A Música Que Nos Une escrita por Aline Lupin
Henry e Anne voltaram para Londres mais cedo do que o previsto. Ele queria fugir de sua mãe e Anne agradeceu por isso. Voltaram a rotina normal e Anne focou em cuidar de Erik e em escrever seu novo livro. Henrietta estava entusiasmada e a incentivava. Elas trocavam correspondência quase sempre e tomavam chá nas sextas. Anne se sentia cada vez mais à vontade com a jovem, que teve que se resignar em abandonar a frente da editora. Seu pai estava bem e a expulsou. Mas, ele iria investir em Anne. Havia gostado do dinheiro que estava faturando.
— Eu odeio meu pai – ela disse, com raiva, enquanto as duas caminhavam por Hyde Park – Ele é um homem tão antiquado. Eu queria comandar tudo aquilo, pois eu sei o que o público quer, Anne. Muitas leitoras estão buscando um tipo de leitura diferente. E você é uma das pioneiras. Não sabe quantas cartas temos recebido das suas fãs.
Anne estava feliz e contente por isso. Mas, ainda havia a melancolia em seu coração. Ela teria que deixar Henry. Logo ele iria ser arrastado pela ruína, ao se casar com ela. E precisava ter coragem para fazer isso.
— É maravilhoso – ela disse, com um sorriso fraco.
— E sabe quem bateu a nossa porta, querendo saber quem é você? – Anne negou – Duas pessoas – ela mostrou com os dedos em v - Uma, que eu não suporto. Lorde Klyne. Estava furioso. Ele disse que o vilão parecia com ele. É um tolo. E a segunda pessoa é a dama que está à frente do jornal Hamilton. A Sra. Hamilton não parava de me questionar e me acusou de ser a Sra. Stone. Isso foi muito hilário.
Anne estava enjoada. E não era por causa da Sra. Hamilton. Mas, por causa de Klyne. Como ele sabia que era ele? Temia que ele viesse atrás dela, tirar satisfações.
— Bom, eu vou levá-la até sua casa, Anne – ela disse, puxando-a para fora do parque.
Elas embarcaram na carruagem, que estava parada do lado de fora. E chegaram ao destino. Henrietta não parava de tagarelar e Anne fingia concordar com tudo. Esperava não ter concordado com assassinato. Ela não tinha ouvido nada. Estava nervosa e tensa.
Saíram da carruagem e Henrietta insistiu em entrar com ela. Anne escutou vozes alteradas dentro da casa. E uma Nancy nervosa veio ao encontro dela.
— Graças a Deus, Anne – ela disse, segurando o avental, com força – O Sr. Collins parece que vai quebrar tudo no escritório. Lorde Klyne está com ele. E os dois não saíram de lá e o Sr. Jones não voltou...vai acontecer uma tragédia.
Anne sentiu-se fraca. E se desvencilhou de Henrietta e Nancy, indo até o escritório de Henry. Precisava intervir. Só, não sabia como. Ela abriu a porta e encontrou os dois parados em frente um ao outro. Henry esganava Klyne, com o braço sobre o pescoço do primo, que tentava se desvencilhar.
— Anne? – Henry disse, com o olhar arregalado.
Klyne aproveitou que seu primo estava distraído e se desvencilhou do aperto em seu pescoço e acertou um soco no queixo dele, o desorientado.
— Parem! – ela gritou.
Klyne a fitou com raiva.
— Você! Você é uma maldição para essa família! – ele cuspiu.
Anne deixou as lagrimas caírem.
— Eu sei – ela disse.
Henry se endireitou, apertando o queixo e com um olhar feroz para Klyne.
— Não se atreva a dizer isso da minha noiva – ele esbravejou.
— Ah, mas ela é uma noiva tão boa, não é mesmo? – Klyne zombou.
— O que quer dizer? – Henry cuspiu.
— Quero dizer que Anne tem coisas a esconder em seu passado. Não contou para ele sobre nós, Anne? – Seu olhar era malicioso – Eu lhe avisei que iria contar.
Henry retesou, procurando o olhar de Anne.
— O que ele quer dizer, Anne?
— Eu...er...- ela balbuciou.
— Não precisa se dar ao trabalho – Klyne interrompeu, com um olhar de desdém – Era isso que queria avisá-lo. Ela foi minha amante Henry. E só queria se casar com você, pois eu não quis desposá-la.
— Isso não é verdade! – ela gritou.
Henry fitou um e outro, com um olhar tenso. O maxilar retesado. Klyne riu, sem humor.
— Anne, querida. Diga a ele. Você foi minha, mas eu disse que não queria me casar. Se está tentando me fazer ciúme, não vai acontecer – ele disse, com um tom irônico.
— Não, não foi assim! – ela tentou explicar, com o corpo retesado, apertando os punhos.
— Não foi assim? – repetiu Henry, boquiaberto – O que de fato houve então, Anne? Você se deitou com Robert?
— Er...sim – ela admitiu, ficando vermelha.
Ele soltou o ar, passando a mão pelo rosto. Estava pálido.
— Meu Deus...de novo não...- ele murmurou.
Seu olhar era abatido e isso partiu o coração de Anne.
— Não é o que pensa, Henry – ela tentou explicar. Mas, isso só tinha piorado as coisas.
— Não é o que penso, Anne? – ele se aproximou dela, com um olhar dardejante – E o que é? Por Deus, você me traiu. E eu disse a você que minha ex esposa tinha feito isso. Como pode? Como...
— Não foi agora. Isso foi antes de conhecê-lo, Henry – ela tentou explicar mais uma vez. Mas, ele parecia descrente, balançando a cabeça, em clara negação – Por favor, acredite em mim.
— Era isso que estava tentando dizer a você, Henry – Klyne interrompeu - Ela – ele apontou – Não é confiável – ele frisou - Não foi a primeira vez que nos encontramos, depois que nosso caso terminou. E me pediu ajuda, para que eu a empregasse, pois eu não queria mais ser seu amante. Eu fiz isso, por não querer vê-la na rua. E ela me enviou esse bilhete. Leia você mesmo.
Henry puxou o bilhete, impaciente, com as mãos tremulas. E respirava fundo. Parecia a beira de uma apoplexia. Ele abriu a boca, parecendo que iria desmaiar, depois de ler o bilhete.
— Como pode, Robert? Eu lhe ofereci amizade e você me apunhala pelas costas? – Anne gritou, ensandecida, voando sobre ele. Acertou um golpe no peito, mas isso não pareceu desestabilizá-lo.
Ele a segurou com força pelo punho e a afastou.
— Vamos, pare de fazer espetáculo de si mesma. Henry já sabe quem você é. E agora, você vai embora de nossas vidas – ele disse, lentamente e se aproximou dela, falando seu ouvido, em um sussurro – É isso que eu disse, Anne. Eu não faço a ocasião, mas se ela aparece, eu a uso ao meu favor. Espero que não fique com raiva de mim, não muita. Mas, você me fez parecer ridículo e você sabe do que estou falando.
Anne se afastou, sentindo o peito doer. O olhar dele era raivoso. Magoado. Era o livro. Por Deus, o que ela fez? Saiu correndo, sem olhar para trás e subiu as escadas. Havia até se esquecido de Henrietta.
Se trancou no quarto e se pôs a chorar. Sua dor com certeza poderia ser ouvida a distância e isso aumentava sua lastima.
***
Anne saiu do quarto, depois que escureceu. Já havia arrumado sua bolsa. Não tinha muitos pertences. Ela viva com pouco. Iria embora com seu pagamento e pediria abrigo a Henrietta. Só precisava ver mais uma vez Erik e se despedir. Ela prometeu que não iria embora a ele, mas teria que quebrar aquela promessa. Tudo estava acabado e não havia mais solução. Klyne a fez parecer promiscua e mentirosa diante de Henry. E por que ele iria acreditar nela? Havia uma carta, a qual ela pedia para encontrá-lo no Hyde Park, pois eles precisavam se entender. E Klyne era família. Henry iria ficar do lado da família, não do dela.
Anne caminhou lentamente pelo corredor, segurando uma vela e foi até o quarto de Erik. Ele não dormia mais no sótão desde o mês anterior. Estava mais comportado e não oferecia mais perigo. Mas, ele não estava lá. Ela ficou tensa e abriu o armário enorme, recostado na parede. Contudo, não havia sinal do garoto. Ela continuou sua busca pela casa e acabou acordando a todos. Só não foi atrás de Henry, porque não iria conseguir enfrentá-lo.
Erik não estava em nenhuma parte e nem Henry, segundo a Sra. Hackney. Ele tinha saído, depois que o primo tinha ido embora. E Henrietta ainda tinha tentado defendê-la, gritando coisas horríveis a Klyne, que a ignorou. A jovem foi embora, pouco depois. E só sentiram a falta de Erik mais tarde, pois acreditavam que o menino estivesse com Anne.
— Eu deveria saber que não. A senhorita saiu tão angustiada – disse a Sra. Hackney, segurando o avental e tremula – Eu sinto muito, senhorita. Eu vou recolher minhas coisas e vou embora. Não mereço trabalhar aqui, depois de perder o garoto.
— Não diga isso, Sra. Hackney. Por favor – Anne a segurou pelo braço fino – A senhora não tem culpa. Ele deve estar com Henry.
— Espero que sim – disse Nancy assoando o nariz em um lenço, depois de chorar muito devido a situação de Anne e o desaparecimento de Erik – Ele deve estar lá fora. Já pedi para o Sr. Jones verificar. Não deve ter ido muito longe.
A senhorita Stone abraçava Nancy e chorava. A Sra. Campbell tentava enfiar bolinhos e chá a frente delas, na cozinha, mas elas estavam alheias a suas tentativas de manter a situação calma.
— Vocês precisam parar de tanto melodrama – a cozinheira disse, irritada – O menino deve estar com o Sr. Collins. Ele vai ser encontrado.
Anne queria acreditar fervorosamente que sim.
Se sobressaltou quando ouviu a porta da frente abrir e saiu da cozinha, rapidamente. Entrando na casa, Henry era carregado pelo Sr. Jones. Henry tinha o braço envolta do pescoço do cocheiro e parecia desnorteado. Anne correu para ele, mas retrocedeu ao ver seu olhar duro. Ele rescendia a bebida. E não parecia de bom humor.
— Ai está...mi..nha lin..da noi..vaaa – ele disse, com a voz enrolada. Estalou a língua e se soltou do Sr. Jones, que tentou segurá-lo, mas Henry já estava diante dela, com um olhar raivoso – Você...- ele apontou o dedo para ela – É uma... – ele parou de falar e ela temia escutar o pior - uma feiticeira. É isso. Um rosto...tão belo – ele a tocou, mas ainda havia raiva em seu olhar. Mágoa. Ele passou a mão pelo seu rosto, como se quisesse memorizá-la – Eu...não...entendo... – ele disse, limpando as lagrimas dela – Você...argh...maldição!
Ela se afastou assustada.
— Você bebeu demais, Henry. É melhor ir descansar – ela pediu, com a voz baixa.
— Não! Eu vou ficar aqui e você vai me ouvir – ele tentou manter a voz firme e conseguiu dessa vez – Eu não entendo...por que me traiu desse modo, Anne? Eu achei que me amasse...
Ele parecia confuso. Seu olhar era carregado de raiva e dor.
— Eu não o traí, Henry. Não fiz nada disso – ela negou, veemente. Seu corpo inteiro tremia, apesar de ter mantido a voz firme.
— Havia uma carta, Anne – ele apontou, com sarcasmo – Você queria a nós dois, não é? Mas, agora vai ficar sem...nenhum - ele riu sem humor - É muito gananciosa para seu próprio bem. Eu deveria ter...eu deveria ter escutado minha mãe. Você estava se aproveitando de mim esse tempo todo...
Ele fechou a boca, com o maxilar tenso. Ela chorou, sentido a visão embaçar. Queria gritar e dizer que ele estava errado. Mas, percebeu que não adiantava lutar. Era melhor ir embora da vida dele. Nunca teria dado certo. Ela sabia agora.
— Enquanto você me insulta, deveria se preocupar com o fato de que Erik está desparecido, Henry. É melhor começar as buscas – ela disse, com a voz amarga.
Isso pareceu despertá-lo.
— Quando? – ele perguntou.
— Hoje de tarde, quando você saiu – ela respondeu, seca.
— Maldição! – ele praguejou.
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