Longos Passos até a Felicidade escrita por Yasmim Carvalho


Capítulo 4
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Oi.. conversamos lá em baixo.
Boa leitura..



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/121268/chapter/4

Capítulo 3

“Por detrás da alegria e do riso, pode haver uma natureza vulgar, dura e insensível. Mas por detrás do sofrimento, há sempre sofrimento. Ao contrario do prazer, a dor não tem mascara.”

(Oscar Wilde)

Narração: Edward.

Eu tinha nove anos novamente e eu corria. Corria por uma densa mata onde eu sabia que de qualquer forma ele me encontraria. Eu estava sonhando e tinha plena consciência disso. Porém, mesmo sabendo que aquele sonho era meu, eu estava apavorado, pois não encontrava as portas de saída daquele horror.

Ouvia seus passos esmagando o mato logo atrás de mim e esforçava minhas pernas para que pudessem correr muito mais rápido. Era preciso. Eu tinha que fugir.

- Edward, como se atreve? – A voz dele gritava meu nome bravo. Meus olhos começavam a encher de lagrimas que eram impossíveis de se conter. Eu tinha que fugi, tinha que correr. – Você não pode fugir. Não há saídas aqui! – Gritou de novo.

Meus pulmões já estavam fracos e me imploravam por ar. Mais eu não podia parar. Correr era a única alternativa que eu tinha. Tinha que haver uma saída, sempre há saídas.

Foi então que eu a vi. Ela estava parada parecendo brava com algo, mais quando encontrou meus olhos sorriu e corou. Meus pés sem minha ordem foram parando até que eu ficasse de encontro com ela. Eu já não era mais o menino de nove anos, e sim um homem de trinta e cinco anos. Os passos dele ainda eram audíveis, mais estranhamente eu não estava assim tão preocupado mais.

A mulher que sorria para mim era Isabella Swan. Ela me entendeu a mão e ficou em minha frente como se fosse um escudo. Quis dizer para ela correr, porque ele a machucaria também, e quis correr junto. Mais não consegui nenhuma das duas coisas. Isabella riu graciosamente e sussurrou.

- Não precisa ter medo, você não está mais só. – Ela deu uma rápida olhada por cima dos ombros e sorriu me passando confiança. – Pode confiar em mim.

Não respondi. Não consegui responder por que meus olhos estavam pregados nos seus olhos que eram tão puros e verdadeiros.

Ele apareceu a nossa frente com o rosto corado de puro ódio. Seu olhar de desprezo para Isabella parecia que nem lhe atingia.

- Eu disse que não há saídas aqui. – Ele falou vitorioso esticando as mãos para me pegar.

Era sempre assim, ele sempre conseguia me vencer, eu sempre acabava caindo em suas mãos. As saídas no final das contas não existiam nem mesmo em meus próprios sonhos.

Ele deu um passo à frente para me pegar definitivamente. Meu corpo todo se retraiu de pavor e angustia.

Isabella Swan deu um passo à frente e ficou cara a cara com ele, desafiando-o com seus olhos chocolates.

- Nenhum passo a mais Sr. Masen. – Ela disse firme.

Ele continuou olhando-a nos olhos como se ela fosse uma piada. Isabella não se abalou nem um pouco.

Sem escutar as ordens dela ele deu um passo à frente e Isabella o empurrou com uma força que eu sabia ser impossível ela ter.

- Eu disse nenhum passo a mais. – Seus olhos que eu tinha visto há tão pouco tempo sorrir agora tinha uma tonalidade seria e muito brava, e que acima de tudo exigia respeito.

Ele continuou sentado no chão olhando-a com ódio puro. Sem se importar com mais nada, Isabella esticou suas mãos para frente e um grande muro surgiu, separando-nos dele.

- Ele não pode mais tocar em você. – Sua voz como sussurro chegou a meus ouvidos carregadas pela brisa fresca. – Sente-se comigo e passe a noite aqui, admirando as estrelas junto a mim.

Sem dizer mais nada, ela se sentou no mato perto de uma arvore e começou a admirar o céu. Fiquei em pé encarando a bela jovem de pele tão branca que mais parecia um anjo...

***

- Edward? Edward? – Uma voz levemente rouca de sono me sacudia parecendo um pouco nervosa.

Abri um de meus olhos e encarei Isabella que tinha os olhos chocolates tão arregalados que deixava seu rosto com um ar apavorado.

- Sim? – Respondi.

Ouvi-a respirar levemente aliviada e colocar a mão do peito se afastando de mim.

- Sinto muito em lhe acordar, você estava se mexendo tanto que.. Desculpe. – Suas bochechas ficaram avermelhadas, e suas mãos correram para o próprio cabelo. – Vou preparar o café da manha. – Mudou de assunto estrategicamente. – Quer algo em especial?

Encarei seus olhos castanhos amedrontados, depois reparei na expressão facial dela e percebi que esperava levar outro fora. Um fora que ela não tomaria, pois ela havia acabado de me livrar de meu maior pesadelo, o mais continuo de todos, mesmo sem ter intenção.

- Não quero nada, obrigado. – Levantei do sofá e arrastando meus pés subi as escadas, degrau por degrau. 

Entrei no meu quarto tirando as roupas que eu usava e as jogando no chão, perto da cama. Nu, atravessei o quarto até a porta do banheiro. Com a porta ainda fechada encostei minha testa na madeira fria refletindo sobre meu sonho.

Finalmente eu havia encontrado um jeito em que ele não encostasse mais em mim e fosse derrotado pela minha própria mente que tanto repetia aquilo, meu maior pesadelo. Porem, estranhamente, Isabella Swan, uma mulher que eu acabara de conhecer ser minha salvadora me deixava angustiado. Porque ela? Porque minha nova empregada tinha que estar em meu sonho salvando-me e convidando-me para assistir as estrelas com ela? Porque não Alice? Seria bem mais óbvio que minha prima estivesse em meus sonhos, preparada para atacar quem quer que fosse para me proteger, mesmo sendo menor e muito mais fraca fisicamente do que eu.

Acho que eu tinha ficado tão surpreso por ela ontem não estar toda rabugenta, ignorante e pronta para amostrar quem realmente era para mim que cheguei a sonhar com ela, com feições puras e sorrisos verdadeiros. Uma mulher despreocupada e impotente.

Admito que fui ignorante com ela, quando a única coisa que ela queria fazer era me agradar trazendo-me um café da manhã muito bem preparado. Mas quando a ouvi chamar-me de Sr. Masen foi como se eu saísse de mim mesmo e novamente me afundasse no meu universo paralelo particular.

Porque eu não era nenhum Sr. Masen. Sr. Masen era como ele era chamado e eu não queria – nunca – ser chamado do nome daquele desgraçado. Sentia-me tão sujo e pequeno quando referiam-se a mim dessa forma, era como se estivessem me comparando com o homem louco e sem escrúpulos algum que eu um dia chamei de pai.


Pareço bem ridículo pensando isso, e sei que deixei a impressão para Isabella de que eu sofria sérias perturbações e sou extremamente ignorante. O pior de tudo era que eu realmente sofro graves perturbações. Não consigo me manter durante o dia todo nesse mundo. Preciso perder-me em um universo onde mais ninguém possa entrar para que eu me sinta pelo menos um pouco com paz de espírito. Esse e meu ponto de escape, e Isabella mais cedo ou mais tarde teria que saber disso, das minhas condições pessoais.

Desencostei minha testa da porta e a abri. Entrei no banheiro que cheirava a urina e ignorando o mau cheiro caminhei até o chuveiro.

Deixei a água correr pelas minhas costas, e fechei meus olhos.

(...)


Passei a parte da manhã toda deitado na cama, apenas perdido em pensamentos aleatórios.

Fazia alguns dias que eu não tinha notícias de Alice, e sinceramente, isso era mais do que estranho, já que minha prima estava sempre aqui ou pelo menos ligando para saber como as coisas iam indo. Isabella deveria ter encantado ela mesmo, para ela não ter ligado ainda.

Desci as escadas e fui em direção a cozinha.

Cheguei à porta da cozinha e encontrei Isabella pulando em frente ao fogão e dizendo baixinho palavras que eu não conseguia compreender.

- Isabella? – Chamei seu nome, fazendo ela se assustar e se virar em minha direção corada.

- Oi. – Ela respondeu ficando mais vermelha ainda. – Tinha um bicho aqui. – Disse sorrindo amarelo, e corando mais forte ainda. – O almoço ainda não está pronto, mais eu fiz muffins, gosta? – Sorriu amostrando uma vasilha com os doces.

Caminhei até ela e peguei um de seus muffins. Dei uma pequena mordida sem vontade, e encarei seus olhos cheios de expectativa.

- Gostou? – Perguntou animada tirando o sorriso amarelo do rosto. – Encontrei um livro de receitas e tentei fazer.

Engoli o que estava na minha boca com um pouco de dificuldade. Não era muito bom, para ser sincero. Porém, eu dei de ombros poupando-a de se sentir envergonhada novamente.

Sem dizer mais nada, andei ate a geladeira e peguei uma garrafa de água, e caminhei para sair da cozinha.

- Edward. – Chamou-me insegura. – Posso limpar seu quarto após o almoço?

- Claro. – Dei as costas a ela e sai da cozinha.

(...)

Narração: Bella.

Os muffins estavam horríveis. Um gosto estranho como se o trigo estivesse passado da validade.

Pensei que tinha arrasado na receita quando Edward experimentou e não fez nenhum comentário ignorante dizendo como estava tudo horrível. Se eu já não tivesse passado por coisas mais humilhantes em toda a minha vida, provavelmente estaria pedindo a morte de tanta vergonha.

Tirei o bolo de carne do forno, e o coloquei em cima da pia rapidamente. Isso não tinha como eu errar, já que eu havia visto minha mãe preparar tantas vezes essa receita.

Tampei-o com um pano, e deixei esfriar um pouco para chamar Edward para almoçar. Apesar de duvidar muito que ele ousasse aparecer na cozinha, considerando a derrota dos meus muffins.

Sai de perto da pia e caminhei ate a bancada onde havia um pote cheio dos meus derrotados muffins. Peguei-os e os joguei no lixo, praguejando baixinho.

Segundo dia de trabalho e eu já preparava uma comida horrível. Espero que isso não afete em nada a visão que tem sobre minha competência.

Abri a geladeira e enchi um copo com água. Encostei-me na bancada, e bebi a água.

Estou me sentindo um pouco apreensiva quanto aos problemas que Edward tem. Sinto que aqueles olhos verdes dele escondem muito segredos.

Nunca fui do tipo de garota fofoqueira que pra se manter viva precisa loucamente está falando de alguém, e muito menos tive a necessidade de desvendar segredos alheios. Mais desde o momento em que pus meus olhos nele, tive vontade de pedir para que me contasse sobre sua vida, sobre quem ele realmente era.

Era tolice essa minha vontade, na certa.

Suspirei e sai da minha posição. Lavei o copo que havia usado e sai da cozinha a procura de Edward.

Atravessei a imensa sala e fui em direção ao escritório.

Cheguei a frente às portas rústicas de madeira, e as encontrei entreabertas. Coloquei minha cabeça na fresta da porta e observei Edward andando de um lado para o outro.

- Mas... Não... Eu sei. – Consegui ouvi algumas poucas palavras em que ele sussurrava com um olhar vago. – Medo... Não...

Percebi que aquilo era um momento dele, sai de perto da porta e voltei para a cozinha.

Provavelmente se eu o interrompesse só iria levar outro passa fora

(...)

Sai de mais um quarto de visita – o último – e fui para o quarto do meu patrão. Bati na porta antes de entrar não querendo que ocorresse nenhum mal entendido e como não tive respostas entrei.

O quarto era o local mais bagunçado e sujo que eu já havia visto dentro da casa. Era uma completa confusão.

As cortinas escuras estavam fechadas, deixando o quarto abafado e sombrio. Fechei a porta atrás de mim e caminhei ate elas. As abri e em seguida as janelas, para que um bom ar fresco passeasse pelo quarto.

Comecei a catar as roupas sujas do chão, e objetos pessoais que ali também tinha. Em cantos variados do quarto, dava para encontrar cacos de vidro como se a pouco alguma briga feia tivesse ocorrido. Continuei a catar as coisas espalhadas pelo chão. Coloquei as roupas sujas em um saco preto e os pertences de Edward que estavam em boas condições na cômoda.

Peguei a pá, um saco de lixo e uma vassoura e comecei a catar os cacos de vidro que estavam espalhados pelo quarto.

Queria sinceramente saber o que passava na cabeça de Edward para agüentar viver em um local assim. Ele poderia se machucar.

A última pilha de vidro que eu catei, encontrei vestígios de sangue. Preferi tentar ignorar aquele fato, porém, sentia que deveria entrar em contado com Alice por causa disso. 

Ela não havia me dito detalhadamente o que eu encontraria na mansão. Mais, começava a passar pela minha cabeça que eu não estava apenas lidando com um homem que se recusava a ter contato com o mundo. Sentia que eu estava em um campo minado, onde a qualquer momento, Edward iria aparecer e explodir.

Se isso acontecesse, com toda certeza, eu não estaria preparada. Provavelmente pegaria minhas coisas e iria embora. Tudo isso seria demais para mim. Tolerar foras e pessoas ignorantes era uma coisa, eu sabia o que esperar delas, mais o desconhecido... Bom, não me dou bem com coisas que não são 100 por cento certas. Para vê bem isso, e só eu olhar pra trás e vê como tudo deu errado em Nova York. Não era algo que eu tivesse 100 de certeza, e eu me ferrei.

Passei o aspirador de pó pelo carpete do quarto. Tirei as roupas de cama suja, e dei um jeito em toda aquela bagunça em que Edward vivia.

Caminhei para o banheiro, e ao chegar à porta, pude sentir o cheiro forte de urina. Ignorando toda a minha vontade de deixar o banheiro do jeito que estava, entrei no cômodo fedido.

Tirei um pano que estava encharcado do chão, e o coloquei perto dos itens de limpeza.

O cheiro era realmente muito desagradável. E novamente, pensei em como Edward conseguia viver assim.

Mesmo sendo homem e rico, isso não significa que seja incapaz de fazer algo para si mesmo. E como se ele não se importasse de viver em um antro de sujeira. Como se pensasse que merecesse isso, de alguma forma.

Um arrepio passou por meu corpo fazendo-me agitar o corpo dos pés a cabeça.

Joguei sabão em pó no chão, e um pouco de água, para depois esfregar. O piso branco do banheiro estava tão amarelo que eu suspeitava piamente que Edward urinava no chão.

Passei para o box que estava igualmente sujo e amarelado, e esfreguei até senti meus braços formigarem de tanto esforço. Não parei. Continuei a trabalhar ate que o banheiro estivesse em condições descentes para uma mansão.

Quando eu sai do banheiro, eu estava em um estado totalmente deplorável. Tinha um cheiro ruim em meus pés e roupas, meu cabelo estava mais bagunçado do que sempre, e o fato de eu feder, já era ruim o bastante para eu considerar-me em um estado deplorável.

Nunca fui muito vaidosa, mas mau cheiro sempre mexeu muito comigo. Prefiro estar descabelada a fedorenta.

Catei todos os itens de limpeza, e roupas sujas e sai do quarto fechando a porta com um pouco de dificuldade.

Foi ai que eu dei de cara com Edward, que parecia mais perturbado do que ontem. Sai de frente à porta dando passagem para ele, porém ele continuou parado me olhando. Ele continuou me olhando, temi que fosse o mau cheiro que o fizesse me olhar de tal forma.

- O que você estava fazendo no meu quarto? – Perguntou agressivo.

Dei um passo pra trás temendo que esse fosse à hora em que a bomba iria explodir.

- O senhor deu permissão para limpar o quarto, e era isso que eu estava fazendo. – Respondi na defensiva.

A boca de Edward ficou em uma linha reta e fina. Temi que ele começasse a gritar coisas ofensivas para mim.

- Não quero que entre mais aqui. – Ele disse serio.

- Mas...

- Não quero!

- Está certo. – Falei enquanto ele entrava no quarto e batia a porta com força.

Fiquei alguns minutos ainda olhando para a porta do quarto e pensando em como era difícil lidar com pessoas como Edward.

Uma hora estava tudo bem, outra ele estava bravo com coisas tão pequenas.

Será que era um teste pra vê se eu queria mesmo o emprego ou se eu agüentava a coisa toda? Se era um teste, bom, eu diria que eu iria passar em todas as questões. Eu agüentei ser humilhada pelo cara que eu amava, não vou agüentar os testes medíocres do meu patrão?

Pensar nas minhas humilhações do passado fez meu coração dar uma batida descompassada e triste. Agarrada com as coisas ainda em minhas mãos comecei a dar alguns pulinhos.

- Superei, superei o meu passado. Superei! – Murmurei enquanto pulava, e segui rumo à escada ainda dando pulos e sussurrando, sem me preocupar que Edward pudesse me pegar fazendo minhas loucuras novamente.

(...)

Vi Edward novamente durante o dia só quando o céu já estava escuro e sem estrelas. Ele ficou me evitando e me ignorando. Não forcei a barra, servi o jantar para ele e me retirei, indo para meus aposentos.

Não liguei para Alice também. Não queria bancar uma de dedo duro, e Edward já era bem grandinho para ter noção do que machucava ou não. Por isso, não importunei a prima dele com seus problemas. Achava também que isso era uma coisa dele e ele não queria ninguém metido onde não havia sido chamado.

Depois da “bronca” que tomei dele passei o dia todo lavando roupa e depois preparando o jantar.

Agora, eu me encontrava em baixo do chuveiro, tirando todo o cheiro ruim que minha pele havia pegado no quarto dele, e do dia a dia trabalhoso.

Eu realmente não levava jeito para a coisa de ser dona de casa. Porque se recebendo para fazer esse trabalho todo eu já estava ficando um pouco pra baixo por causa da quantidade de serviço, imagina não receber nada. Deus do céu, prefiro nem imaginar.

Sai do banho, coloquei minhas roupas intimas e pijamas largos. Joguei-me na cama e apaguei logo de imediato.

(...)


Alguns dias depois...

Domingo.

Antigamente essa palavrinha soava como musica para meus ouvidos, era como se fosse uma confirmação divina de que eu poderia ficar deitada, descansando, depois de uma semana cheia.

Porém, hoje eu me encontrava em pé, preparando o almoço para Edward e suas visitas – Alice e seu noivo – e limpando o primeiro andar da casa.

Eu disse que a palavrinha soava como uma musica divina? Pois bem, agora soam como meu inferno particular, apitando na minha cabeça, “Incompetente, agora tem que trabalhar ate nos domingos para pagar as contas.” Bem humilhante, mais eu agüento. 

O resto dos dias da semana, eu passei limpando a casa, fazendo comida, lavando roupa, passando roupa, voltando a fazer comida. No final do dia eu dormia, cansada demais às vezes até para comer.

Esbarrei com Edward algumas poucas vezes, já que ele se recusava a sair do quarta, que eu tinha quase certeza, já se encontrava no estado podre de antes. E quando ele saia, ficava andando pela casa descalço, com roupas velhas e rasgadas, falando sozinho.

Não vou julgar ele por falar sozinho, eu também converso comigo mesma muitas vezes ao dia. Isso e como uma terapia. Porém, eu não fico parecendo tão perturbada como ele.

As feições do rosto de Edward ficam pálidas e vazias. Seus olhos verdes ficam dilatados e distantes. E seu corpo às vezes dava umas tremedeiras como se ele estivesse chorando.

Cheguei a me aproximar e perguntar se estava tudo bem, mais novamente ele me afastou com mais um de seus foras. Não insisti, já que nunca fui do tipo persistente irritante, e me afastei.

No andar de baixo, eu podia escutar a movimentação de objetos pesados sendo arrastados no segundo andar.

Fiquei tentada a subir as escadas e vê o que estava acontecendo, mais deixei que Edward se entendesse consigo mesmo e continuei preparando a comida.

Eram 11 da manhã, e o dia estava tão fresco, do tipo que se senta na varanda e sente o vento batendo no rosto, que minhas calças jeans e blusa de mangas preta não me incomodavam. Tinha decidido ficar com uma aparência mais decente do que bermudas furadas e blusas largas. Um avental branco e limpo estava por cima da minha roupa.

Eu preparava uma comida brasileira, que eu havia encontrado em um livro de receitas. Era filé de peixe mergulhado no azeite com algumas batatas dourados de acompanhamento. Decidi preparar isso porque me parecia gostoso e particularmente fácil, algo que agradaria a todos. Fiz arroz e preparei as ervilhas para que acompanhassem o peixe.

Eu estava encostada na bancada da cozinha ouvindo o barulho do segundo andar que cada vez só ficava mais alto. Ignorando o fato de que eu seria escorraçada de lá, eu desliguei o fogão e marchei para o segundo andar. As coisas não podiam ficar assim, algo acontecia com Edward, e muito mais do que apenas curiosidade eu tinha desejo de saber. Talvez eu pudesse ajudar. E se eu pudesse, eu não me negaria a isso.

Cheguei a frente à porta de madeira resistente e bati calmamente e gentil. Resposta em palavras não recebi, apenas barulho de vidro se quebrando. Bati de novo.

- Edward? – Chamei com uma voz controlada.

- Vai embora! Vai embora! – Aos berros ele gritou para mim me expulsando.

- Por favor, eu só quero saber se você está bem. – Respondi um pouco mais alto para que ele pudesse me ouvir.

A porta do quarto foi aberta de um jeito bruto e Edward na entrada me olhava bravo. Seu rosto estava manchado por lagrimas, suas roupas rasgadas e em farrapos, e seu braço sangrava.

- Deus, você está machucado. – Murmurei, dando um passo para frente tentando acalcar o braço onde havia um grande rasgo.

Edward deu um passo para trás como se fosse um animal acuado e colocou os braços atrás das costas.

- Isso não é da sua conta. – Sua voz rouca tremeu um pouco.

- Deixe-me cuidar desse ferimento. Por Deus, isso vai inflamar. – Outro passo para trás.

Segui seus passos até que finalmente eu estivesse dentro do quarto. O quarto se encontrava em pedaços. Apenas a cômoda e a cama ainda eram reconhecíveis. O resto... Era apenas resto mesmo, quebrado, estraçalhado e sem concerto.


Meus olhos deveriam estar do tamanho de uma bola de gude, mesmo assim, reprimi minha vontade de correr e estendi minha mão para que ele colocasse o braço machucado nela.

Se eu tinha alguma experiência com machucados? Sim, muita. Quando mais nova, tropeçava em tudo, e por isso, havia aprendido o básico de como tratar de machucados.

- Isabella.. Vai embora! Não quero você aqui, e não preciso da sua ajuda. – Ele murmurou frustrado com minha ousadia de estar em seu quarto quando havia me dito para nunca mais entrar ali.

- Eu sei. – Respondi simplesmente, e continuei com a mão estendida.

Controlei as feições do meu rosto para que eu ficasse com um ar serio, e de quem não se importava com o que ele quisesse ou dissesse.

Ainda assim, Edward ficou murmurando coisas tão baixas que eu mal podia ouvir, porém, quando eu pensei que a próxima coisa a virar pedacinhos fosse eu, ele estendeu o braço.

Segurei com cuidado e analisei a ferida que estava perto do pulso. Segurei-me para não encarar seus olhos e lhe mandar um olhar cheio de perguntas que eu já tinha respostas, e continuei a olhar seu braço. O machucado deveria ter uns 6cm, e o sangue que dali saia não era mais com tanta força, sinal de que aquilo já tinha algumas horas, ao redor, uma leve cratera de sangue seco fazia tudo ficar com um aspecto mais nojento do que seria.

- Vamos ter que descer para eu pegar a caixa de primeiros socorros.

Sem esperar mais respostas dele, fiquei do lado direito – lado do braço machucado – e o guiei para a saída do quarto.

Descemos as escadas em silencio, mais eu podia sentir pela forma como o braço de Edward mexia as vezes que ele estava nervoso, ou provavelmente irritado.

Chegamos à cozinha, e eu o deixei sentado nos bancos que ali tinha enquanto saia correndo até a dispensa onde eu a pouco havia visto uma imensa caixa branca de primeiros socorros. Peguei-a em meus braços magros, e corri de volta para a cozinha.

Edward continuava sentado onde eu havia deixado, ele batia os pés impaciente no chão, e falava sozinho. Não parou de falar quando me aproximei, apenas começou a falar um pouco mais baixo. Revirei os olhos vendo como ele resmungava como uma criança, e puxei um banco para ficar próximo a ele. Coloquei a caixa de primeiros socorros no banco e a abri. Sai de perto da caixa para ir até a pia e lavar minha mão com detergente. Com as mãos limpas, voltei para a caixa de primeiros socorros e peguei gazes. Sai de novo de perto e caminhei até a geladeira, onde eu sabia ter soro fisiológico. Peguei-o.

- Edward, vem cá. – Disse enquanto caminhava até a pia. Edward ainda rabugento levantou-se e veio até mim. – Me da o braço. – Ele estendeu o braço e deixou a boca em uma linha fina.

Abri a torneira e coloquei o braço embaixo da água retirando o sangue seco. Passei meus dedos com cuidado perto da ferida, ajudando a limpar mais rápido. Deixei o braço dele ainda de baixo da água e fui pegar a gazes.

Fechei a torneira, e sequei o braço com as gazes do pacote que eu havia acabado de abrir. Com o braço já seco, peguei mais uns punhados de gazes e as enchi com soro fisiológico, passei sob o machucado, deixando-o bem limpo.

- Nem é tão grande assim. – Falei para Edward enquanto limpava.

Não era mesmo, era um corte bem fino na verdade.

Quando eu olhei para cima esperando que Edward falasse algo, reparei que ele estava com a boca apertada como se sentisse dor. Balancei minha cabeça prendendo um leve sorriso maroto que tentava escapar de meus lábios, e finalizei a limpeza.

- Acho melhor cobrir isso para não infeccionar. – Nenhuma resposta de novo.


Arrastei Edward de volta para o banco e fiz ele sentar. Cobri o leve ferimento, com delicadeza.

- Prontinho. – Falei assim que terminei e sorri para ele.

- Eu só queria entender porque você fez isso. – Ele falou em resposta analisando o braço.

- Fiz o que? – Perguntei confusa.

- Cuidou de mim. – Respondeu baixo.

Encarei Edward e ofereci-lhe um sorriso amigo. Não havia porque não cuidar dele. Ele deveria ficar se perguntando que tipo de pessoa eu seria se não tivesse cuidado de seu ferimento, porque isso sim seria um absurdo.

As bochechas de Edward pareciam ter ganhando um pouco de vida enquanto um tom levemente rosado se alastrava ali. Meu sorriso ganhou mais vida quando percebi que ele era um parceiro em ficar com as bochechas rosadas inconvenientemente.

- Cuidar de seu machucado foi algo que qualquer pessoa faria. As pessoas ajudam umas as outras. – Afirmei.

- Não, as pessoas não fazem isso. – Seus olhos verdes me encararam. – As pessoas nunca fazem algo sem motivo. Não para um estranho.

- As pessoas podem ser melhores do que você imagina. – Respondi um pouco na defensiva percebendo que o que ele havia dito era realmente real para ele.

- Não, elas não fazem. – Mordi meu lábio inferior sem saber o que dizer.

Não acredito que as pessoas são tão ruins a ponto de não ajudar ao próximo, acredito que dentro de cada ser humano, a algo de bom, independente do que ele fez ou venha fazer, a sempre uma chama de bondade dentro de cada um de nós.

- Não, não há. – Edward respondeu fazendo-me perceber que havia pensado alto.

Corei furiosamente e dei de ombros.

- Porque motivo acha isso?

- Por motivos que você não vai saber. – Respondeu na lata.

Suspirei e comecei a catar o material que usei nele. Edward continuou sentado, com os olhos agora baixos e pensativos.

O telefone da cozinha tocou e eu fui atender. Era o porteiro avisando que Alice havia chegado. Falei para abrir o portão, e avisei Edward, que não saiu da posição que antes estava e apenas deu de ombros.

Senti novamente aquele desejo de saber mais sobre a vida dele e ajudar. Toda aquela dor que seus olhos baixos demonstravam eram traços de um passado sofrido. Talvez viver em uma mansão quando era criança não tenha sido assim tão bom. E talvez a minha vida que eu julguei difícil, fosse brincadeira de criança comparada com a de Edward.

Não sei, sinceramente, não faço idéia do que lhe aconteceu para que pudesse chegar nesse estado, onde era perceptível sua descrença na raça humana e na felicidade. Eu só sei, que nesse exato momento quero lhe dar um abraço e dizer que independente de tudo, as coisas vão se acertar. Eu simplesmente quero ficar perto e lhe ajudar. E como se minha vida agora dependesse disso, de ficar perto dele e reparar as coisas defeituosas do seu passado.

Não tive ninguém para me amparar quando sofri, porém, consegui ter força o bastante para me reergue. Sei que nem todos tem isso, a chama da esperança de um futuro bom. Vejo em Edward o quanto isso lhe falta. E por hora, eu começarei a trabalhar em pequenos passos lentos para reconstruí-lo.

Não somos íntimos, mal nos conhecemos. Ele me da foras, e eu sei que sou uma mera empregada. Mais devo demonstrar para ele, que a chama boa realmente existe dentro de cada ser humano. E a minha, eu estarei usando nele. Apenas para que ele tenha um pouco de felicidade.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oi gente.Bom, desculpa pela demora, acabei ficando meio enrolada.E agora com as voltas as aulas, vou postar provavelmente a cada 15/20 dia.Queria agradecer pelos reviews, de verdade, obrigada, isso e muito importante e o que me incentiva a escrever.Não para de deixar os reviews, e acompanhar a fic. E se estiverem mesmo gostando, e acharem que vale a pena, indiquem. ~faz cara de cachorro sem dono, rs~
Mas falando de outro assunto...
O que acharam do capítulo? Repararam que o Edward tem umas reviravoltas no humor dele né, no próximo capítulo vou deixar isso mais explicado. E a Bella, ein? Agora vai começar as investidas dela para descobrir quem realmente é Edward. Me digam, vocês acham que ela vai ter sucesso logo de cara? Vai ter que quebrar bastante a cabeça? Então, falem suas opiniões.
Bom, e isso, até a próxima, beijão para vocês, e comentem.