Not Like The Movies escrita por MsRachel22


Capítulo 13
Faíscas de bravura




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E um dia, eu rezo, eu vou ser mais do que o filho do meu pai”

                    The Lumineers                                                        

 

  As minhas pernas estavam rígidas e inertes, como se eu tivesse corrido pelos corredores até parar na porta 130, embora eu tivesse percorrido o caminho inteiro num ritmo lento. Olhei para os lados antes de erguer o punho e bater na porta algumas vezes até escutar um resmungo irritado vindo de dentro do quarto.

  Durante aqueles instantes de puro pânico, tentei me convencer de que seria Sasuke Uchiha a escancarar a porta e não Gaara ou Naruto, que as coisas simplesmente seguiriam o rumo da minha cabeça e que a rigidez no meu corpo era por pura ansiedade de ser pega andando pelos corredores perto das onze da noite.

  As coisas vão ser exatamente como você quer. Pode apostar nisso.

— Você?

— E-Eu... — abri a boca e assisti o rosto sonolento de Naruto Uzumaki endurecer depois de franzir o cenho. — Eu preciso falar com o Sasuke — emendei e sustentei o olhar analítico dele, levou algum tempo até que ele balançasse a cabeça negativamente e bloqueasse a fresta da porta com o corpo.

— Procure em outro lugar — o tom indiferente não acompanhava o desdém que transbordava em seus olhos e a postura dele não relaxou quando ele se afastou e começou a empurrar a porta.

  Tinha de ter sobrado algo além de sorrisos treinados e acenos bem ensaiados, devia haver algo corajoso e forte escondido em algum lugar. Hinata Hyuuga sabe lidar com isso, não sabe? Sabe lidar com a rejeição e...

— Eu preciso de ajuda — respondi e espalmei as mãos na porta, usando o peso do meu corpo para tentar impedir Naruto de fechá-la. — Eu não vim até aqui por você, acredite em mim. — Aproveitei a hesitação dele e avancei mais um passo, não havia mais do que meio palmo de distância entre nós. — Só... me diga onde ele está.

  A expressão dele continuava a mesma quando o silêncio brotou com facilidade; levou um bom tempo até ele simplesmente dizer:

— Você está estragando a minha noite.

— Será que, só por uma porcaria de minuto, você não consegue parar com isso? — Retruquei irritada e incomodada quando ele forçou a porta mais uma vez; não pela primeira vez, o desdém dele era nítido e espinhoso. — Eu não vim para brigar. — O murmúrio escapou e respirei fundo. — Eu sei que é um pouco demais, mas eu preciso mesmo da sua ajuda e...

— Por que você acha que eu te ajudaria? Tudo o que os Hyuuga fizeram foi estragar com a minha vida e ferrar com a minha família — a voz dele era baixa e arrastada, mas a raiva estava sendo cuspida em cada palavra e me afastei por puro reflexo quando ele continuou: — Você espera que, depois de todos esses anos, eu agradeça e faça de conta que...

  Eu sabia lidar com os olhares tortos e raivosos de Naruto, havia aprendido a conviver com as respostas atravessadas nas raras vezes em que ele se dava ao trabalho de abrir a boca e eu havia aprendido que era melhor dar meia volta assim que ele aparecia no meio do caminho; o grande problema era que eu não sabia lidar com as acusações abertas, não vindas dele.

— Vocês só bagunçam com as vidas de outras pessoas e, depois de tudo, você vem até aqui e quer que eu te ajude? — Ele voltou a cuspir as palavras e, naquele ponto, eu reconheci a mágoa quando Naruto simplesmente hesitou ao me encarar. — Isso soa demais, não é Hinata?

  A respiração ofegante dele quebrava a quietude tensa que havia surgido, minhas pernas tremiam quando dei outro passo para longe daquela porta e a minha garganta fechava.

— Pode me culpar se quiser, eu não ligo — a mentira soou prática e eu não queria erguer os olhos e compreender, de uma vez por todas, que eu não era boa em ignorar o silêncio e todo o desdém. — Você pode apontar o dedo e dizer que a culpa é minha, mas eu não vim... — forcei minha voz a soar convincente e firme quando finalmente o encarei: — Naruto, eu só preciso tirar a Sakura daquela porcaria de solitária e eu não consigo fazer isso sozinha.

  A sensação se impotência era tão ruim quanto manter a cabeça erguida, como se ainda houvesse algum resto de orgulho dentro de mim.

— Você está falando com a pessoa errada, Hyuuga.

  Ah, ainda sobrou alguma coisa, docinho. Um Hyuuga é bom em manter o orgulho a todo custo, não é? Chame isso de especialidade da casa, se quiser.

— Eu estou pedindo a sua ajuda, agora. — Foi a primeira coisa que consegui pensar ao sustentei o olhar dele. — Então, por favor, só... — insisti e eu queria me convencer de que os olhos dele não endureceram ainda mais e que seus lábios não haviam formado uma linha reta.

  O máximo que fiz foi continuar parada no meio do corredor quando Naruto fechou a porta e eu não soube definir se a agonia que embrulhava o meu estômago era por ter falhado em ajudar Sakura ou por compreender que Naruto Uzumaki havia me culpado, em alto e bom som.

  Enquanto eu arrastava minhas pernas rígidas para longe, eu tentava me convencer de que havia sobrado alguma coisa além da filha do governador quando atravessei aqueles portões e aguentei os malditos olhares e todas as provocações e ameaças ao longo de todo esse tempo.

  Você pode lidar com tudo isso, era naquilo que eu tentava me agarrar para contrapor a vontade de dar meia volta e bancar uma versão rebelde e corajosa, que usava mais do que encolher os ombros e exibir sorrisos nervosos como defesa.

  Não senti alívio quando cheguei ao meu quarto e percebi que Ino não estava ali, só havia aquela bolha de conformismo e recriminação que, como sempre, me envolveu.

* * *

  Por dois dias, eu repassei as poucas frases de Naruto Uzumaki na minha cabeça, como se pudesse encontrar algum sentido oculto ou alguma pista que fosse além da culpa que eu tinha por ser Hinata Hyuuga. Durante aquele período, eu rebobinei o desprezo e a fúria que foram despejados e tentei acreditar que não me incomodavam ou que não me magoavam de algum jeito.

  O fundo de verdade era a parte mais amarga.

  Os Hyuuga eram realmente bons em destruir famílias - a nossa era um belo exemplo, se alguém se desse ao trabalho de saber. Era por isso que eu compreendia boa parte dos insultos, das ameaças e de todas as porcarias que as pessoas se sentiam no direito de me atribuir, porque elas traziam meias verdades.

  Nada disso, docinho. As pessoas dizem coisas assim porque é exatamente dessa forma que...

  Os meus olhos ardiam quando tentei me concentrar no copo de plástico que estava entre meus dedos e olhei para Ino quando ela disse:

— O seu chá não vai esquentar se você continuar fazendo isso — ela recostou o corpo na cadeira do outro lado da mesa e tomou um pouco do próprio chá. — Você não está muito bem, não é? — O tom retórico dela foi reconfortante e ela tomou meu silêncio como uma confirmação automática. — Foi o trio fantástico ou...

— A outra opção — respondi e senti meus ombros enrijecendo quando a agonia de dois dias atrás surgiu outra vez. — Uzumaki em pessoa — emendei assim que ela ergueu uma sobrancelha.

— Foi ele quem abriu a porta? — A voz dela era baixa e preocupada assim que voltei e encará-la; agitei a cabeça num aceno rápido e fiquei grata quando reconheci a compreensão nos olhos azuis maquiados dela. — Você foi corajosa, Hina. Eu não conseguiria fazer isso.

— Não, eu não consegui falar com o Sasuke e... Eu só pensei que...

— Nós vamos dar um jeito, não se preocupe — a gentileza e as palavras firmes dela me acalmaram e confiei nela, da mesma maneira como ela sempre fez comigo.

  Não havia consolo cheio de abraços e lágrimas vindo dela, apenas mais daquela garota durona, que dizia com todas as letras que suportaria o peso do mundo ao seu lado. E nessas horas, Ino deixava vir à tona um pouco da garota sem a maquiagem, as frases ofensivas e o riso sarcástico e eu sabia que ela confiava em mim para isso. 

— Plano B: nós explodimos a porta da solitária, arrancamos a nossa amiga do capuz de lá e voltamos para o quarto, e enchemos a cara — ela tagarelou e o olhar preocupado dela suavizou um pouco quando balancei a cabeça. — O que? É um bom plano.

  O refeitório não estava muito ocupado e ainda havia mesas livres quando Sasuke Uchiha passou pelas portas duplas, olhou ao redor e veio na nossa direção. Ino virou o corpo na cadeira assim que Sasuke se aproximou.

— Eu estou dentro também — ele estendeu um papel dobrado ao meio e o agitou mais uma vez quando nenhuma de nós se mexeu.

— As pessoas não têm a obrigação de saber que porcaria está passando pela sua cabeça estúpida, Uchiha — Ino retrucou mal-humorada e um sorriso irônico repuxou os seus lábios automaticamente. — No que você está dentro?

— Você costumava ter um humor melhor pela manhã — o comentário dele me fez franzir o cenho rapidamente e o interrompi dizendo:

— Eu não preciso saber de detalhes sobre vocês dois.

— Ainda tenho pesadelos com isso — ela fingiu sentir arrepios e Sasuke revirou os olhos antes de puxar uma cadeira e sentar entre nós duas.

— E eu quero vomitar todas as vezes em que o universo me lembra de que eu e você quase viramos um casal — ele forçou um sorriso cínico quando encarou Ino; suspirei aliviada quando Sasuke se ajeitou na cadeira e agitou a folha de papel de novo. — Obrigado por me dar ânsia, Ino.

— Agora você sabe como me senti todas as vezes em que você...

— Sem detalhes! — Repeti um pouco mais alto e apertei o copo de plástico com força; eles ficaram em silêncio por alguns segundos e responderam ao mesmo tempo:

— Desculpe.

— É, foi mal.

— Você dizia que está dentro também... — incentivei e torci para que não houvesse nenhum comentário ácido dessa vez. É, pode apostar, era tudo em que conseguia pensar quando percebi que Sasuke e Ino ainda trocavam olhares atravessados.

— Eu quero ajudar — ele respondeu depois de longos segundos em silêncio e estendeu a folha de papel na minha direção. — Levou um pouco mais de tempo, já que o Naruto queria que ficasse bom o suficiente — franzi o cenho e hesitei ao pegar o papel e desdobrá-lo.

    Passei os olhos pelas linhas impressas, o cabeçalho bem alinhado com o símbolo do Governo - comum em documentos oficiais -, o texto bem elaborado e curto que ocupava pouco mais de dois parágrafos e a assinatura caprichada no meio da folha de papel.

  Alisei a tinta do carimbo que tinha o nome completo de um assistente social, seu número de registro com uma parte meio apagada, como se fosse uma questão de uso recorrente daquele objeto. Li e reli os poucos parágrafos algumas vezes antes de erguer os olhos para Sasuke.

— Isso é...

— ...uma dispensa da porcaria da solitária — pisquei surpresa quando o Uchiha completou minha frase, um sorriso mínimo de satisfação acentuava os olhos pretos dele. — Oficial.

— Puta merda — Ino agarrou a folha de papel e a estudou com os olhos ligeiramente estreitos, uma velha expressão que sempre surgia quando ela estava desconfiada. — Como é que ele sabia?

— A Hinata pediu ajuda — ele ergueu os ombros como se aquela resposta bastasse e tudo se resumisse a uma verdade simples; abri a boca, sem saber o que dizer quando Ino abaixou a folha de papel e pôs olhos em mim. — Ele não te odeia tanto assim.

— Tá brincando comigo? — Foi tudo o que consegui responder e tentei absorver que o que Sasuke havia dito não era parte de uma piada ruim. Quando percebi que o rosto dele não perderia a seriedade, disparei: — Você não tá mesmo tirando com a minha cara?

— Olha, eu sei que ele pode ser um completo...

— Babaca — Ino atalhou.

— ...idiota, é, babaca também serve — Sasuke concordou e prosseguiu com a voz um pouco mais baixa: — Naruto pode ser difícil às vezes...

— Você tem certeza de que não tá tirando comigo? — Insisti e ele apenas revirou os olhos.

— Ele é difícil todas as vezes que está de olhos aberto e respirando, mas mesmo assim... — o olhar sério de Sasuke continuava me observando, analisando meus olhos arregalados em choque e descrença. — Naruto só é... Um idiota rancoroso.

 — O seu amigo idiota é bom em falsificar documentos — parte do sarcasmo usual de Ino havia suavizado e ergui uma sobrancelha. — Qual é, Hina, se o cara é bom nisso... Transmita meus elogios ao seu colega babaca, Uchiha.

— Eu não sou o seu garoto de recados, Ino.

— Essa era a única coisa realmente boa que você conseguia fazer com a sua boca.

— Detalhes demais! — Quase gritei dessa vez e espalmei as mãos na mesa, mas o sorriso travesso nos lábios de Ino aumentou até exibir uma fileira de dentes.

— Não que você tenha mudado muito, Uchiha.

— Você se surpreenderia — acompanhei Ino no movimento exagerado de vômito e Sasuke ajeitou os braços no encosto da cadeira, ele ergueu as mãos num sinal de rendimento antes de acrescentar: — Não que seja um convite, mas eu sou um rapaz de talentos...

— Desse tamanho aqui — Ino mostrou o dedo mínimo.

— Calem a merda da boca agora! — falei mais alto e alternei os olhares para os dois e apontei um dedo na direção de cada um. — Eu juro que vou deixar cada um de vocês pelo avesso se eu escutar qualquer comentário sobre a vida sexual...

— Lá vem o universo...

— Hinata, eu acabei de comer!

  Os barulhos de nojo foram mais altos e as vozes do Uchiha e da Ino se misturavam nas reclamações automáticas, puxei a dispensa falsificada e tentei me concentrar no texto extremamente burocrático e didático que Naruto havia elaborado, porque eu não queria passar por uma análise de sentimentos e porquês que justificariam a ajuda dele.

  Ele ainda te odeia. Não importam quantas boas ações apareçam, docinho. Lide com isso.

  Franzi ainda mais o cenho quando tentei imaginar o mesmo garoto que, há duas noites, havia apontado o dedo na minha direção e cuspido que sua vida estava no ponto atual graças à minha família, ficou empenhado em falsificar um documento para liberar outra garota, que ele não conhecia, da solitária.

 — Isso não faz nenhum sentido — murmurei e balancei a cabeça rapidamente quando Ino fez algum comentário relacionado à aparição repentina de Sasuke. — Só... Calem a boca e me escutem — pedi e respirei fundo. — Você está dentro, não é? — Ele se limitou a um aceno mudo e fiquei aliviada por um momento. — Eu tenho um plano, mas só... Nada de piadinhas entre vocês dois, ou...

— É, você vai nos virar pelo avesso — os dois responderam quase ao mesmo tempo e se encararam assustados, Ino fingiu que vomitaria outra vez e Sasuke tremeu.

— Dá pra parar com isso? É muito assustador.

— Você é esquisito, Uchiha — a loira disparou em seguida e disse um pouco mais baixo: — Não acredito que eu estava tão desesperada assim.

— Ei, eu não lembro de reclamações enquanto...

— Isso é muito para assimilar, ok? Já é ruim escutar as piadas e as farpas, mas eu não preciso mesmo saber que vocês... Isso é... — tremi com o pensamento que surgiu e as palavras morreram. Fiquei feliz por isso. — Eu não quero saber, então controlem o que quer que não esteja resolvido entre vocês quando eu estiver por perto.

  A quietude dos dois foi tão estranha quanto os rostos totalmente sérios, eles mal se moviam e só havia o resquício do olhar cínico em Ino que denunciava como ela estava se sentindo. O silêncio perdurou por mais alguns minutos e suspirei aliviada; as expressões continuavam sérias quando comecei a falar.

* * *

  Soltei o ar e atravessei o corredor até a diretoria, por um minuto inteiro imaginei se não estava indo rápido demais e desacelerei meus passos até sentir que parecia apenas uma volta casual pelos corredores.

  Eu mantinha as mãos enfiadas nos bolsos da calça jeans por puro nervosismo assim que passei pela placa apagada e espiei ao redor. Shizune estava sentada em uma das mesas abarrotadas de pastas verdes, o cheiro de peixe foi a segunda coisa que notei quando me aproximei do balcão.

— A Tsunade está aí? — De acordo com Ino, eu devia parecer levemente assustada e agitada, mas não o suficiente para que Shizune pensasse que eu estava a ponto de ter um ataque. Não que ela realmente se compadecesse com qualquer coisa. — Eu preciso falar sobre...

— Dê o fora — a resposta dela foi alta e irritada, ela equilibrava o pedaço de peixe espetado no garfo quando pôs os olhos em mim. — Você é cega, garota? Estou na porcaria do meu horário de almoço, será que...

— É urgente — insisti e olhei nervosa para a saída, esperando que Ino seguisse a parte dela do plano e fizesse Orochimaru se materializar, irritado por não conseguir conter a confusão que a loira deveria causar como distração no refeitório. O problema era que o apito irritante do inspetor não estava ecoando pelo corredor. — Eu... Shizune, eu sei que você pode me ajudar com isso...

— Escuta aqui, Hyuuga: eu não receb... Ah, ótimo! O que é que você quer, Uzumaki? — Ela espalmou as mãos na mesa e inclinou o corpo, os olhos faiscavam em puro ódio e senti que meus dedos ficaram entorpecidos e meus pés pareciam dois membros inúteis, colados no chão. — Não me interessa. Dê o fora.

— Orochimaru está sendo pisoteado lá no refeitório, se isso te interessa. Os guardas precisam ser ordenados — ele fingiu inocência quando piscou na direção de Shizune e observei, ainda presa naquele choque repentino, o rosto dela corar. — Só você pode salvar o dia.

  Shizune alternou o olhar irritado entre nós antes de dar a volta na mesa e se aproximar do balcão, o barulho dos passos duros dela combinava bem com o rosto contorcido naquela carranca mal-humorada e de olhos brilhando em pura fúria. Ela ergueu o dedo indicador e o apontou no meu rosto por um bom tampo até decidir que era a vez de fazer o mesmo com Naruto.

— Se eu descobrir que algum de vocês está metido nisso, eu juro que eu...

— Você vai poder dizer que, graças à sua competência, esse lugar não foi para os ares — a voz rouca do Uzumaki fez Shizune ficar quieta, o sorriso de desafio no rosto dele acentuou as cicatrizes nas bochechas e foi a primeira vez que notei, um pouco assustada, que eu preferia essa versão mais leve e de farpas irônicas. — O tempo está passando, Shizune. Eu prometo que não vou fazer nenhuma estupidez até você voltar.

  Shizune ajeitou as mangas da blusa de lã cinza que usava e endireitou ainda mais a postura.

— Não toquem em nada.

  O aviso dela ecoou tão alto quanto os seus passos, ela levantou o tampo do balcão e o bateu com força antes de passar por nós num trote ritmado e um pouco confiante. A postura provocante e desafiadora de Naruto simplesmente desapareceu assim que ele virou a cabeça e me encarou, os olhos azuis dele ainda me analisavam quando ele disse:

— Você não tem muito tempo até que ela volte. É melhor ir logo — ele me deu as costas e plantou os pés na saída, espiou o corredor por alguns instantes e passei por debaixo do tampo do balcão e comecei a vasculhar nas mesas.

  Eu tentava me concentrar unicamente em encontrar o prontuário com o nome de Sakura, mas uma pequena parte do meu cérebro preferia levantar questionamentos sobre o quanto de amargor havia afetado Naruto e o moldado nessa versão desdenhosa e espinhenta.

  Ele te odeia, lembra? Espiei sobre o ombro e franzi o cenho quando percebi que Naruto continuava ali, vigiando o lugar e não contive a pergunta clássica:

— Por que?

— Você disse alguma coisa? — Parte daquela onda de choque e descrença voltou com força quando percebi que não havia nada além de curiosidade em sua voz. Precisei encarar as pastas com os primeiros nomes escritos à mão e as etiquetas com as numerações extensas quando escutei a sola dos tênis dele arranhando o chão.

— Eu não vejo sentido nisso — reclamei num murmúrio assim que Naruto ficou do outro lado da mesa e vasculhou uma pilha de pastas, ele corria os olhos pelas etiquetas, como se fizesse isso há muito tempo.

— Os novatos ficam nessa mesa — ele explicou e puxou alguns prontuários rapidamente, me inclinei para conseguir ler os nomes e apontei assim que reconheci HARUNO, SAKURA em letras caprichadas na borda. — Você não perdeu a dispensa, não é? — Ele se esforçava em manter os olhos presos na capa verde.

— Eu não sou desastrada, só pra matar a sua curiosidade — resmunguei e tirei a folha dobrada do cós da calça jeans e a estendi. Revirei os olhos quando percebi que ele mal se movia ao pôr os olhos no papel. — Suas articulações ainda funcionam, então só pega logo. — Agitei o papel mais uma vez e o soltei quando Naruto puxou uma borda. — Seria suspeito demais se eu andasse com uma dispensa de solitária na mão.

— Foi inteligente da sua parte escondê-la — o murmúrio dele sabotou qualquer linha de raciocínio na minha cabeça por alguns minutos.

  O silêncio que brotou serviu para estimular a parte de questionamentos na minha cabeça enquanto Naruto pegava um envelope pardo, carimbado com o endereço daqui, com selos e rasgado numa lateral, e o prendia na contracapa do prontuário de Sakura com um clipe de papel, junto com a dispensa.

  Ele ajeitou o prontuário na pilha e passou pela mesa na mesma velocidade; eu passei por debaixo do tampo do balcão e atravessei a saída a tempo de ver que Naruto já havia avançado boa parte do corredor em passadas largas.

  Forcei as minhas pernas o máximo que pude até alcançar o final do corredor e virei à direita, na direção da solitária; ofeguei pelo esforço e diminuí um pouco o ritmo quando reconheci Ino vindo na direção contrária. Sorri em puro alívio quando notei o molho de chaves que tilintava conforme corríamos pelo corredor e as paredes pintadas com aquela faixa cinza davam a sensação de que o lugar era contínuo, infinito.

  Pus as mãos nos joelhos enquanto Ino puxava a chave longa e cromada, a colocava na fechadura de cima da porta de madeira escura e pesada e girava em sentido anti-horário. As dobradiças rangiam quando a loira girou a maçaneta e puxou a porta com força; pulei dentro daquele espaço apertado e abafado e passei os braços por Sakura, e a apertei num abraço.

— O que... — a voz dela era tão confusa quanto sua postura acuada, ela ainda mantinha os braços erguidos e parados ao redor do próprio corpo quando a chacoalhei. — Eu não... — a apertei outra vez e o grito histérico que soltei a fez se encolher quando senti os dedos dela nas minhas costas, como se não soubesse exatamente o que fazer. — Como foi que...

— Tudo o que você precisa saber é que nós temos uma Hinata. — Ino respondeu triunfante. — Vamos dar o fora, garota do capuz. Você precisa de um banho.

— Ela está certa — Sakura murmurou e a risada que rompeu os meus lábios a empolgou um pouco. Passei um braço por seu ombro e sorri ainda mais quando notei que, apesar de todo o receio, Sakura estava alegre por nos ver.


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Notas finais do capítulo

YOOOOO!
Mil perdões, antes de iniciar minhas explicações. As coisas andam muito loucas na minha vida, então peço desculpas pela demora.
Estou me dedicando a NLTM outra vez, e retomarei um ritmo mais constante de atualizações, provavelmente pelas sextas-feiras.
Bom, quis trazer neste capítulo um pouco da relação NaruHina (ainda está bem cru, mas vai ter mais desenvolvimento) e foi delicado escrever pelo ponto de vista da Hinata, porque ela é uma garota que tenta fazer o certo pelo certo, ela tem um senso de justiça que, muitas vezes, não vai condizer com a realidade dela - que considero a principal característica da personalidade dela.
Espero ter conseguido passar isso.
Qualquer dúvida, crítica, sugestão e afins, cá estou.
Até o próximo.
P.S: Agradeço os reviews do capítulo passado, ainda não os respondi. Mals por isso.



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