Amante do Pesadelo. escrita por Nyctophilia


Capítulo 1
A solidão não é o propósito final.




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O mal que nos assola chega para mudar ou quebrar.
   Cabe a vos decidir qual manter.

 

(...)

 

Fade havia passado por muitas coisas em sua vida. Ela foi traída, abandonada e maltratada por homens que fariam demônios parecerem santos em comparação. Ela foi para batalhas suicidas e entregue a própria sorte do destino. E sobre tudo e sobre todos ela prosperou e saiu viva disso. Podia se dizer com clareza que ela era uma sobrevivente do pior que se podia fazer. O poder radiante dela apenas refletiu isso.  

O mal havia se apossado dela, e ela era apenas mais um ponto para perpetuar esse mau em forma de pesadelo, seja em si mesma ou nos outros. Há muito ela havia se acostumado com noites em claro, baixa sanidade e pensamentos intrusivos suicidas. Era o cotidiano. Existiam noites em que o poder dela a faria ver o fim do mundo de uma maneira tão vivida que ela se perguntou se Prowler e Nightmare eram suicidas também por querer que ela saltasse de um penhasco e acabasse com tudo. 

Foi assim durantes anos. A cada empreitada ela sonhava com a própria morte, com o fim da vida como era conhecido. Com um apocalipse onde todos seriam engolfados na escuridão e o vazio iria reinar supremo. As vezes os sonhos eram tão reais que Fade acordava e se perguntava se ela ainda estava sonhando ou se iria sonhar agora.  Quando ela se juntou ao Protocolo Valorant depois de ter sido confrontada sobre o que ela queria fazer por Brimstone, ela tomou a escolha que ela não se arrependeria.  

Havia se passado um ano desde que ela se tornou uma agente do Protocolo. Mas pouca coisa havia mudado. Os erros cometidos não eram esquecidos e nem perdoados. Ela encontrou o ostracismo e o descaso. Não era novidade para ela ser tratada como pária em lugares que frequentava. As pessoas tinham medo dela, os Agentes em que ela aceitou se juntar e formar uma equipe também tinham medo.  

Ela sentia o rastro, era capaz até de sentir o cheiro. Havia momentos em que os outros agentes estariam alegres e comemorando o que fosse, isso até ela chegar no mesmo ambiente, por qualquer razão que fosse, e tudo ficaria negro, e o cheiro do medo, da amargura iria atiçar os demônios do pesadelo que ela tinha consigo.  

Prowler era particularmente bom em se lembrar de suas refeições. Nightmare era demônio do pesadelo mais astuto. Ele sempre estava esperando o momento certo pra se banquetear. E isso sempre era recorrente.  

Todos tinham certo medo dela, e todos usavam uma expressão antagônica quando ela estava perto. Ela se acostumou a suportar os insultos recheados de medo e descaso em sua direção. Se acostumou ao pessoal a evitando como uma praga e sinceramente... Depois de um tempo parou de doer, ela sabia que havia cometido um erro, mas esperava que as pessoas pudessem seguir em frente e lhe dar uma chance de remediar essa ponte quebrada.  

Só que isso nunca veio. Então ela parou de tentar. Simplesmente aceitou que as coisas eram o que eram e que ela seria deixada em paz e evitada como se carregasse a varíola. Ela se acomodou na nova realidade e contribuiu como uma Agente, se mantendo em seu quarto na maior parte do tempo e evitando qualquer um e qualquer coisa.  

Isso até que um novo agente foi trazido ao protocolo. Um que fazia os pesadelos de Fade entrarem em um frenesi.  

Fade nunca pensou encontrar alguém cuja os pesadelos e medo não pudessem ser trazidos à tona, ela nunca esperou ter encontrado alguém imune ao medo a expectativa negativa do futuro. É claro que ela prestou um pouco mais de atenção depois que ela notou que esse novo agente, Dopel não se impressionou com a aura de medo que ela causava.  

O azul do mar e o verde da terra nos olhos dele a deixaram um pouco bamba, reconhecida e admitidamente. Ela gostava da ideia de que havia alguém levemente parecido que fosse, com ela.  

Então sim, Fade prestou atenção especial no novo recruta. Ela ficou de olho de longe observando os demais agentes interagirem com ele. Não era exatamente uma pessoa falante e isso ela podia entender. Ela também não falava muito.  

Foi aceito sem problemas, o fato de ser muito habilidoso e confiável certamente não doeu para que a integração ocorresse sem problemas. Não era exatamente um queridinho do grupo como Neon, mas certamente muitas léguas em popularidade acima dela mesma, até mesmo Viper e Reyna não tinham nada além de elogios a cada missão concluída logo quando foi colocado a prova de fogo.  

Dopel trabalhava bem com ela, ela ousou se envaidecer disso, apenas para se agarrar a alguma coisa e dar sentindo a algo que ela não queria nomear como solidão. Não havia muita conversa, e Fade certamente não tinha o carisma necessário para conversar pelos cotovelos como Jett fazia. Mas Dopel claramente confiava nas informações que ela coletava, e ela aprendeu a confiar na segurança que ele proporcionava, abrindo caminho e despachando qualquer inimigo. Havia algo ali. 

Ela admitiu que senti um leve toque de arrogância quando ouviu os outros agentes confrontando Dopel e perguntando quem ele preferia trabalhar em missões, e o nome dela foi dito em alto e bom tom.  

Ela estava passando desapercebida na cantina, apenas pegando um café. Mas ela saiu daquele local com mais felicidade do que ela admitiria. E isso foi um ponto novo na rotina. O primeiro mês havia passado desde a vinda de Dopel e certamente o padrão foi notado.  

Os dois eram desproporcionalmente bons um com o outro, claro... Dopel era um atirador de primeira linha e ela era muito boa em dizer o que estava acontecendo ao seu redor. Não deveria ser uma surpresa se um lado da ponte quisesse se aproximar para ver o outro lado, não? 

Mas ela ficou surpresa. Em meio a um jantar qualquer, com Skye e Raze claramente ao redor e conversando muito alto pra ser educado, Fade não pôde esconder a surpresa quando notou Dopel pegando seu prato e indo até a mesa mais afastada, quase escurecida pelo ambiente e pouca luz daquela ala.  

Curiosamente onde ela escolheu se sentar e evitar problemas.  

Fade guardava certo rancor dos demais pois a tratarem como lixo. Então ver o rosto desprezado e desconcertado deles quando Dopel a escolheu para se sentar a encheu de uma satisfação violenta que ela não tinha vergonha de se entupir.  

— Por quê? - foi a única pergunta que Fade ousou fazer enquanto os dois comiam em silêncio, mas de alguma forma, o silêncio parecia certo. A troca de olhares mais intensa da vida dela também parecia contribuir para o que quer que fosse. 

— Porque ninguém merece a solidão, especialmente os que se arrependem. A solidão é a crisálida dos monstros. - foi a resposta de Dopel.  

A partir daquele dia, Fade podia contar nos dedos quantas maldições ela ouviu nos corredores. Os demais agentes não eram exatamente receptivos a ideia de Fade estar agora muito mais ao redor de Dopel e monopolizando a atenção dele. Como Jett e Skye que não eram nada sutis sobre o interesse delas.  

Não que ela culpasse as duas muito, ela também estava e estava feliz com o desenvolvimento. Dopel frequentemente a procurava antes de qualquer missão, apenas para tomarem um café ou simplesmente ficarem sentados no sofá, poucas palavras eram trocadas e virou uma certa piada que os dois eram incapazes de se comunicarem se não fosse em missão, mas Fade não se importou.  

O fato de ter alguém investido na presença dela e não a tratando como pária a fazia se sentir nas nuvens.  

Isso a encheu de alegria, e reconhecidamente de satisfação. Havia um certo respeito entre eles e isso a deixava feliz. Havia camaradagem crescente a cada missão, a cada jantar compartilhado, a cada conversa de olhares e meramente a cada momento em que os dois simplesmente estavam perto um do outro.  

Fade passou a ativamente procurar a companhia dele. Começou a surgir dias em que ela bateria na porta do quarto de Dopel com um café da manhã em mãos, sendo convidada a entrar e ficar por lá mesmo, os dois confortavelmente na cama dele, Fade não admitiria para si mesma, mas a ideia de ter alguém tão confortável com ela a esse ponto a deixou doente na primeira vez.  

Não ajudou quando ambos começaram a treinar em conjunto a se sentir menos descolada da realidade, ninguém havia treinado e sequer oferecido algum conselho a ela quando se tratava disso, ela estava acostumada a estar por conta própria, mas inferno congele se não foi uma sensação maravilhosa ter alguém tão bom deixando-a saber onde poderia melhorar.  

Fade não podia reclamar da nova rotina. Depois de mais de um ano inteiro no Protocolo ela finalmente podia dizer que havia alguém que gostava dela. E isso era maravilhoso.  

A familiaridade um com o outro surgiu e Fade foi capaz de ver que na verdade Dopel era uma pessoa reconhecidamente caseira e gentil. Apenas metódico em suas missões. Os toques e as frases avulsas começaram a correr solto entre eles depois que Dopel disse que ela estava linda, logo após dele ir até seu quarto com café em mãos para eles.  

Tinha que ser o sinal de alguma coisa, não é? Então ela começou a falar o que pensava de volta. A cada momento Fade o jorrava de elogios sobre o cabelo longo e escuro que adornava em uma trança, uma trança que ele pedia para ela fazer. Dizendo o quão injusto ele parecia com essa aparência adrogena dele.  

Ele a elogiava e a tocava em momentos aleatórios, ela começou a se provalecer e deixá-lo perto dela. Muitas noites eles simplesmente iriam terminar o dia nos braços um do outro em qualquer canto, se olhando nos olhos e dizendo qualquer coisa, ou simplesmente em silêncio enquanto se bajulavam. 

Dopel deu uma dica única do que ele queria mais do que abraços e palavras bonitas dela, e Fade era tudo senão mulher corajosa.  

Ela o prensou contra os corredores que levavam até o quarto dela, e com um olhar brilhante que ela recebeu dele, Fade sabia que ela teria que ir até o fim.  

Foi assim que ela o beijou pela primeira vez, o corpo maior dela prensando o menor dele contra a parede enquanto a boca dele se apossava dele como se fosse sua dona, como se era assim que eles eram pra ser.  

— Você parecia que iria demorar uma década pra perceber que podia fazer isso. - Dopel deu um sorriso discreto para ela naquele momento e Fade podia jurar que um anjo o forjou apenas pra ela. - Tive que acelerar o processo...  

Fade não se orgulhava da maneira que isso deixou o corpo dela em chamas. Ela o pegou pelo braço e o trancou em seu quarto, os dois saindo apenas no outro dia.  

Havia uma pitada de raiva misturado com orgulho quando Jett apontou para Dopel se fingindo de desinteressada nas pequenas marcas na clavícula do agora namorado de Fade, resultantes das ministrações dela enquanto eles estavam juntos.  

O protocolo ainda a evitava descaradamente, mas agora não havia tantas ofensas... Mais como provocações de alguns agentes, como Phoenix e Harbor. Reyna foi uma mulher inquisitiva, no entanto, uma das primeiras vezes em que as duas se falaram desde a entrada de Fade no Protocolo foi se os dois estavam usando proteção.  

— Eu estava muito ocupada sendo criticada com as pernas esticadas pelo meu namorado pra me lembrar de proteção, e eu fiz questão de deixar a mente dele ocupada com outra coisa. - foi a resposta sucinta de Fade para a mais velha, encontrando certo prazer quando a mulher bufou e se afastou, dizendo que iria verificar com Dopel.   

O relacionamento estável dos dois logo se tornou conhecimento geral. Nada foi feito para proibir isso, contanto que não atrapalhasse nas missões. E isso nunca atrapalhou. Na verdade, o desempenho melhorou ainda mais. Havia certo conforto agora quando os dois eram pareados juntos, mesmo que outros agentes fossem junto em qualquer missão que fosse.  

Nenhum dos outros agentes entendiam, nem mesmo Raze e Killjoy que também estavam juntas. Era um namoro estranho, como os outros gostavam de frisar.  

Isso nunca incomodou Fade, ela seria julgada de qualquer forma nesse lugar. Ela sabia que precisava passar por essa provação para se recompor de uma vida de erros contínuos.  

Mas maldito seja se a ideia de ter alguém real na vida dela não a fazia sorrir.  

Sevgili... - a voz murmurada de Dopel, com o rosto entre o pescoço dela enquanto eles se abraçavam na noite a acordou de um pensamento profundo. - O que se passa na sua cabecinha problemática?  

Fade riu de bom humor com as palavras do namorado, o puxando ainda mais perto do corpo dela, para sentir o calor da vida que ele emanava. Ela se perguntou se o que quer que fosse que existisse no topo dos céus não havia planejado isso o tempo todo, agora nessa e muitas outras noites no quarto quando estavam juntos, tudo parecia certo.  

— Estou pensando em tudo, e mais um pouco. - Dopel ergueu o rosto do pescoço dela para lhe dar um sorriso confuso, o coração dela podia derreter com a doçura dos olhos ainda em sono dele. - Estou pensando em tudo de você, e mais um pouco de nós... 

Fade só podia agraciar a vida que agora ela tinha quando o mais singelo dos sorrisos adornou no rosto de seu namorado, prometendo todos os sabores do vinho e do pecado na noite longínqua.


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