Longos Passos até a Felicidade escrita por Yasmim Carvalho


Capítulo 2
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

A história e narrada pela Bella e o Edward, só para deixar claro.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/121268/chapter/2

Capítulo 1


"Se agirmos de forma bondosa para com as pessoas, elas irão nos recíproca da mesma maneira, mas se agirmos com maldade, obviamente seremos retribuídos com a mesma moeda."
- Atharva Veda

Estados Unidos – 2011

Narração: Edward.

Acordado. Finalmente eu estava nesse estado. Passei minhas mãos ao lado da cama certificando-me de que tudo era real. Eu não estava em mais um de meus pesadelos onde o rosto dele me cercava e suas mãos viam para cima de mim cheias de posse. Finalmente eu voltava ao mundo real onde ele não existia mais, e estava morto.


Sentei-me na cama e passei as mãos em meus olhos, só por costume, eu não precisava fazer muito esforço para acorda, já que se dependesse de mim eu nunca mais dormia, pois em meus sonhos era sempre onde ele estava, apenas me aguardando.


Olhei o relógio que ficava ao lado da minha cama e constatei que deveria levantar, pois já quase era hora do enterro da Sra. Taylor.


Empregada de mais anos que minha existência, a Sra. Taylor foi uma das melhores pessoas que conheci. Ela que cuidou de mim quando soube o que aquele homem me fez. Ela que quis fugir comigo, e quase perdeu seu emprego por isso. Ela que sempre esteve quando eu precisei, cuidando de mim como se fosse um de seus filhos. Ela que foi uma das únicas pessoas que realmente cuidou de mim.


Levantei da cama e fui jogar uma água no corpo para expulsar o suor que aquele pesadelo, o mesmo de sempre, havia-me trago.


Embaixo da ducha forte, e com meus olhos fechados, aquele rosto vinha a minha mente novamente. Perseguindo-me ate que eu não agüentasse mais e abria os olhos, aterrorizado. Era inexplicável que mesmo quando eu tinha certeza de que ele estava morto, eu não conseguia controlar minha mente de ficar com medo.


Ele não podia mais me ferir, mas tenho certeza que mesmo se estivesse aqui fisicamente, ele não seria capaz. Eu já estava arruinado desde o dia em que suas mãos encostaram-se em mim, e toda aquela situação começou.


Sai do banho, coloquei minhas habituais roupas de dia a dia, confortáveis e sai do quarto, descendo as escadas. Cheguei à cozinha, e peguei o telefone, discando para a floricultura e pedindo para que entregassem uma coroa de flores no funeral da Sra. Taylor.


Eu sentia muito pela sua perda, mas simplesmente eu não poderia me arriscar de sair de casa e algo acontecer. Era demais para mim. O mundo lá fora, fora dos grandes muros da mansão, parecia tão perigoso e os humanos me deixavam tão assustado, que seria impossível minha saída de casa. E eu sei, a Sra. Taylor entenderia, onde quer que ela esteja ela entenderia perfeitamente o motivo de eu não estar em seu enterro, rezando por ela junto de sua família.

Sentei na bancada da cozinha e fiquei olhando por todo o lugar meio perdido. Eu sempre tive a Sra. Taylor ao meu lado e nunca havia feito nada na cozinha a não ser pegar algo para beber ou uma fruta e sair rápido. Levantei-me e caminhei ate à geladeira, abri e fiquei olhando ainda meio perdido. Peguei a caixa de leite e fechei a geladeira. Bebi um pouco de leite ainda no gargalo, eu estava praticamente sozinho na mansão, tirando o porteiro, e não havia problema algum em beber no gargalo.


Ouvi o barulho do interfone que o porteiro usava para avisar quando chegavam visitas, o que no geral era sempre Alice ou sua mãe Sara, e atendi.


- A Srta. Brandom está aqui.

- Certo, fale para ela entra, estou na cozinha.

- Claro senhor. – E desligou o telefone.

Passou alguns minutos ate eu escutar o barulho dos saltos de Alice vindo em direção a cozinha. Outro barulho veio junto dela, o barulho dela esbarrando em algo, como sempre.

- Ai, mas que porra! – Ela resmungou e depois deu as caras na cozinha.

- Oi. – Falei cumprimentando-a.

- Por tudo que e mais sagrado, tira aquele inferno de mesinha do caminho para a cozinha, sempre me machuco nela. – Ela resmungou fazendo bico.


Alice vestia uma calça social preta e uma blusa branca, com saltos pretos. O tipo de roupa que ela sempre usava quando eu a via, roupa de trabalho. Ela era uma advogada de prestigio pelo o que me contava e esse tipo de roupa “profissional” era importante. Pelo menos era isso que ela sempre afirmava.

- Deus do céu. – Ela caminhou ate mim e analisou meu rosto. – Não tem comido garoto? – Soltei uma leve risada com a palavra garoto. Eu já não era isso a anos. – Serio Edward, você está mas magro do que a última vez que eu o vi, e olha tem só 4 dias. – Seus olhos cinzas como da mãe me olhavam cheios de preocupação. – Quer me matar de preocupação?

- Lógico que não Alice, já falei para você não se preocupar comigo.

- Como? Sinceramente, como não me preocupar com você se cada vez que eu o vejo parece ter envelhecido anos. E agora sem a Sra. Taylor, eu to ficando maluca. Você já comeu algo por acaso? – Olhei para os lados dando de ombros. – Saco vazio não para em pé Edward.

E sem dizer mas nada ela abriu a geladeira retirou ovos e bacon de dentro, e começou a preparar o café da manhã para mim.

- Não foi trabalhar?

- Fui sim, só que consegui ser dispensada hoje. – Ela me olhou e sorriu de leve. – Tenho trabalhado duro o bastante para conseguir uma folguinha. Bem merecidas para ser sincera.


- Não deveria trabalhar tanto assim Alice. – Ela deu de ombros.

- Para você e bem mais fácil Edward. – Ela disse mexendo os ovos. – Quer dizer, você virou escritor não é mesmo? Você não precisa sair de dentro de casa para prestar seus serviços, apesar de eu saber muito bem que a editora adoraria isso. – Contrai o corpo ao escutar de novo o assunto de sair de dentro de casa.

- Não vamos começar Alice, por favor. – Pedi.

- O que? – Ela começou a fritar o bacon. – Não disse nada demais.

- Você sempre começa assim. Eu não vou sair, e se o assunto que quiser conversar for esse, está encerrado!

- Ta certo. – Ela resmungou. – E só que vou me casar daqui a poucos meses e eu preciso de você comigo. – Ela desligou o fogão. – Você sabe o quanto e importante para mim, que é muito mais do que só um primo, e sim um grande amigo. Como não vou insisti para que saia de casa, se preciso que saia para estar presente em meu casamento?

- Alice... – Murmurei o nome dela me sentindo um pouco mal por não estar presente em seu momento de felicidade. Mas meu medo era mas forte do que eu, e eu simplesmente não podia. – Eu tenho certeza de que você será a noiva mais linda do universo. Eu queria muito ir, só que...

- Não dá. – Ela terminou minha frase.


Fiz que sim com a cabeça e ela me abraçou. Um abraço de solidariedade e entendimento. Ela sabia o que eu havia passado e como eu havia me tornado o que hoje sou.

- Tudo bem.. Eu.. Eu vou entender. – Seus olhos estavam cheios de lagrimas, fazendo sua estrutura pequena parecer mais frágil do que já era.

Passei meus dedos cumpridos no pequeno rosto de minha prima secando suas lagrimas.

- Não chore por minha causa, Alice.

- A... Certo. – Ela virou o rosto para a parede, e respirou fundo. – Tenho novidades, acabei de me lembrar.

- E o que seria?

- Já contratei sua nova empregada, e ela chega em dois dias. Ela não apresenta perigo algum, na verdade conversei com ela, e ela parecia uma ótima pessoa. – Alice se afastou um pouco de mim para voltar aos ovos mexidos e bacon.

- Não sei se isso e uma boa idéia Alice. – Falei um pouco temeroso.

- Lógico que é. – Ela respondeu de imediato. – Você não sabe se cuidar sozinho, e muito menos limpar uma casa. E olha onde estamos, uma mansão, você não daria conta disso sozinho.

- Eu sei me cuidar Alice, não preciso de nenhum estranho dentro da minha casa. – Ela me ignorou.

- E a propósito, o nome dela e Isabella Swan.

(...)



Narração: Bella.

Da para acreditar que eu já fui a todas, todas mesmo, agências de empregos da maldita Nova York? Essa não é a droga da cidade onde as pessoas nunca dormem? Então, deveria estar cheia de empregos, e porque diabos eu não consigo encontrar nenhum para mim? Cadê a droga da hospitalidade?

Quer dizer, eu to aceitando ate ser garçonete no momento, porque sinceramente, minhas economias já estão no final, e elas já eram bem poucas quando eu cheguei aqui. Daqui a pouco eu estou passando fome e sendo jogada para fora da minha quitinete.

E sempre quando eu apareço em algum local que tem uma placa de que precisam de alguém para trabalhar, eles me olham dos pés a cabeça, me dão um sorriso bem do maldoso e apenas dizem, “A, desculpe, já contratamos a pessoa” ou “Você é estudada demais para trabalhar aqui”. Quer dizer, que porcaria e essa? Se eu estou ali, implorando por um emprego, quer dizer que eu não to ligando, no momento, de ser estudada o bastante para estar em coisa melhor e que eu simplesmente preciso daquele trabalho. Mas ta complicado, já que nem as malditas agências me ligam avisando que conseguiram algo para mim.

Me joguei no sofá cama, um dos motivos de minha dor na coluna, sem esperanças. Eu teria que voltar para Forks, sem dinheiro, humilhada, e ainda por cima, teria que choramingar para que meus pais me deixassem ficar em sua casa.


- Meu Deus, que maldade eu fiz, me diz? Porque eu nasci pobre e sem a capacidade de conseguir um emprego? Quer dizer, ser pobre já não basta? – Choraminguei olhando para meu teto mofado, onde tinha infiltração.

Meu celular, o mesmo da época do ensino médio, começou a tocar. Atendi rapidamente já que podia ser algo relacionado com um emprego.

- Alô.

- Isabella Swan? – A voz de uma mulher disse do outro lado.

- Sim. Com quem falo?

- A, desculpe não ter lhe dito. Eu sou Alice Brandon, me deram seu telefone na agência de empregos. A agência Kellogs. 

- Agência de empregos? – Cheguei a me deliciar ao falar aquele nome. Isso era um bom sinal. Bom de verdade.

- Sim. Eu estou precisando de uma empregada para ficar tempo fixo na mansão de meu primo, tendo folga aos domingos.

- Entendo. – Fiz minha voz mais profissional.

- Será que poderíamos ir no Java Café para conversarmos melhor? Ele fica perto da sua casa. Não se assuste, me deram seu currículo. – Ela riu de leve.

- A claro. Chego em 5 minutos. – Como ela sabia que eu tinha arregalado meus olhos em pavor por uma estranha saber meu endereço? Dei de ombros, era uma oportunidade de emprego, isso sim era importante.


- Certo, já estou aqui aguardando.

- Muito obrigada por me ligar, e até logo.

- Até.


Desliguei o celular e corri para meu pequeno armário pegando uma calça social preta e uma blusa bege, roupas profissionais, que me deixassem com ar de seria. Eu podia estar guardando meu diploma no fundo da minha gaveta de calçinhas e indo lava bosta de gente rica, mas eu iria decente, e no salto ainda por cima. Calcei meus scarpin pretos, peguei minha bolsa e corri saindo de casa. Tranquei as portas, e corri pelas ruas movimentadas de Nova York. Finalmente as portas estavam se abrindo para mim. Antes tarde do que nunca.

(...)


Parei na porta da cafeteria, passei as mãos suadas nos meus cabelos já desgrenhados, e respirei fundo entrando na cafeteria. Foi ai que eu me dei conta de que não sabia quem procurar já que haviam varias pessoas no local. Olhei desesperada de um lado para o outro e vi uma mulher de aparência pequena e frágil levantar a mão para mim, me dar um sorriso hospitaleiro, me convidando a juntar-me a ela.


Dei passos longos e rápidos e logo já estava em sua mesa. Ela abaixou um papel, que logo reconheci como meu currículo, onde havia uma foto minha.

- Sente-se. – Acatei suas ordens, sentando-me ereta. Era bom manter as aparências. Ela esticou a mão para mim e eu as apertei com um aperto firme e confiante.

- Prazer em conhecê-la. – Disse, mas segura do que me sentia internamente.

- É um prazer para mim também. – Ela sorriu e soltou minha mão. – Me acompanha com um café? – Mordi o lábio inferior querendo dizer que sim, mas me contive. Café era luxo demais para minha atual situação, onde 10 centavos era muito.

- Não obrigada.

- A que isso, eu insisto. – Ela sorriu e chamou uma garçonete. – Por minha conta. – Acrescentou.

Alice era uma mulher pequena, de cabelos pretos curtos e olhos meio cinzas, ela era muito bonita, e acima de tudo, não me olhava com desprezo e sim simpatia.

- Muito obrigada. – Agradeci envergonhada.

- Não há de que. – A garçonete chegou e entregou meu café. Agradeci com um sorriso e ela se retirou. – Tenho que lhe informar algumas coisas.

- Claro. – Bebi um gole do café e me senti renovada com aquele maravilhoso saber que eu não bebia a meses descendo pela minha garganta.


- Como eu disse pelo telefone, estou lhe contratando para trabalhar na mansão do meu primo, Edward Cullen. – Levantei uma sobrancelha ao ouvir seu nome. Eu tinha visto alguns dias atrás um livro na vitrine da livraria da esquina, e o autor tinha o mesmo nome. – Creio que tenha reconhecido o nome pelo seu rosto. – Assenti. – Bom, Edward não sai muito de casa, na verdade, ele nunca sai, o que significa que ele estará por perto sempre. Não se preocupe, ele não ficará se metendo no que você está fazendo. – Assenti novamente. – Ele e muito quieto e reservado Isabella, e peço para que não mencione nada sobre seus livros, pode ser?

- Claro.

- E ele anda pelos cantos meio abatido, murmurando coisas, peço que não se assuste.

- Ele tem algum problema? – Perguntei temerosa.

- Digamos que alguns que você não precisa ficar ciente. – Fiz que sim com a cabeça. – Assunto de família.

- Entendo.

- E te peço outra coisa também Isabella, não querendo abusar nem nada assim.

- Claro, pode falar.

- Por favor, não o deixe passar o dia sem comer, force se for preciso e diga que foram ordens minhas. Edward anda abatido. – Passei as mãos, ainda suadas, no cabelo, e fiz que sim com a cabeça. – E o salário. Sei que o serviço não é pouco, por isso, proponho pagar plano de saúde e 2 mil reais por mês.


- 2 mil? – Perguntei bestificada. – Mas plano de saúde? – Sorri largamente para ela. – Está excelente. – Ela sorriu para mim.

- Não se engane assim Isabella, o trabalho não é fácil. Edward às vezes e difícil de lidar, esse é o mínimo que eu posso paga-la.

- Tudo bem. – Disse não conseguindo conter minha felicidade. – Quando você quer que eu comece?

- O mais rápido que puder.

- Pode ser daqui a dois dias? Tenho que acerta algumas contas.

- Claro. – Alice sorriu e esticou a mão novamente para mim, o negócio estava fechado, eu tinha um emprego. – A mansão fica um pouco afastada daqui, por isso mandarei o carro vir pega-la.

- Muito obrigada. – Ela se levantou da mesa, deixou uma nota de 10 reais, e pegou a bolsa.

- Eu que agradeço. Até logo.

- Até. – Ela se virou e saiu da cafeteria.


E eu fiquei aqui, sentada saboreando meu café e rindo feito uma idiota por ter conseguindo um emprego com um salário bom. Quer dizer, qualquer salário em minha atual condição era esplêndido, e esse então, me deixava nas nuvens. Nada de humilhações para ficar na casa dos meus pais. Nada de ter que voltar para a pacata Forks. Nada de me arrepender por ter fugido daquele lugar.


(...)

Narração: Edward.

Apreensivo. Isso definia totalmente o meu novo estado de espírito. Eu não sabia o que esperar dessa Isabella Swan, muito menos como deveria me portar em sua frente.


Eu temia que ela fosse uma mulher cheia de crenças e preconceituosa, que chegaria a minha casa apenas para me observar, e depois questionar a minha sanidade, quando eu estivesse em um de meus momentos de solidão, conversando comigo mesmo. E pior ainda, eu temia que ela fosse alguma repórter interesseira louca para saber a cara do escritor que nunca se amostrava. O escritor que temia o mundo.


Suspirei e estiquei minhas pernas no sofá observando as labaredas do fogo que preenchiam a lareira. O outono havia chego com força e com ele havia trago corrente de ar frias o bastante para que eu ficasse minhas noites mal dormidas na sala, esticado no sofá de couro, observando a lareira antiga queimar os tocos de madeira.


Olhei para o relógio que havia a cima da lareira e constatei que em poucas horas Isabella estaria entrando pela porta, apertando minha mão, e analisando como se eu fosse uma aberração. Era assim que as pessoas, as poucas que já haviam me visto, agiam. Tratavam-me como um louco que apenas gostava de ficar enclausurado em seu buraco, e se questionavam de como havia conseguido transformar-me em um escritor.


Para ser sincero, escrever sempre havia sido uma forma para que eu conseguisse sair do mundo real, entrar em um mundo de possibilidades. Quando eu era mais jovem sempre havia sido o meu sonho estar presente em um universo onde meu pai nunca havia encostado-se a mim de forma tão repulsiva, me deixava feliz, mesmo que momentaneamente.


Eu gostava de escrever contos de pessoas que não eram nem bonitos e nem feias. Eu gostava de colocar no papel histórias de pessoas normais, gostava de imaginar como era seu dia a dia, como era trabalhar para conseguir sustentar uma família grande, como era um dilema chegar a casa e ainda dar atenção e amor a todos. Eu gostava de fantasiar que o mundo onde eu vivia era o irreal, e aquele, o feliz que eu escrevia, era onde a verdade existia, era onde eu deveria estar.


Me pergunto quantas noites depois que ele abusava de mim, eu não passava acordado em meu quarto, batendo em meus braços na esperança de acordar. Mas que isso, me questiono quantas vezes eu já não pensei que estava em coma, e que logo, logo, se eu ficasse deitado, repousando, eu acordaria e nunca mais sofreria. Sei que foram muitas horas pensando essas tolices. Muitas horas perdidas que eu nunca faria questão de recuperar, pois no final das contas, foi o que me deixou vivo.


Mas muito mais do que as horas em que eu gostava de fantasiar que logo eu acordaria e nunca mais sofreria, foram as horas de tortura que passei pensando em me matar. Horas em que eu corria para o terceiro andar da mansão, me pendurava na janela, e ficava em um dilema comigo mesmo sobre soltar meu corpo, sentir o delicioso vento em meu rosto, e então, só meu corpo estar no chão e eu estar livre de tudo. Mas sempre quando eu ia me soltar, minha mente traiçoeira e medrosa me alertava de que eu poderia não morrer e apenas quebrar alguns ossos. A dor seria pior, e depois, tudo voltaria ao normal, ou até cem vezes pior.


Eu passei o final da minha infância e toda a minha adolescência dentro de casa. Eu estudei em casa todas as matérias que se tem na escola, e até mais. Aprendi diversas línguas, decorei diversos livros sobre o mundo, e por um tempo, me aplicar a isso era tudo o que eu podia fazer. Passava horas da manhã e grande parte da minha tarde estudando, e quando os professores iam embora, eu era trancado no quarto dele e abusado.


Pensar nisso, me fazia lembrar as horas de tortura em que ele estava dentro de mim e me obrigava a gritar tudo o que eu havia aprendido no dia. E ele gemia de prazer ao ouvir tudo o que eu dizia em meio lagrimas de desespero onde a única coisa que eu queria, era que ele parasse com aquilo para sempre e me deixasse em paz.


E então, na noite do meu aniversario de 18 anos ele morreu. Acredito finalmente que esse tenha sido o melhor presente que alguém poderia me dar. A morte dele foi como se amarras que antes estavam em meus braços, pernas e pescoço fossem soltas. Eu estava livre para sair pelo mundo, explorar o desconhecido, conhecer pessoas novas, e até amar. Eu estava livre para viver meu maior sonho, o de ser feliz.


Mas ai, eu tive medo. Medo do mundo, das pessoas, de tudo. Eu não saberia como me portar com aqueles seres tão estranhos e sem piedade. Eu seria como uma criança perdida em um lugar completamente desconhecido. E foi nesse exato momento em que eu decidi que nunca sairia de casa, porque o medo já havia me dominado.


Não apareci no velório dele, e apenas sinto muito por isso porque soube pela minha tia que minha mãe estava lá. Minha mãe que fugiu poucos meses antes dele tocar em mim.


Não sei muitas coisas sobre ela. Apenas pequenas memórias vagas de quando eu era criança e ela corria pelo enorme pátio comigo, brincando. E depois ela me pegava em seus braços e me rodava, e dizia que naquele momento eu estava sentindo a terra girar. Foi ela que me ensinou essa brincadeira. E fui eu que ensinei para Alice. Era bom sentir o mundo girar, parecia que assim algo realmente tinha sentido na minha cabeça de criança.

Mas em uma noite ela apareceu em meu quarto, e tinha uma imensa mancha roxa no lado esquerdo do rosto. Ela chorava, chorava como eu nunca imaginei vê um adulto chorar. Ela beijou meu rosto, e disse que tinha que fazer uma viagem, e que mais rápido que eu pudesse imaginar, estaria de volta, e então eu iria viajar com ela, uma viagem só nós dois. Ela nunca voltou. Mas a voz chorosa dela dizendo que me amava nunca mais saiu da minha cabeça. Acho que para ela foi melhor assim, mas certamente eu não direi que foi melhor para mim.

Reconheço que por anos passei muito ressentido com ela, acredito que até a morte dele eu achava covarde por não ter voltado por mim, por ter me deixado com o homem que ela sabia ser um mostro. Mas depois que eu soube de sua aparição no enterro dele, mudei um pouco de ideia. Ela, Elizabeth, acredito que tenha sim voltado para me buscar, porém, não conseguiu. E mesmo o rancor querendo sempre me afetar em relação a esse fato, eu não consigo imagina-la com maus olhos.


Durante a minha adolescência, a única menina que eu via era minha prima Alice. Uma vez por mês ele permitia que tia Sara trouxesse Alice para me vê. Esses dias de visitas eram os únicos realmente bons em que eu conseguia não pensar em me matar toda hora.


Alice era mais nova do que eu dois anos, mas mesmo assim, isso em nada impedia que sentássemos e conversássemos sobre tudo que vinha a nossa mente. Ela contava em como eu estava perdendo toda a diversão e me explicava que eu precisava fugir para conhecer o mundo. E quando eu tinha 17 anos eu contei para ela tudo o que se passava dentro daquela casa. Alice ficou horrorizada, queria chamar a policia, na verdade ela queria pegar um guarda chuva e ir para cima do meu pai, achando-o o homem mais nojento e sem escrúpulos que ela já conhecerá. Naquele dia, tia Sara ficou sabendo de tudo também. E como a filha ela teve as mesmas atitudes. Ela bateu em meu pai, jogou tudo que tinha em sua frente nele e o xingou. E depois disso tudo quando elas não conseguiram me levar em embora eu fui castigado. Muito mais do que abusado, ele me batera tanto que partes de meu corpo ficaram em carne viva. Mas sinceramente, eu preferia mil vezes apanhar todos os dias a ter suas mãos tocando em mim.


Passei minhas mãos em meus cabelos contendo o choro. Eu não precisava mais chorar, ele não estava mais aqui.

Depois da morte dele Alice começou a me visitar todos os dias como se fosse um ritual ao qual ela tinha necessidade de saber como eu estava.

Quando ela voltou do velório com minha tia, ela abriu um champagne e pulou de alegria comigo. Ela bateu os pés no chão, dançou, e bebeu tudo que estava em sua taça. Alice afirmava que eu deveria fazer o mesmo, pois estava livre. Naquela noite, ela dormiu aqui em casa comigo. E aquela foi uma das poucas noites de toda a minha vida que eu realmente senti paz ao dormi.

Quando eu acordei, Alice já tinha ido embora. Ela deixara um bilhete dizendo que tinha escola e mesmo querendo não poderia faltar. E no final do bilhete, ela havia deixado uma observação, a que mudara muitas coisas. Ela dizia que tinha adorado o que eu havia escrito e que daria um jeito de ser publicado. E ela realmente deu.

Três meses depois de levar uma historia minha ela já era publicada. Tenho certeza de que isso aconteceu apenas porque o novo namorado de Sara tinha uma editora, e como eu bem conheço Alice, ela o infernizara ate que conseguisse o que queria. O livro vendeu muito bem, e depois daquele, muitos outros vieram em seguida.

Olhei para o relógio e percebi que já passavam das 6h30min. Era a hora em que Isabella Swan chegaria. Ao longe pude ouvir o barulho do carro entrando pelos grandes portões de grade e vindo em direção a porta.

Levantei do sofá e olhei para minhas roupas. Eu usava uma calça de moletom cinza e uma blusa branca. Suspirei. Não irei subir correndo para mudar nada.

Caminhei em passos cansados e devagar até a porta da frente. Abri-a e parada lá estava uma mulher indecisa. Ela olhava para baixo, e isso fazia sua cabeleira castanha chocolate cobrir-lhe o rosto, que da onde eu olhava parecia ruborizado. Ela parecia conversar consigo mesma.

- Olá. – Falei fazendo ela levantar a cabeça rapidamente tomando um susto. Ela colocou a mão no peito e suas bochechas ficaram mais vermelhas do que antes. – Desculpe. – Falei estendendo a mão. – Sou Edward Masen, você deve ser Isabella Swan creio eu.

- Sim. – Ela respondeu e apertou a minha mão. Seu aperto de mão era firme. – E um prazer conhecê-lo Sr. Masen. – E me deu um sorriso doce.

- Igualmente. – Respondi dando passagem para ela na porta. – Venha, vou lhe amostrar a casa.

E sai andando amostrando cada canto da casa e esperando parecer uma pessoa como outra qualquer. Isabella Swan parecia-me ideal para os serviços que tínhamos aqui. Ela era ideal porque era pequena. Ideal por ser inofensiva. Ideal porque simplesmente não me parecia como as outras pessoas do mundo tão desconhecido para mim onde em mente só tinha preconceitos e julgamentos sem base, onde havia tantos monstros disfarçados de humanos.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oi gente, queria agradecer muito pelos comentários, fiquei surpresa de tantos comentários só no prólogo, e muito feliz também.
Então, eu demorei um pouquinho para postar, foi mal. Eu já tinha metade do capítulo pronto, mas fiquei cheia de coisas para fazer e só tive tempo esses dias de finalizar o capítulo.
Esse capítulo foi bem leve, mais para conhecer a personalidade de cada personagem, que é óbvio, e bem diferente da saga.
Espero que tenham gostado, e continuem acompanhando a fic.
Beijooos, e assim que eu puder ( e o mais rápido que eu escrever), to postando.