O que se pode fazer quando sua única atividade para o seu tempo livre é ficar pensando na vida ?

Bom , tecnicamente na morte .

Acho que nada .

Resolvi me vestir . Não ia ficar na cama o dia todo . Já estava ficando até com um pouco de trauma dela ... Resultante de todos esses pesadelos ...

Deus , aonde fui parar ? Com medo de uma cama ?

Céus , eu realmente não estou bem .

Por alguma razão que passou despercebida por mim , começei a me arrumar melhor . E quando digo melhor digo batom , blush e sombra . Eu nunca tinha sequer usado batom nem uma única vez na vida , por que eu estava fazendo aquilo ?

E então minha campainha tocou .

Deixei de lado minhas coisas e desci para atender . E , por ironia do universo , sabe quem era ?

Peter Fintynni .

Típico .

- Olá ! - ele disse sorrindo . Olá ? Como olá ? Ele aparece na minha casa as oito da manhã e só diz olá ?

Eu o encarei séria . Só então notei que ele era alguns centímetros mais alto do que eu .

- Como conseguiu meu endereço ? - perguntei de uma vez .

Ele me olhou divertido antes de responder . Qual era a graça ?

- Já estive aqui outra vez , lembra ? - ele falou quase rindo . Claro que eu lembrava . E eu não queria tocar nesse assunto .

- E como conseguiu meu endereço da outra vez ? - insisti .

Ele revirou os olhos . Céus , desde quando ele era tão sarcástico ?

- Tenho meus métodos .

Métodos ? Sei . Ele sabe ler mentes , isso sim !

Eu estava tão distraída que não vi ele se aproximando .

- Eu prefiro chamar de decifrar pensamentos - ele disse em meu ouvido , tal proximidade me assustou , dei um passo para trás .

Ele tinha admitido isso ? Como ? E por que ?

- Avisei que você já tinha a resposta . Você não quis me ouvir ... - ele deu de ombros .

Recuei mais um passo para trás . Eu já estava quase na parede . Ele entrou na casa fechando a porta atrás de si . E ficou me olhando com os olhos azuis impenetráveis .

Eu jamais conseguiria sequer decifrar os olhos dele , quanto mais os pensamentos . Era impossível .

Ele deu um passo em minha direção , e eu me afastei mais outro . Cheguei na parede . Droga , estou encurralada !

Ele deu outro passo . Eu não podia fugir .

- Por que você parece ter medo de mim ? - ele perguntou tão suave que estranhei . Ele não estava irônico ? Com raiva ?

Minhas teorias de bipolaridade continuam ...

- Eu ... Eu n-não tenho medo - disse gaguejando . Ótimo ! Eu tinha que gaguejar !

- Não minta - ele disse suave de novo , se aproximando novamente . Agora ele estava tão perto que eu podia sentir sua respiração morna batendo em meu rosto . Meu coração acelerou .

- Pra que mentir ou dizer a verdade se você pode simplesmente arrancar da minha mente do que eu tenho medo ? - disse ríspida , não queria aquela aproximação . Perto demais .

Ele me olhou interrogativo . Não lembrava de ter sido assim tão dura com ele antes . Ele deve ter estranhado ...

- Quero ouvir de você .

E então eu me dei conta que de quem nos visse ou nos ouvisse acharia que nós eramos apaixonados trocando juras de amor . Por favor . Eu nunca gostei de tanta babação . Irrita .

Virei o rosto para ele e tentei sair dali , mas ele segurou meus pulsos contra a parede . Não ! Eu não quero sofrer de novo ! Como ele acha que eu me senti quando ele simplesmente me beijou e foi embora ? Eu não queria aquilo de novo !

Ele me olhou sereno e aproximou a boca da minha . Não ! Não !

E tão repentinamente que fiquei até zonza , ele se afastou dizendo :

- Se você insiste ...

Realmente ele era bipolar .

- Não vai me convidar a entrar ? - perguntou ele depois de um tempo , no qual fiquei exatamente como estava , em choque .

Sacudi a cabeça . Convidar a entrar ?

- Tecnicamente você já está dentro . - falei .

Ele suspirou e foi até um sofá .Álias , como ele sabia onde era a sala ? Minha casa era cheia de corredores , como ele sabia que era o da direita ?

- Já esteve aqui antes ? - perguntei . Ele me olhou incrédulo . É claro que já . - Quero dizer , na sala . - corrigi

- Talvez .

Ele nunca ia me dar uma resposta direta .

- E o que faz aqui ? - falei

- Queria sair um pouco . - ele deu de ombros . Era a segunda vez que ele fazia isso . Deus , por que eu estava prestando tanta atenção nele ?

Ergui as sobrancelhas . Sair um pouco era vir na minha casa ?

- Não tecnicamente aqui . Prefiro parques , mas... - ele se interrompeu como se tivesse falado demais .

- Mas ... ? - insisti

- Queria que você fosse junto .

Certo , melação demais , alerta de babação disparado . Por favor ! Queria que eu fosse junto ? Eram oito da manhã , por deus ! E isso parecia algo que um namorado falaria , não ... Não Peter Fintynni . Ele era qualquer coisa menos um namorado perfeito .

- Puxa , obrigada !- ele falou com sarcasmo .

- Quer parar de invadir a minha cabeça ? - falei irritada . Aquilo já estava me enchendo o saco .

- Que bom que quer ir comigo , vamos ? - ele perguntou saindo do sofá e indo em direção a porta , me pegando pela mão.

Eu realmente nunca iria conseguir uma resposta direta dele .