Sonhos de Melli Moore escrita por Suh


Capítulo 11
Lágrimas


Notas iniciais do capítulo

Só quero dizer que tremi de emoção enquanto escrevia este capítulo.
Boa leitura.



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As palmas das minhas mãos estavam suadas.
        Uma mensagem de celular. Raro. Tão claro:

"M&M's, precisamos conversar. 
Venha na minha casa depois da escola. 
Al"

        Naquele dia, pela primeira vez, não dei valor ao Joe ou ao Inu, nem a 
nada a meu redor. Assim que acabou a aula, fui pra casa dele. 
        Bati na porta do apartamento e ouvi sua voz abafada "pode entrar". 
O apartamento é pequeno, mas muito aconchegante. Há poucas fotos, 
mas muitos quadros de arte. 
Bebidas caras em um mini bar e... luz? Eu lembro da luz da casa dele, 
mas naquele dia, estava especialmente sombria.

- Sente-se, Melli. - Há anos ele não me chamava assim. Sentei perto
 dele, tio Al estava sentado curvado e os cotovelos encontravam seus
 joelhos, seus dedos entrelaçados.
 Olhava para um ponto fixo. Ele parecia não saber por onde começar, 
então eu que comecei:

- O-oi.

- Oi.

        Eu não sabia para onde olhar, então me virei pra frente. Solitária,
 na mesinha de centro, havia uma caixinha vermelha. Foi quando percebi 
que ele não olhava para um ponto fixo inexistente, ele fixava a caixinha 
como se fosse algo muito importante. 
        Instintivamente, peguei a caixinha e abri. Meu coração pulou e eu
 fiquei meio sem ar... Não porque tivesse algo que eu não esperava
 encontrar, mas pela beleza do anel. 
Era prateado e tinha uma grande jóia no meio.

- Acho que você já tem idade e maturidade suficiente para saber
 de tudo... - Ele tomou suavemente a caixinha da minha mão, e continuou 
fixando a grande e brilhante pedra do anel. Percebi que ou ele havia acabado
 de acordar, ou ele havia chorado por muito tempo. Eu queria acreditar que 
ele estava dormindo, mas algo me dizia que a verdade era a segunda opção.

- Estou preparada. - Falei, decidida.

        Ele olhou pra mim, tentou sorrir e desistiu.

- Eu sabia... sabia que Alice gostava de mim. Eu percebi, há muito tempo.
 Mas para mim... não fazia diferença. Com o tempo, ela foi ficando bem
 bonita, e eu sou homem, não deixei de notar... Decidi que ela teria alguns
 momentos bons com o cara que ela gosta, eu fui tão estúpido. Era só mais
 uma, só estava ficando com uma garota muito linda, só. Mas... com o tempo, 
eu fui sentindo algo diferente... eu queria ouvir a voz dela, eu queria vê-la...

        Eu estava meio confusa, juro. Ele continuou:

- E então, na manhã em que nós... - ele pirragueou - em que, em que... 
bem, no dia em que fizemos você, - Eu teria rido, se a situação não fosse
 tão séria. - alguma coisa mudou. Ela pediu para casar comigo, e... eu estava
 confuso com aquela situação, eu sempre tive as garotas que eu quisesse,
 mas nunca quis ter ninguém como quis tê-la só para mim. 
Mas, nós viajamos, eu e minha família, de volta a minha cidade natal...
 e eu encontrei alguns amigos de infância. Eles disseram que eu estava diferente,
 que eu não devia "me amarrar", que eu tinha de continuar solteiro e livre, aproveitando,
 eu era jovem... claro que eu não me casaria logo, mas... eu queria a Alice. De alguma
 forma, eles me influenciaram, eu consegui uma boa oferta de emprego lá e pensava 
seriamente em aceitar. Quando voltamos para cá, fui conversar com Alice... e ela... 
ela perguntou o que seria de nós dois. Poxa, eu estava tão confuso.

        Tio Al começou a chorar de novo. Eu estava tentando compreender a historia...
 tentando encaixar tudo, mas aquilo não fazia sentido para mim.

- Melli, eu disse que não sabia o que seria de nós... mas eu juro a você, pela memória de 
Alice Moore, juro que se eu pudesse voltar no tempo, eu mudaria isso. Eu diria que a 
amava e que queria ficar com ela. Eu diria que queria casar com ela, formar uma família
 e ter muitos filhos lindos como você, M&M's... - Minhas lágrimas desciam naturalmente, 
assim como as dele. - Mas eu fui um covarde! Depois disso, Alice me evitou... Eliza estava
 com raiva de mim, não queria me contar sobre ela, e então eu conheci Mi, uma amiga 
delas. Peguei o número dela no celular da Eliza e disse que queria vê-la, conversar... 
na verdade, eu só queria saber da vida de Alice, como ela estava... - ele mal conseguia
 falar entre os soluços. - Alguns dias depois, eu desisti daquilo. Desisti que tentar ser o
 "pegador"... eu queria a Alice, eu queria ela para sempre. Saí de casa decidido a mudar 
tudo, eu falaria com ela, pediria desculpas, mas antes... antes eu fui numa joalheria... 
eu também a pediria em casamento. 

        Ele olhou profundamente para o anel. Eu podia sentir o amor dele dali. 

- Quando eu cheguei na casa dela... me lembro como hoje, as palavras de Natalia,
 "Ela não está, saiu com o namorado". Ali mesmo, na porta da casa da única que amei, 
meu mundo caiu. Guardei o anel numa gaveta, junto com meu coração... e decidi voltar a 
ser o "galinha" que conheciam, comecei pela Mi... 

- E-eu... 

- Por favor, não fale nada... por favor, eu mesmo já me julguei o bastante...

        Eu tremia, e ele também.

- Melli... quando eu descobri que ela estava grávida... pela primeira vez na vida, eu quis 
morrer. Eu não a teria de volta, ela casaria com o maldito Edward - ele fez uma careta com
 este nome - e me deixaria para sempre. Eu até pensei na possibilidade de aquele filho ser
 meu... mas ela estava namorando, e nós só havíamos feito aquilo uma única vez. Mas 
ela acabou com Edward, ele foi embora, eu pensei que podia ter uma chance, afinal... 
E então, quando...

        Silêncio. Soluços.

- Entenda que... é, é muito difícil pra mim falar sobre isso...

        Mais silêncio. Mais choro.

- Quando ela morreu... minha vida acabou. 

        Eu não sabia como ainda tínhamos lágrimas. 

- E aí, eu parei e pensei... que ela morreu por causa do... do parto complicado... Foi culpa 
dele. Eu quis matar o Edward, quis rasgar o coração dele aos poucos como ele fez com o 
meu. Ele a engravidou, ele a matou! - Quanto ódio eu vi nos olhos do... do meu pai 
naquele momento. - Melli... eu passei anos o culpando pela morte dela. Eu li o diário da Mi,
 no fim das contas ela era uma maluca que queria me matar, - não entendi esta parte, 
mas decidi deixar para lá e deixá-lo continuar - e ela dizia que tinha certeza que eu era o
 pai... mas eu não podia acreditar. Ele era o culpado, só ele. Eu sofri por anos, mergulhei na
 bebida e fiquei com mulheres como nunca. Eu queria esquecer, mas a dor era muita...
 e o ódio... o ódio do homem que a matou só crescia. 

        Ele pausou. Respirou e pareceu mais calmo.

- Mas então... eu a conheci melhor, Melli. Você, que mais se aproxima do que foi a sua 
mãe. Você, que faz parte dela. Eu a amei tanto, apesar do... Edward. Você é incrível, Melli...
 e me dá mais ânimo. Alice não se foi sem deixar nada para trás, ela deixou você, e isso 
me alivia. Mas... entenda que... depois de todos estes anos culpando um homem pela 
morte da sua mãe... descobrir que este homem na verdade sou eu... não foi fácil. Pode me
 desculpar pela forma como agi na casa da Eliza? 

        Silêncio.

- Por favor, Melli... eu amo você, eu quero que fique comigo, quero cuidar de você como
 não cuidei todos estes anos... quero ser seu pai de verdade... quero sentir Alice perto de
 mim. Me perdoe, por favor. - Eu sabia que este perdão não era somente pela forma como
 ele agiu com a descoberta.

        Eu levantei minha mão e pousei-a no seu rosto. Ela parecia menor. Enxuguei algumas 
das suas lágrimas e ele fechou os olhos.

- É claro, papai.

        Ele chorou mais e sorriu. Nos abraçamos demoradamente chorando. Choramos como
 se todas as mágoas dos anos pudessem ser esquecidas no ato de limpar nossos rostos. 
Choramos sem nos importar com o que os vizinhos pensariam. Choramos como duas 
pequenas crianças ao se machucarem. Choramos... porque era só isso que podíamos fazer
 no momento.


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Notas finais do capítulo

Alice Moore:
A casa azul.
Meus sonhos eram visões de um possível futuro.
Eu não acreditei no que ouvi e no que estava vendo.
Por que será que a vida foi injusta comigo?

Estava inconsolável.