A voz hostil de Mikey me avisou de que estava atrasado para o trabalho novamente - como se eu não soubesse - e me repreendeu várias vezes. Trabalho de bico na padaria que meu pai tem há uns cinco anos para poder arcar com os gastos da minha faculdade. O foda é que eu sou o irmão mais velho e meu pai teve coragem de colocar o Mikey de gerente no lugar dele enquanto viaja. Eu não sou tão irresponsável, sou?

-De novo Gerard?! Atrasado de novo? -ele disse me puxando para trás do balcão -Você não tem responsabilidade?

-Até parece que você é meu pai! -eu disse revirando os olhos impaciente. 

-Você sabe muito bem o que o pai diria sobre seus atrasos contínuos... Eu estou sendo muito bonzinho e você sabe disso... -argumentou indo para o caixa -Tome cuidado. -ameaçou. 

-Que medo... -roí as unhas fingindo estar amedrontado -Minha vida é uma merda. Desculpe por não ser como você. -provoquei -A mãe me pediu pra ajudar ela com as compras por isso eu atrasei Mikey e...

-Cala a boca e vai atender os clientes Gerard. -disse sério -Não quero saber de você atrasado e reclamando da mãe. O pai tá viajando por causa da nossa tia doente e é natural que você tenha que ajudar ela. Agora vai e não enche o saco. 

-Eu mereço... -juntei as mãos como se fosse rezar. 

Depois de alguns minutos, uma mulher de cabelos negros e curtos entrou na loja e ficou olhando alguns salgados. Passou para a vitrine de frios e por fim parou em minha frente, na vitrine de doces. 

-Olá, posso te ajudar? -perguntei com um sorriso falso nos lábios. 

A senhora perguntou qual bolo era menos calórico porque disse que estava querendo entrar numa dieta, mas por fim acabou levando um bolo de brigadeiro alegando que era para a filha pequena, não foi convincente. Pedidos como esses me divertiam. Mulheres planejando entrar em uma dieta comprando bolos de chocolate, com creme e cobertura não eram exatamente coesas. Assim como as pessoas que compravam um Big Mac no Mc Donald's, juntamente com uma Coca Diet. E quem na Terra entra em uma padaria e fica babando em doces quando estão tentando controlar seu peso?

-Obrigada, meu filho. -disse pegando a bandeja do bolo. 

-Tenha um bom dia. -ofereci mordendo o lábio. Eu odeio quando alguém me chama de "filho", mesmo minha mãe. 

É quase onze da manhã e isso significa um monte de mães e criancinhas gritando. As crianças vão pedir um monte de coisas, as mães vão negá-los e eles começarão a chorar. No final da tarde, avós virão com estas mesmas crianças, seus netos, e as senhoras irão comprar um monte de coisas para agradar as crianças. Brendon que ficava na seção de pães - a mais movimentada - era o que mais sofria. As senhoras já não tinham audição perfeita e ele tinha que repetir os preços um monte de vezes. Sextas-feiras eram uma merda, como a minha vida. 

Uma da tarde era o horário de saída de um colégio aqui perto, bem no horário em que só eu e Brendon ficamos no comando. Mikey saía para almoçar junto de William e Adam. Spencer ficava trabalhando na parte de trás, na produção com Jon. Quando os alunos chegavam, eu tentava fazer contato visual com todas as meninas bonitas e confesso, eu achava alguns meninos bem atraentes... Enfim, eu sorria para todos que me interessavam e os atendia muito bem. 

Até três semanas atrás, eu não ficaria olhando o relógio pelo menos dez vezes a cada cinco minutos. Às duas horas de todas terças, quintas e sextas, minha namorada iria lá depois da aula. Esse horário era o do meu almoço, portanto eu ficava com ela uma hora, uma hora e meia no máximo se meu pai estivesse de bom humor. Eu almoçava rápido, em uns quinze minutos, nos fundos do estabelecimento, enquanto ela falava de como foi à aula, de como estava aborrecida com os pais, de como detestava ter que estudar para física... E de vez em quando, pedia para que eu a ajudasse com alguma matéria que ela não entendia. Depois íamos para a rua e ficávamos brincando e nos beijando, como todos os casais fazem. 

Lyn ficava lá até o meu intervalo acabar, as três. Depois ia para casa e me ligava por volta das sete, quando fechávamos a padaria. Mas aquela sexta era diferente, nós havíamos terminado. Diga-se ela terminou comigo por motivos que eu ainda desconheço. Quer saber? Foda-se, ela não é a única pessoa que pode me satisfazer amorosamente falando. Bem, na verdade eu nunca AMEI ela, eu gostava muito dela, mas voltando... O som da porta se abrindo chamou minha atenção puxando-me para longe de seus pensamentos. 

Eu não teria feito uma cara tão idiota se o cara não fosse tão lindo. Sério, acho que até o Will que estava lá nos fundos percebeu que eu fiquei babando no cara. 

Ele estava vestindo com uma camiseta preta do Black Flag, uma calça jeans apertada de lavagem escura e uns tênis cinza muito cool. O cabelo dele era castanho escuro caindo sobre os olhos cor de avelã e o rosto um tanto pálido. Tinha traços finos, quase infantis. E os lábios dele eram vermelhos como a cereja do bolo que ele estava olhando, se seus lábios fossem doces como eu imaginava... 

Fiquei encarando-o algumas vezes. Ele ficou calado, olhando para os bolos em exposição na geladeira embaixo do balcão. O sorriso bobo no rosto dele o faz parecer uma criança que estava em... Bem, uma padaria. 

-Posso te ajudar? -perguntei hipnotizado pelo sorriso dele e sorri de um modo mais babaca do que o normal, como faria com um cliente qualquer. 

-Ah, sim -ele balançou a cabeça afirmando -Eu vim para pegar um... Bolo de laranja?

-Por que você diz isso como se fosse uma pergunta?

-Porque eu esqueci completamente o nome... Quem costuma vir aqui é a minha mãe sabe... Mas ela acabou atrasando e eu tive que vir buscar. -e ele sorriu de novo fazendo-me esquecer-me de como meu trabalho devia ser feito. 

-Qual o nome da sua mãe? -Brendon veio intervir vindo do outro balcão que estava vazio percebendo os meus problemas óbvios. 

-Linda Iero. -respondeu sorrindo de novo. 

Eu suspirei agradecendo Brendon silenciosamente. Eu me lembrava da mãe dele. Era uma senhora de quarenta e poucos anos que sempre pedia um monte de biscoitos e bolos diferentes, dizendo que eles eram para seu filho. Pelo visto, o menino devia ser uma formiga ambulante, embora seu corpo fosse bem magrinho, o que contradizia a teoria de ele comer todos os doces sozinho como a mulher falava. Linda já havia comentado que eu e o filho dela deveríamos ter a mesma idade, mas com toda a certeza eu era mais velho do que ele, visto que eu aparentava bem menos idade do que eu realmente tinha o que era uma merda às vezes, já que eu tinha cara de 17 anos quando tinha 22. 

-Aqui está o seu pedido, sim. -sorri mostrando-lhe o bolo e cutucando Brendon para voltar ao seu posto. Ele revirou os olhos e saiu sem dizer nada -O nome do bolo é Clockwork Orange e desculpe pelo trocadilho com o nome do doce, quem os batiza é o Spencer, nosso padeiro e ele é meio doidinho, não bate bem das ideias. -ri.

-Eu escutei isso bastardo! -a voz de Spencer se formou logo atrás da porta de plástico fazendo o garoto à minha frente gargalhar. 

-Clockwork é um bom filme... E o bolo me parece bom. -o garoto disse. 

-Graças ao nosso mestre padeiro, nosso herói. -gargalhei. 

-Diga pra ele que eu acho que ele é incrível. Vocês têm os melhores doces que eu já comi... Os melhores salgados e os melhores cookies também. -disse animado. 

-Eu vou. -disse a ele -Ah, a Sra. Iero normalmente leva bolinhos com suas entregas... Você vai querer?

-Sim! Eu estava quase me esquecendo deles! -sorriu batendo a mão em sua própria testa, punindo-se divertidamente -Ainda bem que você lembrou... Minha mãe me mataria se eu não levasse. Ela ama esses bolinhos... Pode ser metade de baunilha e metade de chocolate?

-Claro! -eu disse a abaixando para pegá-los -Aqui está. Você tem que pagar com aquele cara magrelo... -sorri apontando para Mikey. 

-Você pode falar com o seu chefe assim? -perguntou com uma cara engraçada e curiosa. 

-Ah, claro... Ele é meu irmão. -assenti encarando Mikey com uma expressão de dúvida. 

-Ah tá... Nossa! Vocês não se parecem em nada... -riu olhando para mim e Mikey repetidamente -Tchau! -acenou com as mãos. 

-Tchau! -respondi suspirando e cruzando os braços, os encostando na vitrine. 

Eu simplesmente não conseguia tirar os olhos do cara mesmo quando ele pagava por suas encomendas. Quando ele estava saindo, ele ainda me sorriu de novo e eu quase derreti. Nossa ele era tão gato e tinha uns lábios tão convidativos e imagina o que ele podia fazer com aquela boca e...

-Terra para Gerard! -disse William -E eu que pensei que você estava muito triste por causa do fim do seu namoro com Lyn para voltar a flertar com outras pessoas... Que inocente eu sou. Acho que estava errado...

-Não seja idiota, eu não estava flertando com ele! -respondi mal-humorado. 

-Sim, você estava! -Spencer entrou na conversa enfiando a cabeça para fora através do vão de onde ele colocava pães frescos -E ele era um fofo! 

-Ele me pediu para te falar que você faz os melhores doces que ele já comeu. -eu disse tentando cortar aquela conversa. 

-Ah, tá vendo? Uma gracinha. Pergunte a Sra. Iero sobre quando ele vem de novo, sim? -o padeiro disse sorrindo.

-Eu não estou interessado. -declarei categoricamente. 

-Você mal conseguiu atender ele! -William falou rindo -Keep on man!

-Eu podia jurar que você sempre curtiu garotos maninho... Mas depois desse eu tenho certeza. -Mikey se intrometeu -Agora é a hora de começar com homens... -Mikey deu seu conselho totalmente dispensável com uma espécie de sorriso ainda no rosto -Nós todos queremos o melhor para você, você sabe.

-Ele não é meu tipo de cara de qualquer maneira... Ele parece ser um filhinho da mamãe. -respondi cruzando os braços. Então todos riram baixinho. 

-O filhinho da mamãe que tirou a sua capacidade de falar e de pensar. -William disse por fim.

Então eles voltaram seu foco para seus respectivos trabalhos quando uma mulher com três filhos pequenos entrou na loja.