More Than Words escrita por Siaht


Capítulo 1
U: muito Charlie!


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas lindas!!!
Tudo bem com vocês?
Bom, mais um dia de Pride e aqui estou com mais uma fanfic. Amei escrever sobre o Charlie no Pride do ano passado e desde então tenho sentido vontade de escrever um pouco mais sobre o personagem. "More Than Words" surgiu desse desejo. É mais ou menos uma continuação de "Essa (Também) é Uma História de Amor", mas você pode lê-la isoladamente.
AVISO: logo no comecinho da história o Charlie está refletindo sobre comentários acefóbicos e arofóbicos que já ouviu.
Enfim, espero que gostem! ♥



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{more than words} 

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(de indefinido)

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Charlie Weasley sempre fora muito… Charlie. Talvez isso soe um tanto vago e, de fato, era. Mas também fazia algum sentido, se você estivesse familiarizado com o rapaz. O fato era que não havia nenhuma outra palavra capaz de defini-lo. Ou, pelo menos, nenhuma que estivesse ao alcance do vocabulário daqueles que o amavam (mesmo que nem sempre fossem bons nisso). Charlie era apenas… Charlie. Uma afirmação que costumava ser acompanhada por um sorriso condescendente ou um suspiro cansado. 

Charlie que nunca havia trazido uma garota para casa. Charlie que nunca havia trazido um garoto para casa. Charlie que disfarçava pifiamente seu desconforto, quando uma conversa sobre sexo se iniciava. Charlie que se sentia lisonjeado, mas que não estava interessado, passar bem, muito obrigado. Charlie que estava cuidando de dragões, enquanto seus irmãos estavam fazendo bebês.  Charlie que conhecia todas as primas de Fleur, todas as irmãs de Audrey, todas as amigas de Angelina. E também todos os primos, irmãos e amigos. Charlie que ainda não havia se casado. Charlie que achava que era bom demais para os meros mortais (isso não era verdade). Charlie que morreria sozinho, se continuasse daquela forma (isso também não era verdade). Charlie que simplesmente era muito… Charlie. O que sempre soava como uma sugestão sutil para que ele fosse menos… Charlie.

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A

(de assexual e arromântico)

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Charlie Weasley tinha 45 anos quando ouviu as palavras “assexual” e “arromântico” pela primeira vez. Uma cortesia de sua sobrinha de 15 anos, Dominique. Ela/ dela, lésbica e orgulhosa, presidente e fundadora da ADEQ – Associação de Estudantes Queer – de Hogwarts. Eram apenas duas palavras, mas, de repente, sua vida inteira ganhara novas cores. Seu mundo invertera o eixo de rotação. Ele fizera sentido.

Porque o homem passara todo aquele tempo se achando muito... Charlie. Não havia nenhuma outra forma de defini-lo. Ao menos, nenhuma que coubesse em seu vocabulário. Ele simplesmente sabia que era diferente daqueles que conhecia. Sua história inteira havia lhe evidenciado tal fato. Por um longo período, aquilo o incomodara. Ninguém gostava de se sentir desajustado, afinal. 

Além disso, as pessoas ao seu redor, consciente ou inconscientemente, estavam constantemente o fazendo se sentir errado, estranho, quebrado. Como se o fato dele não sentir atração romântica ou sexual fizesse dele… menos. Alguém que precisava de conserto. O próprio Charlie chegara a pensar assim. Passara anos tentando emular o comportamento padrão. Se expondo a situações que não faziam nada além de violentá-lo.

O tempo, no entanto, colocou tudo em perspectiva, fez as feridas curarem e ensinou ao Weasley que ele não deveria ser nada além de si mesmo. Mas ainda faltava alguma coisa. Algo que, poucos dias após o natal, Dominique lhe dera. E aquele fora o melhor presente que ele recebera na vida. 

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P

(de palavras)

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Charlie Weasley não havia entendido, até aquele momento, como não ter as palavras certas para se referir a si mesmo poderia ser violento. Durante todos aqueles anos, ele se sentira um estranho. Um “outro”. Mas não mais. Agora ele entendia quem era. Mais do que isso, agora ele sabia que não havia nada errado com quem era. Poderia parecer pouco, porém, era tudo para Charlie. O homem nunca imaginara que duas palavras – duas simples palavrinhas – poderiam importar tanto. Poderiam mudar sua vida inteira. E, ainda assim, podiam. 

Palavras tinham poder. E negá-las a alguém também era poderoso. E cruel. E uma forma de controle e manutenção do status quo. Era através da linguagem que os humanos atribuíam sentido ao mundo e a si mesmos. Por isso era tão brutal quando a linguagem falhava com você. Porque não permitia que você se entendesse e que os outros te entendessem. Porque apagava as possibilidades da sua existência. Palavras importavam. Definições importavam. 

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R

(de rótulos)

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Charlie Weasley logo percebeu que rótulos poderiam ser  perigosos. Sempre haveriam aqueles que tentariam te reduzir a eles, afinal. Como se não houvesse nada mais que fosse significativo a seu respeito. Como se as únicas opções fosse ser um estereótipo ambulante ou não ser coisa alguma. Após anos de incerteza, Charlie havia compreendido algo importante sobre si mesmo. Mas, de repente, as pessoas – aquelas que, pelo menos, tinham a dignidade de não negar a existência da assexualidade e da arromanticidade – pareciam ter começado a enxergá-lo apenas por aquela lente. O que o homem achava irritante. 

Além disso, mesmo dentro da comunidade que encontrara para si,  havia pessoas que tentavam aprisionar vivências individuais em pequenas caixas, não permitindo que nada destoante existisse. O que era sufocante. Haviam pontos que conectavam Charlie a outros assexuais e arrômanticos e que sempre o conectaria a eles. No entanto, também existiam pontos que eram inteiramente do Weasley e da coleção de momentos e contextos únicos de sua vida.

Ele não entendera isso a princípio. Havia tentado enquadrar suas experiências em uma moldura na qual nem todas elas cabiam. Havia se sentido mal ao perceber o desajuste. Como se estivesse fazendo algo errado. Como se não estivesse sendo aroace o suficiente. A sensação não era agradável.

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C

(de Charlie)

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Charlie Weasley havia tropeçado em algumas  armadilhas, enquanto se descobria. Ele supunha que outros também tropeçassem. Às vezes, as coisas demoravam um pouco para fazer sentido. Não tinha problema. No fim, ele entendeu. Entendeu que definições eram importantes para que as pessoas compreendessem a si mesmas, para que direitos fossem exigidos, para que lutas políticas e sociais se configurassem, para que comunidades fossem criadas. Mas, mesmo que alguns indivíduos não concordassem, essas definições não eram prisões. Não havia uma única forma de existir e de lutar. Havia espaço para singularidade no plural. 

No fim, Charlie Weasley era muito… Charlie. O que queria dizer um milhão de pequenas coisas. Todas elas belas e certas. Assexual e arromântico eram partes desse emaranhado glorioso. Partes importantes, mas que se somavam a várias outras. No fim, Charlie Weasley era muito… Charlie. E estava tudo bem. No fim, Charlie era muito... Charlie. E isso era tudo o que ele precisava ser. 


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Notas finais do capítulo

Bom, essa foi uma história bem curtinha sobre se entender e sobre como palavras são muito importantes nesse processo, mas como as pessoas também são e sempre serão mais do que palavras. E sobre como vão ter experiências múltiplas e sobre como todas elas são válidas e podem coexistir.
Espero que tenham gostado! ♥
Beijinhos,
Thaís