ATO XVII

— Sinto falta de nós. Mesmo quando só conseguia ser insuportavelmente fatalista.

Hermione murmurou com um sorriso distante, soando distraída. Suas memórias daquela época também eram repletas daquela carga fatalista inevitável que o perseguira por todo o último ano, em razão de um futuro previamente definido, que há muito não vinha sendo escolhido por ele.

Apreciou a breve leveza que se instalou nas feições dela por um instante e alcançou a mão dela de novo, delineando com os dedos um caminho abstrato que, por enquanto, era suficiente. Hermione apenas encarou o contato, mais concentrada em mordiscar os lábios de maneira ansiosa, como fazia sempre que seu cérebro se encontrava numa espiral desordenada e indecisa.

— Eu tenho um quarto. – Agora, não se assustava mais com o fato de conhecer tais detalhes sobre ela. Pequenas coisas, reparou enquanto soltava o lábio inferior da pressão dos dentes, que, felizmente, não haviam mudado com o passar do tempo, manias da garota desleixada na mulher elegante que se tornara. Se tivesse um vira-tempo, permaneceria para presenciar isso, não precisava da certeza dela para afirmar a sua. – Por que você não vem? Podemos tomar algo mais forte do que essa bebida, que por sinal ainda é péssima e nós... Continuamos de onde paramos.

A observou rir por ainda detestar Café Irlandês, embora tivesse se esforçado para gostar no início e logo depois voltar a analisá-lo, sem reservas. Cautela e nostalgia em toda ela. De alguma forma, Hermione nunca tivera receio de encará-lo de verdade, sempre segura demais de suas convicções, racional na forma que enxergava tudo com o que tinha de lidar, inclusive Draco e o que eram – no passado.

Por isso, parecera aceitar tão bem o final fatalista que podia oferecer naquele momento. Mas, por toda a noite, enquanto estivera ali, com ela tão perto quanto nunca estivera nos últimos anos, já não tinha mais certeza se conhecia a forma como raciocinava ou se um dia realmente conhecera.

ATO XVIII

Hermione se colocou na ponta dos pés para passar os braços por seu pescoço, colocando todo o peso de seu corpo contra ele, o que o levou a pressionar a cintura bem delineada contra si, ofegando contra a boca atrevida que a garota tinha.

Seu ego era sempre massageado por ser tão autoconsciente de conhecer um lado dela que tido por poucos. Com isso, automaticamente, vinha o peso de saber que, logo, esse tipo de coisa seria - não exatamente esquecido, mas - aos poucos sendo deixado de lado, por ambos. Com o tempo, esqueceria a forma como seu corpo respondia a ela, desde a respiração em seu pescoço até a suavidade da pele macia e perfumada; coisas com as quais já estava habitado demais.

— Você disse naquele dia... – Ela murmurou quando se afastou, os lábios quase que tocando os dele enquanto falava, se recusando a se distanciar. – Disse que isso não terminaria bem. Nós dois. Realmente acha que irá acabar um dia? O que sentimos vai simplesmente passar e se desvanecer com o tempo?

Pesadamente, apoiou a cabeça contra a parede da cabine do Expresso e engoliu em seco, sentindo os dedos inquietos brincando com a lapela de seu terno. Diferente das outras vezes, não suportaria ver algo que não queria nos olhos dela, pois tinha consciência de que ela estava tão impregnada em sua mente que demoraria a superar qualquer mágoa vinda dela.

— É melhor que entenda porquê espero que sim.

Infiltrou a própria mão entre os fios dos cabelos castanhos, acomodando-a na nuca quando a ouviu simplesmente suspirar e apoiar a testa em seu ombro, aproveitando o silêncio fabricado do pequeno ambiente. Embora houvesse ignorado isso por meses, logo chegariam à Plataforma 9 ¾ e, então, não haveria mais habitualidade e intimidade no que faziam.

— Draco...

O sentiu respirar fundo, pensando nas palavras, enquanto um brilho diferente se instalava nos olhos castanhos. Durante todo aquele tempo, Granger jamais o havia encarado assim, de forma o intimidasse e o levasse a imediatamente recuar.

— Não faça isso. – Pediu, vendo-a olhá-lo resignadamente.

— Porquê?

— Eu... – Não havia um motivo tão concreto quanto sua própria covardia. Queria proteger a própria sanidade e o único jeito de fazer isso, durante todo aquele tempo, fora evitando alcançar aquele status, aquele sentimento inevitável, mas ainda não expresso, que jamais seria explorado de verdade. – Eu não quero que me faça querer ficar.

A castanha apertou fortemente os lábios entre os dentes e concordou com um meneio contrariado de cabeça. Ela sempre compreendia, sempre respeitava quem era e o que vinha com ele. Draco precisava ir, não só pelo exílio, mas por si mesmo, para encontrar um jeito de construir a pessoa que gostaria de ser, alguém que ainda iria descobrir.  

De repente, o apito de Expresso soou, indicando que estavam próximos da Estação e ele a olhou, quase receoso. O tempo com a garota em suas mãos parecia passar rápido demais, insuficiente e cruel.

— Acha que vamos nos ver denovo? Algum dia...

— Um dia... É claro.

Hermione questionou, certamente apenas para tentar consolar a si mesma e a necessidade que tinham um do outro, algo que não teria coragem de contestar, embora em outros tempos não visse qualquer hesitação em mentir ou desviar do assunto. Já conhecia muito dela para tentar ir por esse caminho.

Por isso, apenas suspirou e segurou o rosto bem desenhado, encaixando seus lábios de maneira confortável, prolongada, como se decorasse como seria a sensação. No fim, realmente estava, assim como jamais deixaria de sentir a lágrima fria que, silenciosa, terminara na textura de seu dedo.