Epílogo

7 Meses depois…

A claridade entrou pelas grandes janelas do convés, fazendo Lara se espreguiçar e piscar os olhos ensonados.

- Bom dia, love. – Uma voz familiar, bastante convidativa, fez Lara olhar para a figura sentada na sua frente. – Hoje é um dia especial.

Lara sentou-se a muito custo. A gravidez estava na recta final e Grace passava o dia a dizer que a qualquer momento… Mas a barriga estava tão pesada que Lara já se sentia grávida há mais de um ano.

- Bom dia. Especial porquê? – Lara interrogou Jack com cenho franzido.

- Ora, não vais dizer que não te lembras que dia é hoje? – Jack perguntou e Lara rolou os olhos. Esqueceu-se completamente que aquele era o dia dos seus anos. E Alicia devia se ter esquecido que não era para contar a ninguém.

- Jack, eu já disse que não quero nada e neste momento não tenho nem vontade de sair da cama. – Disse. Gravidez era dose. Ou chorava como uma madalena, ou ria que nem uma tolinha, ou ficava brava como uma leoa.

- Não digas isso. – Jack chegou-se mais e depositou-lhe um suave beijo nos lábios. – Não é todos os dias que se faz 20 anos! Só de me lembrar dos meus loucos anos 20… - Jack divagou, fazendo um sorriso aparecer no rosto de Lara. – É para ti.

Jack entregou-lhe uma bolsa pequena cor de rubi e Lara abriu receosa. Olhou atentamente para o que lhe tinha caído na mão. Abriu a boca até ao chão.

- Fez-me lembrar a cor dos teus olhos, love. – Jack retirou o anel das mãos de Lara e colocou-lhe no dedo. Este observou-o maravilhada. Era de ouro e no centro, uma esmeralda brilhava rodeada de brilhantes mais pequeninos. De repente olhou brava para Jack.

- A quem roubaste o anel, desta vez? – Perguntou, parecendo um inquisidor-mor.

- Roubei? – Jack arregalou os olhos. – Love, eu sou pirata mas ainda tenho classe!

- Sei… - Lara disse. Conhecia muito bem quem tinha na frente do seu nariz.

- Comprei-o em Tortuga no mês passado. Sabes que nunca mais saqueamos nada e assim utilizei algumas moedas do último golpe. – Jack explicou. O Pearl tinha tirado umas férias por mútuo acordo dos capitães por causa do estado de Lara. O último saque tinha acontecido quando estava grávida de 5 meses. – Mas claro que existem outras prendas que se podem dar… ou até fazer… - Jack ficou com cara de safado, Lara entendeu o recado e apontou para a barriga.

- Espera mais um tempo. – Lara disse e beijou-o.

- Tens mais duas prendas. – Jack entregou-lhe. – O tal deus que faz suspirar meio mundo…

- Hermes. – Lara acrescentou.

- Isso. Veio de propósito entregar essa carta dos teus pais e isto. – Jack entregou outro saco pequeno a Lara. Esta notou-o mais pesado. Mas antes de o abrir, leu a carta dos seus pais. Ao menos tinha a ajuda dos deuses. Se não fosse isso, talvez lhe custasse ainda mais separar da sua família. Não evitou as lágrimas e Jack suspirou de novo. Depois, esboçou um sorriso para o marido e abriu o saquinho. De lá saiu uma corrente com um medalhão em forma de lágrima. Gravado neste, tinha um navio sob o sol poente. Era cravejado de…

- Diamantes? – Lara arregalou os olhos e levantou a cabeça. – Duvido que os meus pais…

- Foi Calipso, segundo Hermes. – Jack disse.

Lara agarrou no antigo colar que Calipso lhe tinha dado para a proteger.

- Ela disse, que será do futuro júnior. Mas que até lá, poderás andar com ele. – Jack acrescentou. – Agora está na hora de apanhares ar, darling.

Lara suspirou e saiu da cama. Enquanto se vestia, sentiu uma leve indisposição e uma pequena pontada no ventre, mas não ligou. Já lhe tinha acontecido há dias e nada de extraordinário se passou.

Chegada ao tombadilho teve vontade de voltar para trás. O berro de Alicia desejando os parabéns foi tão forte, que Lara teve a certeza que o navio mais próximo deveria ter ouvido. Rodou pela tripulação inteira, Grace fez um almoço delicioso, mas Lara continuava a não se sentir muito bem. O mal-estar começou a ser mais persistente e as pequenas pontadas no ventre já surgiam de meia em meia hora.

- O que é que o Jack te deu? – Alicia perguntou.

Lara mostrou o anel e Alicia como sempre adorou. Lara perguntava-se se Will aguentava os berros de Alicia. Sim, porque na noite de núpcias até os peixes ouviram.

- Hoje não estás com boa cara. – Alicia comentou.

- Não é nada. – Lara tentou esconder. - Sinto-me angustiada. Os meus pais mandaram-me uma foto deles, Alicia. E eu nem isso posso mandar. Quando o neto deles nascer, eles só ficaram a saber, mas nunca o conhecerão.

Alicia ficou séria. Lara era feliz, mas custou-lhe mais a ela a separação da família do que a si própria.

- Porque é que não mandas pintar um retrato? – Alicia propôs captando a atenção de Lara. – Em Por Royal há um homem que faz retratos. Podias encomendar um teu e do pequeno quando nascer. Assim os teus pais já podiam receber uma prenda original!

Lara pensou e sorriu com a ideia, mas no momento seguinte a atenção era para outra coisa. Uma contracção mais forte fez Lara se dobrar e no momento seguinte, sentiu algo escorrer pelas pernas.

- Hoje não! – Exclamou aflita quando viu que as águas tinham arrebentado.

Alicia chamou Grace e as duas levaram-na para o quarto, expulsando Jack a todo o custo.

2 Horas mais tarde…

Jack andava de um lado para o outro, percorrendo o caminho entre a popa e a proa do navio. O navio tinha parado, a tripulação descansava a um canto, mas encolhia-se a cada grito de Lara. Só Barbossa se mantinha impávido e sereno.

- Jack acalma-te. – Barbossa pediu. – Afinal não passa da lei da natureza a actuar.

- Lei da Natureza? LEI DA NATUREZA? – Jack berrou. – Eu estou me c****** para a lei da natureza, Hector. Não é normal demorar tanto, não é normal ela gritar tanto!

- Já assististe a um parto? – Barbossa perguntou brincando com o seu macaco.

- Não. – Jack balbuciou.

- Então cala-te e espera. – Barbossa disse.

Jack sentou-se a um canto angustiado. Nunca imaginou que na sua vida iria ter tanto medo, tanta ansiedade e tanto nervosismo aliados no mesmo dia.

1 Hora depois…

-Ahhhhh! – Lara berrou pela centésima vez. Depois de as águas arrebentarem, as dores não vieram logo, sendo bastante espaçadas, mas nas últimas duas horas era como se fosse arrebentar. Eram mais fortes e sentia cada vez menos força no seu corpo.

- É normal demorar assim tanto? – Alicia perguntou a Grace. Desde que começara o parto, Alicia não tinha largado a mão de Lara.

- Menina Alicia, existem partos que demoram mais de 10 horas! – Grace exclamou.

- Pelo amor de Deus, não digas isso! – Lara exclamou ofegante. Sentiu outra contracção e gritou.

Grace apalpou a barriga de Lara e percebeu o porque de a criança não estar saindo.

- Não fez a volta. – Grace disse.

- O quê? – Lara e Alicia perguntaram.

- A criança vai nascer de pés. Por isso demora mais e é mais doloroso, mas a menina vai ter de utilizar toda a força que tiver para por este bebé no mundo! – Grace exclamou, incentivando Lara.

- Eu quero uma epidural! – Lara exclamou. – Ou melhor uma anestesia completa, uma cesariana!

- Lara, se fizesses uma cesariana seria a sangue frio. – Alicia disse.

- Mas vocês acham que antigamente as crianças nasciam como? Que sempre ouve hospitais? Que era só dar uma injecção e pronto? – Grace perguntou escandalizada. – Fiquem a saber que na minha aldeia, até hà 10 anos atrás algumas crianças nasciam em casa!

- Mas já não estás na tua aldeia, Grace! – Lara exclamou e aplicando toda a sua força na fronha do travesseiro.

- Pois não. Estou num sítio muito pior! – Grace exclamou. – Agora FORÇA!

Lara gritou mais uma vez, apertando a mão de Alicia com tanta força que não entendeu como esta não se partiu.

No tombadilho…

- Já chega! – Jack exclamou, levantando-se em direcção ao quarto. – Eu vou acabar com isto agora mesmo!

- Tu vais fazer o quê? – A voz de Will soou atrás de si e Jack teve vontade de descarregar os seus nervos no pescoço deste. Problema era o pescoço ser imortal, como o resto do conjunto. – Dar um tiro ao teu filho?

- Deixa ele entrar! – Barbossa exclamou. – Assim além de um parto, temos um desmaio no meio, porque ele é daqueles que vai desmaiar. – Barbossa mandou a sua gargalhada típica.

- É melhor vocês não enervarem o capitão. – Gibbs pediu.

- Aquele mini sparrow estará no mundo daqui a nada. A "minha" Grace sabe o que faz! – Barbossa disse, ficando com os olhares todos em cima dele.

A porta abriu-se e Alicia saiu a correr tão suada que mais parecia que era ela que estava a dar à luz.

- Preciso de mais água quente. – Disse, indo em direcção ao porão, onde Cotton tomava conta do recado.

- Como é que estão as coisas? – Will perguntou, aquilo que o paralisado Jack Sparrow não conseguiu perguntar.

Alicia não disse nada, mas o seu olhar fez Will compreender tudo. A situação estava complicada.

- A criança está ao contrário. – Sussurrou para Will. Depois entrou de novo com a bacia de água quente.

- Porque é que ela não me ouviu? Tinha muito mais condições em Tortuga! – Jack exclamou pondo as mãos na cara.

- Tortuga é uma ilha pirata Jack. Dar à luz num navio ou lá é igual. – Will disse.

Um outro grito mais forte ecoou pelo navio e depois o silêncio. Jack parecia um morto vivo e olhou para Barbossa. Este sorria. Só o som nada típico que se seguiu é que o impediu de dar um tiro em Barbossa. Um choro ecoou pelo navio e Jack ficou sem saber o que fazer.

- Parabéns Jack! Bem-vindo ao clube das responsabilidades. – Barbossa riu com cara de gozo ao olhar para a expressão esquisita de Jack.

A porta escancarou-se e Alicia saiu de novo a correr e com um sorriso de orelha a orelha.

- NASCEU! – Gritou quase rouca. – A MINHA AFILHADA NASCEU!

Os piratas ficaram sérios mas depressa a surpresa passou e todos sorriram e deram os parabéns a Jack. Pintel e Raguetti olharam um para o outro:

- Nasceu! – Exclamaram os dois piratas, abraçando-se e chorando que nem dois irmãos que se reencontram anos depois.

- Não vais ver a tua filha? – Will perguntou, abraçando Alicia e beijando-lhe o topo da cabeça.

- Filha? – Jack exclamou com cara de horror.

- Não me digas que querias um rapaz? – Alicia ficou brava.

- Não, é que… - Jack parecia que tinha fumado um quilo de marijuana. Tinha as pernas bambas, o seu cérebro tinha congelado e nada de jeito saía da sua boca. O termo "filha" bateu-lhe em cheio na cara. Não é que não tivesse medo do termo "filho", mas sempre pensou que um rapaz era mais fácil de criar no meio de um navio pirata.

Grace saiu limpando as mãos e apontou com a cabeça para que este entrasse.

- Vais entrar, ou é preciso que te leve à força? – Barbossa perguntou. De um momento para o outro tinha Barbossa e Will olhando ameaçadoramente para si e estes pareceram-lhe anormalmente grandes. Encolhido, deu um passo em frente.

- Eu tenho pernas. Não preciso que ninguém empurre o grande Capitão Jack Sparrow. - Caminhou até à porta e perguntou-se se o seu pai sentiu o mesmo quando nasceu, ainda por cima no meio de um furacão.

Entrou e deparou-se com Lara que sorria derretida para o "projecto de gente" que segurava nos braços.

- Ela é linda, Jack. Nasceu com os teus olhos. – Lara disse, sentindo lágrimas escorrerem outra vez pela sua face.

Jack aproximou-se e sentou-se na beira da cama. Olhou para o pequeno ser embrulhado no cobertor. Ao princípio pareceu-lhe um ser humano vindo de outro planeta, mas depois a pequena abriu os olhos. Lara tinha razão. Os seus olhos eram escuros como os de Jack.

- Mas é a tua cara. – Disse, ao constatar que embora bastantes ténues, possuía alguns traços da mãe.

- Este foi o melhor presente de aniversário que alguma vez tive. – Lara disse, sorrindo para a filha, que alternava o olhar entre a mãe e o pai.

- E foi o presente mais esquisito que tive. – Jack acrescentou.

- Não me digas que querias um rapaz? – Lara perguntou e Jack já estava farto que lhe perguntassem o mesmo.

- Nada disso, love. Eu nunca tive preferência. – Jack apressou-se a dizer. Olhou mais de perto e uma pequena mão agarrou uma das rastas.

- Parece que ela gosta de ti. – Lara disse, depositando com cuidado a filha nos braços de um Jack atrapalhado.

- Ela é bem levezinha. – Jack disse.

- A Grace disse que é normal. – Lara explicou não tirando os olhos da filha. – Aliás, ela nasceu no tempo certo e ao contrário! – Lara riu perante a cara de Jack. – Mas não demorou assim tanto.

- Não… - Jack prolongou a frase. - … não eras tu que andavas de um lado para o outro do navio morrendo de preocupação.

- Ai é? – Lara perguntou. – Então para a próxima faz o favor de ficares tu grávido, para veres o que é bom!

Jack sorriu e por coincidência a sua filha também. E o grande Capitão Jack Sparrow derreteu-se.

- Que nome vamos pôr? – Lara perguntou.

Jack pensou por um momento.

- Eu gosto de Mary. – Lara propôs.

- Mary Rose! – Jack exclamou. Jack olhou para a filha. – Que achas. – A bebé esboçou de novo um sorriso. – Ela gosta. Mary Rose Sparrow!

- Falta o Stevens, Jack. – Lara fez uma careta.

- Ok. Mary Rose Stevens Sparrow. – Jack disse. – Gosto mais só com três nomes.

- Porquê Mary Rose? – Lara perguntou. – Alguma namorada?

- Não, love. Simplesmente porque eu quero que a nossa filha tenha uma personalidade forte e nada melhor que um nome forte. – Jack arregalou os olhos. – O nome de um dos navios mais poderosos que já navegaram neste mares.

- Jack… - Lara arqueou uma sobrancelha. - … nome de navio? – Perguntou. Sabia muito bem de qual navio, Jack estava a falar. O famoso Mary Rose, navio da esquadra de Henrique VIII de Inglaterra e orgulho deste. – Ele acabou por naufragar.

- Mas era um grande navio. – Jack fez beicinho. – A não ser que queiras Pérola ou coisa parecida!

- Não, mas podiam pôr Anastacia! – Alicia entrou puxando Will.

- Anastacia? – Jack pôs a língua de fora e Mary começou a chorar. – Ela não gosta.

- Ela não tem idade para gostar ou não, Jack. E Anastácia começa por A, como Alicia! – Exclamou ansiosa.

- Fica Mary Rose e não se fala mais nisso. E agora com licença que ela tem de comer. – Lara disse.

1 Dia depois…

- Como é a sensação de ser pai, Jack? – Barbossa perguntou, enquanto analisava um mapa ao lado de Jack.

- Complicado. Mas nada que o tempo não ensine. – Jack disse sorrindo e virando levemente o leme para estibordo.

- Engraçado. O teu pai disse o mesmo. – Barbossa disse entre dentes.

- O meu pai? – Jack perguntou. – Desde quando sabes o que o meu pai disse quando nasci?

- Ah Jack. Nem todos os segredos deste mundo são para ser revelados! – Barbossa exclamou. – E ainda há muita coisa que tens de aprender! – Deixou escapar a sua gargalhada.

Jack olhou para si escandalizado. – Bem… - olhou para a sua querida bússola. - … tragam-me o horizonte… e já que vais lá baixo traz-me uma garrafa de rum! – Jack riu safado quando viu Barbossa bufar.

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