Not Like The Movies escrita por MsRachel22


Capítulo 6
Sopro




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Minha vida, meu amor, meu ímpeto, vieram da dor"

                                               — Imagine Dragons 

 

  Arqueei a sobrancelha quando vi Sasuke Uchiha rindo feito uma hiena descontrolada, a cabeça dele voltada à sua esquerda enquanto Kakashi perguntava qual era a graça e o silêncio voltou a reinar na sala; rodei a argola do piercing tranquilamente enquanto notava que Sakura Haruno espiava sobre o ombro na direção do garoto Uchiha vez ou outra.

  Apesar de ser distrativo acompanhá-los a distância, continuei inquieta no meu lugar e mal notei que estava mordendo o lábio inferior com força excessiva até sentir o gosto metálico e salgado de sangue...

(...havia sangue manchando o piso laminado, formando poças extensas e brilhantes sobre a madeira que refletiam seu próprio rosto assustado, aterrorizado e...)

  Pisquei os olhos com força até me certificar que não estava delirando, enquanto esfregava os dedos na boca num gesto mecânico e repetitivo. Talvez, talvez você não suporte muito bem esse dia, era um fato provável e detestei-o por ser tão exposto e espinhento quanto levar um tapa na cara sem saber o porquê.

  Levantei pouco antes da sirene soar, anunciando o fim das atividades-base do cronograma de adolescentes problemáticos e traumatizados. Respirei fundo, levemente aliviada por estar em movimento e saí da sala o quanto antes e, como de praxe, lá estava Hinata de cabeça ligeiramente baixa, fingindo estar concentrada em seu próprio mundo.

— Ei Ino. — Sua voz não passava de um sussurro forçado para soar com neutralidade. Ela passou a manga da blusa branca pelos olhos e a expressão de serenidade, igualmente forçada, moldou seu rosto. — Eu recebi outra carta. Tsunade deixou que eu a lesse antes de Shizune, pelo menos dessa vez.

— Como vão as coisas no paraíso Hyuuga? — Adotei sua neutralidade forçada, mas não consegui esboçar mais do que uma tentativa de sorriso. — Entediantes até a morte?

— Claro, sempre — ela respondeu apressada e tomou fôlego, movendo as mãos como se não soubesse exatamente o que dizer a seguir. — Nós podemos conversar depois. Não é um dia bom para nenhuma de nós.

  Essa facilidade de assimilar o espaço e o consolo sempre me trazia certa calma e alívio sobre Hinata e funcionava muito bem em nossa amizade. Ela simplesmente sabia quais dias eram bons, ruins e terrivelmente bagunçados, parecia saber a coisa certa a se dizer e quando simplesmente se afastar.

— Evite-o se puder, Ino. Não vai valer a pena, você sabe disso — ela suspirou cansada e me encarou por alguns instantes, esperando alguma confirmação da minha parte de que seguiria seu conselho. — Estou no lugar de sempre, se precisar de qualquer coisa.

— Claro — minha voz soou trêmula e pisquei fortemente, dei as costas e andei na direção contrária à de Hinata.

(...não reconheceu aquela voz sofrida e trêmula como sendo a própria conforme os chamava pelo nome; foi então que avançou sobre os corpos estirados escutando o som de seus pés arrastando-se na poça vermelha, morna e úmida. A sensação não foi suficiente para fazê-la gritar, já que avançava com os olhos arregalados nos buracos que haviam na cabeç...)

  Acelerei os passos o mais rápido que pude, oscilando entre conter a ânsia de vômito e a necessidade de ceder sobre os joelhos e gritar o máximo que as minhas cordas vocais e minha garganta permitissem. Trinquei os dentes pouco antes de avistar o banheiro à direita e empurrar a porta, escancarei uma das cabines e mantive as mãos agarradas ao batente.

  A repulsa daquelas memórias todas, das sensações que elas causavam e do suor que brotava na minha pele pareciam canalizar todo o resto. Inspirei e expirei o ar da forma mais lenta que pude, meus lábios se moviam na contagem das respirações; endireitei o corpo e não ousei olhar para os espelhos ovais fixados sobre as pias enquanto saía dali.

  Assim que saí do prédio, senti que finalmente tinha retomado algum controle sobre as minhas emoções e meus movimentos. Andei até a lateral tomada pela grama alta, o barulho de insetos e bitucas de cigarro com batons coloridos e queimados até o filtro, sentei na beirada de uma espécie de degrau em silêncio.

  No horizonte, os arranha-céus despontavam com a ponte que ligava o Centro Reformatório com o restante do mundo, com água preenchendo quase toda a distância. Os muros que ladeavam meu humilde purgatório mediam pouco mais de três metros com arame farpado, as rachaduras subiam como ramificações naturais do cenário.

  Inclinei a cabeça para trás e observei as nuvens preguiçosas, que lembravam...

(...dos momentos marcantes em que a família Yamanaka protagonizara na vida daqueles que estavam reunidos ao redor dos dois caixões lustrosos e bem fechados. Ela não conseguia sair do lugar e foi guiada pelo namorado, Sai, até a coroa de flores com fitas negras envoltas, presa no chão por um cavalete e próxima dos caixões.

  Na verdade, Ino não conseguia assimilar aquele velório com o enterro de sua própria família. Aquela era uma piada bem ruim, se você quisesse saber, porque eles haviam feito planos de dar uma bela festa na semana que vem. Ah sim, uma bela festa, com música, bebida, comida e até mesmo uma banda.

  Ela estava concentrada na forma das nuvens acima da sua cabeça, seu pescoço estava inclinado e ela não sabia por quê, mas estava soluçando, não conseguia se lembrar de como se mover enquanto notava o quão silencioso o lugar estava, como nada fazia mais sentido. Eles teriam uma festa, certo? Eles dançariam, participariam das brincadeiras estúpidas, fariam coisas idiotas na festa e ririam disso no dia seguinte e...)

— Eu sinto muito — sussurrei as palavras, mal sentindo as lágrimas que escorriam pelas bochechas e pingavam do queixo. — Eu sinto muito, papa. Sinto muito, mama. — Não podia mais ver quais formas as nuvens tinham, meus olhos ardiam com as lágrimas e os soluços começaram pouco depois. — Eu só... Eu só quero ir pra casa.

  Acreditei, como havia feito no primeiro ano em que estava alojada aqui, acreditei com todas as minhas forças que alguém daria ouvidos, que me tirariam dali e me levariam em segurança até a minha casa, para minha família e para a minha cama, para a minha vida.

— Por favor... Papa, por favor me leve pra casa!

  Enfiei a cabeça entre os joelhos, balançando meu corpo para frente e para trás, esperando que, no momento em que erguesse a cabeça, eles estariam ali, as coisas ficariam bem e que eu não seria mais obrigada a viver uma versão de mim mesma que odiava; mas quando ergui a cabeça, não havia nada além dos muros.

* * *

  Anoitecia quando o estado de letargia abandonou meu corpo aos poucos. Um sorriso débil repuxou meus lábios quando notei o quão rígidas minhas costas e pernas estavam; não havia mais nuvens nos céus e não haveria a cena épica do príncipe encantado salvando a donzela em perigo ou o famoso resgate heroico de homens com capas.

  Recomponha-se. Você já teve uma boa dose de túnel do tempo por hoje...

  Levantei e senti o formigamento nas pernas quase que imediatamente, me apoiei e contornei a lateral do prédio ainda com a cabeça ligeiramente baixa, sem realmente prestar atenção para onde estava indo.

— ...não a vi hoje. — Hesitei assim que reconheci a voz de Naruto Uzumaki ecoando cansada pelo pátio, ele caminhava o lado do verme, gesticulava um pouco enquanto o volume da voz oscilava. — Eu não entendo porque você e o Sasuke tem tanta preferência em andar ao lado de maníacas.

— E você é a melhor pessoa para opinar sobre isso — me encolhi automaticamente quando ouvi a voz dele, tentei resgatar o autocontrole e me ater a qualquer pensamento tolo, qualquer coisa que evitasse a raiva e a frustração crescentes. — Eu só...

— Sei, sei... Você não precisa me explicar seus motivos Gaara, não me interesso nem um pouco por eles — o tom amigável na voz de Naruto oscilou um pouco enquanto ele tirava um cigarro amassado e o mordia; não demorou muito para que o silêncio se instalasse entre os dois e o Uzumaki olhava sobre o ombro do outro. Os olhos azuis se estreitaram na minha direção e ele ergueu a voz: — Não que seja da minha conta, mas que diabos você está fazendo aqui?

  Abri a boca, tentando personificar a garota forte, durona e de respostas atravessadas que eu tinha de ser ali dentro, mas me vi estagnada na versão assustada e cansada de horas atrás, aquela que não conseguia fazer mais do que se encolher diante do assassino de sua família e amaldiçoar tudo e todos.

— Como assim? Estou cumprindo meu papel de adolescente assassino, sabe... Seguindo o roteiro — a resposta do verme, daquele maldito soou descontraída. — Existe algum problema com isso?

  Um sorriso, aparentemente de deboche, repuxou os lábios de Naruto quando ele retrucou:

— Nós dois sabemos que você não precisa ficar aqui dentro, cara. Você pode pegar as suas coisas e dar o fora quando bem entender. — Franzi o cenho automaticamente e me afastei da parede em que estive apoiada, num passo hesitante para frente. — Ao contrário de nós, você não precisa seguir roteiro nenhum e estou acostumado com isso, sério. Mas você...

— Não é como se eu tivesse para onde ir.

— Nós dois temos contatos lá fora e tudo entraria nos eixos depois de uma ligação ou duas. Isso é besteira. — O olhar analítico e acusatório do Uzumaki estava voltado para o outro, enquanto eu tentava acompanhar a linha de raciocínio do loiro e entender porque eu não havia dado o fora dali, porque não havia escutado as ordens que brotavam na minha cabeça de correr para longe deles ou me atirar contra o verme. — Vamos lá Gaara... Eu tenho mais chances de apodrecer aqui, porque eles me pegaram. Mas você simplesmente se ofereceu e confessou tudo.

— Agora eu entendo porque nos conhecemos drogados. — Ele agitou a cabeça e se afastou um pouco, os punhos enfiados no bolso da calça jeans. — Você é um filho da puta insistente, Naruto.

— É um dos meus dons. — O olhar do Uzumaki se fixou em mim outra vez e, apesar de não notar os rastros úmidos nas minhas bochechas, de não sentir ainda a ânsia de vômito e os tremores nas mãos e pernas, eu reconheci a pena nos olhos azuis dele. — Por falar nisso, quer dar um trago?

— Não nessa noite. — Ele recusou prontamente o cigarro que Naruto estendia e agitou a cabeça outra vez, pronto para dar as costas e ir embora. — Eu preciso manter a cabeça limpa por hoje.

— Se mudar de ideia, sabe onde me procurar — apressei meus passos num trote ritmado e desesperado até as portas duplas, espalmei as mãos na madeira assim que ouvi Naruto gritando alguma outra coisa e o verme respondendo em seguida.

  Você não ouviu absolutamente nada, era o mantra que havia brotado na minha cabeça e nos meus lábios conforme sentia a rigidez dos meus músculos indo embora nos passos apressados pelo corredor escuro e vazio. Mantive a cabeça ligeiramente abaixada e senti que iria cair, iria desabar e entrar em colapso, num estado catatônico de negação.

  Ele foi pego, a polícia o encontrou e o prendeu, certo? Eu estava hiperventilando, perdendo o controle outra vez e saturada em mágoa e ressentimento quando agachei e abracei meu corpo automaticamente. Ele foi pego, ponto final. Ele não se entregou, ele foi pego; foi pego e...

  Não importava o quanto eu tentava me ater àquelas palavras, o quanto eu queria que elas continuassem sendo parte da minha tragédia e da minha realidade, pois o olhar piedoso de Naruto e o tom de voz acusatório se estreitando sobre mim traziam um ponto de vista que eu preferia ignorar até então.

  Eu era a garota órfã, a garota que perdera o mundo da noite para o dia e estava afogada no passado e, a muito custo, havia me tornado essa Ino Yamanaka, violenta, melancólica e absorvida pelo ressentimento. Ele havia me transformado naquilo e eu não me importava nem um pouco em lhe dizer isso em todas as oportunidades.

  Ele se entregou. Ele nunca foi pego.

— Você está bem? — Girei a cabeça e paralisei de pânico assim que o vi, assim que registrei que ele esticava a mão na minha direção e seus olhos realmente pareciam preocupados. Aquele pânico foi destilado na boa e velha mágoa, no rancor de sempre e senti a histeria me dominando.

— Não me toque! — Gritei trêmula, recuada no corredor e com os braços ligeiramente erguidos numa defesa débil. — Não... Não encoste em mim, seu verme!

— Eu não vou te machucar, Ino — aquilo não era mais do que um sussurro cauteloso enquanto ele se afastava um pouco, os olhos verdes atentos a qualquer movimento meu; sufoquei a vontade de transformar aquilo em outra oportunidade de lhe dizer exatamente o que pensava, o que sentia e o quão miserável eu havia me tornado graças a ele. — Eu não vou...

— Vá embora. — Ordenei tão histérica quanto antes, mas me parecia que minha voz não era mais do que um murmúrio arrastado e cansado. — Eu não preciso da sua ajuda. Vai! Sai daqui! — Eu o encarei e senti o peso deste dia, de todos aqueles dias acreditando que houve justiça para meus pais, que a coisa certa havia acontecido durante o julgamento e notei quão ingênua havia sido por me colocar dentro desse lugar, procurando tirar de Gaara o mesmo que ele havia tirado de mim. — Por que você não pega as suas coisas e simplesmente some daqui? Por que você não desaparece de vez?

 Não. Feche a sua boca, você não ouviu isso. Não ouviu nenhuma palavra.

Nenhum de nós pode, lembra? Estou tão preso aqui quanto você e estou conformado com isso — foi tudo o que ele disse e notei o quão automáticas e frias aquelas palavras soavam, como elas se esforçavam para ser convincentes e verdadeiras. — Não é como se você entendesse.

— Então é assim? Você os mata e foi isso? — O rancor transformou minha voz e minha postura em algo agressivo, acusatório. — Só uma merda, só uma porcaria de deslize? — Era o silêncio dele que me irritava, a postura calma e controlada como se nada daquilo o afetasse. — Pelo menos você se lembra do que fez?

— Eu assassinei seus pais. Tirei sua família de você. — A praticidade em sua voz me feria tanto quanto suas palavras, parecia que ele havia ensaiado aquilo por toda a vida; meu corpo tremia e não consegui desviar o olhar dele. — Era o que você queria ouvir, não era? Aí está.

— Seu... cretino! Desgraçado! — Berrei as palavras enquanto levantava num impulso trôpego e me atirava contra ele, mas ele não havia se movido nem mesmo um centímetro quando ergui os punhos cerrados e eu hesitava diante da quietude dele. — Por que você não some? Por que você...

  As palavras simplesmente morreram assim que percebi que, diante dele, eu jamais deixaria de ser aquela menina assustada e paralisada no meio de uma casa bem situada no oeste da cidade. Então, como sempre acontecia, me dei conta da necessidade de ser a versão sobrevivente de mim mesma, vestir a pele daquela garota durona e independente que eu acreditava que poderia ser.

  Endureci a minha expressão e esfreguei os olhos com força, contive todas as perguntas que queria fazer e todas as atitudes que poderia tomar com o resto de autocontrole que recuperei e me forcei a simplesmente olhar para frente e ir para meu quarto. Continuei a andar mesmo quando senti a ponta dos dedos dele no meu cotovelo, fechei os olhos tremendo e ignorei o nó na minha garganta.

— Você está bem? — Ele insistiu.

— Entre todas as pessoas no mundo, você é a única que não tem o direito de me perguntar isso — retruquei confiante de que aquilo seria o que a atual Ino diria e que aquilo o irritaria. — Achei que você entenderia, depois de tudo. Achei mesmo que você saberia disso.

* * *

  Assim que fechei a porta e senti a textura de madeira envernizada sob meus dedos, me permiti retomar ao estado letárgico de horas atrás. Minha cabeça não parava de martelar sobre o que havia acontecido no corredor e o quanto eu havia escutado lá fora, aquele bombardeio de informações e questionários me deixavam tonta e cansada.

  Eu não conseguia associar a postura preocupada e hesitante daquele maldito com a indiferença em confessar um crime, eu não queria tornar o que Naruto havia dito como o outro lado da história, o outro ponto de vista. Se fizer isso, boneca, vai passar a ver que há coisas que você ignorou completamente, como o detalhe que você nunca...

— Ei Ino. — A voz arrastada e trêmula de Hinata chamou minha atenção automaticamente e a notei, o corpo rente à soleira do banheiro e as mãos segurando uma folha de papel com força. — Achei que você tinha se perdido. Estava preocupada.

— Foi quase isso — minha voz soou tão forçada como o sorriso débil nos meus lábios, mas não pude sustentar aquela expressão por muito tempo e fiquei grata pelo silêncio de Hinata. — Mas obrigada por se preocupar comigo. Você é uma boa pessoa.

  O choque atravessou os olhos perolados dela e sua boca abriu levemente, os dedos torciam as bordas do papel em suas mãos e ela abaixou a cabeça ligeiramente. Ela murmurou um agradecimento e sorriu com tamanha naturalidade que cheguei a me perguntar – não pela primeira vez - se a vida toda dela se resumia em sorrisos nervosos muito bem treinados.

— Ah... Eu... Eu tenho que devolver isso aqui amanhã, mas eu queria saber se o Sasori pode tirar uma cópia dessa carta, sabe... — os olhos dela marejaram rapidamente e ela se apressou em secá-los e retomar o ritmo nervoso com as pontas dos dedos nas bordas do papel. — Eu não o vi hoje e acho que não conheço ninguém que... Enfim. — Ela respirou fundo e se aproximou, a cautela se sobrepondo ao sorriso forçado. — Eu sei que você não está com cabeça, mas... Você conseguiu evitá-lo?

  Suspirei numa mistura de alívio e desespero assim que notei que havia alcançado meu limite outra vez, tentei gesticular, formar qualquer frase lógica ou pronunciar qualquer coisa que simplesmente fizesse sentido, mas nada me vinha à mente. Encarei-a como se ela pudesse compreender o que estava na minha cabeça e o quão perturbador havia sido trocar palavras com o verme.

  Eu não conseguia associá-lo a outro nome que não aquele, não conseguia deixar de associar a sua imagem a algo asqueroso e repugnante, pois no instante em que eu o chamasse de Gaara Sabaku, ele seria uma pessoa e não mais o monstro mascarado que havia aparecido no meio de uma noite fria e arrancado todo o sentido da minha vida num...

(...pânico crescente quando sentiu as solas dos pés descalços em contato com a camada espessa, úmida e morna, não queria ir adiante e ver de onde todo aquele sangue vinha, mas o som dos seus passos sobre o piso laminado era uma sucção suave e escorregadia assim que erguia um pé adiante do outr...)

— Eu não consegui. Não consegui, Hina — balbuciei envergonhada e mordi os lábios com força quando Hinata passou os braços ao redor das minhas costas e me apertou com delicadeza.

  Levou um bom tempo até que eu parasse de repetir aquelas palavras e até que eu conseguisse respirar como se não houvesse algo apertando minha garganta; Hinata não havia dito palavras inúteis de consolo ou falado que sabia como eu me sentia, ela simplesmente me escutou em absoluto silêncio e com os braços me apertando suavemente, até que eu retomasse certo controle e então ela se afastou.

— Não se preocupe Ino, eu chuto a bunda dele por você — ela prometeu e riu em seguida, uma espécie de riso escapou dos meus lábios e balancei negativamente a cabeça. Ambas encaramos a porta sendo aberta e Sakura se esgueirando por ela, o capuz cobrindo boa parte da cabeça e os passos silenciosos como se ela não quisesse ser notada de forma alguma. — E se você quiser, Sakura, também posso chutar o traseiro do Uchiha.

— Desde quando você briga? — Embora ela se esforçasse para soar desinteressada, a expressão de Sakura demonstrava sua curiosidade e seu receio em simplesmente interagir.

— Eu abro uma exceção ou outra, sabe. — Hinata hesitou ao esticar a mão na direção de Sakura e brincar que a socaria quando notou o olhar ligeiramente desconfiado e acuado dela. — Se alguma de vocês estiverem na pior, podem me chamar que eu sei um golpe ou dois de...

— Qual é Hinata?! É mais fácil a Sakura ser sociável do que você se meter numa briga — a interrompi e agitei a mão na direção da outra. — Sem ofensas.

— Eu posso ser sociável...

— Ei, nem todo mundo é obrigado a dar ganchos de direita, ok? Eu não cresci acreditando que podia bancar a Batgirl, então desculpe se os dois golpes de karatê que eu sei não são bons o suficiente para a nossa amizade. — Hinata a interrompeu, fingindo estar irritada com meu comentário.

— Dois golpes? Isso é ridículo.

— Ridículo? — O falso choque de Hinata diante daquela frase da Sakura me fez rir, ela apontou um dedo na direção da garota do capuz e disparou: — Ridículo? São golpes extremamente fortes e super potentes, do tipo de filme de ação e você diz que meu currículo não é vasto o suficiente em matéria de briga?! Saiba que assisti uma boa porção de filmes de explosão e golpes em câmera lenta para aprender...

— Ainda é ridículo.

  A discussão perdurava enquanto Hinata argumentava e fingia estar ofendida com as respostas curtas de Sakura, as duas trocavam farpas sutis entre um comentário e outro; talvez, pela primeira vez naquele miserável e mórbido dia, senti que não estava simplesmente alojada aqui, mas que dentro daquele quarto nós três formávamos uma pequena união, uma pequena e estranha unidade, mas que funcionava.


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Notas finais do capítulo

YOOOOOOOOOO!
Cá estou com outro capítulo, espero que tenham gostado. As narrativas serão alternadas em alguns capítulos para mudar a dinâmica da fic e as perspectivas também.
Dessa vez o foco foi a Ino, que é uma personagem que, particularmente, gosto muito. A mudança entre essa versão e a outra é que, basicamente, a Ino acredita piamente que Gaara matou sua família e não acata, até o momento, qualquer versão que destoe do que ela tem como verdade absoluta.
Mas há sempre duas versões de uma história.
Esses capítulos iniciais serviram para apresentar as personagens e a nova proposta de história e, a partir desse ponto, as coisas seguem o rumo apresentado.
Qualquer dúvida, crítica ou sugestão, cá estou.
Agradeço muito pelos comentários e por acompanharem a fic.
A continuação será na sexta. Até lá.
o/