Estava tudo extremamente silencioso na mansão Stark. As televisões permaneciam ligadas, mas JARVIS já havia lhes tirado o som há muito tempo. Os raios do sol já alto, deviam ser umas dez e pouco da manhã, apareciam fracamente pelas frestas das janelas cerradas.

O clac clac característicos dos saltos quinze de Pepper ecoaram altos pelas paredes escuras quando ela adentrou o local, estranhando o silêncio àquela hora.

– JARVIS? Está ai? – Ela perguntou para o teto.

– Sempre.

–Tony está acordado?

– Sim, Srta. Potts.

Pepper respirou fundo, preparando-se para descer as escadas até a oficina. Uma vez lá, digitou sua senha e quando a porta de vidro se abriu, entrou no local, escuro como o resto da casa. Observou em um canto a silhueta de Tony com um leve brilho azul, mergulhada na penumbra.

–Tony? – Ela perguntou, aproximando-se dele.

Estava completamente catatônico, perdido, olhando para o nada a sua frente.  Pepper se posicionou atrás dele, pousando sua mão sobre seu ombro.

Tony não esboçou nenhuma reação significativa, mas virou o rosto sem expressão, permitindo que ela visse seus olhos castanhos. Pepper também viu uma grande marca de sangue seco em sua testa, mascarando o tamanho do corte sobre sua sobrancelha. Próximo aos cabelos havia um machucado começando a ficar roxo. Ele tinha voltado de uma missão... Mas não tinha se dado ao trabalho de se cuidar, tomar banho, nada. Provavelmente tinha tirado a armadura e simplesmente sentado naquela cadeira e ficado ali por... Quanto tempo?

– Tony, há quanto tempo está sentado ai?

Ele sorriu, um sorriso sem muita expressão, mas ainda sim um sorriso:

– Que horas são?

Pepper olhou para o relógio no Black Berry em sua mão:

– São 11: 15.

– Do dia ou da noite?

Pepper arqueou as sobrancelhas com a pergunta, mesmo não sendo a primeira vez que ele a fazia, com certeza era a primeira vez em meses. Desde que ele voltou do Afeganistão, para ser mais precisa.

– Estou com fome. – Ele disse, simplesmente, se recostando melhor na cadeira.

Pepper deu um meio sorriso, perguntando-lhe se queria café da manhã ou almoço. Seu sorriso se completou quando ele respondeu “os dois”.

Enquanto ela preparava o café e ambos esperavam que a comida que haviam pedido efetivamente chegasse, Tony foi tomar banho. Em dez minutos ele estava novamente na cozinha, vestido com uma camiseta do MIT e calças de tactel, os pés permaneceram descalços. Apesar dos cabelos úmidos, o que realmente chamou a atenção dela foi o corte na sobrancelha, muito menor do que ela imaginava. Felizmente.

– Tony...

– Hum? – Ele respondeu, enchendo a boca de alface. Era engraçado como ele comia rápido e em quantidade o que ele realmente não gostava. A imagem dele na oficina distante agora em sua mente, sendo que outra coisa lhe preocupava mais:

– Você se lembra que nesse fim de semana é o casamento da minha irmã, não é?

– Já? – Ele respondeu, simplesmente.

– Sim... E bom, eu tenho que ir antes, amanhã cedo na verdade.

– Hoje não é segunda-feira?

– Sim, mas eu tenho que ir, vou sair amanhã bem cedo.

Tony começou a sondar a carne em seu prato com o garfo.

– Tudo bem. – Ele disse simplesmente, voltando a comer.

Não era essa a resposta que Pepper esperava. Há duas semanas chegou o convite, há uma semana e seis dias ela estava tão apreensiva que ele notou. Há uma semana e cinco dias ele a convenceu a lhe dizer o que estava acontecendo, e há uma semana e cinco dias mesmo ele lhe surpreendeu com a melhor e pior notícia que ela poderia receber: ele ia junto.

Na realidade o que estava acontecendo era o seguinte: a irmã de Pepper, Elizabeth (Lisa) ia se casar no domingo. A irmã de Pepper ia se casar com Adrian no domingo, velho conhecido da família. A irmã de Pepper ia se casar com Adrian no domingo, melhor amigo de Sebastian. A irmã de Pepper ia se casar com Adrian no domingo, melhor amigo de Sebastian que, há 15 anos, foi noivo de Pepper. E Sebastian seria o padrinho do casamento. E Sebastian seria o padrinho do casamento junto com Amanda, madrinha do casamento. Sebastian e Amanda eram noivos há dois anos. Amanda era a melhor amiga de Pepper na época do colégio. Amanda e Sebastian começaram a namorar três meses depois que ele e Pepper terminaram. Pepper fingiu que estava tudo bem, abençoou os dois. Em seis semanas a felicidade deles começou a lhe incomodar tanto que ela saiu de casa. Em cinco anos ela começou a trabalhar para Tony. Há 15 anos Pepper não tinha um relacionamento sério. Na verdade, há 15 anos Pepper não se sentia desejada, e sua confiança em si mesmo nesse quesito já tinha desmoronado. Ou seja: ir sozinha a esse casamento era muito, mas muito humilhante para ela. Mas ela tinha que ir. E ia sozinha, já que arrumar qualquer um para levar com ela aquela altura seria apenas humilhante.

            Mas Tony percebeu que ela estava inquieta, ansiosa, e claro que apesar das tentativas de Pepper mudar de assunto ele tanto insistiu que ela deu-se por vencida. Simplesmente disse que sua irmã ia se casar e que Sebastian seria o padrinho. Tony milagrosamente se lembrava de quem era Sebastian, e do noivado e tudo mais (fruto de uma das poucas vezes em que Pepper bebeu mais de duas doses de tequila, naquele dia ela jurou nunca mais beber com Tony), então não fez mais perguntas, simplesmente disse que ia com ela. Quando ela arqueou as sobrancelhas, perguntando se era porque ele sabia que não sobreviveria uma semana sem ela por perto ele respondeu: “Também, mas acontece que ele vai ver o que perdeu quando vir um multi bilionário sendo constantemente desprezado pela namorada”. Pepper corou e se permitiu sorrir, depois percebendo o quanto aquilo era ao mesmo tempo fantástico e terrível. O que Tony Stark ia fazer na minúscula cidade onde ela nasceu? O que o Homem de Ferro ia fazer lá? E o mais importante, ele ia mesmo fingir o namoro sem querer nada em troca? Ele faria isso por ela? Por ela? É, sua estima estava realmente muito baixa.

            Mas isso tudo foi uma semana e cinco dias atrás. Hoje, agora, ela já não tinha mais certeza de nada disso.

– Que horas nós vamos? – Ele respondeu, simplesmente.

Pepper arregalou os olhos. Ele estava falando sério então?

– O primeiro vôo é as 04h40min.

– Por que não vamos com o meu avião?

– Porque mesmo o aeroporto principal da metrópole mais próxima não suporta o seu avião. Vamos com um vôo comercial até ele, e de carro até a casa de meus pais.

– Hum. – Ele disse, simplesmente, voltando a comer.

Pepper não tinha muita certeza se Tony estava achando isso tudo absolutamente normal e não dando muita importância, ou apenas fazendo parecer que sim.

O fato era que ela, Virgínia “Pepper” Potts, estava indo para o casamento de sua irmã, levando a tiracolo Anthony Edward Stark, um dos homens mais ricos, brilhantes e sexy de sua época, fingindo ser seu devoto namorado. Se aquilo não resultasse no maior desastre de sua vida, com certeza resultaria na situação mais engraçada e inusitada. Mal sabia ela que não seria nada daquilo.