O príncipe olhou para aquele monstro com desdém. Não seria algo simples, mas com tudo que aprendeu nos seus longos vinte anos de idade, acabar com aquela besta seria algo que conseguiria. O problema é que estava demorando demais. Até mesmo pra ele.

Ele cuspiu sangue no chão do campo de treinamento e ouviu um dos seus servos pessoais gritando para o encorajar. “Céus, eu não preciso dessa torcida agora. Eu preciso é de um tapa na cara e acordar pra vida”. O pensamento talvez tenha sido alto demais, porque no segundo seguinte, a mão grotesca daquele bicho avançou sobre ele e rasgou a pele da sua face em um corte imenso na diagonal, percorrendo sua bochecha direita até o lado esquerdo do seu queixo e atravessando seus fartos lábios. Com os reflexos tardios, o herdeiro recuou. O sangue escorria e pingava no chão.

“Estou sem tempo”. Concluiu para sua infelicidade. “Se eu ao menos conseguisse distrair esse monstro e acertar no machucado da sua costela, eu conseguiria ter uma chance”. Os pensamentos do jovem pareciam pequenas engrenagens tentando funcionar, mas, como toda engrenagem mal cuidada, algo as impedia de rodar. Ter vencido todas as últimas lutas com facilidade o tornaram confiante demais. Até mesmo se achava invencível. Mas agora, com sua camiseta de cetim rasgada, e a pele sangrando, pintando o tecido branco de vermelho, ele concluiu que era apenas um tolo. O problema foi ter percebido tarde demais.

Ele desviou de mais uma investida e pegou uma das adagas de seu cinto. Num instante, encheu a mão com a areia do chão e jogou nos olhos da fera, fincando a adaga no ferimento que havia aberto logo no início da luta. O monstro uivou de dor e se virou para o homem, os olhos vermelhos brilhando de ódio, disposto a acabar com ele. Havia sido conjurado por um motivo, e iria destroçar aquele garoto até não restar um fio de cabelo para contar história. Aquilo não era só uma última luta antes da sucessão. Era muito mais que isso.

Só que aquele monstro parecia não morrer nunca. Não se cansar nunca. Mas ele estava cansado.

E bem ali, no campo de treinamento, estava o maior monstro dos Reinos da Harmonia. Não dentro da arena. Mas sim, do lado de fora, sorrindo enquanto se abanava com um leque roxo incrustado de pedras preciosas. O balançar suave do objeto cobria levemente seus lábios, que conjuravam um feitiço proibido. Um feitiço que destruiria o futuro monarca.

Seu plano finalmente havia começado.