O Conto do Cão Negro escrita por BlackLupin


Capítulo 6
Capítulo 06: Cabeça de Javali




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O primeiro passeio do ano a Hogsmeade foi marcado por um frio intenso. O ar frio fustigava tanto naquela manhã, que a maioria dos alunos, por já conhecer bem a aldeia, decidiu permanecer no Castelo acolhedor e protegido. Apesar dos arrepios gelados, Sirius resolveu se arriscar pela estrada lavada pela chuva da noite anterior. Enfiado em vários suéteres e protegendo as mãos nos bolsos da calça, ele seguia de cabeça baixa pelo caminho, protegendo-se do vento. Começava a se perguntar se realmente não teria sido melhor ter ficado com os outros, quando trombou com alguém à sua frente que também não parecia estar conseguindo enxergar direito por conta da corrente de ar e de um gorro que lhe obstruía os olhos.

— Por que não olha por onde anda, seu... – Sirius se calou ao reconhecer a figura agasalhada. – Flori?

Não conseguira identificá-la antes porque sua silhueta parecia estranhamente aumentada pela quantidade de casacos que vestia, quase transformando-a numa bolinha. Por algum motivo, lembrou-se de uma toupeira ao vê-la naquele estado.

— Sirius? É você? – Indagou a garota, virando a cabeça de um lado ao outro à sua procura. – Não consigo ver nada acima das pernas das pessoas. Acho que exagerei na quantidade de blusas, porque mal consigo me mexer. – Retrucou.

Ele riu, pois, de fato, Flori estava tão encorpada, que quando andava lembrava um pinguim. Sirius se aproximou e puxou sua touca para cima, liberando seu campo de visão.

— Como sabia que era eu? – Quis saber.

— Reconheci sua voz. – Respondeu ela, tentando dar de ombros, mas sem sucesso. – Está sozinho? – Indagou, notando a ausência de seus companheiros.

— Estou. Os outros estão em detenção. – Explicou. – Pregamos uma peça na gata do Filch e eu fui o único que conseguiu escapar. Achei que a sorte tivesse sorrido para mim, mas com o frio que está fazendo, estou quase desejando que tivesse sido pego também. E você? Por onde anda a Evans?

— Também foi mais esperta do que eu e decidiu ficar no Castelo. – Respondeu Flori, tristemente.

— E por que não quis ficar com ela?

— Bem, eu realmente adoro os passeios a Hogsmeade e nunca perdi um. Não queria quebrar a tradição hoje, embora esteja começando a me arrepender a cada segundo em que permaneço do lado de fora.

— Ora, mas agora que já estamos aqui, não vamos desistir e voltar com o rabinho entre as pernas, certo? – Disse Sirius, de maneira enérgica.

— Não. – Concordou Flori. – Só de pensar em ter que tirar todos esses casacos, já morro de preguiça. – Acrescentou.

— Então que tal continuarmos nosso passeio juntos? – Ofereceu.

— Hã... Claro, por que não? – Acatou a garota.

Os dois se viraram e continuaram pela estrada. Sirius havia entendido o significado por trás de sua leve hesitação. As coisas andavam estranhas entre eles nos últimos tempos; não haviam mais mencionado a conversa que tiveram na enfermaria no ano anterior e resolveram seguir com suas vidas, colocando uma pedra sobre o assunto e fingido que nada daquilo havia acontecido. Porém, mesmo ainda sendo amigos, Sirius havia percebido um resfriamento na maneira calorosa com a qual ela costumava lhe tratar. E ainda que tivessem deixado tudo de lado, sabia que não voltariam a como era antes.

Sirius pensava naquele dia às vezes; especialmente no momento que tiveram no campo, antes do babaca do irmão aparecer e estragar tudo. Eles quase se beijaram e torturava-se ao imaginar como não teria sido se realmente tivesse acontecido. Lembrava-se do namoro efêmero que tiveram no primeiro ano, e mesmo com a pouco experiência que tinha na época, considerava a semana com Flori muito melhor e mais excitante do que as que tivera com outras depois, por isso, nos momentos em que tais pensamentos lhe acometiam, não conseguia deixar de se perguntar como seria agora que estavam mais velhos. Pensava também na conversa na enfermaria. Ao contrário do que demonstrara naquele final de tarde, sabia muito bem o que a garota queria que dissesse e houve um momento em que ele teria dito o porquê de protegê-la tanto, no entanto, no fim não conseguira. Não sabia a razão, mas sua fala travara justamente naquele momento; ele simplesmente não fora capaz de expressar em voz alta o que se passava em sua cabeça. Não sabia por que ela lhe causava aquele efeito, não poderia ser somente porque gostava dela mais do que o normal. Ele não tinha medo de demonstrar quando tinha interesse em alguma garota, então não deveria ser isso. Talvez nunca tivesse uma resposta satisfatória para aquela questão e contentou-se apenas em aproveitar aquele raro momento em que se encontravam a sós.

Durante o percurso até a aldeia os dois conversaram sobre amenidades, sobre como haviam sido as férias escolares – Flori contou que havia viajado para o Egito e narrou histórias impressionantes sobre os bruxos de lá, enquanto Sirius disse que tão logo regressara de Hogwarts, arrumou as malas e partiu para a casa de Tiago -, sobre suas expectativas para o campeonato de quadribol daquele ano onde, pela centésima vez, Sirius indagou se Flori tinha realmente certeza de que não voltaria ao time, e sobre os N.O.M.s que ocorreriam no final daquele período letivo. Flori disse que havia tirado um tempo de suas férias para revisar tudo o que haviam aprendido até agora, enquanto Sirius fazia uma careta divertida, alegando que não se sentia particularmente preocupado com os exames.

— Mas você sabe a importância que eles têm, não? – Indagou a garota. – É através deles que conseguimos escolher uma carreira.

— É claro que sei, mas não estou ligando para isso. – Retrucou Sirius.

— Não está? Ainda não pensou no que vai fazer quando terminar a escola? – Perguntou Flori, com incredulidade.

— Oh, eu sei sim. – Ele sorriu. – Contudo, que eu saiba, não é preciso nove N.O.M.s para lutar contra Voldemort.

Flori fez uma careta ao ouvir aquele nome.

— Eu não sei dizer se você está brincando ou falando sério.

Sirius deu uma risadinha. Os dois haviam finalmente chegado a Hogsmeade e pararam diante da estrada principal, tirando um momento para observar a aldeia varrida pelo vento; não parecia haver vivalma por ali; certamente estavam todos abrigados em algum lugar seco e quente.

— Para onde quer ir? – Sirius se virou para a companheira.

Flori esfregou as mãos e soprou-as antes de responder.

— Um lugar com bastante calor e, de preferência, com algo quente para beber.

— Bem, isso reduz as nossas opções. – Comentou o rapaz. – Temos o Três Vassouras, é claro, e... – Ele ergueu a cabeça e olhou para além da calçada. - ...a Casa de Chá. – Completou.

— Hum... Três Vassouras. – Respondeu Flori, vacilante. – Se nos virem na Madame Puddifoot certamente vão interpretar as coisas de maneira errada.

— Tudo bem. – Concordou Sirius, que já vira aquela casa de chás o bastante para toda a vida.

Eles rumaram rapidamente na direção do Três Vassouras e ao chegarem lá, encontraram o lugar apinhado de gente quase até o teto. Aparentemente, os estudantes que foram corajosos o suficiente para enfrentarem o mau tempo, haviam resolvido aproveitar seu passeio ali dentro, de modo que a elegante Madame Rosmerta mal conseguia caminhar entre as mesas sem esbarrar em alguém.

— E então? – Indagou Sirius. Não parecia haver um único espaço vago ali dentro, nem mesmo no comprido balcão. – Madame Puddifoot? – Ofereceu.

— Não, espera. – Pediu Flori, pensativa. – Tem um outro lugar que não consideramos, um lugar que certamente deve estar vazio.

— E qual seria? – Perguntou curioso, repassando mentalmente todas as lojas da aldeia.

— O Cabeça de Javali. – Respondeu.

— Tem certeza? Lá não é um lugar muito... – Ele se interrompeu, pois achou que a garota não gostaria de ouvir que não achava o lugar muito seguro para ela. - ...frequentável. – Completou.

— Você já foi lá?

— Fui com os outros, há uns dois anos. – Respondeu.

— E como é? – Indagou Flori. Havia uma curiosa ansiedade em sua face.

— Tão estranho e mal-encarado quanto possa imaginar.

— Mas é protegido, não é? Do frio.

— Suponho que sim.

— Ótimo! O que me diz? Vamos até lá?

— Está mesmo com tanta vontade assim de ir a um lugar fedendo a bodes?

— Morrendo de vontade!

Flori agarrou em seu braço e o puxou para fora do Três Vassouras, enquanto Sirius se deixava arrastar com uma expressão admirada no rosto. Ao entrarem no bar depararam-se com o dono carrancudo atrás do balcão. Ele não pareceu feliz com a chegada de dois adolescentes, porém, para o deleite de Flori, não fez qualquer objeção. Ali dentro estava infinitamente mais agradável do que do lado de fora e ainda tinha o bônus de que não havia muitos clientes, de modo que havia lugares de sobra. Os dois ocuparam dois assentos no balcão e Sirius livrou-se imediatamente de sua jaqueta; parecia extremamente quente agora que se via longe do vento. Flori retirou as luvas e espalmou-as no tampo do balcão.

— Eu quero um uísque de fogo. – Ordenou.

Sirius atrapalhou-se com a manga do casaco ao ouvir aquilo.

— O que foi que você disse?

Ela deu uma risadinha.

— Por que o espanto? Sempre quis experimentar.

— Fico me perguntando o que os outros diriam se vissem a garota certinha, pedindo um copo de uísque de fogo no Cabeça de Javali.

— Eles não diriam nada. – Retrucou Flori, com um sorriso de canto. – Porque esqueci a garota certinha no dormitório hoje.

Sirius sentiu uma contração no estômago que não tinha qualquer relação à fome ou ao nervosismo. Ele se virou parou o barman e ergueu dois dedos da mão direita.

— O senhor pode nos trazer dois copos?

 

***

Inacreditavelmente o barman lhes servira os dois copos, e depois outro. E então mais cinco. Sirius já havia experimentado e bebido algumas vezes o uísque de fogo, por isso não foi tão afetado de início, mas mesmo ele começava a se sentir tonto após o sexto copo. Já Flori estava bastante bêbada. Não apenas por sua voz soar muito mais alta do que o habitual e as risadas ecoarem estridentes pelo bar, mas também porque não parava de tocá-lo no braço e no ombro. Uma vez, chegou até mesmo a descansar, por um minuto ou dois, a mão sobre a coxa do rapaz. E, se aquilo não era prova o bastante de sua embriaguez, então o fato de conversar inclinando-se para tão perto que ele podia sentir o perfume de seus cabelos, certamente era indício suficiente.

Mesmo não sendo o mais responsável dentre os garotos de sua idade, Sirius achou que ambos já haviam bebido o bastante, por isso resolveu entretê-la com histórias a respeito de suas confusões com os Marotos e desviar sua atenção da garrafa de uísque de fogo. Em certo momento, ao olhar de relance pelas janelas, notou que o sol parecia ter finalmente saído e decidiu convidá-la para uma volta do lado de fora, acreditando que um pouco de ar fresco faria bem para sua ebriedade. Flori assentiu docilmente e o acompanhou trôpega para fora do bar.

Sirius ofereceu seu braço como apoio, no entanto, o uísque certamente era ótimo contra a timidez, pois Flori rejeitou seu braço com um gesto displicente e lançou-se ao seu pescoço, abraçando-o e colando o rosto contra o dele. Ele gostou daquela súbita proximidade e resolveu envolvê-la pela cintura com um abraço.

Assim fizeram o seu passeio, como um casal de bêbados apaixonados, cambaleando pelas ruas secundárias de Hogsmeade, escondidos das vistas de curiosos. Não conversaram muito durante o trajeto e puseram-se a apenas apreciar a companhia um do outro em silêncio, usando-se como apoio. Não sabiam para onde estavam indo, mas era como se suas pernas soubessem e quando perceberam, estavam parados diante da Casa dos Gritos. Flori se soltou dele e pôs-se a observar a casa com os olhos arregalados e a boca entreaberta.

— Esse lugar é tão fascinante. – Murmurou ela. – Até hoje nunca ouvi os gritos. E você? – Indagou, virando-se na direção dele.

— Não. – Respondeu.

— Às vezes, acho que essa história de casa assombrada é pura invenção das pessoas. – Comentou. Flori soltou uma exclamação entusiasmada. – O que você acha de entrarmos aí e darmos uma olhada? – Perguntou ansiosa.

— Hum... é melhor não, Flori. Se as histórias existem é por uma razão. – Desconversou ele, que conhecia muito bem a verdade por trás daquelas histórias. – Venha. – Chamou. – Vamos nos sentar ali.

Ele indicou um tronco caído em frente ao portão que cercava a casa. Flori lançou um último olhar desejoso para o lugar e foi se sentar ao lado de Sirius. Sem cerimônia, a garota deitou a cabeça em seu ombro e soltou um suspiro.

— Você está bem? – Indagou Sirius, observando-a preocupado.

Ela assentiu.

— Sim, só estou me sentindo um pouco tonta.

— Você quer voltar para o Castelo? – Perguntou.

— Não. Aqui está bom. – Respondeu.

Eles tornaram a ficar quietos e durante esse momento Sirius parou para apreciar a proximidade de seus corpos e a respiração de Flori em sua nuca, que lhe causava arrepios. Pensou que a garota havia cochilado em seu ombro quando a ouviu chamá-lo:

— Sirius... – Ele virou a cabeça para ela. – Acho que deveríamos fazer isso mais vezes.

— O quê? Nos embebedarmos? – Brincou.

— Ficarmos juntos. – Respondeu. – É tão bom... Por que não fazemos isso mais vezes?

— Eu... eu não sei. – Respondeu ele, sentindo a voz falhar. Ele pigarreou.

— Quando foi à última vez que ficamos assim? – Indagou Flori, mas era como se ela estivesse fazendo a pergunta para si mesma.

— No primeiro ano. – Sirius respondeu de modo automático. – Quando...

Ele se interrompeu quando Flori ergueu a cabeça e o encarou. Seus olhos brilhavam intensamente, lembrando-o, mais do que nunca, dois rubis. Ele adorava aquela cor. Quando suas brincadeiras saíam do controle e era chamado ao escritório do Diretor, sempre desviava sua atenção dos conselhos do professor Dumbledore e passava a olhar para a espada de Griffyndor atrás dele, olhando-a desejoso quando o objeto refulgia para ele tal qual os olhos dela faziam naquele momento.

Não sabia se havia sido efeito dos inúmeros copos de uísque de fogo ou se partira dela mesma, mas enquanto olhava estupidamente para os olhos de Flori, foi arrebatado por um inesperado e avassalador beijo.

Ele tirou apenas um momento para ficar surpreso e então passou a retribuí-la com vigor, e foi sorte estarem sentados, pois passou a se reclinar sobre ela com ânsia, como se quisesse recuperar os últimos anos com um único beijo. Ambos se abraçaram e permaneceram colados como polvos, agarrados um ao outro como se dependessem disso para respirar.

Encontravam-se daquela forma por algum tempo – alguns pedaços dele desejavam por movimentos mais abrangentes e o rapaz estava dando tudo de si para controlar-se não ceder a eles -, até que Flori quebrou o deleitável contato e abandonou seus lábios. Seus olhos eram duas fendas e sua mão ergueu-se e alcançou a bochecha dele.

— Sirius... – Sussurrou. – Eu acho que não estou me sentindo bem.

Antes que pudesse registrar tais palavras, a garota desmaiou em seus braços.

 

***

Flori acordou sentindo um calorzinho agradável por todo o corpo e concluiu que estava tampada com alguns cobertores. Sua cabeça latejava profusamente, enquanto seu estômago doía de fome. Ela abriu os olhos e viu-se em uma cama de dossel e, embora as cortinas fossem vermelhas como as suas, soube imediatamente que não estava em seu dormitório, pois aquelas não eram as suas cobertas e os travesseiros eram mais duros do que os seus. Em pânico, ela se ergueu e só então percebeu que dividia a cama com alguém.

— Você acordou. Que bom! – Constatou Sirius, com um sorriso aliviado.

— Que lugar é esse? Como eu vim parar aqui? – Exclamou. Flori sentiu a cabeça protestar contra seus gritos e levou a mão até a testa. Ao erguer o braço, percebeu que usava somente uma blusa fina, a qual vestira naquela manhã. – Onde estão minhas roupas?? E por que diabos estamos dividindo uma cama?!

— Shh! – Pediu Sirius, levando o indicador ao lábio. – Se nos ouvirem, estaremos numa séria enrascada e teremos muita sorte se formos apenas expulsos!

— É o seu quarto? – Assustou-se a garota, levando as mãos à boca.

— Meu e dos outros. – Corrigiu.

— Mas...?

Ele ergueu as mãos, pedindo calma.

— Prometo lhe explicar tudo, mas, por favor, não grite. É sério, se alguém descobrir...

Embora se sentisse confusa e assustada, Flori assentiu. Quando sentiu que era seguro falar novamente, Sirius continuou:

— Você se lembra do que aconteceu? – Perguntou.

— Lembro que estávamos no Cabeça de Javali e depois saímos para um passeio. – Narrou, forçando a memória. – Paramos para descansar na frente da Casa dos Gritos e... – Ela o olhou e corou violentamente.

— Nos beijamos. – Completou Sirius, pacientemente. – E então você desmaiou.

— E o que aconteceu depois? – Perguntou, cada vez mais aflita.

— Bom, tentei não tomar aquilo como uma ofensa e... usando alguns meios não tão convencionais, consegui trazê-la de volta ao Castelo sem que ninguém nos visse.

— O que quer dizer com “meios não tão convencionais”? – Interpelou a garota, com desconfiança.

— Sinto muito, mas isso é entre mim e os Marotos. – Decretou. – Mas não se preocupe, não foi nada ilegal. – Acrescentou.

— Muito bem, se você diz... mas se conseguiu chegar até a nossa Sala Comunal sem ser interrompido, por que me trouxe para o seu dormitório?

— Porque, espertinha, não sei se você sabe, mas se algum garoto tenta subir até o dormitório de vocês, acaba acionando as defesas do Castelo e transformando tudo num escorrega. – Explicou. – E achei que você também fosse querer evitar os olhares de reprovação de Madame Pomfrey se acordasse na enfermaria e soubesse que ficou bêbada.

— Bem...

— Olha, Flori... Entendo que possa ter passado a ideia errada ter te trazido até aqui, mas não poderia deixá-la sozinha naquele estado. Eu poderia ter pedido ajuda a um dos professores, mas seria o mesmo caso da Madame Pomfrey, além do mais, com certeza não deve ser permitido que estudantes bebam uísque de fogo.

Ela baixou os olhos.

— Desculpe, Sirius. – Murmurou. – Obrigada por ter feito isso por mim. – Ela ergueu a cabeça novamente.

— Não há nada que... – O rapaz tossiu. – Respondendo à sua terceira pergunta, tirei um pouco de seus casacos porque você começou a suar. Eles estão embaixo da minha cama. – Completou. – E quanto à última questão, bem, achei que poderia parecer suspeito se um dos outros subisse até o dormitório e me visse sentado ao lado de minha própria cama e as cortinas estivessem cerradas. – Explicou. – Mas, afinal de contas, é tão ruim assim a ideia de dividir uma cama comigo? – Acrescentou Sirius, com um sorriso malicioso.

Flori bufou e revirou os olhos.

— Eu agradeço do fundo do coração por ter cuidado de mim em meu estado de bebedeira, mas agora que estou fora de perigo é melhor eu ir, antes que algum de seus amigos ou outra pessoa nos pegue aqui.

Ela fez menção de sair, mas Sirius a deteve.

— Espere. Não vá ainda. – Pediu. – Eu... tem algo que gostaria de falar com você.

Embora soubesse que perdia segundos preciosos ali, Flori não se mexeu.

— O que foi?

— Eu sei que não é o momento certo, mas acredito que o momento certo não existe. Eu deveria ter lhe dito antes, mas tenho sido um covarde com você nesses últimos tempos.

— Dizer o quê? – Sua voz não era mais do que um sussurro.

— Que eu sou louco por você desde o meu primeiro ano. – Confessou.

A garota arquejou.

— Que... que brincadeira é essa, Black?

Ele sacudiu a cabeça e sorriu, recordando-se de ambos na sala de troféus.

— Nunca falei tão sério em minha vida. – Garantiu. – Estou cansado de fingir que me contento em sermos somente amigos. Quero que volte a ser minha namorada. Desta vez pra valer.

Aquela ordem implícita fez seu sangue ferver e, por um momento, considerou seriamente em lhe dar um tabefe para colocar suas ideias no lugar. Contudo, podia perceber que seu desejo era sincero e, recriminando-se por dentro, seu ressentimento sumiu e ela assentiu lentamente.

— Tudo bem. – Concordou. – Faremos as coisas diferentes desta vez. – Afirmou.

Um sorriso surgiu na face de Sirius e era ele quem a beijava agora. Eles voltaram a se abraçar como antes, porém, dessa vez como não havia nenhum tronco em seu caminho, Sirius inclinou-a sobre o colchão e deitou-se sobre ela. Aquela intimidade repentina a sobressaltou, enquanto um sentimento abrasador a envolveu. Mesmo que soubesse o quanto aquilo era errado e, que se os descobrissem ali, teriam sorte se fossem somente expulsos, como ele mesmo dissera, não se sentia tentada a parar. Na verdade, ansiava por mais, por isso passou a abraçá-lo e apertá-lo com força, ao mesmo tempo em que os beijos tornavam-se cada vez mais intensos.

Sirius ergueu-se de repente, arfando, e por um segundo acreditou que as coisas acabariam por ali, contudo, seu desânimo foi momentâneo; ele apenas parecia recuperar o fôlego. Quando sua respiração voltou ao normal, suas mãos desceram até a barra da camisa e ele a arrancou fora. Novamente a sensação de que o que faziam era condenável invadiu Flori. As coisas estavam subindo de nível muito rápido e sabia que deveria pará-las enquanto ainda era tempo, mas... Ele era tão bonito.

Ignorando seu bom-senso pela primeira vez em anos, Flori segurou em seus ombros e o puxou de volta, enquanto retomavam de onde haviam parado. Agora as mãos dele passeavam por seu corpo e tentavam encontrar caminho por baixo da blusa fina. Quando abriu passagem, seus dedos escalaram até o torso, enquanto ele a soltava novamente, mas, desta vez, descia até sua garganta e pressionava o seu ventre contra o dela.

A garota achou que estava prestes a se romper quando ouviram o som aterrorizante de dobradiças rangendo. O casal se largou imediatamente e olhou-se em pânico. Ouviram vozes aborrecidas e Sirius fez sinal para que ela o esperasse ali. Saiu da cama e fechou bem as cortinas, enquanto Flori escondia-se embaixo das cobertas e tentava não morrer de vergonha.

— Já estão de volta? – Ela ouviu Sirius perguntando.

— É, cara, já é quase hora do jantar. – Respondeu a voz arrogante de Tiago. – Por que você está sem camisa, Almofadinhas? – Indagou, aparentando desconfiança.

— Voltei do passeio agora há pouco e topei com o Pirraça distribuindo balões d’água na porta de entrada. – Mentiu. Flori se surpreendeu com a capacidade de improvisação do rapaz.

— Ele anda bastante atacado ultimamente. – Ouviu a voz de Remo murmurar. – Ouvi duas garotas do segundo ano reclamando ontem, que ele queria obrigá-las a enfiar aranhas dentro das calças se quisessem passar pelo corredor do segundo andar.

Flori fez uma careta de horror ao imaginar a cena.

— E ele não foi sempre? – Retrucou Sirius.

— Será que vocês podem deixar o bate-papo pra depois? – Indagou a voz aborrecida de Pedro. – Eu mal pude almoçar por causa da maldita detenção daquele aborto nojento e estou faminto!

Ela ouviu um suspiro de tédio.

— É melhor irmos logo antes que Rabicho nos devore. – Assinalou Tiago.

— Vão vocês três na frente, só vou me trocar. – Avisou Sirius.

Os outros despediram-se e após a porta se fechar, Flori ouviu a cortinas da cama sendo arrastadas e uma gargalhada.

— Onde você se meteu, minha toupeira?

Ela atirou as cobertas para o lado, respirando ruidosamente.

— Graças a Merlin, essa foi por pouco!

— Muito pouco. – Concordou. Ele observou Flori saltar da cama e aproveitou para abraçá-la pela cintura e trazê-la para perto. – Precisamos fazer isso de novo. – Ele a ergueu e encaminhou-se até a porta do dormitório.

— Você perdeu o juízo. – Observou Flori, tentando não se deixar abalar pelo fato de abraçá-lo seminu.

— Você ainda não viu nada, toupeirinha. – Provocou.

— E você é um... um... cachorro louco. – Balbuciou.

Aquilo pareceu diverti-lo muito, pois Sirius riu ainda mais. Ele a soltou e espiou pela porta entreaberta.

— A barra tá limpa. – Anunciou.

Flori despediu-se com um rápido beijo e correu para fora do dormitório dos garotos. Felizmente, não encontrou ninguém na Sala Comunal naquele horário; provavelmente todos já haviam se dirigido até o Salão Principal.  Resolveu se trocar depois e desceu para o jantar e, apesar de seu coração ainda bater acelerado com a adrenalina de quase terem sido pegos, ela sorria bobamente quando se juntou às amigas na mesa das refeições.


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