com o passar do tempo ele foi nos ludibriando, não nos ensinando apenas esgrima, mas também magia. Era encantador, tentador, imagine dois jovens fascinados com tudo o que era novo. Mobilion criou sua moradia em uma caverna, mas aquele era nosso mundo mágico sempre que o visitávamos. Em pouco tempo ele encheu aquele lugar de livros, pergaminhos de escritas da língua antiga, de feitiços... era um mundo novo e estávamos sedentos por mais conhecimento. Ao passar de um ano e meio, ele já nos ensinava feitiços proibidos, magia negra... até mesmo como dominar espíritos e nos contou os riscos que isso possuía. Nesses tempos meu irmão Nicolas, começou a agir de maneira estranha e eu pensei que estávamos jogando um jogo perigoso, passei a me sentir desconfortável em ir aprender com Mobilion. Porém antes que eu pudesse transportar meus sentimentos para meu irmão, o pior aconteceu.

Em uma madrugada eu acordei sobressaltada com uma explosão que escutei do lado de fora. Quando sai do quarto, a casa estava em chamas e nossos pais, mortos. Desesperada, corri pra fora da casa e encontrei Nicolas, porém não era ele, seus olhos estavam vazios, naquele momento percebi o erro que cometemos com nossa sede por conhecimento, eu pensei que ele tinha virado um espectro. Naquele momento ele me deu as costas e continuou sua rota de destruição por toda a vila. Todos, parentes, amigos, conhecidos, ele matou todos. Quando o dia amanheceu, Liverpoo era a imagem da desolação. Não havia quem lamentasse os mortos. A vila estava deserta. Apenas um pequeno punhado de pessoas sobreviveu ao caos. Então decidi... se eu não o parasse, ele partiria e continuaria sua marca de destruição em outro lugar, eu fui atrás dele. Peguei minha espada e fui ao seu encontro.

Em nossa luta, quando ele estava prestes a me matar, algo acendeu dentro de mim e essa foi a primeira vez que a fênix surgiu, eu perdi o sentido de mim mesma por um instante e no momento seguinte quando retornei, eu estava com minha espada cravada em seu coração. Eu fui surpreendida por descobrir que tinha um poder que nunca imaginei que tinha, mas qual não foi minha maior surpresa quando o corpo de meu irmão não foi consumido pelo fogo do vazio como eu sabia que acontecia quando um espectro era destruído. O vazio nos olhos de Nicolas desapareceu e eu pude reconhecer meu irmão de volta. A última coisa que ele fez, foi me passar mentalmente a verdade do que tinha acontecido.

Naquela madrugada Mobilion o havia chamado para esclarecer meu irmão sobre o que ele vinha sentindo, ele contou que algumas pessoas nascem com o poder animal dentro de si e que eu e Nic, fazíamos partes desse grupo de pessoas. O que Nicolas vinha sentindo era seu animal interior querendo sair pra fora, que estava enfim reagindo a magia que circulava em seu corpo e queria explodir para fora também. Porém Mobilion garantiu que faria que esse poder se manifestasse de forma controlada se Nic fizesse o que ele dissesse.

Nicolas entrou em um círculo de magia que Mobilion fez e o poder despertou completamente, só que sem controle, ou talvez dominado por Mobilion... era isso o que ele desejava desde o começo, com o poder do meu irmão desperto, eu também despertaria. Mas os planos de Mobilion não saíram exatamente como ele queria, pois eu matei meu irmão e antes ele me contou sobre as verdadeiras intenções de Mobilion. Eu cheguei a fechar o ferimento que fiz em seu peito, mas meu irmão morreu em meus braços. - Virei-me para Eragon e coloquei a mão em seu coração suavemente.

– Dê valor ao seu irmão, Eragon! O que vai, não volta. Eu faria de tudo para ter meu irmão de volta e apagar o que fiz, mas você pode evitar antes de fazer. Foi por isso que eu interferi na sua luta com Murtagh. Por que eu sei como é a prática e eu quis evitar que você sentisse o mesmo que eu. Eu sou uma pessoa vazia Eragon, eu perdi tudo e todos, sou um morto-vivo, para mim não importa se eu morrer, eu não tenho mais o que perder. Não importa quanto poder eu possua, nada disso vale para mim. Eu apenas sinto por tudo estar se repetindo novamente. Por isso, não queira saber como é estar no meu lugar! – Eu dei as costas a ele, soltei um olhar inquisitivo para Óbus, me curvei para Nasuada e me retirei silenciosamente da barraca.

Após isso eu visitei Fredric, conversamos um pouco e então eu fui até o refeitório com Óbus. Enquanto comíamos e conversávamos, Óbus me contava sobre tudo o que ele tinha passado nesse tempo em que estivemos longe.

– Dois meses! – Disparou Óbus. – Faz apenas dois meses que tudo aconteceu e tanta coisa já mudou! Em Liverpoo o tempo costumava não passar, os dias chegavam a ser tediosos, quem diria que hoje estaríamos aqui!?

Eu soltei um suspiro de nostalgia, e então senti alguém passar por trás de mim e soltar um arfar surpreso. Virei-me e encarei um homem de cabelos louros, curto, magro, esguio, de olhos castanhos, sua boca estava distorcida em uma careta infeliz e então reconheci Nero. Outro dos poucos sobreviventes de Liverpoo. Voltei-me para Óbus estupefata.

– O que ele está fazendo aqui? – Questionei Óbus que me encarou com a resposta presa na garganta e um pedido de desculpas nos olhos.

– Err... o que eu posso dizer... Quando sai de Liverpoo, eu não sabia que ele tinha resolvido vir atrás. Eu acabei encontrando com ele muito depois e então já estávamos próximos do acampamento. Faz apenas dois dias que estamos aqui.

– Você! – começou Nero – Eu sabia que a veria novamente um dia, nem demorou tanto, não é? Você e seu irmão desgraçaram minha vida e a vida da minha irmã. Aurora está morta por causa de vocês dois, os irmãos amaldiçoados! Raça imunda, você devia se matar junto com seu irmão antes que repita o que ele fez com esse povo aqui também.

– Nero chega! – Óbus se levantou.

Eu levantei a mão pra interromper Óbus e encarei Nero.

– O que mais você espera de mim Nero? – Levantei-me e o encarei. – O que está perdido, não ah como recuperar. Eu gostava muito de Aurora e meu irmão também, eles iam se casar. O que aconteceu foi uma fatalidade. O que você espera Nero? Você diz como se fosse o único que teve perdas. Nicolas está morto, não está bom pra você? Devia se sentir vingado!

– Como se pudesse! - Respondeu Nero incoerente. – Você e seu irmão são iguais, são da mesma laia. O corpo de Nicolas desapareceu, como pode provar que ele está morto? Eu não me sentirei seguro enquanto não tiver certeza de que você e seu irmão viraram comida de verme!

Puxei meu sai e Nero recuou pra trás acovardado. Notei de relance que as pessoas ao redor no refeitório estavam observando nosso debate. Virei meu sai com o cabo para Nero, puxei seu braço e dei a arma em sua mão puxando-o para meu coração.

– Você quer tanto que eu morra? Então faça você mesmo! – Avancei sobre a ponta da lâmina que tocou meu peito. – Se eu sou um incômodo tão grande para você, me mate! – Olhei-o nos olhos enquanto o suor escorria em sua face. – Vamos Nero, faça o que você tanto quer! Eu estou te dando a chance! No entanto, se você não o fizer, eu não quero nunca mais escutar a sua voz miserável me acusando de alguma coisa. Não quero mais ter que ver a sua cara nojenta. Não me venha mais com seus insultos. Eu não preciso escutar um hipócrita me acusando por existir quando ele mesmo não tem coragem de acabar com o mal com as próprias mãos. Vamos lá, Nero! Vamos! – Ele arfava pesadamente, tenso com a lâmina na mão e então a largou no chão e saiu correndo em disparada.

Eu me abaixei para pegar minha sai e a devolvi ao seu lugar, voltando a me sentar com Óbus. Aos poucos todos voltaram a conversar entre si. O dia foi passando lentamente, eu voltei a ver Dimitri e o apresentei à Óbus. Ensinei alguns golpes de esgrima para Óbus até escurecer e então fui para a barraca onde havia acordado hoje cedo, me avisaram que Lady Nasuada havia a fornecido para mim. As horas se passaram e eu demorei a adormecer refletindo sobre os tantos assuntos que atormentavam meus pensamentos.

O acordo que fiz com Mobilion ainda hoje cedo era a premissa de um futuro que eu não queria ver se realizar; Retornar a ver Óbus foi algo que eu realmente gostei, mas ao mesmo tempo não me agradava pensar que ele lutaria nas próximas batalhas, eu me preocupava com sua vida; Me preocupava com Dimitri; O único alívio vinha de saber que ao menos a vida de Fredric foi preservada; Meus pensamentos foram navegando sobre Mobilion, Óbus, Dimitri, Nero, Fredric, Murtagh, até mesmo sobre Caleb. Tanto sobre o que me preocupar, sobre o que pensar.

Principalmente sobre Nicolas, o que Nero disse era verdade. Após matar meu irmão, eu chorei tanto naquele dia que acabei adormecendo, acordei de volta na vila sobre os cuidados de Óbus que havia me buscado naquele dia, depois da luta. Mas ele havia me dito que não tinha encontrado o corpo de Nicolas, nem rastros, nada. Eu me pergunto o que aconteceu.... Se Mobilion roubou o corpo de meu irmão ou o que... O vazio que sinto desde o momento em que atingi seu coração naquele dia, não desapareceu. Se ele estivesse vivo, eu sentiria, sei que o sentiria, eu e Nicolas sempre tivemos uma forte ligação, então o que aconteceu afinal?

Adormeci por exaustão depois de um tempo, mas meus pesadelos não me deixaram em paz. Acordei no meio da madrugada arfando violentamente e pingando de suor, abracei meus joelhos e deixei as lágrimas rolarem. Depois disso decidi sair pra fora, enchi os pulmões com o ar úmido da noite e contemplei a lua cheia sobre o céu aberto, estrelado. Eu queria sair dali, andar, gastar energia. Sai do acampamento e escalei uma pequena montanha que não era rochosa, bem próxima. Lá em cima eu observei o acampamento em baixo iluminado pela luz do luar, algumas lamparinas ocasionais podiam ser vistas com os guardas que faziam a vigília da noite. Voltei o olhar para a lua tão bela e distante e comecei a cantar.

Além, muito além das nuvens, diante do sol poente.

Um falcão voa sozinho elevando-se no vento.

Eu escuto seu choro solitário, muito triste deve estar.

Voando no vento silencioso, um falcão voa sozinho.

Estendendo-se com suas asas alcança o céu vazio.

Voando no vento silencioso, nunca ele pode descansar.

O que está no meu coração, ninguém jamais saberá.

Um coração como um falcão, assim é este coração.

O que está no meu coração, ninguém jamais saberá.

Falcão solitário no céu vazio.

Eu andei sozinha ao longo de estradas vazias do interior.

Caminhando comigo ombro a ombro, você sempre esteve lá.

Eu sinto sua solidão, solitário você deve estar.

Grilos sussurrando nas gramas dos campos.

Você anda ao meu lado, você trilha o caminho comigo.

Mas você nunca fala uma palavra, você nunca fala.

O que está dentro de seu coração, ninguém jamais saberá.

Aqui dentro deste coração que trilha seu caminho sozinho.

O que está dentro do meu coração, ninguém jamais saberá.

A tristeza de alguém que sempre está sozinho.

Respirei fundo para ver se passava aquele aperto em meu coração, uma lágrima rolou em meu rosto impassível. Eu não tinha mais como expressar minha dor, não tinha mais forças para extravasar, para tirar aquela angústia de dentro de mim.

Os vagalumes piscavam ao meu redor, eu estendi a mão para tocá-los e então escutei um ruído próximo e virei-me para encarar Murtagh que me observava próximo, sua face iluminada pela lua, ele deu um passo em minha direção.

– Desculpe, eu estava escutando a música e acabei chegando aqui, eu fiquei observando, não queria atrapalhar.

– Tudo bem! – Voltei-me para a lua, secando minha lágrima. Eu não me importava, não me incomodava que fosse ele. Sua presença me confortava.

– Bem, eu vou embora...

– Não! – Me dirigi a ele. – Se quiser, pode ficar! – Me sentei no chão e abracei as pernas. Senti sua presença quando ele se aproximou e sentou ao meu lado em silêncio. Uma sensação calorosa me dominou. Pude ver Thorn voando em meio à noite, sua sombra passando sobre a enorme lua.

– Ele deve estar feliz agora que não é mais controlado por Galbatorix – Soltei.

– É verdade! – Concordou Murtagh observando. – Ele, mais do que eu está finalmente conhecendo a liberdade.

– Eu fico feliz por ambos...

– Eu também... por vê-la novamente! Pensei que você tivesse morrido.

– Já ouviu falar que vazo ruim não quebra?

– Já, mas não a conheço o bastante pra saber que você é desse tipo, da próxima vez já estarei avisado!

Fez-se silêncio por um momento até ele voltar a falar.

– Por que me abraçou naquele dia... Milena, não é? – Ele perguntou com a cabeça baixa.

– Sim! Eu não sei, eu achei que você precisasse de um abraço. Não me parece que você recebe muitos.

– Eu tive a sensação de que já te conhecia...

– Talvez conheça!

– O que quer dizer? – Ele me encarou de repente. - Thorn agiu de uma maneira tão estranha quando a viu em Belatona! Eu me pergunto se sou o único que está por fora dos acontecimentos aqui!

Olhei para ele inquisitivamente.

– Bem, você deve ter acordado em uma caverna no meio de uma floresta há alguns dias... – Sua expressão clareou em um instante.

– Então foi isso! Eu senti que Thorn estava escondendo algo de mim. Foi você quem me salvou?

– Ãh, sim... Perdoe Thorn, eu pedi para que ele mantivesse minha identidade em segredo, por que eu não queria que Galbatorix soubesse sobre mim.

– Eu entendo! Obrigado! Se não fosse por você talvez eu nem estivesse aqui! Você me salvou duas vezes!

– Como assim? – Olhei para ele sem entender.

– Em Belatona, se não fosse por você, eu não teria tido coragem para enfrentar o domínio de Galbatorix. Talvez eu nunca tivesse me libertado. Devo minha vida e minha liberdade a você!

– Você não me deve nada! – Respondi desconcertada. – Como você se machucou naquele dia em que caiu na floresta? – Perguntei para mudar de assunto.

– Ah, aquilo... foi um desentendimento que eu e Alrish tivemos, na ocasião eu fui imprudente e não continha nenhum objeto com magia reservada, gastei toda minha energia em uma luta com ele, é claro que eu sai perdendo, por que minhas forças acabaram muito antes das dele. Esse poder que ele possui parece ilimitado, eu não entendo como funciona, mas em geral ele não gasta energia com magia, é um poder nato, próprio... Enfim, como perdi pra ele, saí esbaforido voando com Thorn sem rumo, fomos razoavelmente longe, mas como ambos estávamos feridos e enfraquecidos, despencamos na floresta. Eu usei o pouco de energia que me restava para amortecer a queda.

– Agora eu entendi. Se você quiser saber, eu posso te explicar melhor sobre como funciona o poder de Alrish, afinal eu e ele possuímos o mesmo poder por assim dizer. Embora eu mesma ainda esteja aprendendo como isso funciona! – Olhei para minhas mãos por um momento. – Eu vi a cicatriz que você tem nas costas...

– Ah, eu odeio essa marca!

– Eu gosto de marcas, elas provam o quanto somos corajosos! Cada uma tem uma história, você devia se vangloriar por ter a sua! Eu agora não fico com nenhuma, me regenero tão rápido que nem dá pra me gabar! – Olhei pra ele com uma cara triste.

– Há, você não está falando sério! Se regenerar deve ser o máximo! – Ele começou a rir. – Mas falando sério, qualquer cicatriz é melhor do que essa. Ela é um estigma em mim!

Eu voltei a olhar para as minhas mãos pensativa e tive uma ideia.

– Tire a camisa! – Falei enfaticamente.

– Ãhn? – Ele me olhou surpreso.

– Vamos, tire, eu acho que posso fazer uma coisa, deixei-me tentar!

Ele me encarou por um tempo e então resolveu tirar. Eu me levantei e me ajoelhei atrás dele.

– Vai ficar quente, me avise se eu exceder!

– O que você vai fazer?

– Uma determinada quantidade de calor pode modificar as células... é como moldar vidro.

– É preciso um calor excessivo para moldar vidros – Ele falou alarmado.

– Eu sei! – Ri do seu comentário. – Mas eu não pretendo te tostar, fique calmo! Basta canalizar para um único lugar.

Eu não sabia se ia dar certo, mas eu queria muito que desse. Assim como quando usei meu poder para ajudar Blödhgarm, eu queria fazer o mesmo por Murtagh. Até pouco tempo eu não sabia que podia controlar isso, mas quando entrei em contato direto com Eruda eu me senti tão bem, tão confiante e acolhida. Eu sei agora que posso contar com ela, sei que posso contata-la. Então eu tentei, me concentrei em meu íntimo, procurei senti-la e pedi, por favor, por favor para que ela fornecesse seu poder novamente. Por favor me guie para usar devidamente este poder.

E então eu a senti acesa dentro de mim, um calor passando para minhas mãos que coloquei sobre as costas de Murtagh em cima de sua cicatriz e aguardei. Aparentemente nada acontecia, esperei mais um pouco e então comecei a sentir suas células se modificarem ao meu toque, provocando um leve formigar sobre a minha palma. Requerendo muita atenção, eu avancei lentamente sobre sua cicatriz que de fato foi diminuindo gradativamente. Assim que a pele ficava lisa por baixo das minhas mãos, eu avançava pelo restante da cicatriz. Após um longo tempo quando enfim terminei, eu me afastei um pouco para admirar o trabalho. Suas costas estavam perfeitamente lisas, sem marca alguma. Me apoiei sobre as mãos para trás, eu estava cansada, mas não tanto comparado com hoje de manhã.

– Pode tocar agora. - Eu falei.

Ele voltou a mão para trás para tocar a cicatriz e não a encontrou. Murtagh parou por um instante e então se levantou, sua pele um pouco suada brilhou na luz do luar. Ele continuou se tocando por toda a extensão das costas, sem encontrar nada e então se virou pra mim com um sorriso largo no rosto. Eu me levantei.

– Sumiu! – Ele afirmou descrente. – Haha, sumiu! – Ele me olhou reluzente e avançou sobre mim, me abraçando forte e rodopiando soltando gargalhadas descontraídas, eu não pude evitar ser contagiada por sua felicidade e o acompanhei. Ele girou tanto que acabamos ficando tontos e caímos para trás, ele por cima, me segurou antes que eu batesse no chão e me soltou delicadamente sobre a rocha plana. Demos ainda mais risadas por toda aquela situação. Eu me senti tão viva, há muito tempo eu não ria tão descontraidamente.

Ele estava em cima de mim, seus braços ao meu lado, se apoiando, seu peito nu subindo e descendo com a respiração acelerada, tão próximo que eu podia sentir sua baforada em meu rosto. Eu o contemplei e ele também sessou as risadas me olhando mais calmamente. Murtagh foi se aproximando aos pouquinhos até eu sentir seu nariz roçar no meu, seus lábios e então eu avancei sobre sua boca, ele retribuiu instantaneamente me beijando fervorosamente. Envolvi minhas mãos em seu cangote, puxando-o para mim, sua boca tinha um sabor doce e salgado ao mesmo tempo, mas era irresistivelmente macia. Nossas respirações aceleradas se misturaram, ele se afastou por um instante e me olhou nos olhos.

– Eu a amo! – E suas palavras me encheram de alegria – Te amo desde que te vi pela primeiramente vez, mas não sabia, eu te amava antes mesmo de te conhecer! Você me inebria me preenche de uma maneira que nunca senti! Eu não queria admitir isso pra mim mesmo, mas foi por causa de você que eu mudei que eu me libertei. Eu nunca poderei descrever o que realmente senti quando senti seu toque, seu abraço pela primeira vez... – Ele inspirou meu cangote – Seu cheiro... Você me aceita? Mesmo com todas as minhas falhas? – Seus cachos pendiam emoldurando sua face, enquanto me encarava seriamente.

– Eu te quis desde o primeiro instante! – Soltei um sorriso inebriado – Eu te quero como você for! Eu também te amo!

Ele voltou a avançar sobre minha boca, sua mão tocando em minha face, em meu corpo, seus lábios macios distribuíam beijos molhados sobre meu peito. Sua presença me enchia de vida! O luar pairava sobre nossos corpos enquanto a noite estava só começando para nós dois.


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Notas finais do capítulo

Um leque de possibilidades se abre para Milena agora!

Será que aparecerão mais Esmeraldinos? O que acharam do nome?

Eu juro que tentei inventar um nome mais original, mas gostei tanto desse que preferi deixar assim mesmo!

A letra da música que eu coloquei é da música "Teru no Uta" do filme "Gedo Senki" que traduzindo para o português fica "Contos de Earthsea" é um filme japonês, tem a versão em inglês, mas eu recomendo escutar a música na versão original que é mais bonita na minha opinião.

Eu adoro o filme e recomendo! É dirigido por Goro Miyazaki, filho do aclamado Hayao Miyazaki que é conhecido pelos filmes "Viagem de Chihiro", "Castelo Animado" entre outros!

Comentem o que acharam do capítulo, se gostaram, se não gostaram...

Bjokas ^.~



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