Instinto escrita por Enchantriz


Capítulo 1
Capítulo 1: Instinto




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Durante a madrugada, Zed acordou no meio da escuridão de seu quarto no templo da Ordem das Sombras. Calmamente, ele se sentou e virou o rosto para o lado, em direção a janela fechada.

Havia uma tempestade lá fora, com raios gigantescos e trovões estridentes. As gotas da chuva batiam forte nos vidros da janela reprimindo os longos sussurros do vento.

Zed se perguntou quando começou aquele temporal. Mas não era isso que incomodava o seu sono. Estava se sentindo inquieto por algum outro motivo, e por mais que se esforçasse, não conseguia encontrar uma resposta. Ele ficou ali parado, pensativo, organizando os seus sentimentos. Até que se distraiu com a porta do quarto se abrindo.

— Mestre Zed! Mestre Zed! – Kayn chamou apressado, quase sem voz por não conseguir respirar direito. – Lá fora! Tem algo no céu! Tem algo caindo do céu!

Antes de Kayn terminar a frase, Zed passou tão veloz quanto o vento! Porém, atordoado, ele correu desajeitado pelo corredor, se segurando nas paredes enquanto seus pés descalços escorregavam no piso de madeira. Assim que se aproximou da escadaria, ele se debruçou no corrimão e pulou os degraus, caindo direto no andar inferior. Ele atravessou o salão principal utilizando as técnicas proibidas, criando ao redor diversos clones em forma de sombras para desviar dos seus discípulos aglomerados na entrada. Quando chegou nos degraus em frente ao templo, o seu coração batia rápido, forte e pesado. Ofegante, ele parou embaixo da chuva levantando a cabeça, vendo incrédulo uma gigantesca ilha despencar do céu nebuloso. E naquele momento, todos os seus instintos gritaram:

— Syndra! 

Os pés dele se moveram sozinhos. Ele passou pelos portões, indo em direção a floresta silenciosa, tentando alcançar o suposto local em que a ilha deveria cair. No caminho, retirou de dentro do bolso na calça uma pequena pedra negra redonda. Ele apertou a joia na palma da mão, implorando em seus pensamentos que aquele dispositivo mágico funcionasse.

Com um horrível som de sucção, uma fenda de total escuridão se abriu no ar, no meio da floresta. Zed se atirou no profundo abismo. No segundo seguinte, ele surgiu nos jardins devastados de Fae’lor.

O clima na ilha estava muito pior. As gotas da chuva cortavam como navalha a pele de Zed. A friagem arranhava a garganta. Massas de ar quente saíam de sua boca ainda recuperando o fôlego. O vento forte espalhava os fios de seu cabelo de um lado para o outro, encobrindo os olhos quase se fechando. Ele mal conseguia enxergar com toda aquela chuva incessante.

Por um breve instante, a chuva mudou de direção e o céu clareou com a chegada dos relâmpagos, permitindo Zed encontrar Syndra no telhado da torre mais alta do templo de Fae’lor. 

Syndra estava em pé e de olhos fechados, com um sorriso encantador pintado nos lábios. Caminhava calmamente se equilibrando nas telhas como se fossem uma trilha de pedras para o lugar mais absurdamente lindo de Runeterra. Ela parecia estar hipnotizada dentro de algum sonho, completamente fora da realidade.

Zed chamou desesperadamente por Syndra. No entanto, a sua voz não alcançava ela. A cada passo que ela avançava em direção a extremidade do telhado, ele praguejava impaciente, escondendo o medo que se proliferava em seu coração. Dominado pelo desejo de salvá-la, ele lutou com o vento até chegar do outro lado do jardim. Escalou a árvore mais alta, subindo apressado por entre os galhos. Ao se aproximar do telhado, saltou imediatamente, fazendo as telhas estalarem abaixo dos seus pés, ameaçando saírem do lugar. A princípio, ele pisou com cuidado, temendo que pudesse cair. Mas não podia perder todo o seu tempo ali. Pois Syndra já estava prestes a se jogar do telhado. Então, Zed conjurou a sua sombra viva, a manipulando para surgir atrás de Syndra, e rapidamente, ele trocou de lugar com a sua sombra antes de pegar o corpo da jovem nos braços.

Inconsciente, Syndra gritava amedrontada, se debatendo nos braços de Zed, logo o obrigando a soltá-la, só que dessa vez longe do precipício, e segurando firme os ombros dela. 

— Syndra, acorda! Syndra!

A voz grave de Zed despertou Syndra. Os olhos dela se abriram tomados pelo tom roxo enegrecido de sua magia que, aos poucos, se esvaiu trazendo a vibrante cor prata das suas íris. Assustada, ela olhou ao redor, sem reconhecer onde estava, ou o que tinha acontecido. 

— Ei, olha para mim! Syndra, olha para mim!

Zed ordenou colocando as mãos no rosto de Syndra, forçando ela a manter a atenção nele. Porém, aquele contato durou apenas um segundo.

A ilha chocou-se violentamente contra o mar. Ondas gigantescas se levantaram destruindo as torres, engolindo as muralhas, e arrastando o casal para as profundezas. 

Tudo desapareceu.

Submerso na imensa escuridão do mar, Zed prendeu a respiração e agitou-se descontroladamente, sendo puxado por alguma força súbita e invisível. De repente, em sua frente, surgiu o olhar fixo e sombrio de Syndra irradiando o poder.

Então, o mar foi iluminado pela magia de Syndra queimando como o fogo frio através dos seus dedos. Com a mão direita, ela mantinha o corpo de Zed flutuando aprisionado ao seu lado enquanto movimentava a mão esquerda de um lado para o outro, expandindo o seu poder sombrio por toda a estrutura do templo danificado, reconstruindo a antiga fortaleza de Fae’lor. Depois, com outro gesto, uma rotação rápida de seu pulso, Syndra os enviou para fora dali.

A ilha emergiu escorrendo a água para fora das muralhas, aos poucos tomando altitude, pairando vários metros acima da superfície do mar, no céu acinzentado.

Enfim, Syndra libertou Zed, o fazendo cair na grama, tossindo toda a água que tinha engolido. Mesmo assim, ainda sem fôlego, ele se virou e se sentou levantando a cabeça, vendo as gotas da chuva pararem no ar a centímetros da sua pele, e instantaneamente, virou o rosto em direção a Syndra. Ele assistiu atento ela manipular o tempo, cessando a chuva, afastando as nuvens, trazendo de volta o brilho das estrelas para o plácido céu noturno.

Syndra emitiu um longo suspiro e foi de joelhos ao chão, derrotada. 

— Ei! Garota, você está bem? – Zed perguntou preocupado.

A intensa cor dos olhos âmbar de Zed refletiram nos frios olhos prateados de Syndra.  

Houve um perturbador silêncio entre eles.

Syndra se sentia tão cansada! E também envergonhada. E com raiva de si mesma por seu corpo ter colapsado tão estupidamente devido algumas noites mal dormidas. Aquilo fez com que a sua mente fosse invadida por todas as lembranças do passado, de quando as pessoas ao seu redor apontavam como ela era imprudente e indomada com a magia. Mas Zed não precisava saber o quão quebrada ela estava. Por isso, ela não disse uma palavra. Apenas abaixou a cabeça e aprisionou em seu coração todo o seu arrependimento.

Zed expandiu o pulmão respirando fundo, percebendo que Syndra estava tentando evitá-lo. Ele odiava o modo silencioso dela se castigar remoendo os próprios sentimentos. Só que ele se odiava ainda mais por querer acolhê-la e não saber exatamente como fazer isso. Afinal, ele não era a pessoa mais carinhosa do mundo. De qualquer forma, ele se esforçava para conseguir dar a ela o pouco de atenção que jamais teve. Portanto, Zed estendeu a mão puxando cuidadosamente Syndra pelo braço, a trazendo para mais perto, e ao mesmo tempo, ela lhe abraçou escondendo o rosto sobre as tatuagens em seu peito. E todos os seus sentidos acenderam, emitindo um arrepio pela sua pele.

— Eu não queria que isso tivesse acontecido. – Syndra explicou para Zed. 

— Eu sei. 

— Eu não sou uma pessoa ruim. Realmente, eu não sou assim! 

— Está tudo bem. Eu acredito em você. 

— Mas não importa o que eu diga, eu sei que não vão acreditar em mim! Eu não estou mentindo! Eu não fiz nada para arruinar esse lugar! Porque todos aqui continuam me encarando e me odiando!

Os sentimentos de Syndra entraram em erupção, transbordando através das unhas cravadas nas costas de Zed, rasgando minuciosamente a sua pele. Ele sentiu todo o peso da angústia reprimida dentro dela, sendo injetada como um veneno em seu corpo. O seu coração começou a bater rápido, descontroladamente. Cada vez que puxava o ar para respirar, algo dentro de si quebrava espalhando um ardor indescritível! Mas que ele julgou ser necessário suportar. Porque acreditava que se fosse capaz de superar a dor, conseguiria arrancar aquele sentimento malevolente de Syndra. Com isso, ele se agarrou a ela.

— Eu estou aqui. Está segura agora. 

Como o manto negro da noite embalando a suave luz da lua, Zed cobriu as preocupações de Syndra com doces promessas.

 

Após um tempo, Zed percebeu que Syndra tinha adormecido quando os braços dela escorregaram por suas costas, aliviando imediatamente a dor em sua coluna. Exausto, ele arfou e tombou para trás, se deitando na grama.

Os olhos âmbar se perderam no céu, nas diversas estrelas. Zed procurou ali por uma resposta. A pergunta não era sobre o que aconteceu com Syndra para que perdesse o controle da magia. Isso ele já sabia. A pele embaixo dos olhos dela tinham manchas tão escuras que ele podia dizer com exatidão há quantos dias ela não dormia. Agora, o seu maior problema era encontrar uma forma de levar ela para um lugar mais confortável sem que a acordasse.

Ele levantou a cabeça, vendo a jovem ainda adormecida aninhada ao seu corpo, com a bochecha e os lábios encostados em seu peito. Envergonhado, ele bateu a nuca no chão e esfregou a mão no rosto enrubescido.

— Merda! – praguejou. – Como é que consegue dormir tão tranquilamente em meus braços? Depois de tudo o que eu já fiz nessa vida. – resmungou irritado. – Definitivamente, você não está bem.

Lentamente, Zed se virou de lado, ajeitando o corpo de Syndra sobre a grama. E em seguida, ele apoiou a cabeça em uma das mãos, observando a delicadeza dos traços no rosto dela. Tão linda, com uma mente louca e uma alma quebrada – pensou.

— Para que ser tão caótica?

Zed sorriu. Seus dedos se moveram suavemente por entre os fios claros do cabelo de Syndra, os afastando da frente dos olhos prateados que se abriram devagar abaixo dos longos cílios.

— Por que você ainda está aqui? – Syndra perguntou confusa e curiosa. 

— Eu não vou embora. Se você não lembra, eu prometi te proteger, Syndra. 

— Tudo o que você já fez foi me proteger, Zed. Eu não estou mais exatamente em perigo. Você não precisa ficar o resto da noite trancafiado nessa ilha. 

— Ssh. Vá dormir. – ele tampou a visão dela com os dedos. – Você pode ficar brava comigo mais tarde.

Syndra retirou a mão de Zed de cima dos seus olhos e trouxe para perto do seu rosto, a milímetros de seus lábios. Ela observou o rosto dele, a expressão séria escondendo o sútil sinal do quão desapontado estava consigo mesmo, lá atrás, na camada mais funda dos olhos.

— Sabe... – a voz dela sumiu enquanto bocejava. – Está tudo bem. Eu te perdoo. – avisou fechando os olhos, se sentindo sonolenta. – Se houver uma situação em que você não consiga me salvar, não precisa vir.

Essa situação... o momento em que Zed tivesse que enfrentar a si mesmo no futuro, depois de perder Syndra, o enchia de um medo sufocante! Porque ela era a única pessoa que mais importava para ele.

— Mesmo se eu soubesse que estou atrasado, eu ainda iria para salvar você.


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Notas finais do capítulo

Mais uma historinha triste e fofinha para vocês ficarem melancólicos junto comigo ♥



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