Frostnatter escrita por Blue Dammerung


Capítulo 3
Capítulo 3: Lättnad.


Notas iniciais do capítulo

"Os únicos conhecimentos que eu tenho paciência de aprender são aqueles que não têm uma real aplicação na vida." - Gilbert (da fic) na terceira série.



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E como se a conhecesse desde que nascera, peguei-a nos braços a criança. Não sabia e nem pensava no que estava fazendo, apenas parecia desumano demais, até para mim, que nunca teve um enorme senso de empatia, deixá-la ali, naquela noite, naquele frio, sozinha.

E senti sua pele contra a minha, gelada, como se realmente estivesse morta, então caminhei para longe dali, apertando mais seu corpo contra o meu para que se aquecesse rapidamente. Na hora não pensei o tipo de reação que ela e as pessoas viriam a ter, pois certamente deveria estar óbvio que eu não conhecia aquela criança, mas não me importei.

Não me pareceu certo deixá-la ali.

Sua respiração era fraca, quase inaudível, seu peito, quase imóvel, e eu só sabia que realmente respirava por causa da pequena fumaça que deixava sua boca toda vez que o ar morno de seu corpo entrava em contato com o frio do ambiente.

Ocorreu-me que deveria estar apenas dormindo um sono que talvez achasse que não fosse e tampouco quisesse acordar.”

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Naquela manhã, fui o primeiro aluno à entrar na sala de aula. Não que eu realmente tivesse querido acordar mais cedo, mas graças ao frio da noite anterior e todos os problemas com meus pais, não tinha tirado sequer um curto cochilo, ou seja: Estava dormindo de olhos abertos, e qualquer um poderia dizer que eu parecia mais com um zumbi do que com um humano.

Fiquei na sala de aula até os outros alunos começarem a chegar. Até tive vontade de ir para o pátio e esperar lá fora, ou quem sabe no refeitório, mas o fato de Gilbert e seus amigos também estarem lá fora não me agradava nem um pouco, então preferi ficar na sala.

Quando vi, a primeira aula estava acontecendo e o sono já batia, e como sempre, tentei me manter acordado, sem sucesso. Minutos depois estava cochilando, com a cabeça deitada sobre a carteira, e mesmo que não lembre de todos eles, cheguei a sonhar novamente com a silhueta, a neve e o sangue maculando-a.

Me perguntar quem seria aquela silhueta já tinha virado hábito, e embora algumas vezes eu quase conseguisse ver seu rosto, nos meus sonhos, onde quase tudo era bastante escuro, algo sempre acontecia, seja a silhueta se afastar ou até mesmo alguém me acordar de repente.

E foi basicamente o que aconteceu quando senti algo pesado bater em minha cabeça, fazendo-me acordar de repente e quase cair da cadeira. Olhei para frente, vendo se o professor tinha visto algo, mas ele estava anotando algo no quadro enquanto explicava em voz alta, de costas.

Virei o rosto, procurando quem tinha jogado aquilo em mim enquanto massageava a cabeça. Vi um loiro acenando enquanto sorria, e não entendi, então senti algumas cutucadas no meu ombro, do outro lado, e me virei novamente, encontrando outro loiro, só que com os olhos verdes.

-Ei, tá vendo aquele idiota ali acenando? Foi ele que jogou o livro em você. Na verdade, ele queria acertar em mim, mas é tão gordo que não teve força pra levantar o braço direito.-Ele disse, desviando o olhar entre mim e o suposto “gordo”, falando alto o bastante para que ele ouvisse.

-Hey, eu não sou gordo!-O outro loiro exclamou, há algumas cadeiras de distância de mim e do de olhos verdes.

-É sim! Seu balofo!-Rebateu, olhando para mim e dando um sorriso irônico.-Sou Arthur Kirkland, e aquele obeso ali é o Alfred.-Disse, me estendendo uma das mãos, agora falando mais baixo, visto que o professor se virara para explicar melhor.

-Sou Tino Väinämöinen.-Respondi, apertando sua mão.

-Nossa, com um nome desses eu me jogava de um prédio...-Ele disse, rindo sozinho enquanto eu sentia outra coisa bater em minha cabeça com força. Olhei para o chão. Uma bola de papel, e quando ergui o olhar, voltei a encontrar o outro loiro, Alfred, acenando, só que dessa vez, sem sorrir.-Ah, não ligue pra ele, está com ciúmes porque estou falando com você e ele não.

Eu ri um pouco e então virei o rosto para frente, vendo que o professor me lançava um olhar quase que mortal de tão duro. A aula não demorou para terminar, e quando terminou, Arthur se levantou para falar com Alfred, uma vez que, naquele colégio em especial, eram os professores que saíam das salas e não os alunos.

Estava abaixando a cabeça para tirar outro cochilo quando quando eles dois vieram até mim, então Arthur se pôs na minha frente e apontou para mim entusiasticamente, dizendo:

-Você será nosso mensageiro daqui em diante!

-Como?-Perguntei, sem entender.

-Uma vez que eu e o gordo...

-Não sou gordo.

-Sentamos distantes um do outro e você é o único cara disponível para fazer isso, você será nosso mensageiro e passará os bilhetes entre mim e ele sempre que quisermos!

-Mas ele senta há duas cadeiras de distância...-Eu disse.

-Mas ele tem uma facilidade natural para acertar em sua cabeça, então não tem problema.-Arthur disse, sorrindo orgulhosamente até que Alfred, com os óculos sobre os olhos azuis, deu-lhe um tapa na nuca de repente.

-Isso é por ter me chamado de gordo, seu passa-fome!-Alfred exclamou, sorrindo mais orgulhosamente ainda enquanto cruzava os braços.-Nunca vi ninguém pra cozinhar tão mal quanto você.

Arthur recuperou a postura e se virou para o outro loiro, furioso.

-Sua baleia! E eu não cozinho mal, você que não sabe apreciar comida de verdade!

-Pelo menos sei cozinhar!

-Sabe fazer hambúrgueres e fritar batata frita!

-Pelo menos eu SEI fazer alguma coisa!

-Pelo menos não subo na balança todos os dias e depois me afundo na comida porque não consigo emagrecer!

-Pelo menos não preciso depilar as sobrancelhas porque elas crescem demais e parecem três em uma!

-Pelo menos eu não tenho complexo de herói!

-Eu não tenho complexo de herói, eu SOU um herói!

-Er... Pessoal, o professor já entrou na sala...-Tentei falar, mas logo eles começavam a discutir novamente, até que o professor chamou a atenção deles, então foi a hora de o Arthur me entregar infinitos bilhetes para que eu os entregasse ao Alfred.

O restante das aulas se passaram rapidamente até que chegou o intervalo, para a minha alegria, onde ambos os loiros saíram da sala, assim como o restante dos alunos, e sobrou apenas eu. Ainda estava exausto e meus olhos pesavam bastante, então apenas voltei a deitar a cabeça sobre a carteira e fechar os olhos.

O sono não demorou a chegar, e logo eu tinha adormecido, tanto que quando acordei novamente, com Alfred jogando mais coisas em mim, já era a penúltima aula. Fingi que estive o tempo todo acordado, mas para minha salvação, a professora tinha uma vista bastante ruim e não conseguia ver nada passando da quinta fileira, e eu estava na sétima.

Quando finalmente a última aula veio, ambos os loiros pararam de mandar bilhetinhos, assim que o professor entrou, deixando sua maleta sobre a mesa, assim como o sobretudo. Era Berwald, e já começava a escrever coisas no quadro.

Abri mais os olhos. Não sabia porque, mas sentia quase uma obrigação em prestar atenção em sua aula... Não que eu não gostasse de estudar, eu gostava, mas o sono não deixava, você sabe. Porém, durante toda a aula dele, não adormeci uma vez sequer, e sua voz era a única que soava em toda a sala.

Nem nos cantos ou na última fileira havia aquele conhecido burburinho de alunos conversando bastante baixo, ou sequer o farfalhar de bilhetes sendo dobrados e desdobrados. Nada, apenas a voz dele e o vento que entrava pelas janelas.

Quando a aula terminou, todos arrumaram suas coisas para voltar para casa. Alfred me deu um sorriso animado e me entregou um hambúrguer que estava dentro de sua bolsa, uma vez que ele disse que não tinha me visto no refeitório. Eu agradeci, então Arthur se despediu e ambos foram embora enquanto eu guardava minhas coisas, sem ansiosidade alguma para voltar para casa.

Berwald arrumou suas coisas e quando terminou, esperou que eu terminasse, como no dia anterior. Sorri e passei por ele enquanto o via fechar a porta, mas ao invés de ir até o estacionamento, como eu achava que sempre fazia, me fitou e virou-se para o outro lado do corredor, que daria, em seu fim, numa escadaria que levava às salas das séries superiores a minha.

-Vai dar aula extra hoje, professor?-Perguntei, fitando-o. Ele apenas assentiu e me fitou com o canto do olho.-Então até amanhã!-Eu disse, sorrindo um pouco mais e me afastando em direção à saída.

Não sabia porque, mas algo nele parecia comigo.

Quando cheguei no estacionamento, que logo daria para a rua, onde eu já fazia mentalmente todo o meu percurso de volta para casa, ouvi um barulho alto de vidro quebrando. Olhei ao redor, sabendo que vinha de algum lugar próximo, mas não sabia exatamente de onde.

Também ouvi gritos de fúria e vozes desastrosamente conhecidas, mas as reconheci tarde demais, e quando vi, já tinha corrido em direção a parte sul do estacionamento, uma parte mais afastada e escondida, onde às vezes os professores guardavam seus carros.

Todo o lugar estava vazio, exceto por mim, pelos donos das vozes e pelos carros, pois ou os professores estavam dentro do colégio ou já tinham ido embora e ou os alunos restantes estavam em aula ou estavam em casa. Mas não aqueles três.

Quando corri até onde parecia estar vindo o barulho, agora de algo sendo amassado, vi Gilbert, Antonio e principalmente Francis destruindo um Honda Civic que eu tinha certeza ser do nosso professor de matemática.

-Aquele imbecil nunca mais vai me interromper!-Gritou Francis, batendo no carro com um bastão de beisebol em mãos enquanto Gilbert ria histericamente, segurando uma lata de cerveja. Antonio pulava em cima do carro, rindo igualmente.-Vou mostrar que professor nenhum é páreo para nós.

-Porra Francis, e pensar que tudo isso foi porque você não conseguiu comer aquele moleque virgem... Aliás, cadê ele?-Gilbert perguntou, meio cambaleante. Me escondi rapidamente atrás de outro carro, rezando para que eles não tivesse me ouvido.

-Não sei, mas não tô muito a fim de “comê-lo”, de qualquer forma.-Francis disse enquanto quebrava um retrovisor com uma paulada só do bastão.-Hey Antonio, você viu até que horas aquele professor dá aula?

-Ainda temos umas 3 horas, não se preocupe.-Antonio disse, saindo de cima do carro e tomando a lata das mãos de Gilbert, bebendo uns goles.-Quero ver a cara dele quando ver o precioso carro.

-Aquele filho da puta vai ficar roxo de raiva!-Gilbert gritou, rindo com aquela risada estranha que tinha enquanto Francis continuava a amassar cada vez mais o carro.

Eu estava paralisado de medo agora mas, bem, tinha tido a certeza do que Francis queria fazer comigo e ali, sozinho, sem nenhuma outra alma por perto, estava com mais medo ainda. Tentei me levantar para me afastar de mansinho, quem sabe voltar para o colégio e avisar Berwald, mas eu duvidava que ainda houvesse um “carro” quando ele voltasse... Mais provável seriam apenas sucatas.

Eu estava entre fugir de medo e salvar minha pele ou dar uma de herói (talvez por influência do Alfred) e impedir que eles continuassem com aquilo, mesmo sabendo que seria algo bastante idiota para fazer...

Me apoiando no carro onde estava escondido, me ergui. Pensei por uns instantes que, se eu fugisse, Berwald ficasse com raiva de mim, e se eu o avisasse e quando ele visse que nada sobrasse do seu carro, talvez ele ainda ficasse com raiva de mim, por não ter feito nada.

Então tomei uma decisão infinitamente estúpida.

-Hey... Parem com isso!-Eu gritei, saindo de trás do carro onde estava escondido até aquele momento para aparecer há uns 10 metros deles, apertando os punhos de tanto medo enquanto uma voz gritava como louca para que eu fugisse dali.

Na mesma hora, Gilbert se virou, assim como Antonio e Francis, e como se tivessem ensaiado, os três sorriram um sorriso que chegava a assustar.

-Olha só quem apareceu...-Gilbert murmurou, bebendo um longo gole da sua lata de cerveja enquanto Antonio ia parar ao seu lado, juntamente com Francis, batendo com o taco de beisebol na outra mão, como quem espera para bater em algo.

-Parem de destruir o carro do Sr. Berwald agora.-Eu disse, fazendo de tudo para que saísse algo firme, mas na verdade saiu quase um guincho, tremido e hesitante.

-E por quê?-Gilbert perguntou, se aproximando de mim enquanto eu recuava automaticamente uns passos. Francis me fitava maliciosamente, e Antonio apenas ria, embora menos do que quando estava destruindo o carro.

-Porque... É errado.-Eu disse, recuando mais. Seria tarde de mais para fugir? Talvez Berwald não fosse ficar com tanta raiva assim...

Gilbert percebeu que eu estava prestes a fugir, então avançou vários passos correndo, e quando eu me virei para sair dali, ele me agarrou pelos ombros e me derrubou no chão, caindo com os joelhos sobre minhas costas e prendendo minhas mãos com as dele.

-Moleque... Tava mesmo achando que ia simplesmente sair assim depois de dar uma de herói?-Ele perguntou, empurrando minha cabeça contra o asfalto do chão.-Hey, Francis, você tinha dito que não tava a fim, então posso bater nele?

-Não volto com a minha palavra, fique à vontade.-Francis disse, voltando à quebrar o carro junto com Antonio. Gilbert puxou minha cabeça com força para trás e voltou a empurrar contra o chão rapidamente, fazendo meu rosto bater contra o mesmo inúmeras vezes.

Não sei se foi quando o sangue começou a escorrer, mas então ele se levantou e me levantou junto, apenas para me dar um murro na barriga e outro no rosto, me fazendo cair no chão novamente. Minha bolsa devia ter saído rolando por aí, porque eu não a via em canto algum.

Tentei me arrastar para longe enquanto uma voz parecia sentir prazer em dizer: “eu te disse, eu te disse, eu te disse...”

Gilbert se aproximou novamente e chutou minhas costelas com força, e tive quase certeza que pelo menos uma ele tinha quebrado, ou luxado, não sei, sei que estava doendo e muito. Então ele voltou a me erguer pelo colarinho da blusa já manchada de sangue, e começou a se aproximar do carro, me levando junto.

-Hey, Antonio, você consegue abrir o porta-malas dessa coisa e depois fechar?-Ele perguntou enquanto eu já previa o que aconteceria comigo.

-Você vai mesmo fazer isso com ele?-Antonio perguntou enquanto tirava algo que se assemelhava à uma chave de seu bolso e abria o porta-malas. Devia ser algum tipo de chave-mestra para carros, não sei, quando vi estava sendo jogado dentro do porta-malas com força.

-Já fiz.-Ouvi Gilbert dizer, então ele fechou o porta-malas e tudo ficou subitamente muito escuro.

-Já liberei toda a minha raiva, estou melhor agora.-Ouvi a voz de Francis do lado de fora.-Estou com pena do moleque.

-Acho que ele prefere ficar aí dentro do que com você.-Ouvi a voz de Gilbert comentar, rindo enquanto parecia que se afastava.

-Não seja mau.-Francis disse.-Sabem, o carro ainda pode andar. Não furei pneus nem nada, quero que ele sinta vergonha de andar por aí com um carro em pedaços.

-Você e suas manias...-Antonio murmurou, cada vez mais distantes.

Ouvi mais algumas risadas e então mais nada, apenas o total silêncio e escuro ao meu redor. Me encolhi naquele espaço apertado, tentando abraçar os joelhos, mas todo meu corpo doía. Até tentei gritar, mas eu sabia que ninguém iria me ouvir, além de que minha voz estava falhando.

Minha preocupação era com o ar, pois a única entrada era por umas pequenas brechas da tampa do porta-malas, quase inexistentes, e eu não sabia se aguentaria ficar ali por muito tempo sem que morresse sufocado.

E o escuro não tornava nada melhor, muito menos o fato de que provavelmente eu acabaria chegando em casa atrasado, então, quando eu chegasse, meus pais brigariam comigo, me diriam coisas ruins e eu dormiria sem janta, ou talvez ainda acontecesse coisa pior.

Fechei os olhos com força enquanto sentia-os umedecerem.

Tinha sido uma péssima hora para bancar o herói, ou quem sabe eu tinha pego justamente os piores vilões possíveis, não sei, apenas comecei a sentir as lágrimas rolarem pelo rosto lentamente. Eu estava com medo, com frio, com fome e ainda com sono.

Não sei quantas horas fiquei ali, mas o tempo nunca pareceu tão agonizante.


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Notas finais do capítulo

Não sei vocês, mas fiquei morrendo de pena do Tino. SU-SAN, ONDE VOCÊ TÁ SEU CÃO? Okay okay paray, huauhahua.

Enfim, espero que tenham gostado!

Era pra eu ter postado mais cedo, eu admito, mas só pude tocar na internet agora, além de que estava postando o Extra de Einsamkeit agora, então peço humildemente que me perdoem.

Ah, vocês podem mandar reviews também! É de graça e ainda faz meu heart feliz!

KISSES E DANKE!!