Mercy escrita por M4r1-ch4n


Capítulo 3
Capítulo 2




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          Hermione mordeu ligeiramente o seu lábio inferior, preocupada; ela realmente não queria chegar ao baile sem um pedaço do seu corpo ou então aparatar em um lugar totalmente desconhecido, mas Ron havia insistido que eles chegariam juntos, exatamente como o bom casal que eram. E ele, como homem, não havia aberto mão de ser o bruxo escolhido para fazer o encantamento.
          - Ron. - a garota tentou convencê-lo pela enésima vez; ela já havia perdido as contas de quantas vezes havia tentado a mesma coisa com diferentes argumentos - Nós podemos aparatar juntos e damos as mãos um para o outro lá. Ninguém vai notar.
          - Não, Hermione. Eu quero fazer isso sozinho. - ele retrucou com uma expressão carrancuda, acirrando os olhos na direção da sua namorada - Você não confia em mim, Mione?
          - Eu confio, Ron. - ela respondeu automaticamente, com um suspiro exasperado que fez uma pequena mecha de cabelo se balançar delicadamente na frente do seu rosto - Mas você está pálido e parecendo tão nervoso que eu poderia fazer para você. Já aparatei com várias pessoas antes e seguir coordenadas não é...
          - Hermione, mas que droga! Eu quero fazer isso e ponto final! - ele elevou a voz e a bruxa instintivamente deu dois passos para trás, assustada com a mudança de humor do ruivo. Desde o dia em que ele havia sido perseguido por utensílios domésticos encantados por Hermione, Ron andava sobressaltado e tentando provar o seu valor a todo custo para a sua namorada.
          - Está bem, então. Quando você quiser. - ela respondeu com uma voz baixa e com calma artificial, entrelaçando seus dedos com os do bruxo quando ele sinalizou para que ela chegasse perto dele. Hermione não falou nada, mas a força que o mais novo dos homens da família Weasley aplicou na sua mão foi quase suficiente para quebrar um dedo antes de Ron efetivamente aparatar.
          A sensação desconfortável do encantamento não passou tão rápido quanto Hermione previra significava que eles haviam, no mínimo, saído de Londres. Aparatar com coordenadas geográficas era bem mais complicado do que para um lugar que se conhecia previamente, e enquanto a bruxa já havia feito isso incontáveis vezes no seu serviço, Ron havia tido pouquíssimas oportunidades para praticar esse tipo de aparatação.
          A primeira coisa que Hermione fez quando sentiu o ar noturno no seu rosto foi desvencilhar-se de Ron, usando as duas mãos para apalpar seu próprio corpo, tentando descobrir se algum pedaço seu teria ficado para trás. Foi com um suspiro de alívio que ela se permitiu relaxar, ouvindo o murmúrio de vozes e o tilintar de copos que significava que eles haviam, efetivamente, chegado ao local do baile do Ministério. Com o canto do olho esquerdo, ela observou Ron; ele parecia positivamente surpreso.
          - Eu... Consegui.
          - Conseguiu.
          - Isso merece uma garrafa inteira de firewhiskey!
          Grunhindo internamente, Hermione praticamente teve de seguir o namorado na direção em que os outros convidados caminhavam. Ron disparou na frente, tão feliz com a descoberta de que ele conseguia aparatar sem esquecer as suas sobrancelhas para trás que ele nem sequer havia percebido que a bruxa não caminhava mais ao seu lado.
          - Homens. Queria ver se eles tivessem de usar salto alto. - a garota murmurou para ninguém em particular, colocando um sorriso no rosto quando uma conhecida sua do Ministério da Magia passou com seu acompanhante. Respirando fundo, ela seguiu o longo caminho que se iniciava após um grande portão de ferro, ondulando suavemente na direção de uma mansão. Era um lugar...
          Estranhamente familiar.
          Os convidados ao lado de Hermione passavam caminhando rápido por ela, ansiosos para se juntarem logo ao baile. Agora que ela se aproximava da imponente construção de dois andares, a bruxa conseguia ouvir música junto com as vozes e gargalhadas ocasionais dos presentes. Olhando para cima, ela notou que a lua não estava em lugar nenhum no céu, mas a mansão parecia brilhar com uma luz própria acolhedora, em um tom de dourado pálido que dava a impressão de que as paredes haviam sido pintadas com ouro.
          O caminho que levava até as portas grandes e ornamentadas da mansão era enfeitado com todo o tipo de flor, o aroma das espécies noturnas sendo carregado pela leve brisa até o nariz da bruxa, que sem perceber começou a classificar por nome e propriedades mágicas cada flor que ela conseguia sentir. No entanto, a sensação de que ela já havia estado ali não a deixava em paz ela tinha certeza de que o Ministério nunca havia organizado um baile ali.
          Passando pelas portas e entregando sua bolsa e echarpe a um elfo-doméstico que lhe cumprimentou com uma mesura profunda, Hermione agradeceu à pequena criatura pelo seu favor antes de seguir pelo longo corredor, enfeitado com um tapete vermelho decorado com listras douradas nas extremidades, parecendo algo digno de ser encontrado em um aposento de um Gryffindor. As paredes tinham um tom de bege mais claro do que o exterior da mansão, enfeitadas por sua vez com pinturas e arranjos florais presos aos suportes das velas que flutuavam no ar.
          Aquelas cores seriam um sinal de conforto para a jovem bruxa, mas elas pareciam erradas ali. Tudo era estranho, desde as flores lá fora até o vermelho e o dourado naquele corredor que desembocava em um grande salão. O local era magnífico, cheio de convidados que dançavam ao ritmo da orquestra que havia sido alocada em um patamar ligeiramente mais alto que o dos convidados, próxima de uma escadaria que subia em uma espiral elegante para o segundo piso da mansão, os degraus da escada que parecia ser de mármore cobertos com o mesmo tapete que cobria o corredor que ela havia acabado de atravessar.
          As paredes estavam ricamente ornamentadas com retrados de bruxos célebres, que pareciam se divertir junto com os presentes; a bruxa conseguia ver uma mesa com uma toalha caríssima cheia de comida, onde diversos convidados se serviam das mais finas iguarias que o Ministério providenciava nos seus bailes anuais. Ela viu o cabelo chamativo e inconfundível de Ron junto à mesa, conversando com Harry e segurando uma taça cheia de um líquido que só poderia ser firewhiskey.
          Ela sorriu com orgulho dos seus amigos; eles estavam particularmente elegantes naquela noite, Harry em especial. Os olhos verdes do garoto-herói eram sinceros e atraíam olhares curiosos de todos, mais do que a sua cicatriz em tempos passados. Seu cabelo moreno, quando devidamente penteado, contribuía para um contraste tão hipnótico que ela não culpava o pequeno grupo de bruxas próximas a Harry por ficarem olhando tão descaradamente para ele.
          No entanto, o sorriso de Hermione desapareceu do seu rosto quando ela ergueu a cabeça e encontrou um grande lustre de cristal preso no teto, com voltas e mais voltas de pequenos suportes transparentes que continham centenas de velas magicamente acesas para iluminar todo o salão. Levando as mãos ao rosto para cobrir a sua boca que havia se escancarado com o peso daquela descoberta, ela de repente descobriu onde estava e porque aquele lugar era tão terrível para ela:
          Mansão Malfoy. Aquela era... A casa dos Malfoy e ela estava justamente na sala onde, anos antes, havia sido torturada sem qualquer piedade por Bellatrix Lestrange. As memórias daquela noite horrível voltaram à sua cabeça em segundos, e, de repente, era como se ela pudesse ver o sorriso insano e maligno de Bellatrix, ouvisse seus próprios gritos tão altos e cheios de angústia, sentisse a dor correndo de novo dentro dela.
          Sem pensar no que estava fazendo, Hermione correu. Desviando dos convidados que riam e dançavam, ela só conseguiu respirar de novo quando estava em uma espécie de sacada do grande salão, aberto para os fundos do terreno e em um nível superior ao do resto da mansão. Sem lua no céu, ela não conseguia ver o que se escondia atrás do prédio, mas seu inconsciente registrou a sombra de pelo menos três construções iguais ao fundo.
          Seus dedos apertaram com força a grade da sacada sobre a qual ela praticamente se dobrou na tentativa de encher seus pulmões de ar, forçando-se a recuperar o controle. O aroma de jasmins chegou até a bruxa, servindo como um calmante natural e aos poucos ela conseguiu controlar sua respiração, apesar do seu coração ainda bater mais rápido do que de costume dentro do seu peito.
          A brisa suave acariciava o rosto da bruxa, que sentia as mechas soltas do seu cabelo serem arrastadas gentilmente para trás pelo vento para depois caírem ao lado das suas orelhas quando o leve soprar cessava. Exalando profundamente, Hermione cruzou os braços sobre a sacada, seu corpo ainda inclinado para a frente e encarando a escuridão dos fundos da mansão.
          Como Ron não havia notado? Ou Harry? Aquele local era maligno, era apenas...
          - Bonito. Apenas bonito... Como eles podem se deixar enganar pela beleza?
          - A beleza, senhorita Granger, é uma das coisas mais perigosas neste mundo. Poucos são aqueles que conseguem resisti-la ou então enxergar através dela.
          A voz calma de Lucius Malfoy assustou Hermione, que se virou imediatamente no seu eixo para encontrar a figura do alto bruxo parada a alguns passos dela, também apoiado contra a sacada. Ele tinha o olhar fixo em um líquido verde-esmeralda que ele fazia balançar suavemente dentro da sua taça, parecendo perdido no movimento hipnótico da bebida antes de voltar seus olhos claros para ela e fazer um cumprimento com a cabeça.
          - Senhorita Granger.
          - Senhor... Malfoy. - ela respondeu, notando com desgosto que sua voz havia saído trêmula. Ela não era mais uma garotinha e detestava quando falava como se fosse uma. Respirando fundo de novo, Hermione moveu sua mão direita na direção de um bolso do lado esquerdo que era magicamente invisível aos olhos de qualquer um, mas grande o suficiente para comportar a sua varinha; ela jamais saía de casa sem ela e depois, a presença de Malfoy em um raio de um quilômetro merecia todo tipo de precaução.
          - Por favor, senhorita Granger. Não insulte minha inteligência. - ele comentou com uma distinta nota de irritação na voz, tomando mais um longo gole da sua bebida - Eu não seria tolo o bastante para atacá-la aqui, em pleno baile do Ministério e com tantas testemunhas lá dentro, sem mencionar a quantidade de aurores profissionais... Ou em treinamento que ocupam o salão.
          Ele indicou o salão principal com um movimento rápido dos seus olhos que imediatamente se concentraram na sua taça. A brisa noturna havia voltado a soprar e brincava com os longos fios dourados do cabelo de Lucius, que havia se posicionado com as suas costas contra o vento. Era difícil para Hermione acreditar que ele parecia sereno e melancólico, apenas. Sem escárnio, nojo ou sem qualquer outra manifestação de desprezo por parte do patriarca dos Malfoy.
          Era quase como se ele fosse outra pessoa.
          A bruxa desceu os olhos lentamente pela figura de Lucius, examinando-o com uma precisão cirúrgica. Os olhos prateados, a face de contornos aristocráticos e o cabelo eram exatamente como Hermione se lembrava. Seus robes pareciam caríssimos, mas ela honestamente não esperava nada de diferente de um Malfoy. 
          No entanto, ela tinha quase certeza de que nunca havia visto o bruxo mais velho em roupas tão formais: além da gola de uma camisa prateada, feita em um tecido que parecia reluzir mesmo sob a pouca luz que incidia na sacada, ela não podia negar que o conjunto de robes que ele havia escolhido era maravilhoso, pretos da cor da noite que cobria os fundos da mansão mas decorado com os punhos em um tom de prateado idêntico ao da camisa, cheio de padrões intrincados e elegantes em preto.           Ele era fechado por três pequenas correntes de prata na frente, o que deixava mobilidade suficiente para que as vestes se abrissem embaixo. Era ideal para as danças, para exibir as calças negras de corte impecável e as botas lustrosas de couro de dragão que definitivamente custavam mais do que Hermione ganhava em um mês.
          Em uma palavra, Lucius Malfoy estava hipnotizante. Talvez a atenção que a sua figura chamava fosse a razão que havia levado o bruxo mais velho a se refugiar na sacada, vazia exceto pelas flores e por Hermione.
          - Senhorita Granger, nunca lhe disseram que não é educado encarar as pessoas?
          A garota ergueu os olhos da barra dos robes de Lucius que ela estivera observando para encontrar o rosto do mesmo, adornado pelo mais leve dos sorrisos, porém notadamente malicioso ou... Será que era diversão aquilo que ela via no rosto do pai do seu antigo rival em Hogwarts?
          Movendo os olhos para um arranjo de jasmins que estava preso logo abaixo da grade da sacada, a bruxa torcia para que ela não tivesse corado como uma adolescente boba.
          - Eu...
          - Está desculpada. - ele cortou o pedido de desculpas que estava prestes a escapar dos lábios da garota, fazendo com ela encarasse-o novamente; seus lábios ainda estavam partidos por causa da sentença que havia ficado incompleta, mas haviam se separado mais ainda com espanto.
          Com um movimento rápido, as últimas gotas do líquido esmeralda foram sorvidas por Lucius, que retirou a varinha dos seus robes e moveu-a silenciosamente, fazendo a taça retornar para o salão e provavelmente para a mesa onde a comida estava disposta.
          - Na verdade, talvez a senhorita é quem deve me desculpar, exatamente pela mesma falta de educação pela qual a repreendi há pouco. Ou então ficamos quites.
          Aquilo havia espantado Hermione em definitivo. Lucius Malfoy estivera... Olhando para ela? Ela, uma simples trouxa, tão odiada por todos aqueles que eram devotos da tese de que somente bruxos de sangue puro deveriam habitar a face da Terra?
          O descrédito no rosto da bruxa foi tão claro que fez o bruxo dar uma curta e leve risada, praticamente sem abrir a boca para tanto. O homem alto e loiro deu dois passos para a frente, fazendo uma mesura complicada e de origem definitivamente nobre para Hermione, tomando a mão dela em seguida e aproximando seu rosto dos dedos da bruxa a ponto dela sentir a respiração cálida de Lucius contra a sua pele.
          Era um típico cumprimento aristocrático; ela sabia que no mundo mágico, bem como no trouxa, um homem cumprimentava uma mulher tomando-lhe a mão e beijando a mesma. Mas não era propriamente um beijo, como se supunha vendo filmes ou então lendo os mais variados contos; era exatamente o que Lucius havia feito, chegando perto o bastante para tocar a mão de Hermione com os lábios se assim desejasse, mas afastando-se logo em seguida.
          Sem entender nada do que estava acontecendo, ela notou então que Lucius tinha o mais estranho dos brilhos nos seus olhos: não era ódio, desprezo ou uma vontade selvagem de matar alguém.... E não saber classificar alguma coisa deixava Hermione inquieta.
          - Está muito atraente hoje, senhorita Granger.
          O cumprimento explícito de Lucius quase fez Hermione sacar sua varinha e lançar um feitiço qualquer para que aquele impostor revelasse a sua forma, porque não era possível que o alto e loiro bruxo à sua frente fosse de fato Malfoy; aquilo era tão improvável quanto Hagrid decidindo criar apenas um inofensivo gato persa como bichinho de estimação ou Snape dançando rumba, estivesse o antigo professor de Poções vivo.
          A bruxa trajava um longo vestido vermelho escuro, próximo da cor do vinho. Ele era de veludo e tinha um decote modesto, que cobria boa parte do seu busto e expunha mais o seu pescoço e costas, já que era um modelo frente única. A echarpe que ela havia deixado com um elfo-doméstico ao chegar era a responsável por cobrir o decote atrás, que ia até o final das suas costas.
          Uma linha dourada bem fina circundava o veludo na altura da cintura de Hermione, descendo e se dividindo depois em duas outras linhas da mesma espessura que iam até o chão, onde terminava o vestido. Cada linha era o limite de uma fenda comportada, que se abria pouco antes do joelho esquerdo da bruxa e só era vista quando ela dançava ou então dava passos largos demais.
          Seu cabelo estava preso em um coque, a única forma de domar seu cabelo em algo que diminuísse o volume dele. Fora isso, duas mechas cacheadas haviam sido deixadas livres, mas tratadas com um produto mágico especial que impedia que elas armassem ou então enrolassem demais. Assim sendo, as duas mechas passavam ligeiramente do rosto da bruxa em matéria de cumprimento, que poderia colocá-las atrás das orelhas se elas atrapalhassem demais.
          O espelho do seu quarto havia concordado com Lucius Malfoy; ela nunca ouvira um elogio tão sincero do seu reflexo encantado, mas não havia acreditado muito nas palavras do objeto quando Ron mal olhou para ela na sala, andando de um lado para o outro e recitando as coordenadas do baile daquela noite como se fosse um mantra.
          -...Obrigada, senhor Malfoy. - ela agradeceu depois de alguma hesitação, vendo os olhos do outro se fecharem junto com um breve meneio de cabeça em sinal de que ele havia escutado a garota.
          O silêncio que se abateu sobre eles pareceu estranhamente pesado para a bruxa. Antes, quando ambos haviam trocado cumprimentos e apenas se observado em silêncio, Hermione havia agido de alguma forma, mesmo que com receio ou alguma vergonha. Agora, ela simplesmente não sabia o que fazer ou dizer na presença do bruxo mais velho.
          E silêncio era algo que Hermione não conseguia tolerar muito bem. Trocando o peso do seu corpo para a outra perna, a bruxa deixou de se apoiar contra a grade da sacada e virou na direção do alto homem loiro, examinando-o com curiosidade antes de perguntar:
          - O quê aconteceu com a sua casa, senhor Malfoy?
          Era uma pergunta neutra, ela supunha. Por mais que ela estivesse se remoendo de curiosidade por dentro a respeito dos anos anteriores quando os Malfoy haviam desaparecido do mapa, ela não tinha vontade de descobrir que conseqüências esperavam por ela no caso dela verbalizar suas dúvidas. Lucius Malfoy tinha a fama de arrogante e intolerante quando questionado sobre seus atos ou passado, e embora ele estivesse se mantendo cordial até aquele momento, não queria dizer que ele não reverteria ao seu antigo modus operandi se ela falasse algo errado.
          Lucius deixou seu olhar descansar sobre a garota, ficando em silêncio por alguns momentos que pareceram uma eternidade para Hermione. Os seus lábios se contraíram em uma fina linha por segundos, o gesto quase sendo perdido pela bruxa antes que ele falasse:
          - Minha casa?
          - Mansão, senhor Malfoy. - ela se apressou em corrigir, perdendo uma expressão de puro divertimento no rosto do outro.
          - Casa ou mansão, pouco importa. - ele respondeu com uma face impassiva, mas a sua voz traía alguma emoção: uma espécie de sarcasmo ou amargor - A propriedade deste imóvel não me pertence mais.
          Ela então se lembrou da notícia que havia lido no Profeta Diário a respeito de Draco: ele havia falado ao jornal da sua residência em Londres. Londres. Se ela bem lembrava, a Mansão Malfoy ficava em Wiltshire, logo... Draco não morava mais com os pais ou então os Malfoy haviam perdido a mansão? O quê havia acontecido naqueles anos após a guerra, afinal?
          - Me surpreende que tenha reconhecido a mansão, senhorita Granger. Os esforços do Ministério em remover qualquer característica que pudesse remeter aos Malfoy foram imensos. - o bruxo loiro comentou com uma acidez corrosiva na sua voz e um sorriso cínico nos lábios, uma atitude bem mais parecida com as do antigo Lucius que Hermione tinha nas suas memórias.
          - Eu notei. - ela respondeu, olhando para as paredes e erguendo a cabeça - As paredes, a decoração, as flores... Tudo foi trocado.
          - As flores sempre existiram.
          Hermione se virou na direção do outro, erguendo uma sobrancelha castanha delicadamente mas ficando em silêncio, no entanto. Lucius abriu um sorriso que poderia ser classificado como maligno, se não fosse pela ausência de qualquer intenção vil nos seus olhos.
          - Está vendo aquelas sombras? - ele perguntou, gesticulando com o braço direito para a escuridão atrás deles onde a bruxa podia distinguir três formas idênticas, com o teto em forma arredondada. As três construções eram eqüidistantes umas das outras - São estufas.
          - Estufas? - a jovem repetiu com espanto, piscando e se aproximando de onde o alto bruxo se encontrava, parando a alguns passos dele e se inclinando para a frente, forçando os olhos como se quisesse ver dentro das supostas estufas - O quê existe lá?
          - Eu não sei o que o Ministério mantém lá dentro ou se elas ainda funcionam, mas não era assim antes. - ele comentou e Hermione de repente se deu conta que não só havia virado as costas para Lucius como também havia se debruçado sobre a grade. Lembrando das palavras de Mad-Eye Moody, ela se repreendeu mentalmente e rapidamente girou no próprio eixo, preferindo ficar apoiada contra a grade e ter Malfoy nas suas costas.
          - Não suponho que cultivavam rosas ou violetas. - a garota acrescentou com sarcasmo, olhando com o canto do olho para a única estufa que conseguia ver da sua nova posição, surpreendendo-se com o riso de Lucius novamente.
          - Não apenas. Severus era um amigo próximo, como você bem deve saber. - ele comentou com uma voz neutra, e Hermione pensou se alguma vez o antigo professor havia falado da sua fama de sabe-tudo. Ou então talvez Draco tivesse feito esse favor? - Aquela estufa era dele. Ele costumava plantar e fazer experimentos ali dentro.
          A fim de apontar justamente a terceira estufa que a bruxa enxergava de onde se encontrava, foi o alto bruxo loiro quem deu alguns passos para a frente e indicou a construção. Foi naquela hora que Ron, depois de mais doses de firewhiskey do que ele conseguia lembrar, entrou cambaleando na varanda, arregalando os olhos quando viu alguém inclinado sobre a sua namorada.
          - Mione! - ele exclamou com a voz pastosa, denunciando o quanto ele havia bebido. Os dois presentes na sacada se separaram em segundos, Hermione arregalando os olhos e morrendo de vergonha ao mesmo tempo, enquanto Lucius manteve-se praticamente impassivo, uma mera expressão de desdém no rosto.
          - Weasley. Eu não deveria esperar por melhores maneiras de você, mesmo.
          - Malfoy?
          O bruxo mais novo havia praticamente gritado o nome do antigo dono da mansão, cuspindo no chão logo em seguida enquanto ele retirava a sua varinha de um dos bolsos da sua roupa. Hermione viu o gesto e correu na direção do namorado, que se apoiou contra uma coluna e lançou um feitiço rapidamente contra o outro homem:
          - Estupefaça!
          Um jorro de fagulhas vermelhas saiu da varinha de Ron e atingiu Lucius no peito com força, arremessando o outro homem sobre a grade da sacada e jogando-o no piso inferior da mansão. Horrorizada, Hermione levou as mãos ao rosto, pegando a própria varinha e apontando na direção de Ron, lançando um feitiço que deixou-o calado, com um zíper na frente da sua boca.
          - Ronald Weasley, você é um idiota! - ela gritou, marchando por entre os curiosos que já haviam se aglomerado na porta da varanda ou haviam invadido a mesma pela outra porta que dava acesso aquela área. O salto das suas sandálias batia contra o piso magistralmente encerado da mansão até ela chegar ao tapete do corredor, onde encontrou o mesmo elfo-doméstico de antes.
          - O senhor Malfoy acabou de ser estuporado pelo meu namorado idiota. Estou indo reanimá-lo lá fora, mas por favor comunique isso a alguém.
          - Sim, senhorita!
          O elfo desapareceu no mesmo instante em que Hermione sumiu pela porta principal da mansão, perguntando a si mesma pela enésima vez porque diabos ela namorava Ronald Weasley ou porque ele tinha de agir como se tivesse a inteligência de uma minhoca.
          E ela não tinha certeza se aquilo não era insultar as minhocas indiretamente.



Continua...


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