Meu celular vibrou mais uma vez. E novamente, eu recusei atender.

Qual é, essas pessoas não tinham mais o que fazer?

O pior era que, nas poucas vezes que eu atendia, a pessoa do outro lado não falava nada.

Como se eu tivesse que adivinhar o porquê dela ter me ligado.

Eu não era de me irritar fácil, mas isso estava me estressando mais do que deveria.

Terminei de tomar meu café na cafeteria próxima da faculdade e comecei a trilhar meu caminho de volta para a sala, o dia mal tinha começado afinal.

Assim que guardei o celular no bolso da calça, ele vibrou de novo.

Respirei fundo, e minhas mãos forem inconscientemente para minhas têmporas, como se eu tivesse de massageá-las para impedir de implodir ali mesmo, na calçada da avenida principal da cidade.

Dessa vez eu iria atender, e não seria bonito.

Olhei a tela do celular e o número que aparecia, sem a mínima ideia de quem seria.

E atendi.

— Escuta, eu não sei quem você é ou o que você quer, mas cacete cara! Você acha que eu vou ficar atendendo todas as milhares de ligações todo santo dia sabendo que ninguém diz nada como se eu tivesse que adivinhar quem está falando ou que assunto quer tratar porra! Caralho, eu não aguento mais! Toda vez que eu bloqueio esses números vocês arranjam um jeito de me ligar de novo. Quer saber? Vão pra puta que pariu, eu não vou atender mais ligação nenhuma — disparei, e notei que as pessoas que passavam ao meu redor me olhavam assustadas.

Acho que não era toda vez que elas encontravam uma garota surtando por causa de uma ligação.

— Espera! — escutei uma voz feminina do outro lado — Não desliga! Eu encontrei seu telefone no mural de aulas particulares, eu vi que você dá aulas de Química, e eu estou precisando urgentemente de ajuda em estequiometria.

E então eu lembrei. Eu tinha colocado meu número para reforços de Química no mural na semana passada. E se parte das ligações que eu recusei fosse de gente precisando de ajuda?

Merda.

— Ah. Nossa, eu... sinto muito. — O  tom da minha voz saiu bem mais baixo dessa vez. — Desculpa mesmo, eu nem lembrei disso. Umas pessoas vêm me ligando e me tirando do sério nos últimos dias.

Ouvi um riso do outro lado.

— Não tem problema! Já aconteceu comigo também, é bem chato mesmo.

Ela me ouviu dizendo palavrões. Eu não tinha o costume de fazer isso. Que ótima primeira impressão ela tinha de mim!

— Desculpa. Céus, juro que não sou assim! — Minha boca falou antes que eu pudesse pensar antes. Eu não queria que ela achasse que eu era assim o tempo todo.

A garota certamente desistiria depois dessa.

— Relaxa! Tá tudo bem. Eu sou a Esther, aliás. Eu faço Biologia. Você é a Miyake, certo?

— Pode me chamar de Miya. Eu faço Engenharia Ambiental.

— Legal! Nos encontramos às quatro?

— Isso — eu sorria sem nem perceber.

— Certo. Até depois, Miya! — ouvi um bipe, anunciando que ela tinha desligado.

De imediato, adicionei seu número nos contatos, assim não teria um outro acidente.

O dia seria cheio.