40 Dias escrita por Saori


Capítulo 2
Ódio?


Notas iniciais do capítulo

Oi, oi, oi, pessoinhas! Bom, vamos ao segundo capítulo. Sem spoilers, mas esses protagonistas adoram implicar um com o outro, viu? Tenham uma boa leitura. (:



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Eu não encontrei com Scorpius novamente naquele dia. Na verdade, eu nem sequer saí do quarto. Alimentei-me de biscoitos e pãezinhos que levara do hotel, apenas porque eu não queria olhar para a cara dele. No entanto, eu não poderia fazer isso novamente, porque não havia mais nada para comer e, definitivamente, eu ficava com um humor mil vezes pior quando estava faminta.

Albus me mandou uma mensagem perguntando se estava tudo bem ontem, e eu respondi que sim, na medida do possível. Então, peguei-me pensando novamente: quarenta dias era muito, muito tempo. Eu já estava com saudades de todo mundo, especialmente de passar um tempo na Toca, que era como chamávamos a casa dos meus avós.

Não levantei cedo e nem tarde naquela manhã. Eu diria que nove horas era um meio termo. Tomei banho assim que acordei, era uma mania que eu tinha e, particularmente, adorava. Em seguida, decidi, finalmente, sair do quarto, porque estava necessitada de um café da manhã. Parte de mim se sentia mal por ter que consumir a comida da Scorpius, mas a outra parte me convencia de que estava tudo bem, porque eu o pagaria depois, e tudo ficaria certo.

 Quando eu cheguei até a cozinha, lembrando-me do trajeto que ele havia me indicado no dia anterior, lá estava ele, trajando vestes completamente escuras, com sua postura ereta perfeita e uma feição impassível. Tudo o que ele fez foi desviar o seu olhar para mim, por um mísero segundo para depois voltar a sua atenção para o jornal em suas mãos.

 — Bom dia — falei, quase como um sussurro.

— Bom dia.

 — Você se incomodaria se eu fizesse algo para comer? — perguntei, um pouco sem graça.

— Claro, Rose. Eu prefiro que você vá até o mercado e compre alguma coisa, aliás, é justamente por isso que você vai passar, pelo menos, mais 39 dias aqui — respondeu mal humorado.

Grosseiro.

— O que foi, está tendo um dia ruim e resolveu descontar em mim? — Eu detestava quando faziam isso, e se o Malfoy achava que eu iria deixá-lo sair impune, estava muito enganado.

— Não. Na verdade, eu só achei a sua pergunta bem idiota.

— Você que é um idiota — respondi impaciente.

Ele respirou fundo e sua feição continuou neutra, o que nutriu ainda mais a minha irritação. Caminhei até a geladeira, na qual peguei um ovo, e procurei por uma frigideira no armário. Quando encontrei, fui até o fogão e preparei um ovo mexido. Eu não era uma mestra da culinária, mas pelo menos isso eu sabia fazer. Em seguida, peguei uma fatia de pão em um dos armários e, finalmente, sentei-me na mesa da cozinha, bem de frente para ele.

 Eu estava pronta para morder a primeira fatia do pão, quando senti algo roçando em minha perna. Eu dei um pulo e quase gritei. Do outro lado do móvel, a feição de Scorpius, que antes estava rígida, desabou em uma gargalhada devido a minha reação ridícula, e eu, ainda assustada, levei uma das mãos até o coração, como se fosse ajudar a me acalmar. Quando olhei para baixo, era um gatinho preto, girando ao redor da minha perna direita.

— Por que você não me avisou que tem um gato?! — falei, e as palavras quase soaram como um grito.

— Porque você não perguntou — disse, como se fosse óbvio.

Seja paciente, Rose, você consegue. Repeti para mim mesma exatamente cinco vezes.

— E se eu tivesse alergia, você ia me deixar morrer?

— Primeiro, você nunca foi alérgica a gatos. — Ele respirou fundo, reunindo paciência. — Segundo, então você teria que ir embora, porque o Lynx fica.

— Como você pode saber se eu sou ou não alérgica a gatos?

— Deve ser porque eu te conheço desde, sei lá, os quatro anos de idade?

— Como se você fosse prestar atenção em uma coisa dessas. — Revirei os olhos e abaixei para fazer um carinho no gato. — Oi, Lynx — falei, com um sorriso nos lábios. Eu adorava gatos.

 O gatinho moveu-se debaixo da minha mão, como se implorasse por carinho, e eu ri, achando fofo.

— Isso é esquisito — o Malfoy falou do nada.

— Do que está falando?

— O Lynx — ele começou a dizer, mas parou para tomar um gole de café. — Ele não costuma ser muito amigável com as pessoas.

— Parece que ele gostou de mim, então — falei, enquanto me levantava e retornava ao meu assento.

— Azar o dele.                                          

— Chato — murmurei.

— Insuportável — ele retrucou.

— Idiota.

— Tampinha.

 — Céus, eu vou enlouquecer pelos próximos dias. — Levei uma das mãos até o meu prato, peguei o pão e mordi um pedaço.

— Só você?

Eu não o respondi, porque quando eu era muito, muito, mas muito forte, eu conseguia ser paciente. Ou quase isso, porque, com certeza, eu revirei os olhos, mesmo que não tenha percebido.

Não demorei muito para terminar de tomar o meu café da manhã e voltar a me enfurnar no quarto. Aparentemente, seria assim que eu passaria o resto do dia, apenas para não ter que me deparar com Scorpius novamente.

...

Eu sempre fui o tipo de pessoa que prefere ficar em casa a ir a festas, eventos ou qualquer coisa do gênero. Sempre. Mas quando você é forçado a isso, de certa forma, causa uma agonia.

Havia acabado de falar com a mamãe e o papai pelo telefone, em uma ligação de vídeo. Confesso que a saudade apertou. Embora eu fosse extremamente independente, eu ainda era muito ligada a minha família. Eles eram tudo para mim.

Bastaram quatro dias para que eu ficasse enjoada das cores do quarto. E dos móveis. E de tudo o que ali estava. Por algum motivo, eu tinha essa sensação angustiante e estranha de estar presa e, especialmente, em um lugar que não era a minha casa.

Em três dias, faria uma semana que eu estava morando com Scorpius, e não havíamos tido nenhum diálogo que não terminasse em insultos. Era quase que um talento nosso. Estranhei quando percebi a porta do meu quarto abrir sutilmente, e demorei um pouco para ver o gatinho preto adentrando o cômodo. Lynx estava sendo o meu melhor amigo nos últimos dias e, por algum motivo, eu havia me apegado a ele. Aliás, não havia como não gostar de gatos e, quem não gosta, certamente tem um grave desvio de caráter.

— Você por aqui? — Levantei-me da cama e abaixei até a altura do animalzinho, apenas para fazer carinho nele.

— Lynx? — Ouvi o som da voz de Scorpius ecoar pelo corredor.

— Parece que ele também não te deixa em paz, não é? — falei, enquanto envolvia Lynx em meus braços. — Vamos, seu dono está te procurando.

Levantei-me do chão, com Lynx no meu colo e caminhei até o lado de fora do quarto, deparando-me com Scorpius no corredor, um pouco a frente da porta.

— Ele está aqui — falei, chamando sua atenção.

— No seu quarto? — Sua feição parecia confusa e, ao mesmo tempo, desconfiada.

— Sim.

— O Lynx? — perguntou, como se precisasse ter certeza.

— Sim — reafirmei.

— Ah... — Ele parecia frustrado.

— Pode pegá-lo. — Com calma e cuidado, estendi o gato na direção dele.

Scorpius não demorou muito para pegar Lynx em seu colo e iniciar uma série de carícias que fazia o gatinho parecer estar sorrindo e muito satisfeito. Definitivamente, o Malfoy se importava muito com o animalzinho, e devo dizer que eles provavelmente eram melhores amigos. Ele estava prestes a ir para a cozinha, mas logo deu meia-volta.

— Rose — chamou a minha atenção, então eu voltei meu olhar para ele. — Você não almoçou hoje?

Balancei a cabeça de um lado para o outro, em negação.

— E nem ontem?

— Não — respondi, e senti-me uma criança.

— Você sabe que eu não envenenei nada, não sabe? — perguntou, em um leve tom de ironia.

— Quem me garante? — retruquei.

— Uh... Eu? — Apontou para si mesmo.

— Eu não acredito em você — esclareci.

— Eu não minto. — Sua convicção foi tamanha que eu quase acreditei nele. Quase. — Você não quer jantar?

Aquele pedido deixou os lábios dele de uma forma tão natural, que eu quase entrei em estado de choque. Não era como se Scorpius Malfoy estivesse preocupado comigo. Ele, de fato, não estava. Na verdade, ele só era muito educado.

— Eu vou cozinhar algo mais tarde.

— Eu fiz o almoço hoje, sobrou bastante comida, então, se quiser, não é um problema. — Deu de ombros. — E, também, não deveria ficar tantas horas sem comer.

Por que ele soava como se fosse o meu pai? Céus, isso me tirava do sério, mas a preguiça de cozinhar falava mais alto.

— Uh... claro — aceitei, por fim, dando-me por vencida.

— Por que você pula as refeições? — perguntou, de repente, enquanto caminhávamos em direção à cozinha.

— Porque eu estava ocupada, nem sequer me dei conta das horas passando — respondi, sem muitas explicações.

— Ah... — Ele ficou quieto por alguns segundos. — Ocupada com o quê?

— Com o meu trabalho.

— E com o que você trabalha?

— Isso virou um interrogatório? — disparei.

— Talvez — admitiu. — Vai que há uma assassina profissional morando sob o meu teto, eu preciso saber.

— Em primeiro lugar, eu não te contaria, se fosse o caso — comecei. — Em segundo lugar, não te interessa.

— Você não confia mesmo em mim, não é? — falou despreocupado. — Você é escritora, eu já sei.

— Então por que perguntou? — indaguei, indignada. Maldito Malfoy.

— Porque eu queria saber o que você responderia. — Ele parecia estar se divertindo com a situação, mesmo que não houvesse qualquer sorriso em seus lábios.

— E como você sabia disso?

— O Albus já me contou — respondeu, calmamente.

— Vocês andaram conversando sobre mim?! — perguntei, ultrajada.

Já estava pronta para pegar meu celular, ligar para Albus e gritar com ele, se fosse necessário.

— Não seja tão convencida. — Ele rolou os olhos de um lado para o outro, demonstrando impaciência. — Ele mencionou uma vez, e eu tenho uma memória excelente.

— Ah, claro.

Nós ficamos em silêncio por poucos minutos que pareceram uma eternidade. A minha relação com Scorpius, por algum motivo, sempre fora assim. Eu adorava quando ele ficava quieto, era como se fosse uma forma de preservar a minha sanidade. Por outro lado, o silêncio entre nós era sempre, de certo modo, constrangedor. E eu detestava me sentir constrangida.

Ainda assim, em pouco tempo, a comida já estava quente, e os pratos que ele havia preparado estavam prestes a ser colocados sobre a mesa. Ele estava sendo tão gentil que estava me assustando.

— Ah, eu esqueci de avisar que não gosto de abóbora — comentei, porque sabia que ele tinha feito algo que usava o legume.

— Eu sei — ele disse, enquanto colocava o meu prato bem na minha frente. — Eu não coloquei para você.

— Como você sabe? — Eu estava nitidamente surpresa.

— Eu já disse, tenho memória boa — proferiu, como se não fosse grande coisa.

Talvez não fosse mesmo.

— Memória boa, sei — pareci desconfiada, mas ele não deu importância.

Nós retomamos o silêncio e demos início a nossa refeição. Ficamos quietos por alguns minutos, mas logo senti os olhos cinzas sobre mim, causando-me um certo desconforto.

— O que foi? Tem algo de errado? Eu estou suja por acaso? — indaguei. Quem sabe eu havia me sujado com a comida sem perceber. Não que ele fosse me dizer, se fosse o caso.

— Não — respondeu e adotou uma feição pensativa. — Você não mudou nadinha, não é?

— O que quer dizer com isso?

— Continua a mesma tampinha chata — disse, e eu pude jurar ver a ponta direita dos seus lábios se mover um pouco, quase em um sorriso.

Está tudo bem, Rose. Falta menos do que faltava. Repetir aquelas palavras internamente, de algum modo, me trazia certa calmaria.

— E você continua o mesmo garoto irritante — retruquei.

— Eu, irritante? — Apontou para si mesmo, quase incrédulo. — Já se olhou no espelho?

— Você... — Respirei fundo e contei até dez. — É um idiota.

— Rose, você se lembra de quando éramos mais novos? — perguntou, mas não me deu espaço para resposta. — Céus, você falava feito uma matraca, isso sim era irritante. Devo admitir que ao menos nesse quesito, você melhorou.

— Ah, obrigada, Malfoy. Vindo de você isso deve ser um elogio, já que você nunca vê nada de positivo nas coisas desde... Sempre?

— Não é bem assim.

— Qual é?! Você sempre foi um baita pessimista.

— Não é bem assim — ele repetiu, mas aquelas palavras não me convenceram nem da primeira, nem da segunda vez.

— Você me chama de irritante, mas, por acaso, você se lembra de como isso... — Apontei para ele e para mim, respectivamente. — Começou?

— Com você sendo irritante? — indagou, como se fosse óbvio.

— Não. — Acenei negativamente com a cabeça. — Com você sendo um babaca.

— Claro, porque Rose Weasley é perfeita e nunca comete erros.

— Eu nunca disse isso — dei ênfase à palavra “nunca”.

— Então o que você está querendo dizer? — Eu não tinha certeza, mas ele parecia verdadeiramente confuso.

— Foi você quem começou a me odiar, para começo de conversa! — explodi, finalmente. — Estava tudo bem entre nós, trocávamos cumprimentos, palavras cordiais, até aí a nossa relação estava... Eu não sei, boa? Embora nós não fôssemos muito próximos — falei, ao mesmo tempo em que era invadida por lembranças. — E estava tudo bem, daí do nada você começou a implicar comigo. Sem motivo algum. Naquele dia, no cinema, eu estava feliz por poder ir com você e o Albus, de verdade, mas você conseguiu estragar tudo. Eu me sujei toda de refrigerante, e tudo o que você fez foi rir da minha cara, quando eu queria sumir.

Droga, eu havia falado demais. Definitivamente, eu tinha dito mais coisas do que gostaria. O silêncio que pairou logo depois das minhas palavras foi quase torturante. Eu pensei em me levantar e sair correndo, não uma, mas duas vezes. Contudo, eu nunca fugia dos meus problemas. Nunca.

— Rose — Scorpius me chamou, em um tom de voz baixo, despertando-me dos meus devaneios. Consequentemente, voltei o meu olhar para ele. — Você sabe que eu não te odeio, não sabe?

— Isso não importa mais. — Dei de ombros, tentando parecer sincera.

Eu não costumava me importar com julgamentos alheios, caso contrário, a minha vida seria muito diferente do que a que eu estava vivendo. Eu sempre acreditei que nós devemos fazer o que gostamos e sonhamos, sem precisarmos nos importar com o que os outros pensam. Caso contrário, seríamos podados de tudo em nossas vidas, porque sempre existem aqueles que irão se incomodar.

Levantei-me da cadeira e coloquei a louça sobre a pia assim que terminei de comer. Antes de deixar o cômodo, voltei o meu olhar para Scorpius, como se estivesse dando uma última chance de ele dizer seja lá o que quisesse, mas nenhuma palavra deixou os seus lábios. Após isso, eu apenas retornei para o meu quarto.


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Notas finais do capítulo

Ok, esse capítulo não foi tão revelador assim, eu admito. E a Rose pode ser um tanto quanto infantil às vezes, mas eu gostaria de saber os palpites de vocês para o motivo de tanta implicância. Ou vocês acham que sempre foi assim? Eu fico bem curiosa para saber a impressão que passei para vocês. De qualquer modo, prometo revelar cada vez mais um poquinho sobre eles, até completar esse quebra-cabeça. Obrigada por lerem. ♥



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