A Música Que Nos Une escrita por Aline Lupin


Capítulo 16
Capítulo 15




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Ela ficou acordada, depois que o sol nasceu e observou o perfil de Henry ao seu lado. Observou ele ressonar, profundamente. Ele dormia de barriga para cima e estava com o rosto sereno. Ela estava encolhida no canto da parede, inclinada sobre ele. Fora uma noite desconfortável, pelo fato de a cama ser muito pequena para os dois, mas ela amou cada segundo que teve ao seu lado.

Ela parou para admirá-lo, como se fosse uma pintura. Ele parecia tão mais jovem e menos sério. Seu bigode de um tom loiro escuro o deixava muito mais velho do que parecia, mas agora, dormindo, ele parecia ter rejuvenescido. Ela prestou a atenção no contorno do seu rosto oval e aristocrático. Tinha um nariz afilado, sobrancelhas grossas e loiras em tom de ouro escuro. A pele era branca, deixando transparecer algumas sardas quase imperceptíveis em suas maçãs altas. E seus cabelos loiros, cor de areia caiam sobre o travesseiro, o deixando um aspecto quase angelical. Talvez, de um anjo caído. Ela riu do próprio pensamento.

Ele abriu os olhos ao som da voz dela, de forma lenta e preguiçosa. Agarrou-a pela cintura, beijando seus lábios.

— Bom dia, minha noiva – ele disse, com a voz rouca – Que horas são?

— Acho que ainda não deve ser seis horas – ela respondeu, sentindo seu peito explodindo de alegria. Ele a fitava com tanto amor.

— Ótimo – ele disse, fechando os olhos e os abrindo – Diga que não estou sonhando.

— Não está. Por quê? – ela perguntou, confusa.

Ele passou a mão pelos cabelos lisos dela e depois por seu rosto.

— Não posso acreditar que esteja aqui com você. É tão perfeito. E você é tão linda. Parece um anjo sobre mim – ele disse, beijando-a com ternura – Seus cabelos são tão escuros, deixam seus olhos tão azuis. Parecem duas turmalinas azuis. Tão preciosa – ele beijou novamente, a deixando sem folego – Diga que casara comigo, Anne.

— Henry, você prometeu que iria me deixar pensar – ela disse, com a voz fraca.

— Eu disse? Mas, que droga. Eu não gosto de quebrar promessas – ele falou em tom zombeteiro – Mas, talvez eu quebre e a faça se casar comigo amanhã.

Ela riu, tocando seu rosto.

— Você existe? – ela perguntou, alisando o rosto dele, que já estava com a barba áspera.

— Eu sim. Sou bem real, cheio de defeitos. Um pouco inseguro e ciumento. E você existe? – ele perguntou, tocando os lábios dela com o polegar – Seus lábios parecem uma fruta madura. Eu acho que vou morder – ele mordeu o lábio inferior dela, com leveza, a fazendo rir.

— Pare de ser galanteador – Ela se afastou do toque dele e se deitou em seu peito. Ele respirava profundamente - E eu existo, Henry, respondendo sua pergunta. Meu medo é que você me imagine como se fosse uma mulher perfeita. Sem rachaduras.

— Bem, eu sei que você não é perfeita. Mas, é perfeita para mim. Se encaixa perfeitamente – ele disse, em uma conotação dúbia.

— Henry, estou falando sério – ela ralhou, mas não conseguiu segurar o riso.

— Eu não disse nada de errado – ele se defendeu – Eu apenas disse que nós dois somos feitos um para o outro, apesar das nossas imperfeições. E você foi feita para mim, sob medida – ele beijou os cabelos dela – Eu amo você.

— Eu também te amo – ela respondeu, o abraçando com força.

Ele acariciou os cabelos dela, respirando ainda com profundidade.

— Você tem cabelos brancos, meu amor – ele disse, tocando o couro cabeludo dela com os dedos – E parece que são vários.

Ela gargalhou.

— Quantos anos tem? É tão jovem já para ter cabelos brancos – ele disse.

— Ah, Henry, eu...- ela ficou com medo de dizer e se ergueu, se apoiando no peito dele – Não ficara bravo comigo se eu disser quantos anos tenho?

— De maneira alguma. Se tiver mais de trinta e três, que é a minha idade, vou pensar que é uma bruxa. Pois, você tem um rosto muito jovem. Talvez, seja. Pois, me enfeitiçou – Ele beijou a ponta do nariz dela – E me enfeitiçou com sua música, Anne. Eu sinto que estamos unidos não só pelo que você é. Eu decidi que teria que fazê-la minha quando a vi tocar aquele piano empoeirado. Eu acho que até Erik se apaixonou por você. Ele não sai da frente do piano mais.

— Então, estamos unidos pela música – ela disse, com um sorriso caloroso – Mas, uma pena eu não ser uma musicista de verdade. Sou bem amadora.

— Podemos resolver isso. Nós contrataremos um professor de música – ele disse, passando o nariz na bochecha dela, em uma caricia. Se sentou na cama levando-a consigo. Ela se sentou nos quadris dele, com uma perna de cada lado, sem se importar com a nudez deles. Ele soltou um silvo – Anne, se mexer mais seus quadris, não vamos sair dessa cama.

Ela riu, maliciosa.

— Minha intenção é não sair – provocou, beijando-o de leve.

Os olhos cinzas dele a fitaram com desejo e ele apertou contra si, a fazendo estremecer.

— Acho que posso me atrasar um pouco – ele disse.

Então ele a beijou.

***

Anne saiu do quarto antes dele, vestida e impecável. Não sem antes ele tentar fazê-la ficar na cama. Ele parecia avido em tê-la em seus braços o tempo todo. E depois, descobriu a idade real dela e que seus cabelos não eram escuros.

— Por Deus Anne – ele dissera, colocando as roupas dele, com pressa – Você tem dezenove anos? Ah, por Deus!

Ele parecia constrangido. E muito desgostoso.

— Por que está irritado? – ela perguntara, sem entender – Eu sei fazer meu trabalho direito, se quer saber. E muitas mulheres se casam na minha idade. Algumas se casam com dezessete anos.

Ele bufara, abotoando a camisa com as mãos tremulas. Ela foi em seu auxílio, abotoando para ele. Henry a fitou com preocupação, raiva e paixão.

— Anne, você é tão jovem. Eu me sinto muito velho para você. Eu acho deplorável homens com o dobro da idade da noiva se casando. Isso é horrível. Eu não quero ser um aproveitador. Me sinto um ancião perto de você.

Ela gargalhou e terminou de abotoar a camisa dele.

— Não é, Henry. Você é perfeitamente adequado e não importa sua idade. Eu te amaria do mesmo jeito.

— E se eu fosse um velho babão? – ele provocara, agarrando-a pela cintura – Iria me amar?

A diversão nos olhos dele a deixara com o coração acelerado. Ela o amava, nunca iria esquecer dele, enquanto respirasse.

— Eu iria cuidar de você e te amar, mas não iria o achar atraente, me desculpe – ela respondera, zombeteira.

— Sua menina perversa – ele dissera, em tom de repreensão, beijando-a no pescoço – Então, acho que vou me valer da sua atração por mim para prender-te em um casamento. O que acha?

Ela despertou dos seus pensamentos, ainda lembrando do que acontecera no quarto, há uma hora, quando a porta da sala de estar foi aberta por Erik. Ela se sentia quente e passou o dedo polegar no pescoço.

— Erik, bom dia – ela disse, com um sorriso – Como está hoje?

— Be..em – ele respondeu, mas seus olhos estavam baixos.

Parecia ter chorado. Ela se levantou e o fitou com mais cuidado. Os olhos estavam vermelhos.

— Querido o que foi? – ela perguntou – Estava chorando?

— Nã...o – ele respondeu, com raiva – Eu...não...choro!

— Ó, parece que você conseguiu falar sem gaguejar dessa vez – ela apontou e cruzou os braços – O que está te deixando irritado?

Ele franziu o cenho, mordendo os lábios e se afastou dela, indo para o piano e abrindo o tampo. Seus dedos pequenos resvalaram as teclas, em um som estridente. Mas, depois, calmo. Era a música que eles estavam treinando. Uma sinfonia de Mozart. Fora difícil para ela conseguir tocar e ele parecia ter muita facilidade, em um mês de treinamento. Aquele menino seria um prodígio, ela sabia disso, só olhando para ele. A coluna reta, os dedos elegantes e longos. Eram mãos pequenas e infantis. Mas, quanto mais ele treinasse, poderia se tornar muito mais quando crescesse. Ela faria com que isso acontecesse.

Aproximou-se cautelosamente e ficou ao seu lado.

— Erik, diga-me o que está acontecendo. Por favor – ela pediu.

Ele parou de tocar e a fitou com raiva.

— Vai...me...abandonar...você...vai...ele...vai...- ele disse, pausadamente, sua voz infantil carregada de raiva e dor.

— Não, nunca vou te abandonar, querido. Que ideia absurda – ela tentou acalmá-lo.

— Vai...como...mamãe...vai...me...mandar...embora...- ele insistiu, com os lábios trêmulos.

— Erik – ela se sentou ao lado dele, segurando a mãozinha dele contra a sua – Jamais faria isso. Você é meu pupilo. E Henry jamais te deixaria sozinho, também. Ele é seu tutor. Eu prometo ficar.

— Promete? – ele pediu, com os olhos grandes e verdes, tão expressivos para uma criança.

— Sim, eu prometo.

Anne não queria prometer, mas não queria magoá-lo. Ela não sabia o que seria dela e de Henry. Não sabia como iria se casar com ele, sem arruiná-lo e com certeza Klyne iria impedi-los. Ele estava com raiva. Apesar de estar quieto, ele jurou que não iria permitir que seu primo fosse enganado. Mas, o tempo passou e ele não se manifestou, nem apareceu na casa de Henry. Talvez, ela pudesse ficar calma.

Depois das aulas da manhã, Anne conseguiu abrir a carta que fora enviada pela senhorita Harrison no dia anterior. Ela perguntava se Anne queria tomar um chá com ela em uma confeitaria na Piccadilly. Na Regent Street. Anne respondeu perguntando se poderiam se encontrar na sexta-feira, quando poderia folgar. E enviou o bilhete pelo Sr. Jones, que iria na direção da editora, para buscar Henry. Logo o Sr. Jones chegou, com Henry e entregou a resposta, na parte da tarde. A senhorita Harrison dizia que iriam se encontrar as duas da tarde. E que tinha ótimas notícias.

Henry ficou parado, olhando para ela com um ar desconfiado.

 - Está recebendo bilhetes? – ele perguntou, mantendo o tom calmo.

Seus olhos azuis acinzentados estavam frios.

— Eu estou. Algum problema? – ela perguntou, guardando o bilhete no bolso do vestido.

— Eu acho que sim – ele disse, com a voz lenta – Mas, não quero conversar com a senhorita aqui na entrada. Vamos até meu escritório.

Ela o seguiu, irritada. Ele não era diferente realmente. Era controlador igual a todos os homens. E ciumento. Ela queria se chutar por confiar nele. Provavelmente estaria gravida dele, pois ele não teve o menor cuidado ao fazer amor com ela. Simplesmente deixou que sua semente estivesse encrustada nela. Estava implícita a mensagem de que ela não escaparia dele, nem que tentasse. Apertou os punhos, respirando fundo. Se ele pensava que iria controlá-la, ele estava muito enganado.

Ela entrou primeiro no escritório. Depois, ele entrou e fechou a porta. Fitou-a longamente, com um ar sério e de repente a puxou, encostando-a na escrivaninha, beijando com ferocidade. Ela sentiu o ar faltar e teve dificuldade de acompanhá-lo. O beijo dele foi se tornando lento, alguns segundos depois e ele separou a boca da dela, encostando sua testa na dele, acariciando seu rosto. Ela ficou perplexa com a atitude dele. Deveria repreendê-lo por beijá-la em um lugar em que alguém poderia entrar e flagrá-los. Mas, não conseguia pensar quando ele a tomava para si daquela maneira.

— Senti sua falta – ele disse, beijando seus lábios – Eu senti que não iria conseguir trabalhar direito hoje. Precisava ver você.

— Eu também senti saudades – ela confessou, com a voz fraca.

— Então, me diga que esse bilhete no seu bolso não é de nenhum pretendente – ele pediu, com a voz tensa. Seu olhar era temeroso – Diga para mim que não é nada.

Pobre Henry. Ele realmente era tão inseguro assim?

— Não, querido. Não é. Veja você mesmo – ela tirou do bolso e deixou que ele lesse.

As linhas de expressão da sua testa suavizaram.

— A filha do editor Harrison está pedindo para tomar um chá com você? – ele perguntou surpreso – E tem novidades? O que as duas estão aprontando?

Seu sorriso era meigo.

— Bom, eu publiquei o livro, Henry – ela confessou.

Ele sorriu largamente, beijando sua boca.

— Meu amor, estou tão feliz – ele disse, a abraçando com força – Eu sabia que você iria me deixar orgulhoso.

— Não está bravo? – ela perguntou – Afinal, eu não deveria publicar livros. Nem pensar.

Ele riu.

— Às favas com o que a sociedade pensa das mulheres. Você escreveu, assim como muitas fizeram. E nunca foram reconhecidas por seus trabalhos. Eu vou apoiá-la, com toda certeza – Ele levantou pela cintura e a depositou e cima da escrivaninha – Agora, onde estávamos mesmo?

— Henry – ela protestou.

Mas, não teve chance, quando ele a fitava com tanta paixão e amor.


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