Se tudo continuasse como estava, algo sairia errado. Era uma certeza tão clara que podia ser vista nos meus olhos sempre que o olhava. Eu ainda possuía um sentimento forte por Matt, mas não era mais afeto, eu o tinha como um estranho, queria poder afastá-lo de mim o quanto antes.
    — Nikky, tá me ouvindo? — ela balançou a mão na minha frente e eu despertei.
    — Claro. Continua.
    — Então, podemos fazer o trabalho na minha casa no sábado.
    — Eu estou de castigo, pode ser na minha? — Eu sorri.
    — Tudo bem então.

    Julie sorriu e percebeu minha total falta de interesse no assunto. Não havia me tocado de que estava sendo desatenciosa, mas eu não conseguia mais prestar atenção em nada ultimamente. Havia coisas além do Matt que me preocupavam, a minha mãe era uma delas. Meu pai era outro motivo também, ele havia desmarcado o nosso jantar no final de semana e isso me deixou magoada, desde que ele saíra de casa eu não o via.
    A sirene disparou e todos saíram da sala, logo Penny se juntou na nossa conversa e Olívia desapareceu. Andamos até o pátio e avistamos Bill e Georg conversando sozinhos, era a hora perfeita de falar com ambos.
    — Olá — eu me aproximei com um sorriso animado no rosto.
    — Oi Nin — eu havia sentado ao lado do Bill e ele me cumprimentou, logo após fez o mesmo com Julie e Penny.
    — Então, sobre o que estavam falando?
    — Hoje é aniversário do Georg — Bill dizia com uma expressão ilegível, como se estivesse com raiva de mim e ainda sim sorrindo.
    — Sério? Meus parabéns! — eu disse sorrindo para Georg.
    — Obrigado, Nikky — ele respondeu.
    — Não vai convidar a gente pra festa? — Penny disse, tomando um suco em seguida.
    — Não vai ter festa — Julie respondeu. — Nós vamos ficar em casa.
    — Ah, por quê?
    — Vamos almoçar com a família.
    — E depois? — Penny estava realmente curiosa.
    — Depois nada — Georg falou com ar despreocupado.
    — Então nós podemos sair pra comemorar, o que acham? — Penny disse, repreendendo-se em seguida. — Claro, se vocês quiserem.
    — Gostei da ideia, mas onde nós vamos? — perguntou Georg.
    — Bom, não precisa ser nada grande. Podemos ir no shopping, no cinema.
    — Eu gostei — me infiltrei na conversa.
    — Eu pensei que você estivesse de castigo, Nikky. — Julie me encarou séria.
    — É verdade... Bom, eu posso dar um jeito.
    — Tudo bem então — Georg sorriu. — Só não precisam cantar na hora do parabéns, certo?
    — Pode deixar!

    Eu sorri animada, Bill permaneceu calado. Eu estava com medo de mover os olhos ao redor daquela mesa e, por acaso, encontrar o Matt. Medo que perdeu-se no meio da conversa. Depois que a sirene voltou a chamar a atenção dos alunos, me distanciei de todos enquanto conversava com Bill.
    — Aconteceu alguma coisa? — eu perguntei preocupada.
    — Não, tá tudo bem.
    — Tem certeza?
    — Não.
    — O que eu fiz dessa vez?
    — Você tá tentando me aproximar da Julie? — finalmente eu havia conseguido sua atenção.
    — Eu? — eu soltei uma risada fraca e o encarei. — Como se eu precisasse fazer alguma coisa... Ela gosta de você.

    Eu esperava que ele ficasse envergonhado, mas não, ele manteve-se sério. Começamos a andar pelo pátio, ainda havia tempo antes de entrar para a classe.
    — Como você sabe? — ele perguntou.
    — Dá pra ver, bobo. Ela te olha tão esperançosa e você nem nota.
    — Eu não vi.
    — Mas eu vi. E também vi que você achou ela linda, não é? — ele ficou em silêncio e mirou os olhos em qualquer lugar menos em mim. — Então, vou deixar vocês se entenderem sozinhos, ok?
    — E entre você e o Tom? — engraçado como ele mudava radicalmente de assunto.
    — Hã?!
    — Você tá gostando dele, Nin?
    — Não, mas é claro que não! — eu ri. — Por que pensou isso?
    — Não sei. Acho bom.
    — Como assim?
    — Você sabe... Vocês dois juntos não iam dar certo. Não quero ter que ver um de vocês afastados de novo. — Ótimo!
    — Não se preocupa — sorri fraco. — Eu vou voltar pra aula, até mais.

    Eu dei as costas e andei para dentro da escola. Percorri os corredores com a nossa conversa na cabeça, afinal, qual era o mal de ficar com o Tom? Por que nós "não iriamos dar certo juntos"? Tudo bem, isso eu mesma posso responder. Brigamos que nem dois idiotas, mas... Enfim, eu não me conformava, será que todos pensavam assim?
    A manhã passou rápida, logo eu estava em casa. Minha mãe estava saindo pra trabalhar, nas últimas semanas o seu horário de trabalho havia mudado para a tarde, mas de acordo com ela, era somente por enquanto. Minha mãe era jornalista de uma revista importante, ganhava bem e adorava o que fazia, o que me deixava feliz. Além de tudo, ela era uma mulher extremamente bonita e nova.
    — Mas mãe, eu não vou demorar muito! Por favor! — eu implorava no telefone.
    — Nicole, você está de castigo.
    — Mãe, você trabalha a tarde inteira, eu poderia muito bem ir e voltar sem você nem saber. Mas como eu sou uma ótima filha, eu tô pedindo. Vai mesmo recusar?
    — Eu vou pensar no seu caso.
    — Já pensou? — eu disse após dois segundos.
    — Claro que não.
    — E agora?
    — NICOLE!
    — O que foi? — eu ri e ouvi ela suspirar do outro lado da linha.
    — Eu tenho uma reunião agora.
    — Isso é um sim?
    — Tá. Faz o que você quiser.
    — Eu te amo, sabia?

    Desliguei o telefone com um sorriso estampado no rosto, me senti como uma criança de doze anos pedindo permissão para sair de casa.
    Julie havia me ligado à tarde. Eu estava pronta, com uma calça skinny preta, uma bota e uma blusa roxa simples e apertada. O aniversário do Georg me fez pensar sobre idade, eu desejava tanto ser mais velha e morar em outro lugar, assumir responsabilidades, fazer o que eu bem quisesse e não estudar.
    Já era tarde, eu deixei um recado para minha mãe na porta da geladeira e, antes de sair, decidi levar comigo a blusa que o Tom havia me emprestado, ele certamente iria até lá, afinal Georg era seu amigo, e eu não queria mais ficar com ela. Ganhei as ruas enquanto pensava comigo mesma, já estava escurecendo. O céu da Alemanha à tarde era lindo. O shopping era perto, não demorei muito até chegar lá, o problema foi carregar aquela blusa gigante, se Tom fosse obeso eu até entenderia, mas ele era magro e suas blusas eram incrivelmente grandes para o seu tamanho, fui obrigada a vesti-la.