Perguntaram-me uma vez quem eu sou.

Eu disse que meu nome é Ana Paula e que tenho 15 anos. Nasci em São Paulo, no Centro, vivi sete anos na zona Leste e me mudei para Guarulhos. Disse que sou filha de carioca e paraense, e que muito provavelmente não fui adotada, já que pareço muito com eles.

Mas, depois de responder, perguntei-me se era realmente eu.

Perguntaram-me novamente quem eu sou.

Já fui o número um da chamada várias vezes, pois meu nome começa com A. Mas sempre chegava alguém com um AL para tirar o meu AN do topo. Então várias vezes também já fui o número três. Agora tenho três ALs na minha frente, portanto sou o número quatro. Também tenho RG e CPF. O meu RA fica guardado dentro da minha carteira, caso eu precise.

Mas, depois de responder-lhe dessa maneira, fiquei em dúvida se era realmente eu.

Depois de um tempo, perguntaram de novo quem eu sou.

Eu respondi não sei.

Mas, continuei em dúvida se era realmente eu.

Perguntaram-me de novo.

Então perguntei “quem você acha que eu sou?”.

E não gostei da resposta que deram. Basearam-se na minha morada, na minha cor, no meu rosto, nas coisas que acham da minha fé.

E eu sabia que não era realmente eu.

Quis gritar.

E U N Ã O S E I Q U E M E U S O U.

Mas sou tudo menos o que dizem que sou.

Não sou de propósito.

Eu gosto de desenhar, escrever e ler. Gosto de qualquer música que eu gosto. Dançar na chuva é uma delícia. Gosto de ser louca, histérica e dar risada de tudo. Gosto de estar com quem eu gosto, e odeio estar longe de quem quero estar perto por causa de diferenças bestas que as pessoas julgam ser gigantes. Eu gosto de teatro, porque lá eu sou eu sem me perguntarem quem eu sou, sendo qualquer pessoa sem deixar de ser eu.

Eu gosto de ter medos.

Mas não gosto de ter inseguranças.

Gosto de tentar.

Mas não gosto do medo de tentar.

Gosto de ter medo de não saber quem eu sou.

Mesmo sem saber que eu sou.

Sou essa menina contraditória que diz que não sabe quem é e tenta se descrever. Que tem medo de fazer malabarismo com três bolinhas porque acha que não vai conseguir. Ou pular corda. Dançar. Cantar. Escrever. Desenhar. Menina que não entende a si mesma. Mina dos paradoxos.

Quem sou eu?

Isso não parece importar.

Importa?

Perguntaram-me mais uma vez quem eu sou.

Sou a Ana.

E é isso aí.

Essa sou realmente eu.

Interprete-me.