Jane Austen disse... escrita por Larissa Vitória


Capítulo 2
2. Os belos olhos dela


Notas iniciais do capítulo

Planejava postar de novo apenas no sábado, mas estava tão animada para escrever que esse capítulo saiu rapidinho.

Ah, um recado: dessa vez o ponto de vista é da Hermione. Espero que gostem!



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Harry e Rony estavam atrasados. Como sempre, aliás… mas isso não diminuía a irritação de Hermione. Mais cedo, ela havia convocado os dois melhores amigos para um encontro na biblioteca após a última aula do dia para montar um cronograma completo de estudos para eles.

 

O dela já estava pronto desde o início das férias de verão, é claro. E, por mais que estivesse adiantada em todas as matérias, Hermione tremia só de pensar em perder um minuto sequer de estudo.

 

Já no caso de Harry e Rony a história era bem diferente. Indignada com o desleixo dos dois, ela estava decidida a forçá-los a encarar com seriedade a preparação para o vestibular. Ambos queriam seguir carreira como investigadores criminais e a faculdade de direito era o melhor caminho. Hermione não deixaria ninguém atrapalhar esse objetivo, nem mesmo a preguiça dos dois.

 

Por isso veio direto da aula para a biblioteca esperar a dupla, que participava de uma conversa com o time de futebol. Enquanto aguardava, a garota aproveitou para revisitar algumas leituras, especialmente as da última aula. Estava concentrada nos primeiros capítulos de Quincas Borba — que ela já havia lido durante as férias, assim que saiu a lista do vestibular — quando percebeu que Harry e Rony já demoravam mais que o prometido.

 

“Serão só 15 minutos, Hermione, nós juramos… humpf, não sei como ainda acredito neles”, pensava ela contrariada, enquanto encarava a porta como se a força de sua irritação pudesse fazer com os dois amigos se materializassem bem ali na sua frente.

 

E foi justamente esse pensamento que Draco Malfoy interrompeu com sua provocação, fazendo com que Hermione saltasse da cadeira ao ouvir sua voz tão perto dela. 

 

— Esperando o seu Mr. Darcy, senhorita Granger?

 

Tentando recuperar o fôlego — e sua presença de espírito — Hermione levou alguns segundos para registrar que era seu novo professor de literatura o responsável pelo susto que quase lhe provocou um infarto.

 — Quando se apresentou, esqueceu-se de mencionar que aproximações sorrateiras também eram uma de suas características, professor Malfoy  — respondeu ela, ainda com a mão no peito e mirando os olhos sobre os quais ouviu elogios durante todo o dia.

 

 — Me desculpe, vi que estava distraída e não pude perder a oportunidade. Mas não imaginei que o susto seria tão grande.

 

 — Tudo bem, já estou recuperada  — ela pausou por um momento antes de voltar a falar  — e, respondendo a sua pergunta, estou esperando apenas os meus colegas irresponsáveis. Nada de Mr. Darcy para mim, afinal não sou nenhuma Elizabeth.

 

 — O que te faz pensar assim?

 

 — A não ser pela parte que também sou tolerável, mas não é bonita o bastante tentá-los, os potenciais Mr. Darcy parecem me achar mais do tipo Mary Bennet  — explicou ela com um ar conformado, relembrando a descrição da terceira irmã de Orgulho e Preconceito. “Embora a vaidade lhe tivesse dado perseverança, dera-lhe igualmente um ar pedante e maneiras convencidas, coisas suficientes para obscurecer triunfos maiores do que aqueles que era capaz de alcançar”.

 

De volta à realidade, Hermione estranhou um pouco a curiosidade de Draco. Estava acostumada a conversar com professores fora das aulas, mas nunca sobre assuntos tão pessoais quanto interesses românticos. 

 

A curiosidade virou surpresa com a frase que ouviu em seguida:

 

 — Bem, você certamente tem o belo par de olhos admirados pelo cavalheiro em questão  — disse ele, dando meia-volta logo em seguida e saindo da biblioteca.

 

Pega desprevenida pelo elogio do jovem professor, Hermione agradeceu aos céus por ele ter se afastado rapidamente, pois não conseguiu conter a vermelhidão que incendiou sua face.

 

Cumprimentos a sua inteligência, frequente como eram, já não tinham mais esse efeito sobre ela. Mas o tópico da aparência estava completamente fora de seu costume. Nem conseguia lembrar-se da última vez em que seus atributos físicos foram elogiados.

 

Talvez no último baile de formatura, quando acompanhou Viktor Krum, um intercambista que era apaixonado por ela (e levemente correspondido). Naquela noite ela se esforçou para domar os cachos, maquiou-se à moda das garotas populares e usou um vestido deslumbrante.

 

Terminou a noite nos degraus da entrada do Grande Salão. A notícia de que Viktor voltaria para a Bulgária na próxima semana despejou um balde de água fria em seu espírito que apagou todos os olhares e elogios recebidos mais cedo.

 

As divagações de Hermione foram novamente interrompidas, mas dessa vez os responsáveis foram seus dois amigos atrasados.

 

 — Mione, por favor não nos mate. Você sabe como o Olívio fica todo início de temp…  — Rony, que já chegou se justificando, parou de falar ao notar o olhar perdido e as bochechas coradas da garota  — o que aconteceu pra te deixar vermelha assim?

 

 — Estou vermelha de raiva com a falta de consideração de vocês! Eu não sei porque ainda tento fazer os dois levarem a escola a sério!  — esbravejou ela, na esperança de disfarçar que o rubor na verdade era fruto dos elogios de um certo professor.

 

 — Calma, Mione, também não é pra tanto. Ainda estamos no primeiro dia de aula  — apontou Harry em um tom conciliador, mas logo se arrependeu de suas palavras ao ver que elas enfureceram ainda mais a amiga.

 

— Eu desisto, desisto por hoje! — repetiu ela reunindo seus livros e cadernos e batendo em retirada da biblioteca.

 

Rony fez um sinal para Harry enquanto observava Hermione deixar o ambiente ainda pisando duro.

 

— Que bicho será que mordeu ela hoje? 

 

 

—_____________________________________________________

 

Mais tarde, no silêncio de seu dormitório, Hermione sentiu-se um pouco culpada por explodir com os amigos e decidiu pedir desculpas no dia seguinte. O atraso nem havia sido tão grande para os padrões Harry-Ronísticos, mas eles deram o azar de encontrá-la em um momento delicado, por falta de palavras melhores para descrever seus sentimentos.

 

E, inevitavelmente, seus pensamentos caminharam na direção do responsável pela confusão. Assim como toda a população feminina de Hogwarts, ela não pode evitar reparar na beleza do novo professor. Acostumada com mestres bem mais velhos e sisudos, a juventude e o temperamento do professor a pegaram de surpresa.

 

“Os olhos azuis-acinzentados também”, admitiu para si mesma em pensamentos. Mas, até aí não havia nada demais: alunas apaixonadas professores não eram uma novidade para ninguém. Estranho mesmo era quando as estudantes eram correspondidas.

 

Só de relembrar a breve conversa e o elogio de Draco suas bochechas voltaram a tingir-se de vermelho. Sem conseguir conter o impulso, Hermione alcançou na pequena estante do quarto compartilhado sua cópia de Orgulho e Preconceito e buscou o trecho referenciado por ele, uma conversa entre Mr. Darcy e Miss Bingley, sua impertinente admiradora.

 

— O senhor está pensando como seria insuportável passar muitas noites deste modo, numa sociedade como esta. Aliás, estou de acordo com o senhor. Nunca me aborreci tanto! A insipidez, apesar deste barulho, a futilidade, apesar do ar de importância de toda esta gente. O que eu não daria para ouvi-lo falar com severidade…

 

— Asseguro-lhe que a sua conjetura é inteiramente falsa. Estava pensando em coisas muito mais agradáveis. Estive meditando no prazer que nos pode dar um par de belos olhos no rosto bonito de uma mulher.

 

Miss Bingley imediatamente fixou o seu olhar no rosto de Mr. Darcy, e exprimiu o desejo de que ele dissesse o nome da senhora que lhe inspirara tais reflexões.

 

Mr. Darcy respondeu intrepidamente:

 

— Miss Elizabeth Bennet.

 

E o resto era história: a partir dali a queda do cavalheiro pelos belos olhos da dama transformou-se em paixão, amor e, por fim, um dos casamentos mais celebrados da literatura.

 

Chega disso, já estou exagerando a situação. Não estou apaixonada e nem sendo correspondida, foi apenas um elogio — exclamou Hermione em voz alta, aproveitando que suas colegas de quarto ainda estavam fora.

 

Contando com a ajuda de seu cérebro racional para tranquilizar-se e acalmar o rubor na face, a garota decidiu que, no fim das contas, não havia acontecido nada demais. O melhor a fazer era parar de pensar no assunto e tratar o professor como todos os outros nas aulas seguintes.

 

 

—_____________________________________________________

 

Hermione estava sendo bem-sucedida em sua missão, o elogio não veio à mente em nenhuma das aulas da manhã. Até que, perto da hora do almoço, um novo encontro com Draco Malfoy voltou a deixá-la desconcertada.

 

Aconteceu durante a aula de Educação Física. Com sua total falta de coordenação para esportes, essa era a única matéria em que Hermione não era a melhor da classe. Madame Hooch não tinha paciência para o jeito desengonçado da garota e ficava mais do que contente em deixá-la auxiliar em aspectos mais “administrativos” da aula  — ou seja, carregar os materiais e manter a contagem dos pontos em jogos.

 

A exceção era o primeiro encontro do ano, onde todos os alunos passavam por uma avaliação física que incluía corridas, saltos, alongamentos, abdominais e outros exercícios odiados por Hermione.

 

Depois de sua quinta volta ao redor da quadra, a corrida levou a melhor sobre a garota, Ofegante como nunca, ela pediu licença à professora para uma ida ao banheiro. Relutante, Madame Hooch liberou Hermione, mas pediu que ela se apressasse e voltasse logo para o restante dos exercícios.

 

A distância entre as quadras e o banheiro não era longa, mas Hermione caminhou o mais devagar possível na esperança de perder ao menos o início dos abdominais. Na volta, enquanto passava pela horta dos alunos e admirava o verde vivo dos alfaces, viu Draco Malfoy aproximando-se.

 

— Bom dia, professor! Perdido por aqui?

 

— Bom dia, senhorita Granger. Não, estou aproveitando um espaço na grade para conhecer melhor os terrenos da escola. E você, estava fugindo de alguém?

 

— Não, dei uma breve pausa na aula de Educação Física, mas já estou voltando para lá.

 

— Ah, isso explica o seu estado atual — disse ele soltando um risinho.

 

Hermione sabia que realmente não deveria estar muito apresentável agora, mas não deixou de ficar irritada com a observação impertinente.

 

— Experimente correr sem parar debaixo desse sol para ver se o senhor também não perde a compostura — rebateu.

 

A resposta rabugenta pareceu divertir ainda mais o professor. Em um tom apaziguador, ele disse as palavras que ficariam na cabeça de Hermione pelo restante do dia.

 

— Pelo menos pude comprovar que Mr. Darcy estava certo ao dizer que o exercício traz belas cores ao rosto de uma moça e deixa os olhos ainda mais brilhantes.


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Notas finais do capítulo

Fazendo jus ao nome da história, tivemos mais algumas citações de Jane Austen. Para quem quiser reler, elas estão no sexto capítulo de Orgulho e Preconceito.

E aí, o que estão achando da história? Sei que o ritmo foi um pouco devagar até agora, mas, com os personagens devidamente apresentados, já podemos acelerar um pouco nos próximos capítulos!



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