Meros Encantos Mortais escrita por LittleR


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

"Uma estrada se bifurcava no bosque. Eu tomei a menos percorrida e isso fez toda a diferença."
Robert Frost, A Estrada Não Percorrida.
Boa Leitura!



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Prólogo

 

Ainda consegui chegar bem perto da fronteira antes de ser pega pelos Recrutadores.

Meus tornozelos afundavam na neve e as mãos, nos bolsos do casaco. Havia um tempo já que eu não conseguia sentir meus dedos ou minhas orelhas. Só o estômago. Roncando. Me arrependo apenas não ter lutado mais. É que com a fome e o frio, até considero que fiz muito em ser capaz de arrancar o mindinho de um deles.

Supostamente, os três Recrutadores que me perseguiam não deveriam me ferir. Um deles, porém, me acertou um soco. Não consegui ver qual foi. Veio por trás, enquanto eu lutava com o mais magro. A neve, a tontura e a névoa nublaram minha percepção. Senti apenas o golpe e depois o chão congelando minha bochecha. Um par de mãos abriu meu casaco e rasgou o tecido da minha blusa. O frio lambeu meus mamilos, dedos ásperos tatearam o vão entre os meus seios.

— É uma delas! Vamos levá-la!

Fecharam meu casaco de novo. O maior deles, um homem gigantesco, de pele negra e cabelos trançados, jogou-me sobre os ombros como um saco de batatas e começou a me arrastar de volta por todo o caminho que eu traçara para fugir.

— Seu Duque — balbuciei. — Seu Duque vai ouvir sobre isso.

— É? E o que vai dizer a ele? Que nos atacou e mordeu um dos nossos?

— Sua vadiazinha — resmungou aquele cujo dedo eu arrancara a dentadas. Ele segurava a mão ferida, seu sangue manchando a neve.

— Pare de espernear! Você não está indo pra forca! Vai ser bem tratada no Jardim Oriental!

— Eu estou bem aqui! — Tentei esmurrá-lo pelas costas, mas ele era grande demais. Senti como se eu fosse um inseto tentando derrubar uma parede.

Pensando melhor, eu respirei fundo para me acalmar. Fechei os olhos e tentei evocar qualquer poder ancestral desconhecido que existisse dentro de mim. Uma lufada miserável de vento jogou um punhado de neve nos olhos do Recrutador que me segurava. Ele cambaleou e grunhiu. Então, me largou no chão.

— Sua! Ignir vai devorá-la por ser uma pestezinha! — ameaçou.

— Deixe-me voltar pro meu vilarejo!

— E o que diabos você vai fazer lá? — resmungou o terceiro, entediado. — Você é uma órfã, não é como se tivesse alguém pra quem voltar.

Não tenho a menor ideia de como ele descobriu que eu era uma órfã, mas a declaração me acertou como um tapa. Direto no ponto fraco. Retruquei:

— Não vá assumindo coisas sobre mim, vés gilipus.

Ele me agarrou pelas bochechas com uma só mão. Tinha um rosto assustador, ali entre o jovem e o velho, bochechas sugadas e olhos escuros.

— Fale comigo na língua comum, vadiazinha.

Eu cuspi na cara dele em resposta e o empurrei. Tentei me arrastar para longe, mas o maior deles me agarrou e me deu outro soco. Desabei na neve novamente, sangue escorrendo de meu nariz e a névoa envolvendo os meus olhos. Por sorte, a escuridão que me abraçou depois disso não tinha nenhum espinho para perfurar meus sonhos.


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Notas finais do capítulo

Notas para mim mesma: Estou lendo Estilhaça-me. Aaron Warner Supremacy.

Até Mais!