Cookies escrita por StrawK


Capítulo 5
CINCO


Notas iniciais do capítulo

Obrigada por todos os reviews maravilhosos, gigantescos, que me divertem e me inspiram, e por suportar e acompanhar essa leitura tosca sem betagem. =)
5 de 5



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Imagine que você gostasse muito de cookies de chocolate e que ingerir essa iguaria lhe desse um prazer quase imoral. Imagine que você estivesse tranquilamente feliz tendo sua dose diária desses biscoitos até que um dia você se engasga com um. A tosse que não sai, os olhos lacrimejantes, a falta de ar; todas as sensações elevadas a um nível estranho, provocando uma impressão de morte e desespero.

A cena é rápida – um minuto, talvez – mas para você parece que milênios agoniantes se passaram, até que alguém lhe dá um forte tapa nas costas, desobstruindo sua laringe e devolvendo-lhe o ar.

Depois disso, passa pela sua cabeça a ideia de que comer cookies mataria você. Isso antes de te transformar em alguém obeso, cheio de acne, celulite e com sérios problemas de saúde. Então, numa promessa obstinada, diz a si mesmo que nunca mais em sua vida, nem sob tortura, voltaria a provar uma única migalha desse doce. E jura veementemente que o dia em que isso acontecesse, você engasgaria e morreria.

O começo é estranho, mas consegue se acostumar a não deixar que aquela coisa doce viciante desça por sua garganta novamente e nem mais te incomoda o fato de ver outras pessoas a saboreando.

Você continua levando sua vida do mesmo modo, trabalhando, estudando, viajando... Um belo dia, o avião em que você estava acaba fazendo um pouso forçado, muito distante da rota original. O único jeito de chegar a qualquer lugar com uma remota possibilidade de civilização, é atravessar a pé, um longo deserto.

O primeiro dia de caminhada de sua caravana é tranqüilo, apesar do cansaço e do sol escaldante. O racionamento de comida e água parece garantir alguma chance de sobrevivência. A partir do terceiro dia, entretanto, você descobre que a comida acabou e que o único mantimento restante era um pacote de cookies de chocolate.

Você decide resistir mais um pouco; a fome nem era tão urgente, afinal. Discute, afirmando que seu corpo poderia agüentar mais um tempo sem acréscimo de caloria alguma. Lembra daquela promessa idiota – aquele desafio ao universo – em que você disse que morreria caso voltasse a se alimentar daquele biscoito.

Mas o sol vai sugando suas forças, lentamente. Você sente a falta de açúcar no sangue e a pressão arterial se alterar gradativamente. O calor é forte, mas o mormaço não consegue corar seu rosto pálido; as mãos suam frio.

A estômago suplica por alimento, reclamando com fortes socos e resmungos. Suas pernas quase não te suportam mais e você tem a sensação de que engoliu no mínimo um quilo de areia que nem ao menos serviu para lhe preencher o apetite. Então alguém, mesmo sob seus protestos, abre sua boca bruscamente e força a entrada dos cookies, movimentando sua mandíbula em um gesto de mastigação coagida.

A primeira sensação é de choque. Depois, você sente aquela textura e gosto familiar em sua boca provocar cócegas agradáveis não só em sua língua, mas antecipadamente em seu sistema digestivo.

Você quase sorri e descobre que um pedaço já não é o suficiente – não só pela fome, mas pelo prazer - quando você se pega pensando: “por que diabos eu deixei de comer isso aqui?”

E então, você morre.

É.

.

.

OK.

Deixe-me explicar.

Eu estava... Divagando. Por que foi isso o que o beijo de Sasuke provocou em mim.

Enquanto sua mão direita ainda segurava meu antebraço, a esquerda se encontrava em minha nuca, não deixando me afastar nem se eu quisesse. E acho que deixei bem claro o quanto eu não me importava em ser beijada por ele, porque senti seus lábios sorrirem de encontro aos meus quando chutei o skate para o lado e envolvi seu pescoço com os dois braços, estreitando o espaço entre nós.

O beijo de Uchiha Sasuke era urgente e quase agressivo, como se ele estivesse esperando há muito tempo por isso... Ou estivesse bravo comigo; o que me fez pensar que poderia também ser algum tipo de punição.

A questão era que enquanto ele estava lá, me beijando, eu estava tendo pensamentos ridículos sobre como o último-biscoito-do-pacote-do-deserto faz você morrer.

Não, a metáfora não era sobre os cookies e o efeito do beijo de Sasuke. O próprio Sasuke era mais como... O ‘alguém’ que me forçou a comê-lo, apesar de eu não ter absoluta certeza do que os biscoitos representavam. Ou talvez soubesse.

Meu Deus, eu precisava visitar um psicólogo urgentemente; alguém que conseguisse me explicar por que eu estava pensando em todas essa coisas absurdas quando deveria me concentrar naquela boca quente contra a minha e naqueles cabelos rebeldes entre meus dedos.

Bem, não verdade, eu não deveria me concentrar tanto assim, já que Sasuke, além de ser um mistério, não gostava de mim e ainda havia dito que me mataria se eu deixasse.

“Que talvez eu tenha vindo aqui para te matar, mesmo. Mas só se você deixar, Sakura”. – Foi a frase usada na casa da árvore, que me fez pular de lá, aliás.

E então a ficha caiu.

Não todas as fichas, porque aparentemente eu era medrosa demais para arriscar apostar tantas delas no fliperama imaginário que era minha vida de uma só vez, mas aquela que eu decidi usar – que por acaso era me deixar ser beijada por Sasuke – havia retornado para mim em forma de um insight perturbador.

Parecia que queriam de volta a caipirona desastrada e para isso o Uchiha precisou se apossar da minha família para ver se me deixava com ciúme, despertando em mim um espírito saudosista familiar cheio de remorso.

A parte mais ridícula disso tudo era que eu havia caído como um patinho.

Afastei Sasuke empurrando-o calmamente pelos ombros. Ele pareceu confuso ao me encarar, provavelmente despeitado por eu ter interrompido algo que em sua concepção narcisista seria o sonho de qualquer mulher.

— Você não pretendia me matar... Fisicamente. – afirmei, me sentindo retardada por ter pensado o contrário.

— Se ao menos cogitasse isso, Kushina acabaria comigo. – Eu sabia que aquele desgraçado queria rir da minha cara.

— Então, por algum motivo... Vocês decidiram que essa minha atual personalidade era repugnante e precisava ser eliminada?

— Basicamente, se você analisar de um ponto de vista macro.

Ele colocou as mãos nos bolsos da frente, deixando os polegares de fora. Alternava o peso do corpo sobre os pés, apoiando-se alternadamente nos dedos e calcanhar, balançando-se para frente e para trás; o canto da boca levantado.

Aquele cretino queria muito MESMO rir da minha cara, mas eu não o presentearia com um surto psicótico. Decidi manter a calma e tentar arrancar dele algo mais do que aquele meio sorriso debochado.

— Então, por favor, será que você poderia me explicar a visão micro disso? Eu sinceramente estou cansada de tentar entender como eu não sabia que um desconhecido que diz que me odeia praticamente mora na minha... Na casa... Dos meus pais – pisquei, atordoada. - Além disso, o que diabos foi esse beijo?

— Você pergunta do modo errado para a pessoa errada. – Sasuke virou-se em direção à casa e começou a caminhar.

— Ei, eu não- 

­— Quando foi a última vez que conversou com Kushina, Sakura?

Fiquei encarando suas costas até ver a porta de vidro da cozinha se fechar depois que ele finalmente passou por ela.

.

.

Ela estava de costas para a porta do quarto, levemente inclinada, dobrando algumas roupas. Cantarolava uma canção suave, como as que costumava cantar para me acalmar depois de um sonho ruim - geralmente envolvendo o acidente de carro de meus pais – quando eu era criança.

O enorme cabelo vermelho estava frouxamente trançado e eu reconheci o vestido azul que eu lhe dei de presente dois anos atrás.

Kushina pareceu sentir minha presença, apesar de minha discrição. Rapidamente virou-se e quando percebi, havia atirado um travesseiro violentamente contra meu rosto.

E começou a rir de minha expressão transtornada.

Há uma coisa que esqueci de comentar sobre meus surtos em que me transformo em uma atiradora profissional de travesseiros, almofadas e afins: eu aprendi com Kushina. Simples assim. A diferença era que ela geralmente fazia isso por brincadeira e eu, sempre por estar frustrada com alguma coisa.

Revidei o gesto jogando o travesseiro de volta, mas ela já havia se esquivado e tudo o que eu consegui foi atingir parcialmente a lateral de sua coxa.

O riso mais alto dela me contagiou e quando percebi, já estávamos sentadas lada a lado na cama, rindo e nos encarando com olhares cheios de significados ocultos.

Ela sabia que eu queria - precisava - conversar. Sabia que necessitava desabafar minhas neuroses e zombar tragicamente de minhas atitudes, mas eu não sabia por onde começar.

Eu achava que essa conversa seria capaz de recuperar tudo aquilo que perdi durante quase uma década, a começar por mim mesma. Não que eu fosse voltar a ser uma adolescente inconseqüente de dezessete anos... Eu só queria poder ter aquela espontaneidade que Konoha me trazia e não sentir nenhum remorso por isso. Queria achar algum equilíbrio naquela balança que dividia minha personalidade. Queria poder chamar Minato e Kushina de ‘pais’ em voz alta.

— Então o Sasuke te beijou. – Kushina me surpreendeu com a afirmação. Como é que ela sabia? Não fazia nem meia hora que havia acontecido! Me senti em um tipo de reality show, sério. — O que acha dele?

Abri e fechei a boca umas três vezes antes da voz finalmente sair:

— Acho que ele não gosta de mim e provavelmente me beijou para me irritar – Observei ela se divertir com minha resposta. — Como soube?

Kushina levantou-se e continuou a dobrar as roupas.

— Sasuke é um bom rapaz. Sempre preocupado conosco a ponto de tentar monitorar e controlar nossa saúde e até... Sentimentos.

Eu não queria pensar demais em como fiz minha família se sentir durante todo esse tempo em que os ignorei, por que então eu sabia sempre teria o risco de cair em depressão profunda, cheia de auto-flagelação e me trancar em quarto escuro ouvindo alguma música que me deixasse mais na fossa. E eu não era assim.

Quer dizer, era óbvio que eu sabia ter agido errado, mas eu era mais do tipo que pedia perdão e tentava consertar do que do tipo que chora pelo leite derramado.

— Me conte tudo o que perdi. – Pedi, debilmente.

Ela voltou a sentar-se a meu lado e segurou minhas mãos, e quando ela sorriu novamente para mim com aqueles olhos calorosos, eu não tive outra opção a não ser enterrar o rosto em seu colo e deixar, contrariada, que as lágrimas fluíssem.

— Me desculpe... Mãe.

.

.

Eu sabia que meus olhos estavam vermelhos e provavelmente inchados, depois da sessão ‘recordar é viver’ que tive com minha mãe. E apesar de aborrecida com certas revelações, sentia a cabeça leve, sem ter que me preocupar em ter os neurônios em constante trabalho escravo para juntar aqueles fragmentos perdidos.

Finalmente eu havia descoberto o que significavam aqueles olhares que ela e Sasuke trocavam. Ela havia me contado que Sasuke passara a freqüentar a casa um pouco depois de minha partida, preenchendo, de certa forma, o lugar que deixei vazio.

As fotografias dele na estante sempre estiveram lá, assim como muito outros resquícios de sua ligação com os Uzumakis, – como um casaco esquecido ou mudas de roupas deixadas no quarto que era meu e que ele eventualmente usava - o problema era que meu descaso nas raras vezes que os visitava era tão grande que não via mais nada a minha frente à não ser o relógio que marcaria o horário de minha partida.

A questão era que o Uchiha presenciava cada olhar de tristeza de minha mãe ao saber que eu não apareceria nas férias, ou quando mal respondia seus e-mails, que de fato, lia porcamente. Ele vivenciava cada decepção que eu causava àquela família que agora era dele, e seu senso de justiça lhe dizia que não poderia deixar isso continuar.

Dava para entender por que me odiava. Eu estava matando sua adorada Kushina de desgosto.

Quando soube que eu finalmente daria as caras, Sasuke, que estava fora de Konoha visitando Itachi, decidiu voltar rapidamente para me afrontar e esfregar na minha cara o quanto eu era idiota. Obviamente, contara para Kushina seu ‘plano’- que eu não sabia exatamente qual era - mas ela apenas riu e disse: “Boa sorte, mas não exagere ou ela nunca mais voltará”. E então foi aí que eles começaram com aqueles olhares cúmplices, como se estivessem trocando impressões sobre minhas reações.

Suspirei e me joguei na cama, apreciando pela primeira vez, a familiaridade e quietude do meu antigo quarto. Virei o rosto para o criado-mudo, em que eu havia colocado a New Medicine, com a capa para baixo.

Estendi o braço e peguei a revista, um pouco amassada pelo manuseio de Sasuke e soltei uma exclamação ao encarar a capa.

Era o meu rosto que estava lá, sorridente, com grandes olhos verdes, sob os dizeres: “A bela dra. Haruno: como a  jovem médica encara o dia-a-dia no hospital mais movimentado do país”.

Algo me dizia que eu deveria me lembrar de cerca de quinze dias atrás ter recebido uma equipe de reportagem que me seguiu por um dia inteiro naquele hospital, e que eu havia dado uma espécie de entrevista e tirado algumas fotos. Provavelmente estava tão aprisionada em meu trabalho, sem tempo nem para respirar que nem havia me dado conta de que eu seria a próxima capa da minha publicação quinzenal preferida.

Então era isso que Sasuke tanto lia e relia nessa revista. Estava coletando dados do inimigo para que pudesse atacar de forma rápida e eficaz.

Olhei o índice e localizei o número da página da matéria de capa, e quando abri na página 37, percebi que ela estava muito mais gasta por manuseio do que o restante. Passei os olhos pela matéria, sem realmente ler, mas me achando até apresentável em algumas fotos que foram tiradas enquanto eu atendia alguns pacientes.

Suspirei satisfeita, embora não muito empolgada. Céus, se eu tivesse visto essa capa há exatos três dias, teria dado pulos de alegria e ligado para Ino comprar todas as edições de todas as bancas e sair distribuindo pelo hospital; agora a única satisfação que eu esperava ter era ver o orgulho de minha família ao ver meu pequeno sucesso.

Levantei-me, disposta a finalmente desfazer as malas que aguardavam esse ato desde que eu cheguei a essa casa, certa de que poderia ficar um ou dois meses com tranqüilidade sob os mimos de minha mãe, a hiperatividade de Naruto e a astúcia de meu pai.

Tentei não me ater ao fato de que Sasuke também vinha no pacote.

Enquanto abria minha bolsa de mão, desviei o pensamento para aquela revista de gestantes que eu doaria para Tenten, a vizinha que descobri estar grávida, um dia atrás. Ela namorava Neji, primo da Hinata, desde a oitava série e eu não me surpreendi em saber que haviam se casado e aguardavam a chegada do quarto filho. Bem, talvez a revista de gestantes nem fosse tão útil a ela, afinal.

E foi então que congelei quando vi.

Tive a impressão que vários anos se passaram até que tivesse coragem de mover minha mão e pegá-lo; quando o fiz, senti o sangue subir para meu rosto, esquentando-o com surpresa e vergonha.

Meu Deus! Eu não acredito que isso aconteceu!

Como conseguiria encarar Sasuke depois de acusá-lo de ladrão de biscoitos durante três dias inteiros e depois descobrir que o meu pacote de cookies permanecia fechado e intacto dentro da minha bolsa de mão e que provavelmente EU quem tinha roubado distraidamente seus doces que ele gentilmente dividiu comigo por que achou que eu estava grávida?

.

.

Já passava das vinte e três horas quando finalmente tomei coragem para encarar Sasuke. O encontrei sentado em frente à televisão, assistindo a algum seriado de investigação policial com as pernas esticadas, o cotovelo repousando no braço do sofá, a fisionomia tranqüila; tudo exalava tédio, como se estivesse esperando pacientemente por algo.

Perguntei-me se Kushina já havia lhe contado sobre minha redenção e o deixado com a sensação de dever cumprido. Algo em seu leve ar de satisfação me dizia que sim.

Levantou a cabeça e encarou-me quando percebeu que eu descia as escadas. Olhou o pacote em minhas mãos e abriu um sorriso cínico que me deu vontade de estapeá-lo; mas respirei fundo e continuei descendo, cautelosamente, até me sentar a seu lado.

Estendi a mão, oferecendo o pacote fechado de cookies a ele. De cabeça baixa, não consegui ver sua expressão ao pegá-lo, mas imaginava que faltava pouco para que aquele sorriso se transformasse em uma gargalhada.

— Estou pagando minha dívida – falei, tentando manter um mínimo de orgulho no tom de voz.

— Depois do que fiz por você, acho que me deve muito mais do que um pacote de biscoitos.

Ah, certo. Eu não sabia se queria ficar para ouvir tudo. Vai que no final minhas suspeitas paranóicas se confirmam e ele diz que tenho que pagar com a vida?

— E posso saber o que foi que você fez por mim que seja digno de recompensa? Não consigo pensar em nada melhor do que me apavorar com frases de duplo sentido e me constranger com um beijo.

Cruzei os braços debaixo do peito; meu maxilar retesado e olhar estreito, fixo naquela estante cheia de fotografias, talvez mandasse o recado de como eu estava brava por ser usada, mesmo com todos os efeitos benéficos.

— Meu beijo te constrangeu? – Pela visão periférica, percebi que ele também cruzou os braços sob o peito. Provavelmente estava com uma das sobrancelhas levantadas.

— Não é essa a questão. – o encarei.

— Então qual é? – ele aproximava o rosto, imperceptível e quem sabe, até involuntariamente.

Levantei-me de forma abrupta, com medo de que ele pudesse tentar me constranger outra vez. Por que foi mesmo que me deixei ser beijada? Ele era tão idiota!

— A questão é que os cookies sempre foram seus – explodi, em um acesso de auto-indignação fora de hora. — E eu achei que eram meus, mas na verdade os deixei jogados no fundo da minha bolsa e provavelmente ainda estariam lá se-

— Se não tivesse reavaliado sua vida — ele pareceu ponderar se eu falava realmente dos cookies ou de algo mais. — Tem razão, Sakura... Acho que não me deve nada além desse pacote de biscoitos. Ou metade dele, já que não comeu sozinha. – Sasuke sorriu, abriu o pacote e me ofereceu um cookie, que aceitei com relutância depois de alguns segundos de perplexidade.

Decidi interpretar sua frase como uma tentativa de admitir que ele somente deu um empurrãozinho e eu era realmente a responsável pelo desenrolar dos fatos.

Sentei-me novamente. Odiava ter uma linguagem corporal tão gritante; era óbvio que ele sabia que eu estava apreensiva.

Ele colocou o pacote em cima do sofá, entre nós dois, e fez um sinal com a mão para que eu pegasse outro; assim que o fiz, Sasuke me imitou. A cena do saguão era repetida naquela sala, mas dessa vez eu estava ciente de que dividíamos os biscoitos que pertenciam a ele.

Isso – tudo isso – era de um nível de cretinice tão grande que senti vontade de rir.

— É... Acho que podemos dividir os biscoitos – falei, gracejando mais para mim mesma do que para Sasuke.

— Está se referindo aos cookies ou à família Uzumaki?

— Aos dois – continuei sorrindo, não sei por quê.

Sasuke ajeitou-se, ficando meio de lado, virado para mim; a lateral do braço no encosto do sofá. Seus olhos escuros me perscrutavam, divertidos, e pela primeira vez, não o xinguei mentalmente por sustentar aquele sorriso de lado.

Talvez ele não fosse tão terrível quanto eu achei que fosse. Pretensiosamente seguro de si, sem dúvida, mas pelo menos eu sabia que tinha bom coração. Quer dizer, não é todo cara que bola um plano estúpido com grandes chances de fracassar, para deixar sua família de consideração um pouquinho mais feliz.

Lembrei-me então que eu não sabia exatamente que plano era esse e resolvi perguntar.

— Não tinha um plano específico – explicou. — Mas o fato de você ser psicótica ajudou bastante. Eu queria importuná-la até que caísse na real.

— Não entendo como um beijo poderia ter ajudado nisso – dei de ombros, mordendo mais um biscoito.

— Você fala muito sobre esse beijo, para quem acha que não foi de ajuda alguma.

— E não foi. Se quiser saber, enquanto me beijava, eu estava divagando, fazendo analogias sobre como o último-biscoito-do-pacote-do-deserto pode te matar – declarei em tom professoral, me divertindo intimamente com sua expressão de indignação.

— Algo me diz que precisarei de um psicólogo, se pedir para que me explique isso – ele riu, sem muito humor.

— Provavelmente.

Pela primeira vez, me senti por cima da carne seca em uma conversa com Sasuke; talvez por que fosse também a primeira vez que tivemos uma conversa franca, sem aquela história de psicopata e todo o resto.

Acho que percebeu isso, por que logo fez questão de tentar me punir pela ousadia de tentar fazer pouco caso dele:

— Você está certa. O beijo não fazia parte do plano. A beijei por que me senti atraído por você.

Engasguei com um cookie.

A tosse não saiu, os olhos lacrimejaram, faltou o ar; todas as sensações elevadas a um nível estranho, provocando uma impressão de morte e desespero... Até Sasuke me dar um majestoso tapa dolorido nas costas.

Mas eu sabia que não ia morrer que provasse um cookie novamente.

— AI! ISSO DOEU, SEU GRANDE FILHO DA MÃE! – gritei, quando recuperei a voz.

.

.

No dia seguinte, levantei mais animada do que o normal, ajeitando alguns objetos pessoais pelo quarto. Hinata havia me convencido a ir com ela ao centro da cidade, para ajudá-la a comprar o enxoval, e se eu bem me lembrava, o ‘passo aí mais tarde’ de quem morava em Konoha era antes do meio-dia.

Encarei meu reflexo no espelho, me sentindo mais leve, mais feliz, mais relaxada que o normal. Senti até vontade de saltitar por aí, como uma criança feliz, com direito à macacão jeans, pirulito na mão e chapéu com cata-vento em cima.

Antes de sair do quarto, parei em frente à prateleira do meu gesso cheio de assinaturas. Observei cada rabisco colorido um olhar saudosista.

“Mas aposto que todos que assinaram o gesso eram pessoas que realmente gostavam de você”.

Sorri diante da lembrança das palavras de Sasuke, de certa forma contente por poder admitir que ele estava certo.

Ouvi levas batidas na porta, antes de ser aberta. Sasuke ficou encostado no batente, me olhando; as mãos nos bolsos da calça.

— Você não tem casa? – brinquei; Kushina havia me dito que Sasuke estava de férias e ficaria um tempo por ali, já que estava reformando seu apartamento. Mas ele não tinha cara de quem morava em apartamento, se quer saber. Parecia mais um daqueles caras que moram em uma cabana rústica, consertando coisas com um martelo a todo instante, suados e sem camisa, enquanto as vizinha balzaquianas suspiravam e se abanavam em seus quintais. Ou um psicopata, mas enfim...

— Quem é você, mesmo? – ele devolveu no mesmo tom.

Apesar da brincadeira, levei a resposta - que dei somente a mim mesma - de forma mais séria. Eu achava que eu sabia quem eu queria ser, achava que sabia quem ou o que havia me tornado. Achava que estava satisfeita com isso.

Modifiquei essa certeza de uma forma assustadoramente rápida, o que me levou a crer que em meu íntimo, eu sabia do que realmente precisava, mas minha cegueira sentimental impedia qualquer mínima tentativa do meu coração em tentar se aquecer.

Quem eu era?

Talvez eu tivesse que descobrir novamente, mas eu sabia que minha mãe era Kushina, meu pai, Minato e que meu irmão desmiolado era o Naruto. Me dei conta que Sasuke talvez fosse muito mais irmão de Naruto do que eu, então sorri quando o encarei:

— Acho que sou sua nova irmã. Muito prazer.

Ao invés de sorrir de volta, ele pareceu contrariado. Caminhou até a gaveta, abriu-a pegou a mesma caneta de dias atrás, quando falou que achava minhas pernas bonitas. Fez o mesmo gesto de girar a caneta nos dedos, como se fosse uma baqueta e rabiscou suas iniciais no meu gesso.

— Precisamos dividir mais cookies, então - antes de sair, voltou-se para mim e roçou os lábios nos meus, de um jeito que me fez meu coração bater mais forte.

Enquanto encarava a porta, ri alto.

— Cretino...

.

.


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Notas finais do capítulo

FIM (OU NÃO)
YO!
Antes que me xinguem, deixem-me explicar:
Vocês podem ter achado o final broxante, mas não dava para desenvolver um amor eterno em alguns dias, né? Pois apesar de terem se conhecido no passado, eles não tiveram nem uma semana de convivência quando se reencontraram. O que ficou então, foi sem duvida, uma atração física, algumas guerras verbais e quem sabe, a promessa de umas férias um pouco mais... Interessantes.
E é aí que pergunto: Paro por aqui, deixando para a imaginação de vocês, ou faço um epílogo narrado pelo Sasuke, contando um pouco sobre as férias com Sakura e o início de uma provável amizade colorida? Fico na dúvida, pois acho que essa ideia tem conteúdo para uma continuação longa, e não quero me arriscar, já que empaquei em uma outra fic e prometi para mim mesma que a terminaria ainda esse ano...
Enfim...
Digam o que acharam deixando reviews.
E pode parecer estranho, por que eu geralmente digo que nunca gosto do que escrevo, e apesar de fugir ao clichê cheio de beijos, amassos e pedidos de casamento, (que adoro XD) eu realmente gostei de escrever COOKIES, que foi algo mais existencial, cheio de psicologia barata -q.
Besitows! =)



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