Ensina-me a Viver escrita por Graziele


Capítulo 8
A Procura de Emprego


Notas iniciais do capítulo

Big thanks to: sheilaalves, lecullen, bonno, Ruthmasen,LoveDimka, Labap, iarinha_tp, lay_mimosinha, Stefannymarie, Elinha, ivis.



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- Bella, você sabe quando que o senhor Marks vai vir buscar aquelas flores...? – a voz fina de Alice Brandon ia sumindo dos ouvidos de Isabella.

Naquela segunda, ela tentava a todo custo, se concentrar em alguma coisa na sua floricultura, mas era um trabalho árduo.

As lembranças do dia anterior ainda estavam mais vívidas do que ela queria. Era como se, toda vez que pensasse no soldado, a avalanche de memórias a afligisse, fazendo tremores estranhamente bem vindos passarem por seu corpo.

Depois daquele episódio embaraçoso na calçada, Bella entrara em casa como um furacão, com vergonha até de pensar em encarar o soldado. Tudo bem que ainda tinha o fator de que fora ele mesmo que começara a palhaçada de beijá-la, mas, ainda assim, tudo era novo demais para ela conseguir digerir.

As sensações, os pensamentos e tudo que sentira naquele simples roçar de lábios estavam além de alguma maldita explicação que ela pudesse encontrar. Não fora uma explosão de sentimentos, mas fora intenso demais para sua própria sanidade mental.

Jesus! Ela não podia ter deixado aquele homem ter tamanha intimidade com ela!

O por quê? Bem, talvez fosse simples: ele era inglês. Ele estava tentando matá-la no primeiro momento. Ele nem devia estar dentro da sua casa. Ele iria trazer complicações para sua vida.

Mas que inferno! Desde quando ela se tornara tão imoral a ponto de deixar um homem fazer tal coisa com ela? E se alguém tivesse visto? O que ela iria inventar? Sim, porque, se alguém tivesse visto os dois, ela não teria coragem de dizer que o inglês era primo de sua mãe. Sua situação ficaria ainda mais embaraçosa.

Oh, meu Deus! Ela iria pro inferno se continuasse a agir daquele jeito.

Ainda tinha a questão má resolvida das ‘aulas de alemão’. Com que cara ela iria encará-la depois daquilo, senhor?

O soldado não parecia ter se incomodado tanto quanto ela. Porque ele entrara na casa com a expressão mais animada que fosse possível. Os olhos esmeraldinos e brilhantes dele estavam mais claros do que nunca, e aquela sombra preta que habitava os mesmos orbes parecia ter desaparecido.

Bella, contudo, adorava vê-lo sorrindo. Ele já era um pecado de homem e quando sua face assumia um tom brincalhão – quase malicioso – aqueles lábios vermelhos se curvavam num bonito sorriso ele ficava simplesmente... Irresistível.

- Isabella! – um grito estridente perfurou-lhe os ouvidos, fazendo-a praticamente pular de susto.

- Por Deus! – Bella arfou, com as mãos no coração, sentindo o bater frenético do mesmo. – Quer me matar, mulher? – Completou com indignação desviando o rosto e encarando a balcão enquanto normalizava a respiração.

- Pelo amor de Deus, Bella! – Alice reclamou jogando as mãos para o ar, num sinal claro de exasperação. – Aonde é que você estava? – Bella já ia abrir a boca pra dar uma resposta engraçadinha, quando Alice levantou um dedo, pedindo para que a amiga se calasse. Um sorriso nos lábios já indicando que sairia besteira. – Eu acho que você estava a quatro quadras daqui, na Rua Frieden... Mas especificamente em sua casa, e mais especificamente dentro do seu quarto com certo inglês...

- Alice! – Isabella ralhou corando de imediato.

- O que foi? – Alice perguntou inocentemente, mas Bella ainda via a sombra maliciosa no rosto dela.

- Você fala desse jeito e me deixa parecendo uma meretriz. – Isabella explanou, fitando os orbes azuis da amiga.

- Bella, eu não falei pensando nisso! – A jovem Brandon falou, numa indignação muito bem fingida. – Jesus, eu estava me referindo a sua evidente preocupação com o soldado!

Bella se limitou apenas em assentir, mas ainda sem esconder o sorriso de divertimento.

Alice – mesmo quando era insuportavelmente irritante – conseguia deixá-la de bom humor. Quando a mãe de Bella morrera daquela forma tão brutal, deixando a menina e o pai desolados, fora Alice – juntamente com o Doutor Parkers – que a fizera se reerguer e encarar a vida de novo. E quando a morte se instalou novamente na família Swan – dessa vez se abatendo sobre pai de Bella – fora novamente Alice quem a consolou.

Isabella sempre fora muito forte. Porém, o apoio recebido de Alice fora imprescindível para que Bella não se entregasse à dor, ao ver as duas pessoas mais importantes de sua vida mortas de maneiras tão distintas, mas igualmente assombrosas.

As duas se conheciam desde o nascimento e sempre foram muito juntas em tudo. Desde os roubos de frutas nas propriedades vizinhas, até as traquinagens de espalhar neve na rua para que os entregadores de leite escorregassem e deixassem o leite a mercê das duas, que os furtavam e bebiam tudo até vomitarem.

Alice sempre fora mais... ‘moleca’ do que Bella. Era a mais destemida da gangue infantil em que eram membros e sempre comandava as travessuras. Bella, por outro lado, morria de medo de ser pega pelos adultos e quase nunca participava do ato. Com a desculpa de que servia mais como ‘controladora da missão’, ficava de fora na vigia.

E as travessuras eram verdadeiras operações de guerra.

Se algum adulto chegava perto, Bella gritava algum tipo de código e logo todas as outras crianças maltrapilhas e desengonçadas saiam correndo da propriedade que estava sendo invadida com as frutas roubadas em questão transbordando pelas roupas sujas.

Mas isso fora há mais de onze, quando as duas ainda eram duas menininhas de nove anos, correndo desembestadas pelas ruas de Nagold.

Elas cresceram, porém a amizade continuara a mesma. Inabalável.

Dividiam medos, risadas, segredos e a floricultura.

Alice Brandon crescera numa família humilde e muito simples. Sua mãe lavava roupas para outras pessoas em troca de algum dinheiro e seu pai tinha uma loja de tecidos – que fora vendida logo após sua morte pela mãe de Alice, para que a filha pudesse começar a investir em sua floricultura.

Bella, por sua vez, crescera também numa família humilde, ainda mais do que a de Alice. Seu pai tinha um carrinho cheio de tinta, das mais diversas cores, que o auxiliava quando ele saía para pintar casas, ou estabelecimentos das outras pessoas. A mãe de Bella tinha um grave problema na coluna que não a deixava trabalhar fora, mas ela sempre ajudou o marido fazendo bordados para fora.

- Bella! Pelo amor de Deus! – Alice lamentou novamente, fazendo Isabella se encolher e se retirar de seus pensamentos nostálgicos. – Preste atenção, ou essa floricultura fechará as portas mais cedo do que prevermos!

Bella suspirou para o drama desnecessário que a amiga fazia e, por fim, se virou para ela com os olhos cerrados.

- Tudo bem, Alice – rendeu-se. – O que você queria saber mesmo?

Alice rolou os olhos, e jogou as mãos para o ar, pedindo por paciência.

- Esqueça. Vou me virar sozinha. – Falou por fim, fazendo um gesto displicente com as mãos.

Bella bufou e foi para o outro lado da bonita floricultura, e se pôs a organizar as flores do campo que ali jaziam.

- Sabe...  – Alice começou novamente, dessa vez andando na direção de Bella. – Como vão as aulas com o soldado?

Bella, no primeiro momento, franziu o cenho completamente confusa. Mas que a raio de aula Alice se referia...? Ah, sim! As aulas de alemão...

- Não vão – admitiu Bella, com um sorriso amarelo. – Ainda nem comecei a ensiná-lo. – Isabella não mencionou a aula “desastrosa” do dia anterior, pois estava resignada a varrer aquele acontecimento de sua memória.

Alice rolou os olhos novamente.

- Desse jeito, ele vai conseguir muito o emprego.

- Ora, Allie, você fala como se fosse fácil! – Bella lamuriou, largando as flores e encarando a amiga. – Não tem como eu ensinar um homem a falar alemão em dois tempos! E, também, se ele não conseguir o emprego com o tal Whitlock, ele arruma outro.

- E com quem? – Alice levantou um sobrancelha, desafiadora. – Ele não tem nenhum documento, e essa oportunidade com o Whitlock não pode ser desperdiçada, porque, lá, ninguém vai querer saber dos antecedentes dele.

- Que seja – Bella murmurou. – Fala pro seu amigo esperar mais algumas semanas, para que eu possa tentar ensinar alguma coisa pro soldado.

- Ótimo – Alice balançou a cabeça positivamente, aprovando. – Depois, é só ele pegar qualquer trem e sumir da sua vida, levando as complicações junto.

Estranhamente, Bella não gostou do jeito que Alice se referiu ao soldado. Ele nem era tão ruim assim. Tudo bem que tinha a maldita história dele ser do país inimigo e blábláblá... Mas, poxa, alguém que ficava tão feliz apenas por comer alguns doces não podia ser alguém do mau.

Porém, Isabella logo balançou a cabeça, espantando aqueles pensamentos, porque os doces lembravam-na do dia anterior.

E ela não precisava de nenhum lembrete para recordar-se de como gostara daquilo.

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Um mês  depois.

As aulas de alemão foram bem sucedidas, afinal.

Surpreendendo a todos, Edward se mostrara um bom aluno. E – ironicamente – em dois tempos, já dominava quase toda a língua falada no país. E, não, ele nunca mais tentara aquela palhaçada de beijar Isabella. E ela agradecia por isso, porque, caso aquilo se repetisse, não teria mais desculpa nenhuma para ficar em silêncio, já que Edward agora conseguia se comunicar.

Entretanto, pra ele conseguir entender, era preciso falar lentamente e ter a mesma paciência para esperar que ele conseguisse responder.

Mas Isabella sabia que era só uma questão de tempo até ele começar a falar tudo.

Falando dessa forma, a alemã tinha, novamente, a sensação de estar falando de um filho. Ora, ela estava parecendo mais uma mãe orgulhosa de um filho que proferia as primeiras palavras.

Bufando, Bella terminou de arrumar a mesa de madeira, colocando a jarra de suco no meio da mesma. Ela e o soldado costumavam comer na mesa, agora que ele já podia andar e se comunicar.

Logo depois, Edward descia as escadas usando a última peça de roupa restante das que Alice comprara pra ele. Bella não sabia aonde ele tinha enfiado as roupas sujas, mas tinha a vaga desconfiança de que ele as escondera para que Bella não as lavasse. Orgulho masculino, talvez?

Só por essas mínimas coisas Bella já podia dizer que ele era uma boa pessoa. Se ele fosse alguém que queria se aproveitar de sua bondade, já teria enfiado as roupas sujas no meio das dela para que Bella as lavasse.

E, também, alguém com más intenções jamais olharia fundo nos olhos de Bella como ele sempre fazia.

Quando o soldado sentiu o cheiro da macarronada um belo e espontâneo sorriso surgiu naqueles lábios vermelhos. Bella não teve como não retribuir.

- Eu gosto disso – ele sussurrou, ainda com um forte sotaque... Que o deixava muito mais charmoso.

- Bom saber que acertei, então – a alemã acalentou, colocando a tigela com o macarrão em cima da mesa.

O soldado colocou a bengala – que ainda o auxiliava – ao lado do balcão da pia e se sentou, ainda com certa dificuldade, por conta das queimaduras ainda não curadas que lhe adornavam o quadril.

- Você sempre acerta. – Ele comentou, fazendo Bella corar de imediato.

Bella pegou o prato com flores roxas e colocou o macarrão, depositando o mesmo na frente de Edward, que o atacou como se aquilo fosse a última comida do mundo.

Bella riu enquanto se servia também.

- Não precisa comer tudo como se não houvesse amanhã, soldado – ela brincou. – Tem mais aqui. – Completou, com uma sobrancelha arqueada, gesticulando para a tigela de macarrão.

Edward riu também, diminuindo o ritmo das garfadas.

Um silêncio confortável se instalou. O único barulho que o violava era o tinir dos garfos contra os pratos de louça.

Edward estava concentrado na comida, saboreando com gana. Ele se lembrava de comer macarronada há muito tempo atrás, quando a mesma era feita pela sua mãe, mas há tanto não se recordava do gosto. E duvidava seriamente que existisse alguém que fizesse comida melhor do que sua alemã.

- Obrigado – ele sussurrou, servindo-se de mais comida.

A alemã franziu o cenho, levando um garfo até a boca deliberadamente.

- Por...? – ela incitou.

- Por tudo. – O soldado respondeu simplesmente, largando o garfo e encarando os orbes castanhos dela. – Por me abrigar, por cuidar dos meus ferimentos, por me dar comida, por não me entregar ao governo...

- Não há de quê – a alemã respondeu dando os ombros.

Edward bufou, mas ainda sem desviar os olhos dos dela.

- Você fala como se não fosse grande coisa. Eu sou de um país inimigo do seu e estava tentando te matar no primeiro momento.

- Mas não conscientemente – ela lembrou, ainda fascinada por aqueles olhos verdes tão lindos e brilhantes. – Te obrigaram àquilo, não é?

- Eu estava lá pra matar todos os inimigos. – Bella estremeceu com o tom baixo que o soldado usou. – E isso incluía seu país. Devia me odiar.

- Não sou patriótica. – Bella respondeu, com um lampejo de sorriso. – A única coisa que nos difere é um pedaço de mar e o idioma.

Edward suspirou. A moça até que tinha argumentos bons para rebater.

- Você não tem traços alemães – ele observou, mudando de assunto.

- Meu pai não era alemão – Bella respondeu, desviando os olhos do olhar dele e voltando sua atenção para a comida. – Puxei mais a ele.

- E ele era o quê? – Edward perguntou, parecendo realmente interessado.

- Americano. – Isabella respondeu, dando os ombros novamente.

Edward riu, deixando Bella com a testa franzida em confusão.

- Por que está rindo?

- Nada é que... Parece que sua mãe também não era muito patriótica, porque os Estados Unidos também estão querendo acabar com seu país.

Bella sorriu também, maneando a cabeça em concordância.

- Ninguém escolhe quem vai amar. – Ela comentou, logo se arrependendo. Outro tipo de silêncio, com a aura mais pesada, se instalou e ela arriscou um olhar de esguelha para o soldado, encontrando-o com um sorriso discreto e com os olhos verdes sombreados numa coisa que Bella não soube distinguir.

- É – ele concordou por fim, voltando a comer. – Ninguém escolhe.

Os dois voltaram a comer em silêncio, sem se encarar.

- Huh... – Bella começou, vendo a oportunidade perfeita para falar do emprego com Jasper. – Eu... Meio que... Arrumei um emprego pra você. – Disse, com um sorriso amarelo.

O soldado franziu o cenho, com os olhos esmeraldinos completamente confusos.

Perguntava-se aonde e como a alemã tinha conseguido o tal emprego e já ia perguntar, mas parou de súbito ao perceber que falava inglês. Abanando a cabeça, começou do começo de forma mais lenta do que gostaria:

- Como você conseguiu?

A alemã levantou-se da mesa, pegando seu prato e dando a volta pra pegar o do soldado. Ela se inclinou mais do que o necessário, inebriando Edward com o perfume de flores do campo que ela exalava.

- Um amigo da minha melhor amiga trabalha numa construção e precisa de ajudantes.

- Oh – Edward murmurou simplesmente. – Mas ele não vai querer saber dos meus documentos?

- Acho que não. Ele só precisa que você tenha força braçal.

- É, acho que isso eu tenho – Edward riu. Os treinamentos exaustivos no Exército tinham que servir pra alguma coisa pelo menos.

- Desculpe se fiz errado, mas eu achei que você precisaria de algum dinheiro pra... Huh, ir embora.

Edward queria dizer que encontrara um bom motivo pra nunca mais voltar pra Inglaterra, mas resolveu calar a boca. Afinal, não queria que a alemã pensasse que ele era algum tipo de aproveitador.

- Claro – ele concordou, apanhando sua bengala e se levantando da mesa com lentidão. Se dirigiu para a pia com louças e pegou alguma já começando a ajudar a moça a lavá-las. – Mas ele nem me conhece... Como pode dar emprego para alguém cujo não sabe dos antecedentes?

- Ele é apaixonado pela minha amiga – Bella confidenciou, rindo. – Acredito que faria qualquer coisa por ela.

Edward riu também.

- E quando vamos aparecer por lá?

- Amanhã, que tal?

- Sem problema. – Sorriu.

Edward estava por demais entediado dentro daquela casa fechada e, sinceramente, estava super feliz por dentro por finalmente sair e ver alguma coisa que não fosse paredes, mas, estranhamente, o fato de que – arrumando emprego – ele estaria mais perto de ir embora o deixou chateado.

Naquela noite – como vinha acontecendo no último mês – Edward foi dormir no outro quarto, deixando o quarto no qual ele ficara tanto tempo para sua legítima dona.

Bella se ajeitou no meio das cobertas grossas, ainda sentindo frescor másculo do soldado nelas. Inconscientemente, ela inalou o travesseiro, suspirando de satisfação. Ao perceber seu próprio ato, revirou os olhos para si mesma.

Por fim, Bella adormeceu, mal sabendo que, no cômodo bem ao lado do seu, havia um soldado pensando nela.

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O dia amanhecera em harmonia com a inusitada alegria de Bella. Não se passava nem das oito da manhã, mas as crianças de toda a rua já estavam brincando. A alemã estava fazendo um café da manhã, enquanto o soldado estava no andar de cima arrumando as camas.

Quer dizer, arrumando a dela pelo menos, já que o ele parecia ter acordado junto com os cantos do galo.

Aquele seria o dia em que eles iriam atrás de Jasper Whitlock e sua tão famosa construção. Alice conseguira enrolar o homem por mais algum tempo, até que Bella conseguisse ensinar a língua completa do país. Porém, ele já parecia estar impaciente, porque o tempo de ‘enrolação’ já ia completar um mês.

Isabella se virou de súbito e quase derrubou todo o café que estava numa jarra ao avistar o soldado parado no batente da porta. Colocou a jarra com o líquido fervente na mesa decorada com um pano também florido e colocou a mão no coração, já ficando irritada com o riso de deboche que o soldado proferia.

A alemã ainda se perguntava como um homem tão grande quanto ele podia ser tão silencioso. Talvez eles ensinassem isso no Exército também.

- Achou que eu iria te matar? – ele perguntou com escárnio.

- Não. – A resposta veio com tanta certeza que fez o sorriso de Edward desaparecer de imediato.

Ninguém podia confiar tanto assim nas outras pessoas. Era errado, era insano. Edward sabia bem como esse tipo de confiança cega acabava com as pessoas.

- Não devia depositar tanta confiança assim em mim, alemã – ele deu som aos seus pensamentos.

Ela deu os ombros e se sentou na mesa, gesticulando para que o soldado fizesse o mesmo.

- É sempre bom ter fé nos outros.

Edward se sentou também na mesa, balançando a cabeça, cada vez mais fascinado com a alemã.

- Você não sabe quem eu sou.

- Eu confio em você – ela disse simplesmente, como se aquilo resumisse tudo. Edward olhou novamente naqueles olhos castanhos e viu verdade. Ninguém nunca dizia isso a ele, pois ele sempre fora traiçoeiro para conseguir o que queria. Ninguém nunca, jamais depositara uma confiança nele, entretanto ali estava aquela doce alemã confiando nele tão cegamente quanto podia.

- Mas não devia – ele murmurou, em inglês, apenas para ter a certeza de que a alemã não ouviria.

- Soldado? – ela chamou tirando-o de seus pensamentos e fazendo-o encará-la.

- Hm? – ele murmurou.

- Aonde estão suas roupas sujas?

Edward franziu cenho.

- Estão no quarto... Por quê? – indagou, ainda confuso.

- Ora, porque tenho que lavá-las. – Ela revirou os olhos, como se fosse óbvio.

- Você não vai lavar minhas roupas sujas.

- E por que não? – Bella perguntou, arqueando uma sobrancelha, petulante.

- Porque são roupas masculinas! – ele disse, levemente mais alto.

- E o que tem? – Bella continuava lívida.

- Não vai lavar minhas roupas, alemã. – Ele disse, numa convicção que não amedrontou em nada a alemã.

- Pare de ser tão orgulhoso, pelo amor de Deus! – ela bufou. – Qual é o problema, afinal?

Edward arregalou os olhos para o espevitamento daquela moça. Nunca pensara que discutiria isso com alguém, tampouco que esse alguém fosse uma mulher. Ela devia saber que somente as mulheres casadas podiam lavar roupas masculinas, e ainda se essas citadas roupas pertencessem aos seus respectivos maridos. Mas, com aquela mulher falando de forma tão natural que lavaria as roupas dele, o fez parecer um velho do século anterior.

- Meu Deus, você é capaz de levar um homem à loucura, alemã. – Ele murmurou rindo, dessa vez em alemão com a clara intenção de fazê-la ouvir tudo.

Ela sorriu, mas estava adoravelmente corada.

- Então, termine de comer para podermos ir atrás de seu emprego, certo?

Edward assentiu, já se servindo de leite e devorando todos os biscoitos que lhe foi possível.

Bella se levantou da mesa e se recostou na pia, apenas saboreando um biscoito enquanto observava, com diversão, o soldado de lambuzando todo com o chocolate.

- Então... – ela começou, depois de alguns minutos de um silêncio confortável. – Se eu não lhe conheço... acho que agora é um bom momento para fazê-lo.

Edward engoliu os últimos biscoitos, virando-se na cadeira e encarando os olhos brilhantes de Isabella, incitando-a a continuar.

- Quando você descobriu que tinha vocação militar? – ela perguntou. Edward não pode evitar rir, ao ver como aquela pergunta soava irônica pra ele, afinal ele nunca descobrira se tinha a ‘vocação militar’, mas sim descobriram pra ele e o forçaram a exercê-la.

- Acho que é pergunta certa é: ‘quando descobriram que você tinha vocação militar e praticamente te chutaram pra um campo de batalha, pra que você pudesse exercê-la’?

- Tá – a alemã disse, revirando os olhos. – Quando descobriram que você tinha vocação militar e praticamente te chutaram pra um campo de batalha para que você pudesse exercê-la? – Completou, com um sorriso.

- Logo no começo da guerra. – Ele respondeu simplesmente.

- Nossa. Participou de muitas batalhas então?

Edward desviou o olhar do dela por milímetros quase imperceptíveis, apenas para encarar a parede atrás da alemã, como se, ali, ele visse um filme de sua vida. Como se ele visse o garoto – ainda franzino e medroso – entrando na guerra, com medo de decepcionar o país. Como se ele ainda visse todos que se aproximavam dele sendo mortos da forma mais brutal e odiosa possível. Como se ele ainda visse todas as pessoas desesperadas por comida andando em volta da Base Militar. Como se ele ainda visse todo o seu assombroso passado.

- Sim, muitas. – Ele concordou, apenas.

Bella olhava para o homem na frente com muita... admiração. Sim, porque ele era corajoso, ele certamente já enfrentara muitos outros homens armados, ele certamente já defendera outros com sua própria carne... Ora, e ela tinha medo de roubar algumas maçãs!

Mas ele viu que aquele assunto não agradava o homem. Os olhos verdes com aquela sombra preta denunciavam isso.

- Vamos andando – Bella disse, suspirando e se desencostando da pia. – Jasper Whitlock não vai querer um empregado que se atrasa logo no primeiro dia de trabalho.

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- E se ele resolver querer ver os meus documentos? – Edward perguntou, temeroso.

Diabos! Estava se sentindo um maldito menininho de cinco anos indo para seu primeiro dia de aula! Onde estava Edward Masen, afinal? Aquele audacioso soldado que peitava até os seus superiores sem medo de levar um tiro o meio da testa? Poxa, era apenas uma construção! Para alguém que já jogara bombas na Sede do Governo Alemão aquilo deveria ser fácil como abotoar uma camisa!

- Ele não querer saber de nada, soldado – a alemã assegurou, pela qüinquagésima vez. – Céus, parece que você está indo para a forca! – Zombou ela.

Edward apenas deu um sorriso amarelo, repetindo um mantra de que seria fácil.

Bella se divertia com o nervosismo dele. Um homem de praticamente um 1,90 de altura, parecendo uma muralha de músculos, exalando superioridade... Com medo de enfrentar um pobre construtor de casas!

Era uma memória de se guardar.

Eles viraram a esquina da rua da floricultura de Bella e logo avistaram a tão famosa casa sendo construída. Havia três ou quatro homens suados e fatigados que se matavam pra fazer aquela mistura que costumava sustentar os tijolos que seriam postos na casa.

Ao longe, Isabella já conseguira distinguir Jasper Whitlock. Era um moço pálido e pouco forte que levava uma cabeleira loira e olhos azuis claríssimos, daqueles que davam a impressão de enxergar sua alma. Estava com uma calça bege e com uma camisa branca – tão suja que já parecia ser preta – completamente desabotoada.

Bella não sabia muito sobre Jasper. Sabia apenas que ele entrara na guerra há algum tempo atrás, mas voltara tão rápido quanto, depois de quebrar um braço e de perder o irmão.

Ao avistá-los – e provavelmente reconhecer Bella – Jasper acenou e começou a andar na direção dele, sorridente.

- Ei! – ele cumprimentou. – Isabella Swan, certo?

- É – Bella confirmou, colocando a mão no ombro do soldado e incitando-o a se aproximar. – Esse é Edward Masen.

- Oh – Jasper deixou escapar, analisando o homem de cabelos bronzeados dos pés à cabeça.

- Viemos porque Alice Brandon disse que precisava de ajudantes. – Bella informou. Ao ouvir, o nome ‘Alice’ foi como se alguma coisa tivesse sido ligada na cabeça de Jasper. Os olhos marítimos dele logo começaram a brilhar e um sorriso involuntário apareceu em seu rosto.

- Claro! – ele bateu na testa, como se só tivesse se lembrado naquele momento. – Ela veio aqui e comentou que um primo da sua mãe iria passar um tempo em Nagold e precisava de emprego, não é?

Edward não estava entendendo muita coisa, porque a conversa fluía tão rapidamente que era praticamente impossível captar alguma palavra que ele conhecesse, porém a alemã de repente o fitou com os olhos castanhos pedindo para que ele confirmasse qualquer coisa que o outro havia dito. E Edward somente obedeceu-a.

- É.

- Nossa, fico feliz que tenha aparecido... – E uma estranha conversa se iniciou. Jasper comentava que os outros homens que estavam trabalhando ali eram todos uns molengas que não aguentavam nem duas horas no trabalho braçal e já estavam reclamando...

Mas o que importa é que tudo foi muito fácil.

Parecia realmente que Jasper estava encarecido de ajudantes bons, porque quase implorou para que Edward começasse a trabalhar naquele exato momento. Ele pareceu oferecer alguma quantia significativa por dia, já que o soldado viu os olhos da alemã brilharem quando Jasper disse o quanto pagaria pelo serviços de Edward. Mas como ele não entendia de nada da moeda alemã mesmo...

E tudo foi combinado.

Edward começaria no novo emprego no dia seguinte, e ele apenas auxiliaria Jasper em toda aquela história de levar tijolos, trazer tijolos...

A proposta de começar a trabalhar naquele dia mesmo só foi recusada porque a alemã tinha prometido a ele que o levaria para tomar sorvete.

E Edward – em tanto tempo que ele não conseguia nem contar – estava feliz.

Porque sabia que aquilo era o começo de uma nova vida.


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Notas finais do capítulo

Heeey, amores! :DTudo bem com vocês? Espero que sim :) Essa foi rápida, huh? HAUAUUAUA' Bem, o capítulo de hoje foi morno - já que eu tenho a mais plena certeza de que muitas estavam esperando beijos avassaladores e um romance ardente -, mas vamos com calma. Eles nem se comunicavam direito até algum tempo atrás e não tem como eu fazer eles se apaixonrem tão repentinamente. Isso seria meio fantasioso. Aliás - por falar em fantasioso - , eu queria dizer que sei que é impossível alguém aprender outra língua em tão pouco tempo (principalmente alemão, que tem uma pronúncia super complicada), e desde já peço desculpas por isso, mas era necessário pra história rolar, não é? Então, viva a ficção! hehe. Mas acredito que o capítulo de hoje teha servido pra ele saberem mais um do outro, confiarem mais.Bom, flores, é isso :D Vou tentar trazer o próximo terça feira - que, a propósito, é meu aniversário, rs.MUITA obrigada por todos os reviews anteriores! Vocês são demais! O/Espero que tenham gostado desse, e que comentem pra eu saber o que acharam (:Beijos, e até o próximo! =***