Prepare-se para interceptar

A guerra continua em desvantagem

O amor é cego

Mas seu beijo pode abrir meus olhos

Alguns dias passaram. Kaito havia dito que era difícil dar o fora em alguém, o que levou-me a acreditar que ele pretendia terminar com Luka, mas parece que tinha mudado de ideia, visto que isso não aconteceu. Ou talvez eu tivesse entendido errado.

Os boatos continuavam a todo vapor e eu me sentia cada vez mais sozinha. Kaito não voltou a falar comigo depois daquele dia, pois Luka andava grudada nele como chiclete. Não sei se era impressão minha, mas ela estava mais arrogante do que nunca.

Mas não agora.

Certa vez ela me ouviu cantarolar enquanto usava o banheiro. Dessa vez eu ouvi uma conversa dela ao telefone.

— Sei que não posso perdê-lo, você já disse isso milhares de vezes. Estou me esforçando — uma pausa — Sim, tem uma aluna que gosta dele — outra pausa — Não importa se ela rica ou pobre, a garota gosta dele de verdade. Eu não… — silêncio — Eu sei, mãe. Vou recuperar o dinheiro da família. Até logo.

— Recuperar o dinheiro? — comentei, saindo da cabine e sobressaltando-a.

— Ouvindo a conversa dos outros? Que falta de educação — respondeu, embora o tom arrogante não conseguisse disfarçar a preocupação — Descobriu meu segredo. Feliz?

— Na verdade estou confusa — respondi enquanto lavava as mãos — Digo, você falou que é descendente de uma família de condes, então…

— E sou. Mas meus avós gastaram toda a fortuna dos meus ancestrais em bobagens e agora não temos mais nada. Somos nobres falidos — Luka cruzou os braços — Meus pais usaram o pouco dinheiro que restou para me matricular nessa escola para que eu me casasse com algum garoto rico e voltássemos a viver com conforto. Por acaso os pais do Kaito são excêntricos  que acharam a ideia de ter um título de nobreza muito atrativa então decidi investir nele.

— Por que está me contando isso?

— Porque estou farta disso tudo — Luka passou a mão pelos cabelos, frustrada — Farta de ser usada para recuperar uma fortuna idiota. Cansada de ficar com um garoto de quem não gosto.

— Por isso você dizia que não “pode” perder o Kaito ao invés de não “quer” — murmurei — Você nunca gostou dele.

— Exato — Luka confirmou — Ridículo, né? Te acusei de dar o golpe do baú, mas sou eu quem estou fazendo isso.

— Foi porque seu pais te obrigaram, certo?

— Eu nem gosto do Kaito — Luka resmungou — Digo, eu não o odeio, mas… às vezes ele é tão irritante! Com aquele jeito bonzinho de ajudar todo mundo… fiz de tudo para irritá-lo, tirei as coisas que ele mais gosta e nem assim ele termina comigo!

— Quer terminar com ele? — exclamei pasma.

— Não posso terminar com ele, minha mãe me mataria — Luka deu uma risada amarga — Por isso estou tentando fazer com que ele termine comigo. Assim a culpa não será minha — ela me encarou pensativa — Você gosta mesmo dele, certo?

— Você sabe que sim — desviei o olhar.

— Lamento ter atrapalhado sua vida. Acho que no fundo o Kaito tem uma queda por você também.

— Então, se o Kaito terminar com você…

— Não sei o que vou fazer. Talvez ir para uma escola pública, conhecer pessoas normais — deu de ombros — Mas não ficarei no seu caminho.

— Obrigada.

— Não agradeça — ela tirou um vidro de esmalte da nécessaire e o bateu contra a pia, quebrando-o — Você vai me ajudar a terminar com o Kaito. Lamento por isso, de verdade.

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O assunto foi parar na diretoria. Normalmente ninguém acreditaria que uma aluna de prestígio agrediu uma bolsista com um vidro de esmalte quebrado, mas Luka confessou. Havia novos cortes pelo meu corpo além do esmalte vermelho misturado com sangue. Ela também tinha marcas de unha e hematomas dos socos que levou quando revidei, mas não se comparava aos meus machucados.

Ambas fomos suspensas por uma semana. Mas isso não foi tudo. Luka disse que a briga foi por ciúme, mas aquilo foi a gota d'água para Kaito. Ele terminou com Luka.

Quando a suspensão terminou Luka não voltou para escola. Os boatos sobre mim tinham parado, visto que havia um assunto novo para os alunos comentarem: De que a família de Luka estava falida e que ela pretendia dar o golpe do baú.

Algum tempo passou. Voltei a fazer as refeições com colegas de classe. Kaito retornou ao clube de música. Os boatos sobre Luka desapareceram e agora a fofoca atual era sobre alunos gêmeos transferidos, que achavam serem filhos de uma amante.

— Todo dia um boato diferente… as pessoas não tem mais o que fazer? — comentei. O ensaio do clube tinha acabado e eu e Kaito tínhamos ficado para organizar os instrumentos musicais.

— Devem achar divertido cuidar da vida dos outros — ele deu de ombros — Mas eu ainda preciso cuidar de uma coisa na minha vida.

— O que? Você retornou ao clube de música, voltou a tomar sorvete…

— Mas não te dei uma resposta — interrompeu — Terminei com a Luka já faz tempo. Te devo uma resposta.

— Não precisa ter pressa…

Ele segurou meu queixo e aproximou-se, unindo nossos lábios. Senti meu coração disparar enquanto ele envolvia meu corpo com a outra mão, abraçando-me com ternura. Apoiei as mãos nos ombros dele enquanto Kaito deslizava a mão do meu queixo para meus cabelos, acariciando-o enquanto trazia-me par mais perto. Suspirei de surpresa e ele me soltou.

— Essa é minha resposta — ele disse quando nos separamos.

— Tem certeza? — murmurei, tocando os lábios com os dedos.

— Não teria te beijado se não tivesse — ele sorriu — Gosto de você faz tempo. Aquele namoro foi ideia dos meus pais, porém, quando souberam que Luka era uma nobre falida, ficaram furiosos. Estou livre para ficar com quem quiser agora. E eu quero você.

Atirei os braços ao redor do pescoço dele, sorridente. Kaito não “precisava” ficar comigo, ele “queria” ficar.

Finalmente tinha vencido a guerra.