Frostnatter escrita por Blue Dammerung


Capítulo 11
Capítulo 11: Vackra lila ögon.


Notas iniciais do capítulo

"É muito mais divertido culpar as coisas em vez de arrumá-las", Gilbert quando colocou a culpa em um colega de sala depois de pichar todas as carteiras sem exceção.



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E minutos depois, lá estávamos nós. O táxi tinha acabado de dobrar a esquina, e com um olhar solidário, o diretor do orfanato esperava ao lado da entrada por mim e pela criança que eu carregava nos braços. Não queria soltá-la.

Me aproximei dele e do prédio relativamente deteriorado como se andasse em direção à forca.

'É um menino, não é? Sabe o nome dele?', ele perguntou, se aproximando de mim e estendendo os braços para que eu lhe entregasse a criança, mas não o fiz, não ainda, por favor, apenas um pouco mais, só mais um pouco.

'Sei', respondi, olhando o rosto do menino. O diretor parecia me fitar estranhamente. Deveria ser porque quando as pessoas iam ali levando uma criança, elas queriam se desfazer delas, enquanto eu não queria me separar da minha. Minha. Pronomes possessivos já usados inconscientementes.

'Ela vai ficar bem, essa criança', o diretor disse então, novamente estendendo os braços para tomá-la de mim. Hora de deixar ir. Mas não quero deixá-la ir, quero que fique comigo. Mas preciso deixá-la ir...

Eu a entreguei a ele então, muito hesitante, mas entreguei, juntamente com a mochila cheia de roupas e outras coisas que eu separara justamente para ela. Mas antes de se separar totalmente de mim, o pequeno garoto agarrou-se em minha camisa. Abaixei o rosto e acabei me deparando com seus olhos. Belos e únicos olhos violetas...”

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-O quê?-Thomas perguntou, sem entender ou ao menos fingindo que não entendia. Berwald se aproximou da porta pela qual acabara de passar e a abriu, deixando claro que queria que o irmão fosse embora.

-Vá.-Disse meu professor.

-Mas... Irmão, qualé, vamos esquecer o passado e...

-Morra junto com o passado.-Berwald disse, ficando cada vez mais irritado pelo o que eu podia perceber.

Lentamente deixei a cozinha e entrei na sala, aonde eu via todo o confronto de olhares com detalhes dignos de uma guerra travada mudamente. Não vou mentir, aquilo meio que me deixava triste. Lógico que eu não gostava de ver meu professor de mau humor (até porque tinha medo dele normal, imagine de mau humor) mas além de tudo, ver dois irmãos brigarem não parecia certo.

-Ahm...-Eu levantei a voz sem querer me meter, mas já colocando uma colher no meio daquela discussão. Porém, Thomas sobressaltou a voz, passando por cima da minha.

-Berwald, você não pode fingir que não existo. Somos irmãos! Crescemos juntos e...

-Cale a boca.-Berwald disse, estreitando os olhos por detrás das lentes dos óculos.-Não quero mais ouvir nenhuma palavra que venha dessa sua boca imunda e sem caráter.

-Gente...-Eu tentei novamente, mas Thomas voltou a investir.

-Nossos pais me apoiaram quando eu disse que viria para cá. Pense como eles vão ficar felizes em nos ver bem de novo!-Disse o mais velho, sorriso torto no rosto.

-Não.-Berwald negou, mas ainda segurando a porta aberta.

-Porra, Berwald, você não pode me dar uma chance?!-Thomas exclamou, se aproximando do meu professor e empurrando o sofás e poltronas um pouco para o lado enquanto atravessava a sala e ficava bem de frente para o irmão.-Eu sei que eu errei! Me deixa...

Mas antes que Thomas terminasse a frase, Berwald o pegou pelo braço e o levou até suas costas num daqueles golpes que os policiais usam, e já levava o irmão mais velho para fora de casa quando eu cometi o erro ou o acerto, não sei, em gritar:

-Espera! Por favor, Berwald.-Corri até ele e segurei um de seus braços, e tão logo o nome dele deixou meus lábios, virou a cabeça para mim sem qualquer vestígio da raiva que sentia pelo irmão, apenas a calma seriedade que tinha.-Deixa ele ficar, por favor.

Então seus olhos ganharam um tom de irritação. Acho que era quase como uma traição para ele eu pedir que seu odiado irmão ficasse, mas para mim, cuja a família estava despedaçada, ver dois irmãos se separando por causa de algo que provavelmente não passou de um mal-entendido... Não dava para apenas ficar observando.

-Eu me responsabilizo por ele, prometo!-Eu disse, começando a gaguejar diante do olhar do meu professor.-Por favor, deixa ele ficar! Eu sei que não adianta dizer, mas... Vocês são irmãos! Se meu irmão estivesse vivo, eu faria de tudo para sempre ficar perto dele... E... Ahm...-Engoli em seco, lembrando do acidente que levou meu irmão, mas então ergui o olhar para meu professor e fitei bem fundo em seus olhos.-Por favor, Berwald?

Ele continuou me fitando por alguns minutos enquanto Thomas gemia de dor por causa da posição em que Berwald ainda o prendia. Então suspirou e jogou o irmão no chão rudemente, fechando a porta com um chute e me dando um último olhar antes de subir as escadas e desaparecer no segundo andar.

-Ufa... Cara, valeu por me ajudar! Tô te devendo uma, falou?-Disse Thomas, se erguendo do chão e começando a rir.

-Olha, eu disse que vou me responsabilizar por você, então, por favor, não faça nenhuma besteira enquanto estiver aqui, okay?-Disse enquanto o via alongar o braço e então se sentar no sofá, deixando os pés sobre a mesa de centro.

-Sem problema, amiguinho.-Respondeu, rindo como se nada tivesse acabado de acontecer, ligando a televisão e colocando num canal de esportes.

Ouvi um barulho alto vindo do segundo andar, e não duvidei que fosse meu professor expressando sua raiva de forma física e não mental. Estava começando a me culpar pela “chantagem emocional” que fizera a ele.

Suspirei longamente e acabei subindo as escadas e então para o segundo andar. Arrepios desciam pela minha espinha. Estava apavorado em ter que enfrentar um Berwald de mau humor, mas se não pedisse desculpas, tampouco conseguiria dormir naquela noite.

Me aproximei do quarto dele, onde eu estivera dormindo nos últimos dias. A porta estava fechada, mas baques altos de coisas sendo jogadas eram ouvidos a todo instante pela porta de madeira.

Fiquei de frente para ela e dei algumas batidas de leve, procurando chamar atenção, mas ele não pareceu ouvir. Bati mais algumas vezes e chamei.

-Professor?

Então os barulhos altos pararam e o ouvi destrancando a porta, girando a chave na fechadura para só então aparecer diante de mim, olhar mais frio e mais sério que o normal.

-Er... O senhor está bem?-Perguntei, sem saber por onde começar. Não podia apenas pedir desculpas por chantageá-lo, assim tão de cara, não podia.

Ele me fitou e então negou com a cabeça, se virando para mim para adentrar mais uma vez no quarto. Em cima da cama estava uma bolsa grande com roupas enfiadas dentro, assim como lençóis e travesseiros.

-Para onde o senhor vai?-Perguntei, estranhando.

-Carro.-Respondeu apenas, terminando de fechar a bolsa.

-Não me diga que o senhor pretende dormir no carro!-Eu exclamei. Agora me sentia tão culpado que quando o vi avançando em direção a porta, levando a bolsa consigo, não evitei e segurei sua mão, o que, ainda bem, o fez parar imediatamente.

-O quê?-Ele perguntou, um pouco mais rude que o de costume.

-O senhor está com raiva de mim?-Eu perguntei, abaixando o olhar para fitar apenas minha mão na dele enquanto ele ainda fitava a porta aberta e então o corredor.

-Estou.-Ele respondeu. Eu quis sorrir porque achei engraçado o fato de eu segurar a mão dele agora com minhas duas mãos, uma vez que as mãos dele eram bem maiores que as minhas, mas não era hora de sorrir.

-Me desculpa...-Eu murmurei.-É que... Eu não queria aborrecer o senhor, mas... Tenho medo de o senhor acabar se arrependendo por causa do Thomas...-Disse, temendo ter passado da linha, mas ele continuou em silêncio.-Se as despesas ficarem grandes demais para o senhor, se dermos muito trabalho, eu me proponho a ir embora. Não quero causar mais problemas.

-E para onde você iria?-Ele perguntou, finalmente virando-se para mim e me fitando, embora eu ainda mantivesse os olhos presos a mão dele nas minhas.

-Eu não sei, mas... Não me afastaria muito.

-Não pense que deixarei que vá embora tão facilmente.-Ele disse, deixando que a bolsa caísse no chão para levar a mão agora livre até meu queixo e erguer meu rosto.

Acabei corando incondicionalmente. Eu sabia que... Sabia que aquilo poderia novamente levar até aquele incidente onde ele me tocara, mas... Eu não queria deixá-lo triste. Além de que... Não era ruim quando ele me tocava, assim, tão levemente.

-Eu... Ahm...-Gaguejei, engolindo em seco enquanto ele continuava a me fitar.-O senhor ainda está com raiva de mim?

-Não há como eu ter sequer um sentimento negativo sobre você.-Murmurou, soltando sua mão do meu queixo e então pegando a bolsa para novamente sair do quarto.

-Professor!-O chamei, me colocando bem no meio de sua passagem.-O senhor... Ahm... Por que o senhor... Por que o senhor não dorme aqui, comigo, no quarto? Pode ser que chova e que fique frio demais e o senhor pode adoecer se dormir no carro!

Ele me fitou, sério. Então disse:

-Não te incomoda?

-N-Não... Quero dizer... O quarto é do senhor. Não tenho direito algum em expulsá-lo do quarto quando era para eu dormir no carro.-Eu disse, desviando o olhar e fitando o chão.

Ele pareceu pensar por alguns instantes, então voltou para o quarto e deixou a bolsa ao lado do guarda-roupa, despindo sua camisa e se sentando na cama enquanto eu ficava entre a porta aberta e o corredor, apenas fitando-o.

O horário já nos mandava dormir, mesmo que amanhã fosse domingo, além de que o sono já fazia minhas pálpebras pesarem. Ele notou que eu o fitava e disse:

-Feche a porta do quarto senão ficará frio.

-Ah, sim.-Eu disse, entrando no quarto e fechando a porta enquanto meu professor entrava no banheiro e terminava de se despir para tomar um banho. Peguei meu pijama, levando em conta o fato de que eu guardava minhas roupas em algumas gavetas extras do guarda-roupa de Berwald, e me sentei na cama, esperando que ele saísse.

O que não demorou muito, e quando ele saiu, mais uma vez vestia apenas uma toalha presa a cintura. Pensei se aquilo não seria um mal de família. Antes que começasse a corar, me enfiei no banheiro o mais rápido que pude e fechei a porta, me despindo e entrando no boxe, não evitando em fazer alguns desenhos no vidro quando o vapor impregnou no mesmo.

Terminei, escovei os dentes e saí do banheiro apenas para encontrar meu professor deitado na cama, vestindo apenas a calça larga que usava para dormir, de bruços. Os óculos jaziam ao lado, no criado-mudo, e até a luz do quarto já estava apagada.

Desliguei a luz do banheiro e, mesmo temendo bater a canela em algum móvel indesejado, me arrastei até a cama e me deitei ao lado dele, puxando o lençol para me enrolar e também pegando outro para colocar em cima do meu professor, para que ele não sentisse frio.

A única coisa que iluminava o quarto era apenas a luz da lua que passava pela janela na parede atrás de nós, então ficava bem fácil ver as costas do meu professor, uma vez que quando eu o cobri, só consegui cobri da cintura para baixo e temia que, quando ajeitasse, meu professor acordasse, o que certamente não seria bom.

As costas do meu professor... Quero dizer... Não que eu notasse esse tipo de coisa, mas era engraçado como elas eram bem mais largas que as minhas. Assim como os braços eram maiores e o peitoral era mais forte e... Ahm... Deixa para lá.

Mesmo assim, o que veio na minha mente naquele momento foi o fato que ele dissera que me desejava. Como ele podia me desejar? Logo eu? Eu, um simples humano, um simples rapaz que nunca se destacou em matéria ou esporte ou coisa alguma exceto no quesito sofrimento familiar.

Eu era homem, não era formado em nada, não tinha dinheiro, não tinha nada de valor, minha família era desestruturada, meu irmão morrera e eu nem sequer tinha um lugar para morar direito. E eu nem era tão bonito assim, na verdade, nunca prestara atenção nesse fato, mas... De novo, me peguei pensando no que Berwald vira em mim quando disse que me desejava e quando me tocara.

Pelos céus, eu, do jeito que eu era, conseguia ser capaz de provocar ao menos uma faísca de tesão em alguém? E, diabos, por que eu estava pensando nisso? Virei na cama, ficando de costas para Berwald, tentando dormir.

O que não consegui de forma alguma, e mesmo meia hora depois revirando na cama dezenas de vezes, o sono não vinha, e acho que me mexi tanto que devo ter acordado meu professor, porque quando eu me virei novamente, ao acaso ficando bem de frente para ele, seus olhos estavam abertos e ele me fitava com a seriedade de sempre.

Mas era estranho vê-lo sem os óculos. Parecia menos... Imponente. Ou assustador, tanto faz.

-Desculpe, eu acordei o senhor?-Perguntei, temendo que sim e ainda que ele estivesse com raiva novamente. Ninguém gosta de ser acordado no meio do sono.

-Não.-Ele respondeu, olhando em meus olhos firmemente daquele jeito que me fazia sentir como uma criança. Era o tipo de olhar que fazia você confessar todos os seus pecados se tivesse feito algo errado.

-Ah... Não consigo dormir.-Eu disse, sorrindo amarelo.-Não estou com medo nem nada, é só o sono que não vem... Acho que vou esquentar um pouco de leite para mim, dizem que ajuda a dormir. O senhor também quer?

Ele negou mudamente, mas na hora que eu ia me levantar da cama, ele segurou meu pulso e me puxou de volta, o que fez com que eu caísse bem em cima dele. Me envolveu com um dos braços enquanto levava a mão do outro até minha cabeça, mexendo em meus cabelos.

-Fique.-Ele disse, a voz firme enquanto eu corava violentamente.

-Professor... Eu... Ahm...-Tentei falar alguma coisa mas ele não me soltava, e o contrário, parecia me apertar cada vez mais contra si.

-Feche os olhos. Durma.-Ordenou então, movendo minha cabeça para que eu a deitasse exatamente sobre seu peito enquanto ele ainda afagava meus cabelos. Lógico que eu já estava morrendo de vergonha, e apesar de ele não estar me tocando, aquilo chegava bem perto. Engoli em seco. A não ser que fosse muito rude com ele, não conseguiria me soltar, e ser grosso com meu professor pesava em minha consciência.

-Durma, Tino.-Ele sussurrou, vendo que eu ainda estava acordado e bastante nervoso. Fechei os olhos, realmente tentando dormir enquanto agora ele deslizava uma das mãos pelas minhas costas, sobre o tecido do pijama.

Não sei o porquê, mas novamente, a sensação de estar nos braços dele, aquele calor, aquele toque, no fundo da minha memória parecia que eu já tinha, não visto, mas sentido aquilo. O que era estranho porque, pelo menos segundo à minha mente, eu só conhecera Berwald naquele ano.

Não sei quando meu coração parou de bater tão rápido e meus olhos realmente começaram a pesar, mas quando vi, já dormia. Novamente não sonhei com silhuetas escuras, sangue ou neve, o que eu não sabia dizer se era bom ou ruim.

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Na manhã seguinte de domingo, eu acordei no lado onde eu deveria dormir na cama, e não sobre meu professor. Eram pouco mais das onze da manhã, e no quarto só tinha eu de alma viva. Me levantei e deixei o cômodo, descendo as escadas para encontrar Thomas ainda dormindo no sofá (e babando) e Berwald tomando uma xícara de café enquanto via o jornal na mesa da cozinha.

Me aproximei dele e me sentei a sua frente, sorrindo embora lembrasse da situação constrangedora da noite passada.

-Bom dia.-Eu disse, pegando uma outra xícara sobre a mesa e a enchendo de café. Ele assentiu, me lançou um olhar e voltou a ler o jornal. Parecia ignorar com todas as forças o irmão agora roncando na sala.

Me levantei e peguei algumas torradas para comer com manteiga, perguntando se meu professor também queria. Ele assentiu e eu as coloquei na mesa junto com o pote de manteiga.

-O senhor vai sair hoje?-Eu perguntei apenas por perguntar.

Ele deu de ombros rapidamente, indicando que não sabia. O que não era muito bom, porque caso ficássemos em casa, e quando digo nós, digo eu, Berwald e Thomas, eu sabia que seria a hora mais propícia para brigas.

Por isso eu pensei em sair para um lugar calmo naquela tarde.

-O senhor está livre?-Perguntei.

Ele assentiu, agora me fitando, talvez percebendo que eu estava maquinando alguma coisa.

-Podemos ir no Parque Municipal hoje?-Falei, sorrindo. Era apenas um parque comum repleto de árvores, um lago no meio, gente fazendo cooper e coisas assim. Berwald pareceu pensar por alguns instantes, mas então assentiu num “podemos” mudo e voltou a ler o jornal.

Sorri mais um pouco enquanto comia. Como nenhum de nós dois parecíamos dispostos a almoçar e Thomas ainda dormia, assim que terminei de comer, subi para o segundo andar para me trocar rapidamente, vestindo uma bermuda simples com uma camisa leve e chinelos.

Quando voltei, Berwald já estava do lado de fora da casa, a chave do carro numa das mãos enquanto segurava o restante do jornal que não pudera ler na outra. Vestia uma calça jeans e camisa social, e não preciso dizer o quanto aquilo era estranho, mais uma vez vê-lo sem o terno ou o sobretudo de sempre.

Entramos no carro e nos afastamos de casa. Não havia nuvens no céu e tampouco algum indício que fosse chover, embora o clima estivesse naturalmente frio, agradável. Eu olhava a paisagem passar rapidamente pelo vidro enquanto Berwald permanecia compenetrado em dirigir.

O que acabou por nos trazer um silêncio bastante constrangedor, mas por sorte o parque não era tão distante assim e rapidamente chegamos. Meu professor estacionou o carro junto ao meio fio e saímos do mesmo, e tão logo chegamos, Berwald se sentou no banco sob uma árvore mais próximo, abriu seu jornal e continuou a ler.

Perguntei-me se ele não queria estar em casa, mas com Thomas ainda babando no sofá, duvidei. Aproximei-me dele e me sentei ao seu lado, olhando ao redor. O parque era simplesmente lindo, mesmo sendo bastante comum. Pessoas iam e vinham fazendo caminhadas ou então apenas rindo enquanto faziam um piquenique.

-Sente falta? -Ouvi Berwald perguntar de repente, o que me fez virar-me para fitá-lo no rosto.

-De quê? -Perguntei, sem entender.

-De uma família.

-Ah... -Entendi. -Não sei. Acho que sim. -Não sabia mais o que dizer. Que eu sentia falta do meu irmão, acho que ele já sabia, e preocupá-lo com esse tipo de coisa não me parecia bom. Ele pareceu voltar a ler o jornal, então eu apenas fiquei vagando os olhos pelo parque.

Até que dois carros importados de repente pararam do outro lado do parque, e mesmo sendo distante, eu conseguia ver que de dentro do primeiro carro saiu um casal e do segundo, saiu um rapaz e uma criança.

O homem e a mulher pareciam que tinham acabado de vir da festa de gala mais chique da cidade ou então, estavam indo para ela. Só as roupas deveriam ser mais caras do que todos os meus pertences juntos e multiplicados por três.

Porém o rapaz vestia uma calça jeans rasgada na altura dos joelhos e uma camisa preta com alguns desenhos em prata, e segurava a criança pela mão.

Não sei o porquê, logicamente não estava tão perto para ouvir as conversas deles com detalhes, mas eles pareciam discutir o rapaz e o casal, e então o casal voltou a entrar no carro e deixaram os mais novos no parque.

E aquele rapaz me parecia estranhamente familiar, até demais. Estreitei os olhos para ver melhor, mas ainda assim não conseguia ver com detalhes. Então o rapaz, que eu estava começando a duvidar se realmente era um rapaz por causa da cor dos cabelos, segurando a criança loira por uma das mãos, adentrou uma parte do parque que era repleta por árvores, o que os fez sumirem do meu olhar.

Seria... Não, não, claro que não. A única pessoa que eu conhecia e que tinha cabelos claros daquela forma não tinha um irmão, e mesmo se tivesse, duvido que o tratasse com tanto... Carinho.

Sentei-me melhor no banco, as costas doendo na madeira escura e dura.

Então de repente meu professor se pôs de pé e jogou o jornal no lixo mais próximo, acho que porque ele já o tinha lido inteiro, e então me estendeu uma das mãos e perguntou:

-Caminha comigo?

Fitei a mão dele por alguns instantes antes de responder um “sim” com a cabeça e dar-lhe minha mão enquanto me levantava. Ele colocou a mão livre no bolso da calça e com a outra me puxou para um dos caminhos que se entrelaçavam no parque, rodeado e sombreados pelas árvores.

O que era estranho porque todos que passavam por nós nos fitavam com olhos por vezes maliciosos ou repreendedores. Mas Berwald não parecia querer soltar minha mão, e eu nunca que o pediria para fazer aquilo.

Andamos por alguns pares de minutos em silêncio, que se estenderam até formar uma meia hora, então Berwald avistou um carrinho que vendia vários tipos de coisas como algodão doce e pipocas, e me perguntou se eu queria alguma coisa.

-Não estou com fome. -Respondi, sorrindo e sem pensar pegando na minha barriga, como um hábito qualquer.

-Vou comprar água. -Ele disse então, soltando minha mão e apontando para um banco de madeira um pouco distante dali, deixando claro que eu deveria esperá-lo lá.

Caminhei para o banco e me sentei enquanto via Berwald falar com o vendedor no carrinho. O clima estava agradável ainda, e eu até me sentia bem, quero dizer, meu corpo não latejava dolorosamente em nenhum lugar, então estava tudo bem.

Sentei-me melhor no banco, fitando o vento balançar os galhos das árvores, e foi quando estava fechando os olhos para sentir melhor a brisa que acabei por ouvir um resmungo baixo, quase um choro, vindo de trás de mim.

Virei o rosto, mas atrás do banco havia somente alguns arbustos e árvores, e entre esses arbustos estava uma criança, ou melhor, a mesma criança que eu vira tempos antes, saindo do carro importado segurando na mão daquele rapaz.

-Oi, você está bem? -Perguntei, olhando-a por cima do banco enquanto ela levantava o rosto e me fitava. -Está se escondendo?

-Eu... -Ela começou, mas então parou, engolindo em seco como se tentasse de tudo para não chorar. -Estou bem.

Parecia não ter mais que uns cinco anos de idade, os cabelos loiros cuidadosamente cortados e lisos caindo solenemente pela cabeça, os olhos azuis tristes e um tanto magoados.

-Como é seu nome? -Perguntei.

-Ludwig. -Respondeu a criança, esfregando um dos olhos.

-Sou Tino. Não acha melhor sair daí? Vai começar a se coçar por causa dos arbustos, eles podem ser venenosos. -Comentei. Não me parecia certo deixar uma criança no meio do mato.

Ele se levantou de repente então, correndo para longe dos arbustos e vindo parar perto de mim, fitando o chão enquanto batia nas roupas para tirar a areia.

-Meu irmão brigou comigo. -Disse então.

-Por quê? -Perguntei.

-Eu disse que papai e mamãe não brigariam se ficássemos em casa, mas aí meu irmão quis sair comigo e então eles brigaram porque tinham uma festa para ir... Meu irmão disse que eu não devo fazer as coisas só para agradar o papai e a mamãe, mas é que eu não gosto de vê-los brigando... Aí ele gritou comigo e eu soltei a mão dele e... Me perdi.

Coloquei uma mão na cabeça dele, sorrindo. Apesar dos prováveis status que tinha e do dinheiro na conta bancária da família, era só mais uma criança com os mesmo problemas e inseguranças.

-Quer ir procurar pelo seu irmão? Posso ir com você para que não se perca de novo, o que acha? -Perguntei, virando o rosto apenas para checar que Berwald ainda estava falando com o vendedor, que agora gesticulava nervosamente. Preocupei-me se estaria acontecendo algum problema, mas tinha certeza que meu professor ficaria bem... E tentei não pensar no que ele faria caso se virasse e visse que eu não estava lhe esperando.

-A gente pode? -Ludwig perguntou, erguendo os olhos azuis para mim, esperançoso.

-Claro que sim! Vamos achar seu irmão. -Eu disse, estendendo minha mão para ele enquanto ele me dava a sua e caminhávamos em direção ao centro do parque, aonde geralmente tinha mais gente e maior probabilidade de encontrar o quem-quer-que-fosse o irmão do Ludwig.

Andamos até lá e quando chegamos mesmo o lugar estando lotado de gente, Ludwig disse que nenhum deles eram seu irmão, então continuamos a procurar, e durante todo o percurso, o loirinho nada falou, sempre com a expressão triste e agora dura estampada na face.

Fomos à entrada do parque e também não encontramos o irmão do Ludwig, e na verdade, já estávamos cansados quando de repente, eu ouvi um grito atrás de mim com uma voz curiosamente rouca, porém conhecida.

-Ludwig! Bruder, aonde você se meteu?!

Virei-me, assim como Ludwig, que correu para o rapaz e pulou em seus braços, rindo e abraçando o irmão mais velho que, para meu choque, era um Gilbert que sorria alegremente, desarrumando os cabelos loiros do menor.

Como?! O Gilbert que eu conhecia era mau, era irritante, era grosso e revoltado com todo mundo a ponto de parecer que odiava a todos senão ele e seus amigos, mas... Os cabelos prateados, os olhos vermelhos, a pele bastante clara... Não conhecia nenhum outro albino que também tivesse o sotaque alemão bastante presente.

-Bruder! Nós procuramos por você, me desculpa por ter me perdido, é que... -Ludwig começou, mas Gilbert apenas sorriu mais.

-West, seu moleque, não faça isso de novo! Quer me matar no coração?! -Exclamou o mais velho, que ainda não parecia ter me notado ali, rindo e então pondo Ludwig no chão, que apontou para mim e disse:

-Ele me ajudou a te procurar, o Tino.

-Tino é? Eu conheço um Tino e ele é... -Então Gilbert ergueu o olhar para mim e me fitou bem nos olhos por vários segundos, quase sem acreditar. Ele parecia tão surpreso quanto eu, até que sua expressão se tornou mais e mais fechada até se transformar numa carranca de raiva. -Vamos embora, West.

-Mas... -Ludwig tentou falar, mas Gilbert o pegou pela mão e saiu caminhando para longe dali, levando o menor consigo, que até acenou para mim antes de desaparecer entre as árvores do parque.

Ah, bem, aquilo fora inesperado. Nunca que eu ia sequer imaginar que Gilbert tinha um irmão mais novo, tampouco imaginaria que ele o tratasse assim tão bem.

Fiquei uns instantes ali, até que me lembrei do meu professor e no mesmo instante fui correndo para onde eu o tinha deixado, rezando com todas as minhas forças para que ele não tivesse notado minha ausência.

O que não funcionou porque quando eu cheguei lá, ele estava sentado no banco aonde eu me sentara antes, o olhar baixo, fitando o chão, e segurando um algodão-doce numa das mãos. Será que até aquele momento ele estivera esperando por mim?

Aproximei-me, e tão logo ele me percebeu, ergueu o olhar e me estendeu o algodão-doce, em silêncio, naquele sério que ele geralmente tinha, só que um pouco mais pesado. Não sei, parecia um tanto triste.

Sentei-me ao seu lado, balançando as pernas enquanto fitava o algodão-doce, intocado.

-Me desculpe professor. É que eu fui ajudar um menino que...

-Eu te vi sair. -Ele disse apenas, fitando as pessoas passando correndo ou andando de bicicleta na nossa frente.

-Ah... Desculpa-me por não ter te avisado, então.

Ele permaneceu em silêncio, vez por outra ajeitando os óculos que escorriam pelo nariz. Peguei um pedaço do algodão-doce e coloquei na boca, sentindo uma leve nostalgia com aquele gosto. Lembrou-me às vezes em que eu e meu irmão íamos para o parque de diversões.

Inclinei-me para o lado, encostando a cabeça em seu ombro e fechando os olhos enquanto pegava outro pedaço do algodão-doce. Não queria que ele ficasse com raiva, e eu tinha certeza que ele não diria que estava.

-Obrigado pelo algodão-doce, professor. -Murmurei.

-Por nada. -Ele respondeu, o tom de voz um pouco mais leve. E acho que ele me desculpou ali.


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Notas finais do capítulo

Okay, eu mereço uma surra mesmo. Mas antes de me mandarem para a forca diante desse terrível atraso, posso dizer que minhas provas acontecem toda semana e são enormes e dignas de pesadelo? Pois é, é triste.

Porém eu sei que isso não é o bastante para tal atraso, então, por favor, me perdoem. Claro que já comecei o chap 12 mas não tenho previsão de terminá-lo, então... Bem, não sei *apanhamuito*

Enfim, também culpem minha beta porque ela também demora para betar, mas agradeçam à ela porque é ela que vive me cobrando para apressar esse "treim" como ela diz, então...

Espero que tenham gostado! E que me desculpem, mais uma vez!

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