Um Reino de Monstros Vol. 1 escrita por Caliel Alves
Saragat e Clapeyron andavam pelos corredores subterrâneos de Flande. O velho tinha um lampião na mão, o conjurador caminhava com total ar de despreocupação.
Metros e mais metros eram vencidos com um monólogo de Clapeyron. Saragat dava respostas vagas e observações lacônicas. Os pensamentos do mascarado estavam voltados todo que exclusivamente para Tell.
— Mestre Clapeyron, o senhor faz parte da mais curiosa ordem militar de Lashra, vocês são cavaleiros que não usam armaduras!?
Clapeyron sorriu com a pergunta, e de modo ainda mais irônico, respondeu:
— Quem precisa de proteção são os nossos inimigos.
Saragat achou aquilo o cúmulo da autoconfiança. Mas não acreditava que havia algum tipo de proibição acerca do uso de armaduras. Eles realmente preferiam o combate livre e honesto. Com o pouco que vira, já admirava as habilidades de esgrima flandina.
Clapeyron se virou enquanto andava. Saragat viu os seus dentes brilharem na escuridão. Seu rosto expressava especulação, e quando a pergunta veio, abalou o conjurador.
— Agora ainda mais curioso, Saragat, e isso não passou despercebido a um homem fervoroso como eu, os conjuradores de Nalab não costumam ser mulheres? Talvez isso tenha passado desapercebido aos que já perderam sua fé nos Deuses Virtuosos e aos jovens que não conheceram os ritos religiosos como eu, mas é realmente curioso, não?
— É uma longa história.
Tudo bem, Saragat, todos nós temos nossos segredos escondidos.
À frente deles, uma luz cortou a escuridão como se fosse um raio. A entrada ficava há alguns metros. Eles correram velozmente.
Eles podem estar sendo atacados, droga, logo aqui!
Clapeyron estava preocupado, a sua maior angústia nos dias de guerra era perder as pessoas que amava uma a uma. Já perdera um filho e não admitia perder outro.
Quando o mestre de armas e o conjurador saíram entrada à fora, o cenário era o mesmo de um campo de batalha. Crateras e árvores ressequidas estavam tombadas no chão.
Se aquele local ficasse próximo de Flande, provavelmente já teriam sido atacados pelos agentes da Horda. A tensão continuou, pois, uma coluna de poeira ascendeu aos céus.
De costas para eles, estava Dumas. Tell aos olhos de Saragat e Clapeyron, havia sido atacado. Eles se adiantaram e chegaram até o jovem espadachim de olhos esbugalhados.
— O que foi Dumas, foram atacados?
— Vimos o feixe de luz, quem fez isso?
— Foi o Tell.
Quando a coluna de poeira baixou, o garoto estava de pé com a espada erguida. Ele se virou e dezenas de árvores foram derrubadas. Uma ranhura vertical de mais de três metros fendia o solo limoso em duas partes iguais. Index sobrevoava a cratera.
— Novo recorde, Tell.
Index com as suas patinhas, fez um sinal de “ok” e voltou a voar para perto dele. O garoto mostrou um sorriso contente no seu rosto sujo e suado. Pôs a espada nos ombros e deu um legal com a mão esquerda. Mas aos poucos, o seu corpo foi tombando.
A espada caiu de seu ombro, o guardião ainda tentou impedir a queda, mas o garoto veio a cair no chão desacordado. Dumas e os outros dois foram até lá ajudá-lo.
Dumas tomou Tell em seus braços e deu leves batidinhas em seu rosto.
— Tell, acorde! Vamos lá, você conseguiu, não é hora de desmaiar.
— Vocês exigiram muito dele, sabia? Ele é só uma criança.
— Ele não é apenas uma criança, é especial, afinal de contas, é um Lisliboux. Essa família provou ao longo da história que com esforço e dedicação nós podemos deixar um legado não importando se nossa origem é humilde.
Saragat olhou para Clapeyron e depois para a cratera. Aos olhos do conjurador, era difícil acreditar que o Lisliboux teria feito aquilo com poucas horas de treino, havia algo a mais. Ele virou-se para Dumas que, ergueu Tell nos ombros e o carregou em direção à entrada do refúgio. Clapeyron, Saragat e Index seguiram-no.
— Como um jovem com um dia de treino consegue realizar uma técnica avançada de esgrima e ainda aplicar um efeito tão poderoso no golpe, cabelo de macarrão?
— Meu nome não é “cabelo de macarrão”, seu mascarado leviano. E isso só é possível porque eu o treinei! Hahaha.
Tirou todo o mérito do garoto, seu esnobe.
— Ainda assim, era uma espada muito pesada para ele, uma lâmina de ferro...
— Ferro não, chumbo.
Clapeyron falou aquilo como se fosse à coisa mais normal do mundo se empunhar uma lâmina de chumbo. Saragat estacou de repente.
Eles haviam dado uma lâmina daquela para que o garoto treinasse, e ainda assim ele conseguira empunhá-la e golpear!
O conjurador começou a refletir sobre o que Nalab tinha lhe dito na noite de sua fuga.
— Sei como você se sente, Saragat. Um garoto tão franzino levaria muito tempo para erguer àquela espada bastarda. O nosso objetivo não era ensinar uma grande técnica a ele, os nossos jovens demoram anos até que se consiga fazer algum movimento digno na esgrima flandina. Se a sua velocidade aumentasse, ao menos, estaríamos felizes com esse processo. Pois bem, adaptamos uma das minhas técnicas, ou melhor, fundimos uma técnica de esgrima e uma magia arcana de Tell.
Dumas então explicou o complexo processo de treinamento ao qual tinha submetido o seu aluno. Tell usou de muito esforço no treinamento, usara energia física e mágica exaustivamente para conseguir um bom resultado.
Tell concentrava a sua energia nas mãos, o que tornava a espada mais leve, e logo após, a redirecionava para a espada. Entretanto, o processo demorava um pouco até que estivesse completo. O fato da concentração de energia mágica nas mãos diminuir o peso da lâmina foi um alívio, e de certa forma foi pulada uma etapa.
Agora os treinos se concentrariam em aumentar a velocidade e aplicar a força corretamente. Mas isso seria feito pela manhã, agora só lhes restava uma noite de sono.
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