A Deusa da Morte escrita por Aline Lupin


Capítulo 3
Capítulo 3




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Adam fez várias visitas à casa de Emily. Estava entusiasmado por conhecer aquela família tão interessante e por estar próximo de Emily. Ela era encantadora. Sua doçura o envolvia em cada momento. Às vezes em que esteve com ela, quase sempre eram em seu jardim. Ela explicava sobre as flores, como cuidar e até seus significados.

— Está vendo esse narciso - ela aponta, com um sorriso nos lábios - Segundo a mitologia grega, Narciso, ao ver seu rosto nas margens de um rio, se apaixona por si mesmo. A flor seria a representação do egoísmo e da vaidade. Mas, bem, ela não é linda?

Adam assente.

— É como o livro de Oscar Wide, O retrato de Dorian Gray? - Adam pergunta, associando o mito grego a história do escritor.

— Pode-se dizer que sim. Esse livro também mostra o reflexo de uma mente egoísta e vaidosa. Dorian se apaixona por seu reflexo quando é eternizado por um pintor, ao posar para um retrato. Se relacionarmos o mito de Narciso e a história de Dorian, são semelhantes.

Cada diálogo com Emily era uma surpresa para Adam. Ela não era somente doce e bela, havia uma mente inteligente por trás de toda sua aparência angelical. E quando tocava seu violino para ele, era a melodia mais bonita que ele já ouvirá.

— Ainda precisa praticar, Emily - provocou Mikael, quando ela terminava de executar uma música de Beethoven - Eu diria que é quase perfeito.

Emily fez uma cara de ofendida.

— Sou muito melhor que você, irmão - ela revida.

— Está mais que perfeito - murmura Adam, observando ela, sentando da poltrona na sala de estar.

Ela não parecia ter escutado e começou a executar outra música. Mikael arqueou as sobrancelhas. Ele estava sentado perto da janela, no seu sofá preferido da sala. Parecia enxergar Adam, pois seu rosto virou em sua direção, ao ouvir aquilo. Adam se sentiu desconfortável e fitou seus pés. Mikael sorriu, apenas. Adam pensou que talvez não tivesse o escutado. Era o queria acreditar.

E Emily continuava a pintar, sem descanso. Havia sonhado várias vezes com o rosto do homem divino. Ele a arrastava pela mão e sempre a levava para um lugar escuro e cheio de árvores mortas. Ela se horrorizava a cada pesadelo. E retratava isso em seus quadros. O rosto dele era marcado pelo ódio e raiva. Ele não a maltratava, mas dizia que ela lhe pertencia, que seria dele, em breve. Emily escondeu os quadros, pois não queria de maneira alguma assustar seus familiares, já bastava à dor da perda do seu pai. Ela tentava encarar aquilo como fantasia, apenas isso.

E um grande evento se aproximava. Em uma noite de verão, Emily e Mikael se arrumavam, com vestes vitorianas. A festa seria temática do período vitoriano e todos deveriam portar máscaras. Emily e Mikael foram contratados para tocar no local, junto com mais alguns músicos conhecidos deles. Emily trajava um vestido na cor cinza, de seda, com as mangas curtas e luvas pretas de veludo até o cotovelo. Seus cabelos negros estavam elaboradores em um penteado intricado, cheio de tranças e com sua franja curta sobre a testa. Colocou sua máscara de veludo negro sobre o rosto e fitou seus olhos castanhos no espelho de corpo inteiro do quarto de sua mãe.

— Está esplendida, querida – comentou sua mãe, ajeitando mais uma vez os cabelos da filha – Acho que podemos colocar uma flor em seu cabelo? Para ficar menos sombrio seu visual...

— Não, mãe – ela pede, sorrindo para o reflexo de Flora no espelho – Eu quero passar despercebida. Não gosto de chamar a atenção, você sabe.

Flora assente. Suspirou, pensando no tempo em que conhecera seu marido em um baile, também de máscaras. Ela era filha de um visconde e tinha muita riqueza, contudo, ao se casar com seu marido, Martim, perdeu tudo. Ele era advogado e não tinha nenhum problema financeiro, mas o pai de Flora era preconceituoso e desejava que ela se casasse com um homem com títulos. Flora não aceitou e fugiu com Martim e assim foi renegada em sua própria família.

— Querida, espero que se apaixone nesse evento – ela comenta – Você merece ser feliz. Já tem vinte e dois anos. Eu na sua idade...

— Já estava casada e grávida de mim – Emily terminou a frase, colocando o último par de brincos de pérolas na orelha – Eu sei, mãe...mas não quero me casar, não agora. E Adam...

— Adam parece ser um ótimo pretendente – comentou sua mãe, ao ver que Emily ruborizou ao mencionar o nome dele e não conseguia terminar a frase – E ele está demorando em oficializar um pedido de casamento. O tempo passa, Emily, você precisa de segurança. Não temos muito e não quero que viva somente da música. Adam se comporta mais como seu amigo e não sei se ele está realmente interessado.

A expressão de Emily murchou. Fazia um mês que ele a visitava, mas sua mãe tinha razão, ele não lhe dava qualquer sinal de querer firmar um compromisso. Apesar disso, era um ótimo amigo, ouvinte e eles sempre tinham assuntos interessantes a discutir. Ele não a tratava como uma tola, mas apreciava seu gênio e inteligência.

— Tudo bem, mãe, a senhora tem razão – Emily diz, sentando na cama de dossel – Mas, não quero me casar. Ainda não. Quero sentir algo pelo cavaleiro em questão e não sonho com véu e grinalda. Sonho em ser livre apenas isso.

Flora assente. Ela abre a gaveta da penteadeira e pega um estojo de veludo verde. Sentou-se ao lado da filha e abriu o estojo. Havia um colar de perolas negro. Era a única joia que permaneceu com ela, ao fugir com Martim.

— Filha, quero que uso esse colar, está noite – Flora disse, colocando o colar no pescoço de Emily – Vai combinar com seu vestido e também quero que uma parte de mim vá com você nesse grande evento.

Emily sorriu, apertando a mão da mãe.

— Mãe querida, não sabe o quanto esse gesto é atencioso e me faz muito feliz – ela diz, agradecida, sentindo lágrimas despontarem dos seus olhos – Mas, a senhora poderia ir conosco, sabe que precisa sair e foi até convidada.

Flora negou com a cabeça.

— Não sairei querida, não sem meu Martim – ela explicou – Não tenho mais o vigor da juventude, também. E para mim, está muito bom ser mãe de dois filhos maravilhosos.

Emily beijou a face da sua mãe, com carinho e se levantou.

— A senhora que é maravilhosa, mamãe – ela diz.

Mikael apareceu na porta, trajado com suas roupas de galã. Ele vestia uma calça bege, um casaco preto que ia até os joelhos, uma camisa, um colete e um lenço enrolado no pescoço. Todos no em tom branco. Sobre sua cabeça, usava uma cartola negra e já estava com sua mascara de veludo negro sobre os olhos azuis translúcidos. Ele sorria e parecia ver sua irmã e mãe dentro do quarto. Carregava o estojo do seu violoncelo e uma mão e na outra o estojo de violino de Emily.

— Onde está minha encantadora acompanhante? – ele pergunta, com tom jocoso.

— Aqui e você não sabe se sou ou não encantadora – Emily provoca se aproximando do irmão e ajeitando seu lenço.

— Eu sei, sim, posso ver sua alma – ele devolve, com um sorriso de zombaria – E nossa mãe, não virá?

— Não, querido – Flora diz, levantando-se da cama e colocando o estojo de veludo verde dentro da gaveta da penteadeira – Vocês merecem esse dia e eu só iria atrapalhar.

— Será uma pena não tê-la por perto, minha mãe – ele diz, com sinceridade – Um dia terá que sair de casa. Quero leve-la a ópera.

Flora assente, tentando não dar mais assunto para aquela conversa. No horário combinado, uma carruagem de aluguel parou em frente a residência daquela família. Emily e Mikael se despediram de sua mãe e embarcaram na carruagem com mais dois músicos. William e Richard. Eram dois amigos de Mikael e eles eram responsáveis por ter encontrado aquele trabalho. Eles conversaram, enquanto a carruagem percorria as ruas londrinas, até a residência do conde e da condessa Derby, em Mayfair. 

— Está belíssima, senhorita Emily – William comentou, ajustando sua mascara negra sobre o rosto. Seus olhos azuis a fitavam com surpresa – Eu diria que será uma sensação nesse baile de máscaras.

Emily riu. Mikael, que estava ao lado dela, sorriu, concordando levemente com a cabeça.

— Minha irmã acredita que trajando essas roupas fúnebres, não irá passar despercebida – ele comenta.

Emily deu uma cotovelada na costela do seu irmão, o fazendo grunhir de dor e soltar risadinhas.

— Eu diria que ela parece um anjo, mas um anjo da morte – comentou Richard, com eloquência – E irá chamar muito a atenção com sua beleza, Emily. Será difícil algum cavaleiro não a tirar para dançar.

Emily bufou, irritada com aquele assunto.

— Por favor, senhores, não gosto desse assunto. Irei apenas a trabalho – ela diz em tom sério, não deixando de ser cortes – Peço que esse diálogo se encerre.

Richard e William assentem. Conheciam o gênio de Emily e sabiam que ela gostava de ser tratada com seriedade. Ela não gostava de leviandades e muito mais com a sua pessoa. Apesar disso, Richard queria contrapor, mas se calou. Era secretamente apaixonado por ela e não queria cair em seu conceito. O silêncio foi quebrado por mais uma anedota de William e todos pareciam esquecer-se da beleza de Emily. A carruagem parou, depois de meia hora de viagem e Richard pagou o condutor com algumas libras. Ele fez questão de ajudar Emily descer a carruagem e ela lhe agradeceu.


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