POV NESSIE

Desesperada era o termo certo para mim, naquele instante. Por algum motivo, desde que Jacob havia me posto na cama, seu carinho pareceu ter algum outro significado. Eu nunca havia visto ele tão decidido. Nos transformar era algo, no mínimo, meio impensável, mas em circunstâncias atuais eu não via outra alternativa. O jeito em que ele me depositara em nossa cama improvisada, me deixara com uma sensação de perda, como se ele estivesse indo para a guerra. Eu sabia que era só um pressentimento bobo, mas eu havia sentido o que as mulheres daquele século sentiam quando o amor da vida delas ia embora para longe, indo de encontro com a morte. Mas para eles, o significado era honra, era acabar morrendo por sua pátria, morrendo com orgulho porque todos os outros homens faziam o mesmo. Lutavam, de algum modo, por aquilo em que eles acreditavam ser um motivo válido para viver suas vidas. Morrer sem ter tido chances e nem se arriscar por aquilo que se acredita é morrer sem ter vivido realmente.

Por isso eu afastei meus pressentimentos. Jacob estava fazendo aquilo que acreditava ser real para ele e para sua vida e eu não podia objetar contra, pois era parte do mesmo pensamento também.

Mas mesmo que eu quisesse dormir, mil e uma coisas se passavam por minha cabeça, me deixando confusa e carente. Eu precisava de seus braços quentes me envolvendo mais agora do que nunca. O mundo todo ameaçava acabar com a minha paz, ficando gigantesco e querendo cair em cima de mim. A briga com a minha família, a decisão de me transformar em humana, como me transformar em humana, viver em La Push que era outra realidade, e principalmente, ter a minha filha em boas condições. Ela continuava comigo, quentinha e segura dentro de mim, mas ela me alertava que uma hora ou outra ela iria querer sair. Não sabia ao certo se seria como eu fiz com a minha mãe - Jacob me contara uma vez como eu praticamente matei minha mãe, facilitando o trabalho do meu pai - e isso me deixava apreensiva. Se eu fosse vampira ainda, dava para ter um pouco mais de resistência, mas como eu agiria? E se por acaso a transformação fosse simples, eu poderia talvez morrer. Mesmo que Alice repetisse mil vezes que me via sadia, eu ainda tinha lá minhas dúvidas. Afinal, eu estava com Jake o tempo todo.

Um chute de leve na parte esquerda da minha barriga me alertou. Eu me virei cuidadosamente de lado e peguei o travesseiro de Jacob, para apoiar melhor as costas, mas parecia que minha Escolhida não estava muito satisfeita. Ela chutou mais forte, provocando uma dor maior.

Seria um aviso?

Apalpei minha barriga, bem no lugar em que ela chutara e apertei.\t   

- Filinha, por favor, eu preciso dormir!

Ela ficou quieta por alguns instantes, enfim. Consegui colocar o travesseiro debaixo das minhas costas, mas no exato minuto em que me endireitei, ela deu um chute tão forte, que parecia que um ser mais forte que eu havia me dado um soco. Ou eu estava fraca por causa da gravidez, ou era ela vampira também. Bem, ela iria nascer com o meu sangue, de qualquer jeito. Sangue humano, mas com características de vampiro, reforçadas com os genes de lobo de Jacob. Me arrepiei ao pensar na força que ela teria. Como em um sonho que tive na noite passada, com a garotinha doce que corria de mim na floresta de La Push. Ela tinha os cabelos negros e escorridos e sua face morena era parecida com a minha. Mas seu jeito determinado de andar e olhar para mim com aquele sorriso divertido, era tudo vindo de Jacob. Ela corria, corria de mim. Até que eu mandei ela vir até mim, senão eu iria embora. A doce menininha adquiriu uma feição tristonha, mas cruzou os braços, veio até mim e olhando bem em meus olhos disse "Você não pode ir embora, mamãe. Eu sempre vou te encontrar, pois sei bem seu cheiro e conheço bem essa terra para que eu possa voltar para casa", e então eu a abraçava e falava "Isabella Rachel, você é uma criaturinha impossível!". Uma bruma cobria nossos rostos felizes e eu via uma mulher com poucas roupas, uma tatuagem da reserva em seu braço e o olhar fitando o horizonte e ao seu lado, um homem musculoso e lindo que me olhava com ternura. Não era Jacob e ninguém que eu conhecesse, mas retribui o olhar para ele. A menina de repente batia no peito e uivava forte e depois, os dois me deixavam sozinha em meu próprio sonho...

Ela estava em meus sonhos, como costumava fazer certas vezes. Na noite em que Jake e eu nos amamos pela primeira vez, ao dormir, eu havia sonhado com ela. E nas noites que se seguiram também, ela sempre estava lá. Minha filha. E na noite passada, ela havia me dado seu nome, algo que eu ainda não pensara. Mas Isabella Rachel era um bom nome. Isabella de minha mãe e Rachel para a mãe de Jake. Isabella Rachel Black, a Escolhida.

Sem insistir muito, me levantei da cama. Parecia que a senhorita escolhida não me daria sossego para dormir, então fui até a janela para tomar um ar fresco.

A Lua jazia lá fora iluminando toda a reserva. Era bom morar lá, afinal. O ar era mais puro do que de Forks, mesmo que eu morasse no meio de uma floresta. Parecia que só pelo fato de ali ser um lugar envolto de mais mistérios, de um mar e de uma lua com aquela imensidão, fazia tudo se tornar mais puro. Purificador.

E agora seria melhor, pois como humanos poderíamos viver felizes, sem tantas ameaças espreitando sempre as margens de nossa vida. Eu devia saber o quanto estava pedindo para Jake, mas eu era infinitamente contra um futuro cheio de sobrenatural para minha filha.

Mas não era fácil desistir.\t\t 

E todo mundo acreditava que a minha escolha era feita sem pensar duas vezes. Mas não era, porque eu estava desistindo de mim mesma, de meus poderes, da minha família. Estava acabando com a alegria eterna de meus pais. Mas quando se ouve que você terá uma filha, que é a Escolhida bem antes de você pensar em nascer, o futuro dela é o que mais importa. Eu estava desistindo por ela, pensando apenas como é que ela iria se sentir sabendo que nasceu com a infelicidade sobrenatural de ser. Eu não tive escolha, e nasci meio a meio, e sim, aquilo me matava por dentro. Eu sempre fora bastante madura para saber que isso era uma desgraça e ao mesmo tempo uma glória, afinal eu era diferente e, portanto, invencível, mas o que eu era diante de tudo? Eu era protegida por tudo e por todos, esperando sempre uma nova ameaça italiana. Eu nunca cacei sozinha, também nunca briguei para matar um animal sozinha porque sempre tinha alguém querendo me poupar do "esforço", e muito menos cresci sem ter alguém perto de mim para ver se eu estava bem.

E isso sempre fazia com que eu me sentisse impotente. Do que valia a força, a inteligência, as imagens e o crescimento acelerado se não para ser usado?

Era por isso que eu abri mão de mim mesma facilmente. Eu nunca tive a chance real de ser uma vampira, então seria fácil desistir disso. Mas eu sabia que iria deixar minha família infeliz, assim como provavelmente minha filha. Isabella Rachel não seria mortal como eu, não teria a mesma facilidade que eu tive e nem muito menos a minha escolha. Ela iria nascer totalmente sobrenatural. Ela não foi um dia humana e depois se tornou vampira. E também não cresceu humana para depois se tornar lobisomem. Ela iria nascer vampira e lobisomem.

Poupar ela de mais coisas sobrenaturais a sua volta seria o mínimo que eu poderia fazer.

Eu consegui voltar para cama e fechar os olhos, porque ela havia se acalmado finalmente. No meu íntimo desejava que ela estivesse dormindo também, quentinha e bem alimentada dentro de mim.