Construindo meu futuro - HARMIONE escrita por LadyPotterBlack


Capítulo 22
20 - "Wish you were sober"


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo possui uma cena com conteúdo [+16]



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/810803/chapter/22

O céu noturno estava azul profundo e intenso, completamente bêbado por estrelas brilhantes. Mas nenhuma estrela brilhava mais do que os olhos de Hermione naquele momento.

Olhando para baixo, o coração de Harry tropeçou em seu peito quando seus olhares se chocaram.

Aqueles olhos, aquela expressão...

Harry simplesmente amava aquilo.

Amava Hermione. Amava seu jeito.

Harry amava a forma como Hermione mantinha sua guarda alta, como ela se protegia. Como ela era capaz de afastar a todos com um simples olhar. Amava seu lado teimoso, genioso e marrento.

Mas acima de tudo, Harry amava quando Hermione se permitia abaixar a guarda, quando se permitia sentir tudo, quando ela se permitia ser vulnerável. E, o melhor, ele amava ser o causador, ele amava ter o poder de desmontar Hermione, de deixá-la confortável para isso.

Harry amava a expressão inocente que emoldurava o rosto de Hermione naquele instante. Amava como seus olhos brilhavam com um sentimento puro e genuíno, mesmo quando o seu corpo dizia o contrário. Ele conseguia sentir o corpo dela quente contra o seu, conseguia ver suas bochechas coradas, cobertas pelo mais profundo tom de vermelho, e, por Merlin, ele sabia que o motivo por ela estar corada não era constrangimento. Ela estava corada devido ao desejo. Ao desejo que sentia por ele.

Hermione estava queimando por desejar Harry.

E que todos os Deuses e grandes bruxos da história o amaldiçoassem.

Ele a queria da mesma forma.

Ele assumia, era um criminoso.

Harry se declarava culpado. Completamente culpado, sem direito a defesa, advogados, ou um julgamento digno. Simplesmente não havia absolvição pelo seu crime.

Mas havia um culpado.

Hermione era a culpada.

Hermione era completamente culpada pela forma como ela o fazia querer roubar seu coração.

Então que o mundo o julgasse. Que o mundo o chamasse de criminoso por aquilo, mas Harry, de forma alguma, se arrependia por aquilo. Jamais estivera tão feliz como naquele momento.

— Acredito que se continuar sorrindo dessa forma, suas bochechas irão se rasgar. — Hermione comentou risonha, acariciando a bochecha de Harry com a ponta de seus dedos.

Impossivelmente o sorriso de Harry se alargou. Uma de suas mãos desceu pelo corpo de Hermione, até encontrar sua cintura e ficou por lá. Seu braço rodeando o corpo dela, a mantendo junto de si. Sua outra mão subiu indo em direção a mão que Hermione usava para acariciar seu rosto.

Harry entrelaçou seus dedos, levando as mãos unidas para junto de seu peito, para que Hermione pudesse sentir o "TUM TUM" acelerado de seu coração contra a palma de sua mão.

— Eu estou feliz, apenas isto.

Hermione soltou um pequeno riso.

— Pelas batidas de seu coração, eu diria que você está apavorado, isso sim.

Harry riu e puxou Hermione ainda mais para si, não deixando um único espaço sequer entre seus corpos.

Hermione suspirou, todo aquele contato físico era o que ela desejava naquele momento. E, por Morgana, como ela desejava, como precisava senti-lo naquele exato instante, como precisava das mãos dele passeando por seu corpo, lhe deixando arrepiada, como precisava dos dedos de Harry enterrados em seus cabelos... Ela mordeu seu lábio inferior desejosa, desejosa demais, para a própria sanidade.

 mais um beijo. Hermione prometeu a si mesma. Só mais um beijo e ela iria para seu dormitório antes que fizesse algo realmente insano.

Hermione se afastou ligeiramente do peito de Harry, ele pareceu não gostar muito da decisão, pois soltou um resmungo. Mas, antes que ele tivesse a oportunidade de perguntar o que havia de errado, Hermione capturou seus lábios em um beijo profundo.

Um gemido escapou dos lábios de Harry. Por Merlin, aquela garota seria a sua perdição, mas também seria a sua salvação.

Sem conseguir se conter, ele a puxou para si, firmando seus corpos um contra o outro, maciez contra rigidez, sua mão indo em direção aos cabelos dela, se firmando nos cachos, desejando agarrar tudo o que ela estivesse disposta a entregar naquele momento.

Hermione suspirou, gemeu e choramingou tudo em um único som ao senti-lo agarrar seus cabelos.

Por Morgana aquele beijo era muito, muito, muito melhor do que qualquer coisa que ela pudesse imaginar. A descrição literária de beijos não fazia jus àquilo que estava sentindo naquele instante. Versos ou textos não faziam jus àquela chama ardente que se formava no baixo de seu ventre e se espalhava por todo o seu corpo. A imaginação simplesmente não fazia jus à realidade. Por Morgana, como era bom poder sentir o corpo de Harry contra o seu, sentir sua respiração falhando, sentir os músculos se contraindo sob o seu toque...

Era impossível parar. Não havia como romper aquele beijo, principalmente agora que ela conseguia sentir os lábios macios e doces contra os seus se movimentando, exigentes.

Quando o ar faltou nos pulmões de Hermione, ela quis se amaldiçoar.

Pulmões estúpidos!

Sentiu uma falta absurda dos lábios de Harry quando o beijo foi finalizado.

Pulmões estúpidos!

A raiva que começava a borbulhar no peito de Hermione, foi completamente apagada assim que os lábios de Harry decidiram que a distância realmente era cruel e devastadora.

Ele começou uma pequena trilha de beijos no rosto de Hermione. Começando pelo canto de sua boca, marcando ali um longo beijo, para então ir até o lóbulo de sua orelha, sugando-o lentamente. Hermione suspirou tentando aproveitar ao máximo aquela avalanche de sentimentos e sensações que entorpeciam a sua mente e seu corpo. Harry, por fim, desceu com pequenos e marcantes beijos por seu pescoço, chegando até o primeiro botão de sua camiseta, parando ali, não avançando nenhum outro passo.

Hermione olhou para baixo e a visão fez suas pernas bambearem e suas mãos buscarem algum apoio. Algo que lhe prendesse a esse mundo.

Harry soltou uma pequena risada, baixa e maliciosa, ao sentir as unhas de Hermione cravando em seus ombros.

Ela sempre estava no controle de tudo. Estava no controle de suas próprias ações, no controle dos planos, das estratégias... Então, era simplesmente encantador vê-la se contorcendo, tão sem controle de seu próprio corpo.

Era mágico saber que ele estava lhe causando isso.

Harry subiu aos beijos pelo colo de Hermione, parando para morder um local particularmente sensível em seu pescoço. Então ele colou sua boca ao ouvido dela e sussurrou.

— Acredito — houve uma pausa, uma respiração rápida escapando de Harry — acredito — ele começou outra vez — que deva ir para o seu dormitório agora. — Disse sem fôlego, tropeçando nas palavras, como se estivesse se segurando.

Hermione afundou mais as unhas nos ombros de Harry ao ouvi-lo, rouco e sem fôlego no pé de seu ouvido.

— Por acaso está me expulsando dos jardins, garoto problema? — Sussurrou a provação bem baixo e próximo do ouvido dele.

Harry riu. Era impressionante como ela sempre conseguia surpreendê-lo.

— De forma alguma. Adoraria ficar com você aqui — ele a apertou junto de si para que não houvesse nenhuma dúvida de que ele realmente gostaria que ela ficasse. — Mas temo que se o fizer, não conseguirei soltá-la.

E toda aquela chama, todo aquele desejo latente que borbulhava no corpo de Hermione se abrandou. Toda aquela necessidade cega causada pela paixão deu lugar a outro sentimento. Deu espaço para a outra face da paixão.

O carinho.

O simples querer estar ao lado da pessoa, sem palavras sendo ditas ou beijos sendo roubados. A vontade quase insaciável de ter o outro ali do seu lado, dividindo o mesmo espaço, compartilhando calor.

Hermione passou os braços ao redor do pescoço de Harry, dando-lhe um abraço apertado.

— Não quero te soltar.

Harry riu ao ouvir a confissão e a agarrou ainda mais.

— Também não quero te soltar. Nunca mais! Demorei tempo demais para ter você assim.

Hermione sorriu como uma tola apaixonada.

E que a maldita verdade viesse à tona. Ela se sentia como uma tola apaixonada!

Hermione riu baixinho e Harry se afastou para poder fitá-la melhor.

— Você terá de me contar o motivo dessa risadinha.

Hermione balançou a cabeça, negando-se a contar a verdade.

Um brilho muito maroto dominou os olhos de Harry.

— Acredito que terei de arrancar a verdade por mim mesmo, então — ele suspirou como se estivesse prestes a fazer algo realmente trabalhoso.

Hermione o olhou como se ele estivesse ficando louco, o que não deixava de ser verdade, uma vez que Harry estava enlouquecendo por ela.

Harry abaixou seu rosto o suficiente para que ele pudesse encaixá-lo na curva do pescoço de Hermione e começou a trabalhar por ali.

Começou com um lento beijo, seus lábios se demorando na pele, como se estivessem querendo gravar a sensação de tê-la ali, quente e macia toda para ele.

Hermione se arrepiou inteira.

— Vai me contar o motivo da risada?

Ela balançou a cabeça sinalizando que não.

Não usara palavras, não por estar sendo teimosa, mas porquê não tinha a certeza de que conseguiria formular uma frase, uma palavra sequer, sem suspirar pelo imenso prazer que ela estava sentindo naquele momento.

Harry balançou a cabeça em negação, seus fios de cabelos fazendo cócegas no queixo de Hermione.

— Estou fazendo um péssimo trabalho!

Se fosse capaz de falar algo realmente coerente, sem emitir algum som que denunciasse o quanto ele definitivamente não estava fazendo um péssimo trabalho, Hermione teria feito. Teria lhe dito que ele estava se saindo excepcionalmente bem em deixá-la sem palavras.

Mas ela simplesmente não conseguiu fazer nada além de arquear seu pescoço, tentando, de alguma forma, ter mais dos lábios dele.

Harry riu ao se dar conta do que ela estava fazendo e se afastou completamente.

Hermione abriu os olhos se sentindo estranhamente vazia sem o corpo dele contra o seu.

Harry teve de morder seu lábio para não lhe escapar nenhum palavrão.

Hermione nunca lhe parecera tão bela quanto naquele instante, seus cabelos bagunçados, seus lábios inchados e avermelhados, devido aos beijos, as bochechas coloridas pelo tom mais profundo de vermelho e as vestes completamente desalinhadas. E claro, aquele primeiro botão da gravata desabotoado, oferecendo-lhe uma pequena tentação.

— Se você não for para o seu dormitório agora, não irei conseguir ficar longe de você.

Hermione prendeu seu dedo entre os dentes, avaliando a situação. Ficar ali com Harry era realmente uma proposta tentadora. Tentadora demais para a sua própria sanidade.

— Vá antes que eu me arrependa de ter estragado nosso momento roubado nos jardins.

Hermione sorriu e avançou na direção dele, dando um pequeno beijo em seus lábios antes de se afastar.

— Me dê um minuto. — Ela pediu, então virou-se de costas para ele, empunhou sua varinha e começou a trabalhar.

Harry riu e observou enquanto ela colocava de volta o feitiço glamour em seu corpo, observando como, aos poucos, Hermione Granger deu lugar a Bela Morning. Ficou parado, apenas observando enquanto ela começava a dar os primeiros passos em direção ao castelo, mas, então Hermione parou sua caminhada e olhou para ele de forma apreensiva.

— Harry, me prometa que quando eu acordar amanhã, isso não será um sonho. Me prometa que nosso beijo não será apenas uma ilusão de minha cabeça.

Ele sorriu de forma carinhosa.

— Eu prometo que tudo isso foi real. — Ele disse, então levou seu dedo mindinho aos lábios, dando-lhe um pequeno beijo e depois o ergueu. Uma pequena promessa.

Hermione sorriu abertamente, então repetiu o gesto, selando a pequena promessa, o pequeno segredo, dos dois. Apenas dos dois.

*

*

*

Dez minutos mais tarde, Harry voltou a ser Tiago Star caminhando pelos corredores de Hogwarts em direção ao seu próprio dormitório, há quem diga que ele estava praticamente saltitando pelos corredores, com um sorriso estúpido espalhado em seu rosto.

Ele continuou sua caminhada até alguém trombar com ele, fazendo-o cair no chão. Harry teve a estranha sensação de que o esbarrão foi proposital, mas ele estava muito bem-humorado para ficar chateado com isso. Então ele só se levantou e alinhou suas vestes, ele não sabia em quem esbarrou, só percebeu quando escutou uma risada baixa e astuta.

Imediatamente Harry ergueu olhar, fuzilando o maldito com seus olhos.

— Por Morgana, não me olhe dessa forma! Você deveria ver como estava ridículo andando pelos corredores saltitando. — Regulus disse rindo claramente se divertindo com a situação.

Harry estalou sua língua, o som reverberando pelo corredor vazio.

— Eu estou feliz, apenas isso.

Os olhos de Regulus faiscaram com um lampejo de malícia.

— E toda essa alegria tem a ver com uma certa garota da Grifinória que passou correndo, de uma forma bem semelhante a você, se me permite dizer, por esse mesmo corredor?

Harry teve a decência de sentir as bochechas corando com o comentário do amigo.

— O que você está fazendo aqui? — Ele perguntou ao invés de responder à pergunta.

Harry não estava esperando que Regulus fosse direto ao assunto. No fundo, ele esperava que seu amigo o provocasse mais a respeito de toda a situação. Mas não foi isso o que aconteceu.

Regulus, de um instante para o outro, assumiu uma postura séria, seu olhar se tornando determinado, seus ombros ficando tensos por sua concentração.

— Eu estava procurando por você.

— Por mim?

Regulus soltou um pequeno bufo. Às vezes ele se esquecia de como os Grifinórios poderiam ser lerdos.

— Oras, tem mais alguém neste corredor?

Bom-humor.

Era tudo o que a mente de Harry se forçava a repetir. Ele estava muito contente e não iria se aborrecer pelas pequenas farpas nas falas de Regulus.

— O que foi, Reg?

A inquietação de Regulus pareceu se abrandar ao escutar o apelido sendo dito pelo amigo.

— Só queria saber se você estava realmente bem em relação a tudo que ocorreu durante... você sabe — ele pareceu receoso em terminar a frase. Não queria ter de trazer o assunto à tona uma outra vez. Então resolveu falar rápido, de forma quase embolada. — O duelo com Snape.

A menção do duelo foi como uma nuvem acinzentada em um dia de sol. A promessa de que toda a diversão e todos os sorrisos podiam sumir a qualquer momento.

Harry fechou seus olhos.

Um pequeno trovão começando a despencar em sua mente, ameaçando por fim em toda a sua alegria.

Estavam todos comentando sobre ele mais uma vez. Uma segunda maldita vez!

— Qual ruim? — Ele perguntou em um suspiro cansado.

Regulus escorou seu ombro na parede do corredor vazio, em uma posição casual enquanto dizia palavras absurdas.

— Ugh! Nada de mais você sabe, só estão dizendo que você provavelmente é o braço direito de Voldemort. Sabe, dizem por aí que ele tem um certo fascínio por cobras. — Ele disse olhando para suas unhas, como se estivesse comentando sobre o tempo. — Se bem que me recordo de ter escutado algo sobre você ter um basilisco de estimação. Se eu não estiver muito enganado a garota até dissera um nome... — ele parou, coçando seu queixo. — Rex! — Estalou seus dedos — isso, o nome de seu basilisco de estimação é Rex.

Aquilo foi o suficiente para uma risada irromper de Harry. A tensão repentina se esvaziando aos poucos de seu corpo.

— Essa gente acredita em cada coisa. — Harry disse enquanto se apoiava ao lado de Regulus na parede.

Black sorriu, estava orgulhoso e contente consigo mesmo por arrancar uma risada de seu amigo.

— E você o que acha disso?

Regulus ergueu uma sobrancelha.

— Isso importa? — Perguntou franzindo o rosto. — Importa o que eu acho disso tudo?

Harry assentiu.

Uma sensação estúpida dominou Regulus. Ele era importante. O que ele pensava tinha valor. Bem, pelo menos para uma pessoa.

— Bom, se me permite dizer, eu acho muito legal. Quero dizer, — ele se desvencilhou da parede, a agitação dominando sua fala — quantas pessoas por aí não gostariam de falar com algum animal. Oras, eu não digo que ser ofidioglota é estupendo, só porquê Salazar Slytherin era ofidioglota, mas pense comigo, o quão útil pode ser?

Harry soltou uma risada amarga.

— Claro, ser ofidioglota pode ser muito útil, — ele concordou ironicamente — mas só se eu planejasse me tornar um manipulador de serpentes.

Regulus suspirou.

— Eu sei que não é a habilidade mais popular de se ter, mas veja o que aconteceu no salão, por exemplo, você apenas conversou com a cobra e ela simplesmente desapareceu sem ao menos deixar uma pessoa ferida.— Ele parou, então soltou uma pequena risadinha. — A não ser que o ego ferido de Snape seja levado em consideração.

Harry riu.

— Nunca imaginei que você não gostasse de Snape.

Regulus revirou seus olhos.

— Não é só porque ele é da Sonserina que isso o torna menos babaca.

Harry ergueu suas sobrancelhas em uma pergunta silenciosa.

Regulus voltou a se encostar na parede, escorregando o seu corpo até que ele estivesse sentado no chão.

— Antes de entrar em Hogwarts eu já havia escutado muitas histórias sobre ele. — Ele confessou, seus olhos se fechando, como se ele estivesse revisitando uma memória distante. — Quero dizer, Sirius entrou dois anos antes de mim.

Harry não disse nada. Ele apenas se sentou ao lado de Regulus e o escutou.

— No primeiro verão em que Sirius voltou para casa, ele chegou cheio de histórias. — Regulus abriu um pequeno sorriso. — Todas sobre os incríveis amigos que ele tinha feito. — Um suspiro escapou do sonserino. — Eu fiquei mordido de ciúmes, acho que, no fundo, eu sempre soube que chegaria um momento em que Sirius escolheria eles ao invés de me escolher.

Afinal, por que alguém escolheria Regulus?

Por que alguém escolheria alguém tão entediante, tão covarde?

Por que escolher alguém que se esconde na sombra das outras pessoas? Alguém que se esconde nas escolhas tomadas por outra pessoa.

Por que escolher ele? Por que se prender a ele?

Harry teve que morder a sua língua para não dizer que Sirius não havia escolhido entre os Marotos e Regulus.

Sirius havia feito uma escolha, sim.

Sirius havia escolhido entre ficar em uma casa onde era rejeitado, tratado como um erro, uma aberração... ou fugir. Ir para uma casa em que ele poderia chamar de lar. Com pessoas que o acolheriam e o protegeriam. Pessoas que o amariam.

Ele havia traçado seu destino a partir de uma decisão. Contudo, o problema das escolhas é que não podemos prever o que se desenrolará a partir delas.

Não podemos traçar todos os destinos, nem calcular todas as possibilidades. Não podemos decidir o que irá ser menos ou mais doloroso, ou que causará menos estragos. Simplesmente não conseguimos.

O que acontece se eu escolher ficar? O que acontece se eu escolher partir?

O que iria acontecer se Sirius permanecesse na casa dos Black 's? Regulus ainda estaria indo para o lado de Voldemort?

A própria relação de Sirius com os pais poderia ser diferente?

Ou para isso mudar, teríamos de ir mais a fundo nessa história?

O que aconteceria caso Sirius não tivesse sido selecionado para a Grifinória? Ele iria parar na Sonserina?

Afinal, ninguém pode negar que Sirius é ambicioso, audacioso e tem um certo desprezo pelas regras.

E se ele fosse parar na Sonserina, ele ainda seria amigo dos Marotos, ou seu melhor amigo se tornaria Regulus?

E se isso acontecesse, ele seria a melhor versão de si mesmo, com um futuro glorioso ao invés de um destino marcado por tragédias e perdas?

Esse é o problema.

As escolhas são marcadas por duas palavrinhas "e" "se". Separadas elas podem parecer inofensivas, quase bobas. Mas juntas elas podem ser perturbadoras. Podem ter o poder de nos assombrar durante as noites. Nos fazer revirar nos lençóis, pensando, pensando, calculando e calculando...

E se eu tivesse tomado aquele caminho?

E se eu tivesse tomado aquela outra direção?

Certa vez, depois da partida de seu irmão, Regulus havia se aventurado a entrar em seu quarto. Havia passado horas e horas deitado em sua cama tentando entender por que diabos ele havia o abandonado naquela casa.

Então, quando estava prestes a ir embora, decidido de que o motivo não era suficiente para abrandar o que ele estava sentindo em seu coração, Regulus tropeçou em um livro esparramado no chão.

— Merda! — Ele deixou o palavrão escapar, então abaixou-se e apanhou o livro para ver do que se tratava.

Era um livro estranho, ele concluiu, cheio de desenhos e rabiscos, em algumas páginas ele conseguia ver alguns desenhos e algumas anotações feitas por seu irmão. Quando viu que as imagens não mexiam, ele deduziu que se tratava de um livro trouxa.

Regulus até pensou em jogar o livro de volta para o chão, mas o objeto estranho já havia despertado a sua curiosidade.

Folheando de forma quase despreocupada o livro, Regulus encontrou uma página que dizia o seguinte.

 

"Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho basta."

 

Aquelas palavras poderiam muito bem resumir os próximos dois anos de Regulus.

Ele estava perdido sem seu irmão para guiar seu caminho, então qualquer caminho bastava, certo?

Mas o que acontece quando você tem um caminho traçado, um destino selado e de repente não o quer mais?

Ainda dá tempo de voltar?

Os devaneios quase confusos demais de Regulus foram interrompidos por Harry.

— E onde Snape entra nessa história?

Regulus chacoalhou a cabeça, tentando, de alguma forma, se distanciar do passado e se prender ao presente.

— Meu irmão não é flor que se cheire, aliás, nunca foi. — Ele disse com uma pequena risada. — Mas Snape não é nenhum santo. — Regulus ergueu seu pescoço, checando se, de fato, não havia mais ninguém nos corredores. — Os Marotos você sabe, eles têm alguns segredos... — A última parte foi dita em um breve sussurro, como se Regulus temesse que as próprias paredes pudessem escutá-lo.

Harry ergueu suas sobrancelhas, o espanto evidente em seus olhos.

Do que ele sabia?

— Não me olhe com essa cara. — Regulus semicerrando seus olhos, disse para Harry. — Existem coisas evidentes demais dentro daquele grupo, apenas os tolos para não enxergar.

— Onde você está querendo chegar?

Regulus quase riu do espanto e da preocupação de Tiago, mas ele preferiu responder, ao invés de rir da cara do amigo.

— Veja, quando a lua cheia se aproxima, o Lupin sempre parece cansado demais. O grande salão parece como uma masmorra de tortura feita especialmente para ele, com todas aquelas conversas, todos os ruídos. Com todo o barulho. E olha que coincidência, um dia após a lua cheia ele nunca aparece nas aulas, ou, quando dá às caras, parece que foi sugado por uma dúzia de dementadores. E o mais chocante, Potter, Pettigrew e Sirius também não aparecem e, quando dão o ar da graça, sempre estão cansados demais, como se tivessem passado a noite em claro.

Quando Regulus terminou de falar, a boca de Harry estava aberta em puro choque.

— Então o que isso significa?

— Que você presta muita atenção em seu irmão e nos amigos dele?

Regulus revirou os olhos.

— Eu não sou nenhum idiota e acredito que você também não seja. Está claro que Lupin é...

Harry não o deixou terminar.

— Não diga as palavras, alguém pode acabar escutando. — Ele pediu, sua voz saindo como uma súplica. Quanto menos pessoas soubessem sobre a condição de Aluado, mais seguro ele estaria.

Regulus maneou a cabeça em concordância. Mesmo estando em Hogwarts, não era seguro sair confidenciando segredos por aí onde qualquer pessoa poderia escutar.

— A questão é a seguinte. Não somos burros e Snape também não é.

— É claro que ele percebeu. — Harry murmurou mais para ele mesmo do que para Regulus.

— Sim, ele percebeu. — Regulus concordou apesar de não ser necessário. — E claro que ele não ficaria calado por muito tempo.

— O que ele fez? — Harry perguntou, mesmo tendo a vaga lembrança de uma história sobre Severus tentar divulgar de maneira bem explícita para toda a escola e para as autoridades, sobre a face lupina de Remus. Harry também se lembrava de como Severus afirmava com voracidade que Sirius tentara matá-lo durante o sexto ano.

Regulus respirou fundo.

— Primeiro você tem que compreender que Sirius sempre foi o mais impulsivo e explosivo de nós dois. Eu gosto de pensar que eu sou o mais racional de nós dois. — Ele disse com um pequeno riso, como se recordasse de todas as pequenas aventuras de quando eles eram crianças. De como Sirius tinha planos grandiosos que certamente os colocariam em furadas e de como ele tentava, de alguma forma, persuadi-lo de que não era uma boa ideia.

Harry queria poder congelar aquela imagem. O sorriso sereno de Regulus enquanto ele se recordava de seu irmão.

— A questão é a seguinte. É muito fácil despertar a raiva e a retaliação de meu irmão, basta cutucá-lo onde dói mais. Basta mexer com suas feridas. No início do ano passado, toda a escola comentava sobre Sirius não morar mais debaixo do teto dos Black's. — Ele parou por um momento, depois acabou soltando uma risada curta e amarga. — Não me lembro de algum outro momento nesta escola em que fui chamado para participar de tantas rodas de conversas, ou outro momento em que meu nome foi tão mencionado.

— Todos queriam saber o motivo para Sirius sair de casa. — Harry murmurou e mais uma vez amaldiçoou aquelas redes de fofocas que corriam à solta por Hogwarts.

Regulus assentiu.

— Nunca foi segredo que Sirius não se dava muito bem com nossos pais. Ele não fazia questão de esconder. — Ele balançou a cabeça. — Por outro lado, nossos pais tentavam manter as coisas debaixo dos panos. Afinal, como uma família dos "sagrados vinte e oito" — ele disse com uma pompa exagerada o título que os Black's ostentavam na alta sociedade bruxa. — Como nós poderíamos ter algum tipo de problema?

— Deve ter sido um choque e tanto quando Sirius foi morar com o pap... — Harry quase deixou escapar "papai". Às vezes estar com Regulus era tão fácil que ele simplesmente se esquecia do papel que deveria desempenhar. — Com os Potter's. — Ele corrigiu, tentando soar da forma mais impessoal possível.

Regulus ergueu as sobrancelhas avaliando a frase.

"Há algo de estranho." — Ele pensou.

Ele fez uma pequena nota mental: Tiago estava gaguejando ao dizer as palavras.

Não que gaguejar fosse algo de outro mundo ou algo do tipo, mas parecia que ele não queria falar os Potter's, parecia que ele iria dizer outra coisa.

Ele decidiu que poderia deixar para pensar naquilo mais tarde. No momento ele estava concentrado em contar uma história.

— Foi um choque e tanto. Lembro-me de uma noite em que estava voltando da biblioteca e, quando passei por um corredor, escutei a voz de Sirius. Eu tentei sair de lá, eu verdadeiramente tentei, mas não consegui — Regulus fechou os olhos e levou uma de suas mãos aos seus cabelos, puxando-os com força. — Quando Sirius saiu de casa houve uma briga muito muito feia entre ele e nosso pai. Tudo começou em um jantar, estava toda a família Black reunida e... — Regulus parou de contar, um nó imenso o impedindo de continuar. — Quer saber? Não é uma história minha para te contar. — Ele respirou fundo tentando afastar as lembranças, mas era tudo tão vívido. Os gritos de seus pais, a risada estridente de Bellatrix... Sirius sangrando, a descarga de poder que saia dele toda vez que ele falava ou lançava um feitiço para se proteger de seu pai.

— Tudo bem — Harry disse, sua voz tranquila — não precisa me contar os detalhes.

Harry fez uma pequena nota mental: conversar com Sirius sobre essa noite específica, se ele estivesse disposto, é claro. Precisava entender tudo o que havia acontecido com seu padrinho. Precisava saber de que pessoas ele teria de se vingar quando a hora chegasse.

— Eu só queria saber se estava tudo bem com Sirius,— Regulus tornou a falar — depois de vê-lo todo machucado eu precisava... — Ele não conseguia continuar falando sobre aquele dia, o bolo de sentimentos arranhava sua garganta, o impedindo de contar mais. — Só precisava saber se ele estava bem. Imaginei que ele estaria conversando com um de seus amigos, mas não.

— Era Snape. — Harry certeiramente supôs.

— O próprio. — Black confirmou — Eles estavam em uma pequena discussão acalorada. Imaginei que fosse pelo passado deles, digamos assim. Quando ainda não estava em Hogwarts, Sirius contava sobre esse menino, o seboso, como ele dizia. Sirius me contava que ele adorava brigar com ele e seus amigos. Ele dizia que por serem mais atentados, os Marotos sempre levavam a culpa, mas ele me garantia que Severus se mostrava um adversário a altura para suas traquinagens.

— É a cara de Sirius. — Harry disse rindo, por um momento se esquecendo da tensão que permeava aquela conversa.

— Quando entrei na escola, comecei a perceber que não era bem assim. Claro havia a rixa declarada entre os Marotos e Severus. Mas eu comecei a perceber que grande parte da implicância de Sirius por Severus, estava relacionada ao fato de ele pertencer a Sonserina. Aquilo me magoou.

— Claro que lhe magoaria — Harry disse de forma compreensiva — você também é da Sonserina.

Os olhos de Regulus brilharam ao ouvir aquilo. Ele estava sendo compreendido!

— Naquela noite eu imaginei que seria mais uma provocação entre os dois, mas eu fiquei mesmo assim e escutei tudo o que era dito.

— Não era só mais uma provocação?

Regulus negou com a cabeça.

— Severus estava dizendo que sabia sobre o verdadeiro motivo para a saída de Sirius. Estava dizendo que Lucius, marido de nossa prima que estava no jantar, lhe havia contado tudo. Severus disse que Sirius gostava de se exibir por aí por ser da Grifinória. Da casa dos bravos, valentes e dos corajosos, mas, ele não passava de um covarde que havia fugido de sua própria casa.

Harry fechou seus olhos, os espremendo. Sua língua cutucava sua bochecha enquanto ele pensava no efeito das palavras de Severus em cima de Sirius.

— Sirius deve ter ficado uma fera.

— As palavras acertaram o alvo em cheio. Sirius era como um feitiço poderoso nas mãos de um bruxo fraco. Estava pronto para sair pela culatra. Severus se aproveitou da situação e começou a fazer insinuações.

— Sobre Sirius?

Regulus negou com a cabeça.

— Não. Ele foi onde doeria mais. Ele começou a ofender os Marotos. — Regulus tombou sua cabeça para trás e deixou que a verdade sem filtro lhe escapasse. — Eu nunca entendi muito bem a relação deles. É... — ele procurou as palavras, mas não as encontrou. — Eu não sei, mas a verdade é que nunca vi Sirius defender algo ou alguém como ele defende aqueles garotos.

"Isso é amizade verdadeira!" — Harry pensou.

Em sua mente lhe veio a imagem de Hermione e Rony.

Não havia nada naquele mundo que ele não faria por aqueles dois. Nem que o inferno caísse sobre a terra, ele deixaria de tentar protegê-los.

Ele imaginava que, com os Marotos, seria da mesma forma.

Seu coração ficou triste ao perceber que Regulus não conhecia aquilo. Não conhecia como era lutar pela vida de outra pessoa. Não sabia como era dividir o peso da tristeza ou de seus problemas. Regulus simplesmente não conhecia a amizade.

"Mas você irá lhe mostrar!" 
— Uma vozinha em sua mente lhe dizia.

Harry estava tão perdido em seus próprios pensamentos que mal percebera que Regulus tornara a falar.

— ...então — Harry pegou a frase pela metade — ele começou a fazer suposições. Começou a dizer que sabia sobre Lupin, sobre suas viagens mensais ao salgueiro lutador e também revelou que sabia como segui-lo. Disse que iria desmascará-lo para toda a escola.

— E o que Sirius fez?

— Aquele idiota? — Regulus perguntou, mas não deu tempo para que Harry respondesse, ele simplesmente continuou. — Aquele imbecil o desafiou! Que se Severus fosse tão valente e bravo como ele dizia, então ele iria conseguir provar que cada palavra que saía por sua boca era verdadeira.

Harry arfou, o ar sendo roubado de seus pulmões pela idiotice de seu padrinho.

— Mas, não é possível, ele não colocaria o segredo de Aluado em perigo dessa forma. — Harry disse, se negando a acreditar que seu padrinho podia ser tão estúpido e tolo.

— Em defesa de meu irmão, eu acredito que ele estava com o orgulho ferido por ser chamado de covarde e, também acredito, que ele não iria imaginar que Snape seria tão burro a ponto de se meter com um lobisomem em forma adulta.

Se Harry não estivesse tão chocado com o comportamento de seu padrinho, ele até poderia gostar e considerar um avanço o fato de Regulus estar defendendo Sirius. Mas ele não estava com cabeça para aquilo.

— Não importa. — Ele disse se sobressaltando. — Foi estúpido de qualquer forma.

— Nunca disse que não foi. — Regulus disse, quase ofendido. — O que importa é: Severus foi atrás dos Marotos na próxima lua-cheia que sucedeu essa conversa. Soube que ele quase foi atacado por Lupin, mas Potter, ao que parece, acabou salvando a pele dele.

Com as palavras de Regulus, Harry foi engolido por uma memória. Uma conversa que havia tido com Dumbledore a quase uma vida atrás.


— E, além disso, seu pai fez uma coisa que Snape nunca pôde perdoar. — O diretor lhe contou.

— O quê?

— Salvou a vida dele.

— O quê?

— É... — disse Dumbledore, sonhador. — É engraçado como a cabeça das pessoas funciona, não é? O Prof. Snape não conseguiu suportar o fato de estar em dívida com o seu pai. Acredito que tenha se esforçado para proteger você este ano, porque achou que isso o deixaria quite com o seu pai. Assim podia voltar a odiar a memória do seu pai em paz...



— O que mais aconteceu?— Harry perguntou querendo saber de tudo.

Regulus deu de ombros.

— Os detalhes eu não sei. Mas uma coisa todos perceberam, os Marotos ficaram estranhos... durante um bom tempo era comum vê-los espalhados pela escola, e não juntos como sempre foi.

Harry balançava a cabeça. Algumas peças do quebra-cabeça do futuro finalmente se encaixando. Finalmente fazendo sentido.

A discórdia. Ela havia sido plantada ali.

Por isso foi tão fácil para Rabicho jogar Remus e Sirius um contra o outro. James havia tido de se esconder junto com Lily e Harry, então não havia mais o Pontas para colocar panos quentes e juntar todos os amigos, como ele sempre fazia.

Por isso fora tão fácil para Rabicho fazer Remus acreditar que Sirius era o traidor do segredo. Afinal, Sirius já havia deixado um segredo importante, um segredo vital, lhe escapar.

— Se James não tivesse salvado a pele de Snape, Lupin em sua forma animalesca provavelmente teria atacado e deixado Severus gravemente ferido. Isso teria tido graves consequências.

Harry arfou, ele ainda não tinha pensado naquilo.

— Execução. — Ele murmurou em um fiapo de voz. — Essa seria a punição de Aluado se ele tivesse atacado Snape.

Regulus concordou.

— O boato que correu pela escola é que os Marotos haviam feito uma brincadeira com Snape. A brincadeira havia dado errado e ele quase havia morrido. Sirius, como o mandante da brincadeira, quase foi expulso.

— Isso deve ter sido horrível. — Harry disse, sua cabeça se afundando em suas mãos. — Mas o que você acha disso?

Regulus franziu o cenho.

— Eu acredito que meu irmão não tinha a intenção de matar Snape ou de fazer Lupin ser executado. Ele só foi um imbecil.

— Você acredita que Remus tinha de ser executado por ser um lobisomem?

Regulus não tardou a responder.

— Há quem diga que os lupinos são imundos e não devem ser considerados como bruxos. Que eles são apenas "criaturas mágicas". — Regulus disse, suas palavras sendo um mero eco de tudo o que ele escutava na casa dos Black's. — Mas não penso dessa forma. — Ele se impôs. Já passava da hora dele assumir as rédeas de seus pensamentos e suas convicções. — Quero dizer, pelo que eu sei, Lupin não nasceu com a licantropia. Ele foi infectado. Ele não escolheu ser assim. Lupin nasceu bruxo, não uma "criatura mágica".

Harry ergueu sua cabeça no momento em que Regulus terminou de falar. Sua boca aberta em espanto. Ele mal conseguia acreditar no que ele havia acabado de dizer.

Mas, então algo prendeu a atenção de Harry.

— Como assim "pelo que eu sei, Lupin não nasceu com a licantropia". Do que você sabe? Como você sabe?

Regulus se limitou a responder com um sorriso misterioso, então ele se levantou.

— Já está tarde e amanhã será um longo e tedioso dia, então vou me recolher agora. Acredito que você deveria fazer o mesmo.

Recolher.

Harry tinha de voltar ao dormitório. Mas e se os meninos ainda estivessem acordados? E se houvesse mais especulações sobre ele ser ofidioglota?

A noite que prometia ser um desastre, para Harry, havia acabado espetacularmente bem. Ele havia tomado Hermione em seus braços, havia a beijado sob o luar. Havia se perdido na paixão.

Ele não queria que uma conversa desastrosa acabasse com todo o encanto daquela noite.

Como se sentisse a tensão e a hesitação exalando do corpo de Harry, Regulus começou a falar.

— Acredito que você deveria voltar ao dormitório. Acredito que os meninos não irão te julgar, falando baboseiras sobre você ser maligno, ou uma aberração. — Ele disse com sinceridade. — Pelo menos eu sei que Sirius não irá te julgar ou te repreender. — Regulus soltou um pequeno sorriso. — Meu irmão sempre teve a mania de gostar de aberrações. — Um nó se formou em sua garganta, afinal, antes de conhecer Tiago Star, ele estava a um mísero passo de se tornar uma aberração. Algo completamente irreconhecível. — Não sei se é bastante, mas não penso que você seja maligno ou uma aberração. Eu acredito em você.

Então com essas palavras, ele deixou Harry sozinho no corredor, com sua mente quase explodindo tentando compreender tudo o que havia acabado de escutar.

*

*

*

Enquanto voltava para a torre da Grifinória, Harry concluiu que as coisas com Regulus eram... surpreendentes, na falta de uma palavra mais adequada.

Era espantoso pensar que o garoto que havia acabado de dizer que Remus era um bruxo e não uma criatura mágica, estivera tão perto de se tornar um comensal da morte.

Um arrepio cruzou o corpo de Harry com esse pensamento. Com essa variação do futuro.

Mas aquilo não iria acontecer, pelo menos não mais.

A única coisa que Harry precisava saber era como reatar a relação de Sirius e Regulus. Para ele, estava mais do que claro que Regulus sentia muito a distância entre ele e seu irmão, mas ele não sabia como diminuí-la, não sabia como se reaproximar.

E Sirius, bem... ele parecia ter aceitado que aquela era batalha perdida. Um duelo vencido. Afinal, não se pode salvar aquele que não deseja ser salvo.

Não são todas as batalhas que travamos que saímos vencedores e o mais importante é preciso escolher pelo que vamos lutar.

O destino de Regulus parecia já estar selado. Então porquê diabos Sirius travaria essa batalha?

Os pensamentos de Harry morreram no momento em que seus olhos encararam a porta do dormitório.

Ele respirou fundo.

" Seja corajoso!" — Ele podia ouvir de Hermione em sua mente sussurrando.

Com esse pensamento, Harry abriu um pouco da porta e colocou sua cabeça, apenas sua cabeça dentro do quarto, espiando. Tentando de alguma forma detectar algum movimento, algo que indicasse se os meninos estavam ou não acordados.

Mas tudo o que ele conseguiu escutar foi o barulho rítmico e melodioso da respiração dos garotos e o destoante assobio que marcava o ronco de Peter.

Aliviado por ser o único acordado dos garotos, Harry entrou no dormitório e rapidamente se enfiou debaixo das cobertas, deixando seus pensamentos correrem à solta. Deixando-os voltarem para Hermione.

Sua melhor amiga.

A pessoa que estava com ele nas maiores loucuras.

A garota que ele acabara de beijar.

A pessoa por quem ele estava completamente apaixonado.

Com esse pensamento, um sorriso idiota se espalhou pelo seu rosto. Seu coração martelava contra seu peito e, pela primeira vez em muito, muito tempo, Harry se permitiu sentir esperança.

Esperança de que tudo daria certo. Esperança de que eles conseguiriam mudar o futuro.

E de que ele poderia ser feliz. Que ele poderia ser feliz ao lado de Hermione!

Acontece que nas páginas amareladas, ter coragem é muito fácil. É brilhante ver como o protagonista que perdeu tudo o que ele mais amava na vida, continua firme, continua forte e perseverante. É brilhante ver como ele continua seguindo em frente. Como ele continua tendo esperança de que as coisas irão magicamente mudar. De como ele acredita que toda a desgraça e a perda que amaldiçoam a sua vida irão simplesmente sumir, dando lugar a conquistas e sorrisos.

Mas... e na vida real?

Conseguimos ser perseverantes? Conseguimos acreditar no impossível?

A verdade é que é preciso muito mais energia e coragem para ter esperanças do que para aceitar a morte e a desgraça.

E por muito, muito tempo, Harry não teve essa esperança. Ele não teve essa chama quente dentro de seu peito que lhe dizia que, por mais que as coisas estivessem uma merda, no final elas dariam certo.

Por muito tempo Harry não pode acreditar no impossível, mas naquela noite, depois daquele beijo, após ter Hermione em seus braços. Ele voltou a ser corajoso. Ele voltou a acreditar no impossível.

Harry deixou um suspiro de felicidade escapar e, com a imagem do sorriso de Hermione vívida em sua mente, ele deixou que a escuridão o embalasse no mais confortável dos sonhos.

O que Harry não imaginava é que, apenas a duas camas de distância, havia alguém acordado. Alguém que não conseguia dormir, alguém que não conseguia pregar os olhos.

*

*

*

Sirius escutou quando a porta fez um pequeno "click" indicando que alguém havia acabado de entrar, ele sabia quem era, mas não fez nenhuma menção de se levantar.

Sua mente já estava turbulenta demais. Já tinha problemas demais.

Quando percebera que Tiago havia adormecido, Sirius se levantou a passos lentos e se encaminhou até o banheiro, trancou a porta e foi até o espelho.

E ficou ali parado, encarando seu reflexo pensando e pensando.

 Que merda você está fazendo com a sua vida? — Ele perguntou para a imagem no espelho que lhe encarava impiedosamente.

Sem permissão alguma, sua mente disparou para a tarde anterior.

 

*

*

*

 

[DIA ANTERIOR - FESTA DA VITÓRIA, SALÃO COMUNAL GRIFINÓRIA.]

O salão comunal da Grifinória estava abarrotado de pessoas. O calor humano irradiava por todos os cantos, a música alta era ensurdecedora para qualquer pessoa que não estivesse no clima da comemoração. O que era o caso de Sirius Black.

Já fazia meia-hora desde que Sirius tivera a conversa mais deprimente de sua vida. Em sua memória, ele não se recordava da última vez em que tinha sido tão sincero e franco sobre como ele se sentia em relação ao seu irmão mais novo. Não havia dito aquelas coisas nem para James, ou qualquer um dos meninos. Para falar a verdade, Sirius não se lembrava da última vez em que se permitira admitir para si mesmo como ele se sentia.

Para Sirius, falar sobre Regulus era extremamente difícil e doloroso. Sempre que o assunto surgia em sua mente, aquela tão conhecida sensação de impotência o dominava. Então, ele simplesmente ignorava. Não adiantava ele ficar se remoendo. Ele não queria se sentir um covarde, não queria se sentir incapaz de ajudar seu irmão.

Sirius simplesmente não queria sentir.

O ato de sentir sempre foi e sempre será a ruína do ser humano. Sentimos por aquilo que fazemos, sentimos pelo que deixamos de fazer, mas principalmente sentimos pela possibilidade de falhar. Por isso, nós criamos várias histórias, narrativas em que somos heróis e vilões, narrativas em que conseguimos fazer tudo, salvar a todos sem cometer um único erro sequer no processo, várias invenções que sabemos não existir, sabemos que não estão lá, mas continuamos a nos enganar.

Sentir é uma merda, cavamos nossa própria ruína com nossos sentimentos. Mas ser incapaz de sentir é uma forma semelhante de destruição.

Não queremos morrer, mas também não queremos viver como telespectadores de nossas próprias vidas. Não queremos ser alheios ao que está acontecendo ao redor. Queremos sentir, sentir qualquer coisa. Só queremos sentir algo real.

E, naquele momento, Sirius só queria sentir uma fagulha acendendo em seu peito. Só queria algo que lhe despertasse, algo que lhe mostrasse "hey, você está vivendo!"

Suspirando, Sirius se dirigiu para a mesa de bebidas que estava ao fundo do salão. Precisava beber alguma coisa, precisava de uma distração. Precisava esquecer de todos os problemas com sua família babaca. Seus amigos estavam muito felizes e entretidos para incomodá-los com o seu drama familiar, então, ele precisava resolver aquilo sozinho.

Sem se importar, Sirius arrancou o copo de bebida da mão de um garoto mais jovem. O garoto pareceu não gostar muito da atitude, lançou um olhar atravessado para ele.

Sirius, por sua vez, não se importou, apenas abriu um sorriso arrogante.

— Estou apenas lhe fazendo um favor, você é jovem demais para isso aqui — erguendo sua mão, ele levantou a bebida até os seus lábios, tomando todo o líquido em um só gole. Sirius fez uma careta quando terminou de engolir. — O que é isso aqui? Xixi de dragão? — Ele perguntou, seu rosto cada vez mais se contorcendo em uma careta.

O garoto pareceu encontrar uma satisfação tremenda ao ouvir os resmungos de Sirius, então apenas abriu um sorriso zombeteiro e vitorioso enquanto se afastava, deixando para trás um Black perdido em sua própria mente.

Em dias normais, Sirius gostava das festas, por Merlin, ele sempre era a alma das festas. Mas naquele dia em específico, ele não estava no clima para as comemorações, o que era, na sua opinião, uma merda. Droga, eles haviam acabado de ganhar um jogo acirrado contra a Corvinal e tudo o que ele estava fazendo era se lamuriar pela sua família de merda.

Sirius respirou fundo, precisava apenas de uma distração.

Não foi difícil para ele encontrar as garrafas escondidas de Whisky de fogo, assim como não foi difícil tomar uma garrafa inteira para si. Sirius não bebia em um copo, não, ele bebia direto do gargalo da garrafa.

O álcool descendo por sua garganta, fazia um pequeno caminho ardente até seu peito. Sirius sorriu um pouco, aquilo era o que ele precisava. Aquela tão conhecida queimação que o álcool lhe proporcionava, assim como a névoa que já começava a dominar sua mente, invadindo seus pensamentos.

Em festas "comuns", Sirius sempre era visto no meio da multidão, sempre estava no centro das grandes rodas de conversa, dominando o ambiente, contagiando a todos com suas histórias, com suas piadas. Era mágico.

Mas naquele dia, Sirius não estava com humor para aquilo. Não queria ninguém a sua volta, não queria que seu mau-humor se espalhasse por aí.

Então ele apenas ergueu a garrafa em direção aos seus lábios mais uma vez. O Whisky de fogo que lidasse com os seus problemas.

Uma pequena e terrível voz, que se Sirius prestasse atenção, muito se assemelhava a de sua mãe, começava a ecoar em sua mente.

Beba um gole por todas as vezes que ouviu não ser o suficiente.

Um gole por não se encaixar.

Um gole por não ser o Black certo.

Um gole por não ser o filho certo. O verdadeiro herdeiro.

Um gole por ser incapaz de ser alguém normal.

(Já começou a beber?)

Um gole por todas as vezes que sentiu não ser o bastante.

Um gole por não ser o irmão que deveria ser.

Um gole por não conseguir salvar seu irmão.

Um gole por todas as vezes que sentiu que você era a versão errada de si mesmo.

(Beba agora!)

Um gole por não conseguir lidar com suas próprias frustrações.

Um gole por ser uma maldita farsa.

(Só beba!)

Um gole pela merda de futuro que o aguarda.

Um gole por não conseguir se firmar com ninguém.

Um gole por não saber lidar com a merda dos seus próprios sentimentos.

Um gole por não merecer ser amado.

Um gole por...

No final das contas, Sirius já não sabia o porquê estava bebendo.

A única coisa que sabia era que ele definitivamente já havia ultrapassado o limite do álcool.

Já havia cruzado a linha entre beber o suficiente para enevoar sua mente, causando a sensação gostosa de despreocupação, e beber o suficiente para lhe fazer pensar demais, sentir demais...

Droga!

Ele só queria uma distração, mas o que havia conseguido era justamente o oposto, estava pensando demais, sentindo demais.

Precisava de outra coisa. Urgentemente.

Com um grunhido, Sirius soltou a garrafa de Whisky quase vazia de suas mãos e se encaminhou para a mesa de bebidas outra vez. Bebeu um copo de água e depois alcançou um copo de cerveja amanteigada.

"Talvez o problema estivesse no Whisky de fogo." — Ele pensou.

Então não faria mal tentar a cerveja amanteigada, certo?

Enquanto estava encostado na mesa ao fundo do salão, algumas garotas se aproximaram dele. Todas com sorrisos charmosos e movimentos lentos, desenvolvidos demais para soarem casuais e despreocupados.

Elas o queriam. O desejavam.

Mas sempre que se aproximavam o bastante, Sirius apenas balançava a cabeça e murmurava:

— Hoje não.

Normalmente ele não teria problema algum em se envolver com uma garota. Não havia nada de mais, nenhuma delas estava lhe cobrando uma promessa de um "amanhã", ou um "nós". Nenhuma delas estava esperando um futuro, ninguém estava lhe pedindo em casamento. Não, elas tinham o mesmo objetivo que ele. Uma noite. Uma única noite para se perderem juntos, para desfrutarem de seus corpos e suas companhias. Nada de mais.

Mas, naquela noite não parecia certo.

Parecia que estar com uma daquelas garotas naquela noite seria só para esquecer. Uma distração. Foder para esquecer.

Não parecia certo.

Não que Sirius fosse do tipo que idealizava as noites românticas, com pétalas e velas, nada disso. Mas foder para esquecer, parecia sujo demais até para si.

Ele sabia, eles estariam apenas desfrutando de seus corpos. Ambos. Seria consensual. Não havia nada de errado em querer ter uma noite e nada mais.

Mas a ideia de estar com alguém só para se distrair da sua vida de merda, lhe parecia podre. No fundo ele saberia, não estaria com a garota por sentir-se atraído por ela, não estaria com ela por desejá-la. Estaria com ela apenas para manter sua mente ocupada.

Esse simples pensamento, o pensamento de usar alguém da mesma maneira suja e podre que os Black 's faziam, de algum modo fez Sirius se sentir pior do que já estava.

O show de lamentações de Sirius foi interrompido por uma cabeleira loira a sua frente. Roubando toda a sua atenção, o trazendo para perto como se ela fosse a própria gravidade. Não teve tempo de assimilar o que estava fazendo, para onde seu corpo estava o levando, só percebeu estar seguindo-a, quando seus pés esbarraram em uma poltrona, fazendo-o cair no móvel.

E Sirius ficou ali sentado na poltrona observando Marlene McKinnon. E durante aquele tempo, durante aquela pequena fração de segundos, em que seus olhos percorreram o corpo de Marlene, começando por seus pés, subindo por suas coxas grossas, indo para sua camiseta de uniforme com os três primeiros botões abertos, dando aquela visão tentadora do que se escondia por debaixo daquela camisa, e parando naquela imensidão azulada... Foi naquele momento, na pequena fração de segundos escondida no piscar dos olhos, que, pela primeira vez em anos, o corpo de Marlene não era tão impressionante quanto seus olhos ou o imenso sorriso que emoldurava seu rosto.

Pela primeira vez em anos, o brilho em seu olhar era mais especial do que aquela gota de suor que descia por seu pescoço e se escondia na curva tentadora da abertura de seu uniforme.

Sirius se sentiu estranho ao notar o caminho que seus pensamentos estavam seguindo. Olhou para o copo em sua mão e o afastou rapidamente.

O que havia de errado com as bebidas daquela festa?

Sirius balançou a cabeça, mas seus olhos se negavam a sair de Marlene. Ele não era cego, nunca havia sido, então sempre reconhecera a beleza de Marlene McKinnon. Sempre a apontava como uma das mais belas de Hogwarts. Com certeza ela estava no topo da lista das mais poderosas, em quesitos de magia, das mais atrevidas e mais tentadoras também.

O fato era: Sirius não era tolo e nenhum imbecil. Não era imune à Marlene McKinnon.

Quando se envolveram no quinto ano, começara com uma brincadeira. Ele era gostoso, ela também. Ela estava afim, ele também. Ele a desejava, ela também.

Então eles simplesmente fizeram o que seus corpos pediam.

Mas no decorrer da história, Sirius percebeu que aquilo que eles tinham estava passando dos limites.

Ele percebeu que Marlene McKinnon não era  uma garota bonita, ele percebeu que ela também era divertida, sarcástica, bem-humorada e tinha um desejo incontrolável por aventuras.

E foi aí que o problema começou. Sirius não queria mais só os beijos e levá-la para a cama para poder arrancar suas roupas, ele queria escutá-la contando histórias sobre como ela enfeitiçou um balaço para acertar um garoto que havia lhe importunado. Queria escutar o som de sua risada e...

Aquilo não era certo.

Ele não podia se apaixonar. O amor entre duas pessoas não existia!

A paixão era uma fraude.

O amor entre um casal não passava da mais pura farsa. Ele já havia visto com os próprios olhos como o amor a dois conseguia destruir tudo de bom ao seu redor.

Amor não existia daquela forma.

Amor era o que ele sentia por James, Remus e Peter.

Amor era se transformar em Almofadinhas em todas as noites de lua cheia. Amor era deixar um chocolate reserva guardado no fundo do baú para os dias em que Peter não estivesse feliz. Amor era escutar James falando sobre Lily durante todos aqueles anos. Aquilo era amor.

Mas naquele fim de tarde, olhando para Marlene enquanto ela dançava, Sirius começou a duvidar de si mesmo.

A verdade é que Sirius tinha medo do amor. Sirius pensava que se ele fosse capaz de amar alguém, amar verdadeiramente sem medo de se entregar, e desse errado... ele não conseguiria aguentar. Não conseguiria sobreviver.

É mais fácil ficar sozinho. É mais fácil se esconder atrás de noites de bebedeira e atrás dos corpos que passam como um borrão em sua mente. Uma mancha, apenas isso. Algo incapaz de deixar uma marca. Incapaz de deixar uma cicatriz.

Por que o que acontece se você aprender a amar e depois não tiver a quem amar?

O que acontece se você gostar de amar e ficar dependente disso?

E se você moldar sua vida diante do amor e puft... ele escapa por entre os seus dedos.

Somos capazes de sobreviver a esse tipo de dor?

Somos capazes de sobreviver a um coração partido?

Mas... E se a paixão não fosse só destruidora e se...

Sirius não pode concluir seus pensamentos, pois do outro lado do salão, Marlene o encarava.

*

*

*

Marlene estava com seus olhos fechados, balançando o quadril no ritmo em que a canção tocava, sua mente vagando, entorpecida pela felicidade de ter ganho uma partida acirrada de quadribol.

O sorriso estava estampado em seu rosto, a alegria correndo por suas veias.

Marlene interrompeu sua dança para ir até à mesa de bebidas, precisava de uma cerveja amanteigada para completar sua animação. Quando chegou à mesa de bebidas, foi recebida com muitos olhares e sorrisos charmosos. Marlene apenas retribuiu com uma piscadinha, uma promessa. Mais tarde ela estaria disponível. Mais tarde ela poderia curtir a festa com alguma companhia, mas naquele momento ela só queria dançar.

Estava prestes a se virar quando sentiu algo. Sentiu quando suas costas queimaram com aquela sensação de que estava sendo observada.

Marlene não era tola, sabia que atraia muitos olhares para si, mas aquele olhar, aquela queimação que estava sentindo era diferente.

Só uma pessoa foi capaz de fazê-la se sentir assim quando a olhava daquela maneira.

Ela fechou seus olhos.

Não era possível. Não depois de todo aquele tempo.

Marlene tomou um grande gole de cerveja amanteigada, torcendo para que ela lhe desse a coragem necessária para encará-lo.

Lentamente ela virou seu corpo para trás, encontrando os olhos acinzentados que ela conhecia tão bem a encarando.

Sirius a encarava como se eles não se vissem há décadas, como se ele tivesse passado muito tempo longe e, agora, ele estivesse tentando memorizar cada pedacinho dela. Cada pequena mudança.

Marlene fechou seus olhos quando um arrepio cruzou o seu corpo. Ter o olhar de Sirius sob si, fazia seu corpo formigar e latejar... Mas ela não era uma covarde, então deixaria seus olhos bem abertos, para que Sirius soubesse que ele não era o único ali ciente da presença um do outro.

Oh, ela estava ciente da presença dele, ciente de seu corpo esparramado naquele sofá. Como estava ciente!

Inconscientemente eles começaram uma pequena e estúpida batalha de encarar. Seus olhos travados, como se estivessem em um desafio, um duelo, e quem desviasse o olhar primeiro seria o grande perdedor.

Mas McKinnon não era uma perdedora e também não era de seu feitio ficar esperando... não, ela era do tipo que partia para a ação.

Marlene tomou sua bebida em único gole e se virou para deixar a caneca vazia em cima da mesa de bebidas. Então toda a sua atenção estava voltada para aquele corpo, aquele lindo e grande corpo, esparramado naquele sofá e para aqueles olhos que pareciam duas lascas de gelo, fervilhando no mais puro desejo.

Passara muito tempo desde que haviam "se divertido juntos". Passara muito tempo desde a última vez em que ela havia se perdido naquele corpo e como desejava ter mais uma oportunidade para se afogar naquele desejo.

Marlene molhou seus lábios pensando em tudo o que gostaria de fazer com ele. Pensando em todas as formas que gostaria de tomá-lo e em todas as formas que gostaria de tê-lo.

Como se conseguisse ler todos os pensamentos famintos e desejosos de Marlene, Sirius estendeu sua mão em direção a ela.

Um convite.

Um pedido.

Um chamado.

Uma súplica.

Os olhos dele se encontraram com os dela e Marlene se deixou afogar naquela profundeza acinzentada. Havia um milhão de perguntas escondidas ali, naquele olhar, nenhuma pergunta para a qual ela estivesse realmente preparada para responder, pelo menos não em voz alta.

Marlene começou a sentir a hesitação dominar seu corpo e ela odiou aquilo. Ela não era covarde!

Ela o desejava ardentemente, bom... pelo menos ela o desejava naquele momento. Seu corpo clamava pelo dele, suas curvas imploravam por atenção e sua pele começava a formigar.

Então, se era para fazer aquilo, se era incapaz de negar seu próprio desejo, então ela o faria. Iria se afogar e se perder em suas vontades. Faria de todas as formas possíveis, de todas as maneiras que desejasse, mas ela faria a seu modo. Ela estaria no controle.

E se no final tudo desse errado, bom... pelo menos ela teria tido uma tarde deliciosa, um interlúdio espetacular em que estaria no comando. Em que faria tudo aquilo que seu desejo mandasse. Em que deixaria Sirius Black a sua mercê.

Sentindo sua pele esquentar por um motivo que definitivamente não era a bebida que corria por suas veias, Marlene caminhou até a mão estendida de Sirius.

Ela caminhava a passos firmes e decididos como se ela fosse a dona daquele salão. Como se ela fosse a própria dona da festa. Como se ela fosse dona de tudo. Como se fosse dona até mesmo de Sirius, como se ela caminhasse para reivindicar aquilo que era seu por direito.

O corpo de Sirius tremeu diante daquela cena. Marlene no controle era... excitante pra caralho!

Para dizer o mínimo.

Se sentindo subitamente desconfortável sentado naquele sofá, Sirius se remexeu, tentando, de alguma forma, ficar mais aconchegado.

Mas que diabos!

Quem havia sido o idiota que dera a ideia de deixar a mesa de bebidas tão afastada? Por que diabos ela estava tão longe?

E quando foi que Marlene começou a andar em câmera lenta?

Sirius teve que respirar fundo. Sua vontade era caminhar até ela, colar seus corpos e se desfazer daquela camisa maldita!

Mas ele não estava interessado em criar uma cena e bom... Marlene já havia deixado bem claro quem estaria no comando naquela tarde e ele não seria burro ou estúpido o bastante para atrapalhar os planos dela. Muito pelo contrário, ele estava ansioso para ver o que ela tinha em mente.

Seu corpo formigava tentando adivinhar o que ela havia planejado.

Qual jogo eles jogariam naquela tarde?

Quando ela já estava perto o bastante, Sirius tentou esticar o braço e puxá-la para si, mas Marlene apenas se esquivou de seu toque. E por um momento aterrorizante, Sirius temeu que tivesse interpretado mal todos aqueles olhares.

Mas sua angústia logo foi dissipada.

— Não lembro de ter lhe dado permissão para me tocar, Black. — Marlene disse em tom acusatório, mas toda a firmeza de suas palavras se perdia pelo seu tom de voz. O tom baixo e cálido, como um sussurro de um amante.

Sirius deixou um suspiro aliviado escapar do fundo da sua garganta. Eles estavam na mesma página, ele suspeitava que até estivessem na mesma linha, então ele faria o que ela quisesse, o que ela pedisse, o que ela mandasse, mas ele também faria aquilo de seu modo.

Sirius lhe ofereceu um sorriso preguiçoso de macho antes de se recostar, levantando as duas mãos para trás de sua cabeça, encostando-as no suporte do sofá. Esperando e esperando a próxima atitude, o próximo ato do joguinho deles.

— Como quiser McKinnon, como quiser. — Ele disse, uma pequena provocação.

Desgraçado arrogante!

Marlene cutucou sua bochecha com sua língua, e mordeu fortemente o seu lábio inferior, para impedir que uma resposta suja lhe escapasse.

Maldito presunçoso!

— Alguém já lhe disse que você fala demais, Black? — Marlene perguntou se aproximando cada vez mais, a esse ponto estavam a míseros dois passos de se tocarem.

Uma risada profunda e rouca escapou de Sirius.

— Devo ter escutado isso uma ou duas vezes em minha vida. — Ele confessou com um sorriso cafajeste nos lábios, para então, inclinar seu corpo na direção de Marlene. — Mas não vamos falar sobre mim, vamos falar de você. Por algum acaso teria vontade de me calar, McKinnon?

Seus olhos se acenderam com a proposta, mas ela não daria a ele a satisfação de saber que aquilo era exatamente o que ela estava desejando. Ao invés disso, Marlene apenas terminou sua caminhada até ele, seu corpo ficando entre as pernas espalhadas de Sirius.

Ele pareceu gostar da proximidade e, pensando que a essa altura já estava autorizado para tocá-la, ele estendeu suas mãos tentando alcançar qualquer pedaço do corpo dela. Marlene apenas balançou sua cabeça, estendeu sua própria mão, apoiando-a no peito de Sirius e inclinou seu corpo para frente até que seus lábios estivessem grudados na orelha dele.

— Você ainda não pode usar as mãos, Black. — E com essas palavras, com o comando silencioso escorrendo em sua voz, sua mão forçou o corpo dele para trás, até que Sirius estivesse completamente imóvel no sofá. Bobo e atônito por perceber que Marlene não estava brincando quando dissera que ele não poderia tocá-la.

Marlene pareceu gostar de vê-lo assim. Rendido. Sirius era sempre tão pomposo e tão arrogante, era bom vê-lo rendido daquela forma.

Um sorriso lento e provocativo se espalhou pelos lábios de Marlene e ela subiu em cima dele naquele sofá. Com a mão espalmada em seu peito, ela se ajeitou em seu colo, colocando as pernas uma de cada lado das coxas de Sirius, ficando frente a frente para ele. Míseros centímetros impediam seus rostos de se tocarem.

— Assim é melhor não acha? — O hálito quente de Marlene acertou Sirius como um balaço.

Recobrando o mínimo de juízo que ainda lhe restava, Sirius começou a apalpar o sofá à procura de algo.

Marlene o olhou de forma estranha. Por que essa provavelmente não era exatamente a reação esperada quando você se senta no colo de alguém. E, naquele momento aterrorizante, Marlene temeu que ele estava desistindo do joguinho deles.

Mas Sirius logo achou o que estava procurando e, com um sorriso vencedor nos lábios, ele ergueu sua varinha. Marlene franziu suas sobrancelhas.

O que diabos?

Ela estava prestes a perguntar o que estava acontecendo, mas Sirius foi mais rápido e logo murmurou um feitiço, erguendo uma bolha de privacidade ao redor deles. Afinal, eles ainda estavam no salão comunal e ele não estava afim de gerar um show para qualquer adolescente pervertido e cheio de hormônios.

Se bem que naquele momento ele era o adolescente cheio de hormônios.

 Assim é melhor não acha? — Ele retrucou usando as mesmas palavras de Marlene para se referir à bolha que acabara de erguer. Uma clara mensagem de que agora eles teriam privacidade total para fazerem o que sentirem vontade. Aquilo que bem entenderem.

Marlene acabou soltando uma risadinha. Aquela era de fato uma ideia genial.

— Vou ter que concordar com você, Black.

O olhar de Sirius se iluminou, tanto quanto qualquer estrela do céu.

— Sempre acredito que as estrelas irão despencar dos céus quando você concorda comigo.

Ela revirou os olhos e ele não pôde deixar de sorrir.

— Não seja tão dramático.

— Não estou sendo dramático, estou sendo verdadeiro. É diferente. — Sirius retrucou, afinal, ele não perderia a oportunidade de retrucá-la. Mas, naquele momento havia algo bem mais interessante de se fazer ao invés de discutir.

Marlene sorriu visivelmente pensando a mesma coisa e aproximou seu rosto do dele, seus lábios entreabertos. Seu hálito quente acariciando os lábios dele. Sirius fechou seus olhos esperando pelo beijo. Ele quase podia sentir o gosto da cerveja amanteigada que ela havia bebido a poucos instantes em sua boca, mas o beijo nunca veio de fato.

Ao invés de ganhar um beijo, ele recebeu uma risadinha baixa e cálida ao pé de seu ouvido.

— Isso foi cruel. — Ele grunhiu, sua voz tomada pelo desejo nada saciado. Ele iria reclamar mais, protestar mais, reivindicar mais. No entanto, quanto ele sentiu os lábios quentes e macios de Marlene grudados ao seu pescoço, ele decidiu que os protestos não eram de fato tão necessários assim.

Marlene quase gemeu ao sentir o gosto salgado de Sirius em sua boca. Ela conseguia sentir o perfume dele, o que ele sempre usava. Aquele que tinha um aroma suave, mas presente ao mesmo tempo. Que tinha um cheiro amadeirado, que a lembrava de suas noites na floresta proibida. Todavia havia algo mais. Algo quente e cítrico, quase amargo, mas ela não conseguia identificar o que era e isso a deixava maluca.

Era uma mistura exótica, mas também perigosamente excitante. Como o próprio Sirius de fato era.

Aquilo estava deixando-a inebriada!

— O que foi que conversamos sobre o drama, Black? — Ela perguntou enquanto afastava seu rosto do pescoço dele, sua voz rouca.

Ele riu desacreditado. Aquela garota era totalmente surpreendente.

— Permissão para usar as mãos? — Ele tentou mais uma vez.

Marlene balançou sua cabeça enquanto movia suas próprias mãos para a barriga de Sirius. Para aquele abdômen tão perfeitamente trabalhado. Ele podia ser um baita arrogante, um maldito arrogante, mas seu corpo ainda era terrivelmente atraente.

Marlene arrastou suas unhas por cima do tecido fino da camiseta dele, forçando e forçando. Ela queria tocar na pele dele. Queria a fricção e o contato direto dos corpos, mas ela também queria a provocação e o flerte, queria levá-lo ao seu limite.

Sirius sentia sua respiração ficar pesada. Tensa, rápida. Totalmente descompassada. Ele tinha a plena certeza de que ela estava provocando-o, ele podia ver aquilo em seus olhos. Podia vê-los ardendo de desejo, mas também brilhando em malícia por estar no controle. Marlene com certeza não fazia ideia do que estava acontecendo em suas calças, se fizesse, não estaria agindo daquela forma.

A brincadeira ameaçava ficar mais curta a cada arrastar de unhas dela.

Santo Merlin!

Sirius tentou pensar em coisas que não eram legais. Tentou pensar em balaços errantes e balaços gigantes o perseguindo. Mas aquilo de nada adiantou. Ele só conseguia pensar naquela loira linda e perversa - perversamente linda — sentada em seu colo. O deixando tão tonto e bobo, deixando seu coração disparado, seu pulso acelerado e definitivamente deixando todas as partes do seu corpo acesas. Totalmente rígidas e clamando por ela.

— Espere! — Ele pediu num impulso. Sua voz entrecortada, como se as palavras e a própria respiração tivessem sido arrancadas do fundo de sua garganta.

Marlene riu melodicamente.

— Não me diga que tem alguém rápido no gatilho aqui, Black. — Debochou ainda risonha.

Sirius riu incrédulo, levando suas mãos ao seu rosto e aos seus cabelos, os puxando, tentando pensar em algo coerente.

Mãos.

Certo, ele definitivamente queria usá-las. Queria provocar Marlene. Queria tocá-la do mesmo modo que ela estava fazendo com ele.

Marlene podia enxergar o pedido em seus olhos e, por isso, respondeu:

— Não.

Mas dessa vez ele não desistiria tão fácil da ideia.

— Não pense nas mãos de um adolescente afobado do quinto ano que não saberia tocá-la.

Marlene estava começando a gostar de onde aquela proposta daria.

— E o que exatamente suas mãos fariam, Black? — Ela indagou, havia uma certa provocação, mas também havia curiosidade e desejo.

Sirius sorriu. O sorriso de quem certamente sabia muito bem como usar as mãos. O sorriso de quem estava ansioso para provar isso. Não que ela não soubesse, ou melhor, não que ela tivesse esquecido disso.

— Pense assim. Um adolescente apressado, cheio de hormônios, ficaria louco com a ideia de poder tocar em seu corpo. Ele não perderia tempo e sairia logo enfiando as mãos por debaixo da sua saia. — Ele disse zombando balançando as sobrancelhas de uma forma particularmente engraçada.

Marlene acabou se engasgando com uma risada e deu um pequeno soquinho no ombro dele.

— E você por acaso não é um desses adolescentes cheios de hormônios?

— Nah... — ele emitiu um pequeno som com sua língua — eu já passei dessa fase.

— De querer enfiar as mãos debaixo da minha saia?

— Eu nunca falei isso. — Sirius disse malicioso, deixando claro de que ele gostaria sim, de se enfiar debaixo da saia dela.

Marlene sorriu largamente com as palavras dele. Estava gostando de onde aquilo estava chegando. Por um momento ela havia se esquecido de como eram as coisas com Sirius.

E ela gostava daquilo. Gostava muito. Gostava da provocação e do flerte, dos beijos e das mãos atrevidas. Mas aquele era o outro lado.

As palavras.

Não só as atrevidas, mas as palavras engraçadas. As palavras que a faziam rir em momentos nada convencionais.

Aquilo era normal?

Ela deveria rir enquanto estava sentada no colo de um cara?

Bom... As coisas não eram assim com suas outras conquistas amorosas.

Levar alguém para a cama era como um jogo de quadribol. Partia sempre de uma estratégia.

 

1.º Avaliar as possibilidades.

2.º Escolher um alvo.

3.º Partir para o ataque.

 

E a partir daí as coisas ficavam fáceis. Marlene é uma garota charmosa e engraçada, forjada na arte do flerte.

Ela não terminava as noites sozinha, exceto se fosse uma escolha própria.

Mas aquilo não era normal. As conversas que tinha com seus amantes, com os seus parceiros de cama, geralmente se resumiam aos flertes e às palavras indecentes.

Risadas?

Nunca. Por isso ela sentira tanta falta de estar nos braços de Sirius.

Porquê era fácil e agradável. Era gostoso, mas também divertido.

Marlene espalmou as mãos no peito dele. Seu sorriso em seu rosto ainda era largo.

— Então me diga, Sirius — aquela foi a primeira vez durante a conversa deles, que ela o chamou pelo nome. Aquilo não passou despercebido por ele. — O que exatamente suas mãos fariam comigo?

Sirius sorriu.

— Elas com certeza fariam muitas coisas, Marley.

Marlene afastou todos os pensamentos que aquele apelido lhe despertava. Aquele era o momento para sentir e não para pensar. Ela não queria ter que pensar no que aquele momento roubado entre os dois poderia causar, no que ele poderia despertar. Mas também não queria pensar no passado deles e definitivamente não queria pensar no futuro e nas suas possibilidades.

Queria apenas se perder no momento, era o seu corpo deveria assumir o controle, não sua mente.

— Seja mais específico. Preciso de mais detalhes. — Ela pediu.

— Pense assim — ele aproximou seu rosto do dela, afastou algumas mechas de cabelo e encaixou seu rosto ali, na curva de seu pescoço, para poder sussurrar as próximas palavras em seu ouvido. — Minhas mãos começariam calmas. Indo na direção contrária do que você estaria esperando. Primeiro testando e explorando. — Marlene deixou seu corpo tombar um pouco na direção dele. — Eu começaria pelo seu rosto. — Ele anunciou em um rompante.

McKinnon se afastou depressa olhando para ele de modo confuso.

Aquilo de fato não era o que ela esperava.

— Eu te falei. — Sirius disse rindo de sua expressão perplexa.

— Você está falando sério?

— Humrum — ele murmurou e, por um instante, Marlene quase acreditou que aquela simples palavra era algo indecente. Bom, não era, mas deveria ser, pela maneira como ele pronunciou.

— Então me conte o que suas mãos fariam com o meu rosto? — Ela pediu impulsionada pelo desejo que via brilhando nos olhos dele.

— Falar? Eu prefiro mostrar.

E assim, sem a permissão, Sirius começou a tocá-la. Mas de modo algum ele se esquecera de usar as palavras.

Ele não era um tolo que acreditava que o sexo era simplesmente a penetração.

De forma alguma o sexo poderia ser resumido, poderia ser rotulado, como estar dentro de outra pessoa.

Não, jamais.

Sexo poderia ser muitas coisas, de muitas maneiras. Poderia ser estar dentro de alguém, mas sexo também era o toque, a espera, a provocação. Sexo também era palavra. Eram as indecências que ele sussurrava para Marlene, mas também ia muito além disso.

— Minhas mãos começariam traçando cada pequena pinta do seu rosto. — Ele murmurou, sua voz saindo grave e áspera como um cascalho. Seus dedos acompanhavam tudo o que ele dizia. Pulando de pinta em pinta no rosto macio e delicado de Marlene. — Então eu chegaria aos seus lábios. Chegaria nessa sua boca perfeita, cheia e macia.

Marlene soltou uma lufada de ar. Ela estava sentindo. Sentindo muito. Sentia o que era dito e também o que era feito.

Sentia sua pele esquentar. Arder. Seu pulso estava disparado, como se seu sangue estivesse travando uma corrida dentro de seu corpo.

Os dedos grossos e ásperos de Sirius encontram os lábios dela, contornando-os, deixando o traço de fogo em sua pele.

— Você é tão terrivelmente linda, Marley. — Ele passou o polegar pelo lábio inferior dela.

Ela suspirou de prazer e o surpreendeu enfiando seu dedo na boca, lambendo e chupando. Marlene olhou bem no fundo dos olhos de Sirius e tirou o dedo de dentro da boca, apenas para passar a língua por toda a extensão dele antes de mordê-lo, levemente bem na ponta, lançando uma onda impetuosa de calor e prazer diretamente para o meio das pernas dele.

Olhando no fundo dos olhos dela, era impossível para Sirius não pensar em como seria ter aquela boca, aquela boca linda e terrível - terrivelmente linda - ao redor do seu pau.

O simples pensamento fez Sirius revirar os olhos no mais puro prazer.

Ele queria censurar seus pensamentos, seus pensamentos maliciosos, pervertidos e indecentes, mas era impossível fazer aquilo quando ela o olhava daquela forma.

Para o bem da sua sanidade, e para a duração da brincadeira, Sirius retirou seu dedo de dentro da boca de Marlene.

— O que você faria depois? — Ela perguntou, sua voz embebida em desejo. Ela estava gostando, gostando muito daquilo.

— Depois eu começaria a descer pelo seu corpo.

Marlene ergueu suas sobrancelhas e arqueou o seu corpo, esperando que suas mãos fizessem exatamente aquilo que suas palavras sugeriram.

E foi o que aconteceu. As mãos de Sirius começaram a descer pelo corpo dela. Primeiro só as pontas dos dedos contornando a lateral do corpo de Marlene, desenhando a curva lateral de seus seios, se moldando a sua cintura, passando pelo quadril...

Fora uma terrível batalha para ele não espalmar suas mãos em cada pedacinho de carne. Mas, por fim, ele decidiu que esperar era muito melhor. A espera poderia ser torturante, mas também poderia ser muito prazerosa.

As mãos de Sirius desceram por todo o corpo de Marlene até chegarem ao fim de suas pernas e foi só aí que ele voltou a falar.

— Eu partiria da sua panturrilha.

— Você só pode estar brincando! — Ela exclamou, quase ofendida.

Sério, a panturrilha?

Haviam tantas partes mais interessantes.

Por que as panturrilhas?

Ele riu do aborrecimento dela.

— Deixe-me tentar convencê-la, então. Eu começaria a te acariciar só com os dedos. O toque quase como um fantasma. Apenas para sentir seu corpo arrepiar.

E de fato o corpo de Marlene se arrepiou. Ela voltou a tombar na direção dele, procurando um apoio. Ansiando por mais proximidade, por mais toques, por mais palavras...

— Então quando eu visse que você estava gostando eu começaria a subir minhas mãos por suas pernas. Oh, eu de fato gostaria de subir pelas suas pernas! — Como se para enfatizar o que estava dizendo, ele gemeu, o som baixo e quente. Em resposta, Marlene arfou, seu corpo parecia que entraria em combustão a qualquer instante. Mas Sirius não parou por aí. — Então logo as minhas mãos estariam nas suas coxas. Essas coxas fartas. Eu não usaria só os meus dedos nesse momento, eu usaria a mão inteira para segurá-las e apertá-las. Meus calos certamente iriam arranhar a sua pele, mas isso não seria um incômodo, não, isso só tornaria as coisas mais interessantes.  — Ele começou a fazer exatamente isso, e seu toque era tão quente, tão firme e tão seguro. Ele sabia exatamente o que estava fazendo. — Seu corpo começaria a tremer — ele voltou a usar as palavras — e eu continuaria a subir. E, quando você pensasse que eu iria enfiar minhas mãos no meio das suas pernas... — Ele parou de falar, deixando que ela imaginasse.

As mãos de Marlene foram de encontro com os ombros de Sirius, os apertando. Buscando apoio. Ela não tinha certeza de que suas pernas estavam firmes o suficiente para se apoiar nelas. Seu corpo tremia com o desejo, com a imagem mental das mãos de Sirius no meio das suas pernas...

Até o momento, as mãos dele espelhavam cada maldito movimento que ele descrevia. Então porquê diabos as mãos dele não estavam no meio das suas pernas?

— Continue. — Ela pediu, sua voz saiu fraca, como um suspiro.

— Isso por acaso foi um pedido? — Ele perguntou, sua voz saiu rouca e um pouco presunçosa.

Mas ele não poderia impedir aquilo.

Ela gostava de dizer aos quatro quantos sobre como ele era marrento e teimoso, mas a verdade é que ela possuía tanta marra e teimosia quanto ele. Então, ele não se sentia mal por querer ouvi-la pedindo por seus toques. Pedindo por seu corpo.

Marlene já não estava se importando com quem estava de fato comandando a brincadeira. A única coisa que ela se importava, naquele momento, era saber onde diabos as mãos de Sirius iriam parar.

Por isso, ela balançou a cabeça confirmando que aquilo era, de fato, um pedido.

Sirius sorriu presunçoso.

— Então, quando minhas mãos já estivessem no topo das suas coxas, eu as enfiaria debaixo de sua saia. — As mãos dele avançaram, rompendo aquela última barreira, se enfiando debaixo do tecido, mas ficaram paradas, não tocando em nada especificamente. — Mas eu não iria onde você está pensando — ele continuou. — Não, eu iria movê-las. Eu iria para trás. Eu iria de encontro a sua bunda gostosa, Marley.

Marlene arfou quando sentiu seu toque. Suas mãos eram gananciosas, pegando tudo o que queria, tudo o que desejava. Em uma tentativa louca de aplacar todo o desejo guardado e reprimido.

Marlene sentia seu corpo derreter, o toque era ótimo, muito bem-vindo, mas não era o suficiente. Seu corpo pedia mais.

— Mas eu também não iria parar por aqui — a voz dele voltou a ecoar naquela pequena bolha deles. Naquela pequena fuga da realidade. — Com uma mão eu iria segurar sua bunda gostosa, mas a minha outra mão não ficaria aqui. Minha outra mão iria subir pelo seu corpo até a sua nuca — ele começou a subir. — Eu iria entrelaçar os meus dedos nos seu cabelos e os puxaria de leve. Até que sua boca estivesse a centímetros da minha e...

Ela não deixou que ele concluísse sua fala.

As palavras naquele momento não eram o suficiente para aplacar o seu desejo. Ela queria mais. Ela precisava demais.

Marlene duvidava que qualquer toque fosse o suficiente para acalmar seu corpo, mas ela tinha uma boa ideia do que poderia ajudar a aplacar o seu desejo.

— Sirius — ela chamou, seu coração parecia querer explodir dentro de seu peito. — Me beija! — Ela pediu. — Me beije logo, por favor.

Sirius congelou. Ele jamais imaginava que aquelas palavras iriam sair da boca de Marlene. Mas aconteceu, ela disse aquilo.

Ela quis dizer aquilo.

O tempo parecia ter congelado. Ele não sabia como agir com Marlene estando tão vulnerável em seus braços.

Mas de repente ele sorriu. Um sorriso completo, sem traço da tristeza que ele carregava horas antes. Um sorriso sem traço de presunção ou arrogância.

Havia ali apenas o desejo. Desejo em sua forma mais primitiva, crua e genuína.

Ele a queria da mesma forma.

— Você jamais precisa pedir por um beijo meu. — Ele sussurrou, sua voz estava embebida por sentimentos demais. — E jamais precisa implorar por um assim, Marley. — Ele murmurou enquanto afastava alguns fios de cabelos que estavam espalhados pelo rosto dela. — Todos os meus beijos que você quiser, serão seus! 

E então, antes que ela tivesse a chance de dizer alguma coisa, antes que tivesse a chance de respirar, ele abaixou a cabeça sobre a dela e capturou sua boca em um beijo faminto e ardente. Seus lábios eram vorazes, pegando tudo o que ela tinha a oferecer e exigindo ainda mais.

Sirius queria ir devagar. Ele verdadeiramente queria. Queria começar aquele beijo de uma maneira calma e precisa, queria inflamar o beijo lentamente, queria acender o desejo no corpo de Marlene.

Mas ele simplesmente não conseguiu.

Já estava cansado daquele joguinho.

Eles já haviam se provocado demais. Para falar a verdade, ele acreditava que tudo até aquele momento não passava de uma grande provocação. Todos os momentos juntos, mas também os separados.

Então aquele não era o momento para se negar o desejo. Aquele era o momento para aceitá-lo.

Marlene deixou seu corpo derreter contra o de Sirius, suas mãos se enfiaram por debaixo da camiseta dele, querendo tocar todo e qualquer pedaço de pele dele. Ela precisava daquilo tanto quanto do ar que respirava.

Tudo estava indo bem, deliciosamente bem até que... até que não estava mais.

Assim que Marlene mergulhou a língua na boca de Sirius, ela entendeu qual era o cheiro que ela não havia identificado no pescoço dele.

Bebida.

Na boca dele, estava a própria garrafa de whisky de fogo. Por um momento, ela até pensou que estava enfiando a língua em uma dose daquela bebida, mas não, era só Sirius.

Aquilo foi como um balaço direto no estômago de Marlene.

Ela se afastou depressa.

E foi quando ela viu.

Sua mente estava tão entorpecida pelo desejo, tão inebriada pela ideia de estar novamente nos braços dele, que ela simplesmente não havia notado como suas pupilas estavam.

Como ela poderia não ter visto aquilo?

Como podia ter sido tão cega?

Suas pupilas estavam dilatadas, muito dilatadas, havia apenas um pequeno aro cinzento ao redor de uma imensa escuridão.

Marlene duvidava muito que aquilo fosse apenas pela excitação, eles haviam começado agora. Como ele poderia estar assim?

E havia também aquela vermelhidão toda ao redor de seus olhos.

Como ela havia sido tão tola?

— Eu não acredito nisto! — Ela exclamou, sua voz embebida em amargura.

— Não acredita no quê, Marley? — Ele retrucou enquanto investia em beijos pelo pescoço de Marlene.

Ela espalmou a mão no peito de Sirius se afastando e se esquivando de seu toque.

— Não me chame assim! — Ela exclamou. — Você está completamente bêbado!

Ela estava com raiva e, naquele momento, ela não sabia exatamente de quem estava com raiva.

Estava com raiva dele, por ele ser um canalha?

Ou estava com raiva de si mesma, por ser uma tola e cair no papinho dele de novo?

Foi a vez de Sirius ser acertado pela realidade, como um balaço terrível e gigante.

— Não. Não foi isso, eu... — ele começou a se explicar, mas Marlene não deu tempo para que ele pudesse terminar.

— Não digo eu. — Ela disse enquanto saia do colo dele e endireitava as suas roupas. Ela não queria que ninguém ali soubesse como ela havia sido um idiota ao cair nos braços dele. — Eu mereço muito mais do que ser a sua conquista de fim de festa, Black! Eu não aceito ser a sua bebida mais barata para curar qualquer que seja a merda que feriu seu ego.

Outro balaço gigante acertou Sirius, dessa vez foi certeiro, foi direto no seu coração.

Uma parte dele se rasgou.

Sirius ficou sem fôlego.

Ele desejava Marlene, ela não estava tampando nenhum buraco na vida dele, ou em seu ego.

— Não! — Ele praticamente berrou tentando puxá-la. Se ela fosse embora dali, ele duvidava muito que ela voltaria a olhar nos olhos dele outra vez e aquilo não poderia acontecer. Não de novo. — Eu fui um idiota no quinto ano. — Ele disse em um supetão. Uma parte sua, sabia que Marlene não estava chateada pelo que havia acontecido entre eles naquele fim de tarde. Aquela ferida era muito mais antiga. Muito mais profunda. — Eu estava com medo e assustado. Eu não queria me apaixonar, mas aconteceu. Eu fui um covarde e você não merecia aquilo. — Ele dizia de forma rápida, quase embolada. — Mas não pense, não duvide nem por um segundo que eu não a desejo! — Ele terminou seu pequeno discurso com o rosto vermelho, em parte, pelo constrangimento por estar revelando coisas que jamais havia dito em voz alta e em parte por estar sem fôlego.

Marlene lhe lançou um último e pequeno olhar.

— Seu pequeno discurso foi bem gentil e até fofo. Mas de verdade, eu queria que você estivesse sóbrio quando me dissesse essas coisas.

E assim, da mesma forma repentina que ela entrou nos braços dele, ela foi embora.

A diferença é que naquele momento, Marlene havia saído com o coração rasgado. Com uma ferida aberta e inflamada dentro do peito.

A verdade é que quando somos machucados e nos curamos, ficamos apenas com uma cicatriz. A lembrança de que um dia fomos feridos. A recordação de que já fomos frágeis e vulneráveis.

Marlene havia ignorado todos os lembretes que suas feridas mais antigas causadas por Sirius haviam lhe mandado. E o resultado? Uma boa dose de coração partido.

E agora ela teria de lamber suas feridas sozinha, outra vez.

E Sirius ficou lá, parado, estagnado, sem reação enquanto a assistia correr pelo salão comunal até se enfiar nas escadarias que a levariam até o dormitório feminino.

Dentro de seu peito seu coração se rasgava um pouquinho mais.

Quantas feridas um coração poderia aguentar até se partir de vez? Até se cansar e parar de bater.

*

*

*

[DIA ATUAL - DORMITÓRIO MASCULINO GRIFINÓRIA - BANHEIRO.]

*

*

*

Depois do que Sirius pensava ser a milésima vez que ele repassava a tarde anterior em sua mente, ele decidiu jogar um pouco de água fria em seu rosto.

Estava tarde e ele já havia fodido com tudo. Não adiantava ele tentar fazer alguma coisa. Marlene jamais iria olhar em seus olhos outra vez.

Sentindo a vergonha esquentar seu peito, ele não foi capaz de se encarar no espelho uma segunda vez.

Então ele simplesmente foi em direção ao quarto e se afundou nos travesseiros.

O dia seguinte seria um longo e importante dia, ele precisaria estar preparado.

Alguém parecia concordar com ele, porquê em um espaço onde o tempo não seria capaz de alcançar, onde o destino não poderia interferir, começava uma pequena e exclusiva reunião.

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Construindo meu futuro - HARMIONE" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.