Enquanto eu respirar escrita por WinnieCooper, Anny Andrade


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Mais uma fic com Anny para esse projeto lindo do mês de Maio. Aqui trouxemos um pouco de como imaginamos a relação de Arthur e Hugo. Temos um carinho especial por nosso Huguinho (amante dos trouxas e desenhista), esperamos que gostem :*



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“Querido avô...

Enquanto eu respirar vou lembrar... Das coisas simples da vida. Das coisas que no final, com o passar do tempo, são as únicas que sempre lembrarei...

Ele aprendeu a acordar para ver o sol nascer, gostava de assistir aquela figura alta de óculos segurando uma caneca nas mãos e soprando o chá quente. Seus olhos cheios de expectativas para o novo dia. A luz do sol iluminando todos os objetos daquele lugar cheio de magia, uma magia diferente daquela ao qual estavam acostumados, uma magia mais simples, comum, os trouxas também conseguiam criar coisas mágicas sem nem perceberem a grandiosidade delas.

O Hugo de quatro anos era encantado com aquela garagem cheia. O de cinco gostava de ficar em cima da mesa enquanto assistia cada um dos objetos serem abertos, desparafusados, fechados novamente. O de seis aprendeu a usar a chave de fenda. O de sete gostava de comer rosquinhas. O de oito aprendeu a tomar chá. O de nove sempre acordava atrasado. O de dez só saia da garagem na hora de ir embora para casa. O de onze contava os dias para as férias.

Hugo Weasley aprendeu a apreciar cada segundo que passava com vovô Arthur. Quando menor ele não era de correr pela casa ou de tentar voar com vassouras, ele ficava no canto desenhando e lendo revistinhas. Até encontrar o avô esperando o sol nascer para começar a brincar de inventor. Ou pelo menos era como Hugo enxergava.

Naquele dia o avô sorriu e o pegou no colo, ficaram em silêncio vendo aquela luz laranja tomar conta do mundo todo, mandando embora a escuridão. Para o pequeno Hugo aquela sensação era tão boa, como se ele e o avô por aqueles minutos fossem especiais por assistir algo tão bonito.

— Acho que terei um auxiliar hoje. – Arthur afirmou atrás dos óculos.

Mesmo não sendo uma pergunta Hugo acenou afirmativamente e sorriu radiante.

Foi ali que tudo começou. Mais do que avô e neto, passariam a serem amigos, companheiros, ambos apaixonados pela cultura trouxa e com olhares de ternura para todo o mundo.

...Enquanto eu respirar vou lembrar... e desenhar cada detalhe seu... Seu rosto com rugas, Seus cabelos brancos, e seu sorriso de criança ao montar um brinquedo. Guardarei comigo suas expressões num pedaço de papel...

O tempo fazia com que ficassem ainda mais momentos na garagem. Hugo apesar de gostar de montar e desmontar preferia desenhar. Desenhar objetos, peças, às vezes o avô trabalhando.

Era como assistir uma criança descobrindo brinquedos, via os olhos de seu avô brilharem todas as vezes que montava e desmontava um carrinho de fricção. Lembrou-se de seu outro avô, que propriamente trouxa não lhe proporcionava nenhum desses momentos. Não que ele fosse um péssimo avô, adorava lhe dar doces escondido de sua avó Granger. Fingia que eram doces sem açúcar por causa das cáries e da profissão deles, mas aqueles tinham açúcar. Apesar de se deliciar, era Rose que mais gostava de ficar com eles. Ele admirava os brinquedos que compravam a ele, o videogame, os carrinhos de controle remoto mais modernos. Mas eram os momentos simples com seu avô bruxo, que o marcavam mais.

... Enquanto eu respirar vou lembrar... de cada história e sabedoria passada de anos. Descobria novamente como se fosse a primeira vez, o segredo da vida. Da sua vida. Da nossa vida...

Certo dia resolveram caminhar ao redor da Toca. Observaram as casas dos vizinhos, que mesmo vizinhos, eram bem distantes, Arthur lhe contava a história de cada um. Não poupava o neto de cinco anos de história da Guerra. Aprenderam a admirar a natureza que se mostrava em volta, cheia de insetos diferentes, lhe contava a metamorfose da borboleta, lhe mostrava porque o céu mudava de cor dependendo do horário do dia, lhe ensinava a vida lhe mostrando a vida.

Arthur Weasley percebeu que o neto amava esses momentos. Diferente dos outros onze netos, que brigavam por atenção, que brincavam de quadribol no jardim, Hugo preferia lhe escutar, e prestar atenção em cada passo que ensinava, sobre a vida, ou sobre objetos trouxas. Seu orgulho se exalava quando lembrava que justo Hugo carregava seu nome, como segundo nome. Hugo Arthur Weasley seria seu neto preferido?

Não que ele acreditasse em predileções, era como lhe pedir para escolher só um filho, não sentia ser Hugo seu neto preferido, mas era ele que lhe escutava, ele que estava a mais tempo consigo. Justo um de seus netos menores prestava atenção no avô já de muita idade com a memória um pouco comprometida. Poderia dizer que Hugo era seu neto especial.

...Enquanto eu respirar vou lembrar... de admirar o quão sábio é em saber observar e perceber minha fragilidade em meu esconderijo. Assim como tinha o seu próprio. Sabia reconhecer o meu e respeita-lo...

E ele se mostrava especial em tantos aspectos. Quando trazia Lily para perto enquanto ela chorava pela atenção dos outros. Quando defendia a irmã, mais velha, dos primos todos, quando elogiava a pior das comidas que seu pai fazia, quando ainda estava aprendendo a cozinhar. Quando deitava no colo de Hermione e escutava as histórias que ela sussurrava enquanto lia. Quando abraçava a avó sem ter vergonha de demonstrar o carinho que sentia.

Mas Arthur percebia dentro de todas aquelas coragens e afeto a timidez escondida naquele chapéu trouxa que o neto colecionava. Aprendeu que chamava-se boné e que Hugo tinha muitos. Parecia convencido a se esconder embaixo daquelas abas.

Como se o brilho nos olhos e os cabelos ruivos pudessem passar despercebidos. Era impossível. Suas sardas faziam com que seu rosto sempre se destacasse, apesar das tentativas de escondê-lo. Então o avô percebeu que além de especial, talvez Hugo fosse aquele dos netos que mais se parecia com ele. Uma versão nova, melhorada, de Arthur. Isso o fazia se sentir orgulhoso.

Hugo foi crescendo rodeado de brilhantismo. Os primos cheios de habilidades e qualidades. Sua irmã muito mais ativista do que a mãe gostaria, mas mesmo de longe se podia enxergar o orgulho nos olhos dela, orgulho e vontade de enforcá-la ao mesmo tempo. Ele por outro lado queria passar despercebido, gostava da garagem exatamente por isso. Lá tinha tantos objetos que passavam despercebidos e que quando encontrados eram grandiosos. Queria ser assim. Sentia que era.

...Enquanto eu respirar vou lembrar de esquecer xadrez e aprender tudo novamente. Só para sentir toda magia da primeira vez... Da primeira vez que aprendi sobre a vida...

Era fácil conversar com o avô, não precisava fingir e nem se esconder debaixo do boné. Na garagem o tirava de sua cabeça e permitia-se mostrar a ele por inteiro. Foi ele que lhe ensinou a jogar xadrez, o melhor professor que poderia ter. E ele lhe ensinou a mexer na televisão que instalou na garagem. Seus olhos brilhavam como de crianças ganhando chocolate na páscoa. Foi Arthur que o levou para assistir quadribol num estádio aos oito anos. E com essa idade ele ouviu a absoluta sabedoria vinda de seu avô.

Havia uma mulher na arquibancada e ela chorava. Lágrimas incessantes caiam de seus olhos e a dor transpassava de forma quase tocável a ele.

— Devemos ir ajudá-la? – Hugo perguntou ao avô incomodado e preocupado.

— Não, ela veio aqui para ficar sozinha. – falou com a sabedoria de vida que tinha.

Hugo observou ao redor todas pessoas vibrando e torcendo pelo time que assistiam. Ela não estava ali para isso. Não estava sequer sozinha. Várias pessoas estavam ao seu redor. Destoava de diversas maneiras do ambiente em que estava.

— Mas ela não está sozinha.

— Às vezes  aqui, no meio de tantas pessoas, é o único lugar que ela pode se sentir sozinha acompanhada.

Hugo encarou os olhos cansados de seu avô. Havia verdade e sabedoria neles e com sua pequena experiência de um garoto de oito anos, prestou atenção o máximo que conseguiu na frase seguinte que ele proferiu:

— Dói menos ficar sozinho acompanhado...

Hugo então o abraçou e pensou consigo que em meio a garagem e toda sua felicidade em mexer com objetos trouxas devia ser uma maneira de não se sentir sozinho. Então ele prometeu algo que ele não tinha como garantir que cumpriria ao avô:

— Sempre estarei ao seu lado, para que quando se sentir sozinho, tenha minha companhia.

Arthur o apertou no abraço e sentiu uma lágrima escorrer de seus olhos ao mesmo tempo em que o Chuddley Canons fazia um gol.

... Enquanto eu respirar vou lembrar...

Sentado naquelas pedras velhas olhando as flores que lutavam para crescer entre elas era fácil entender como a vida pode ser difícil e bonita ao mesmo tempo. Frágil. Delicada. Encantadora. E por fim nostálgica.

Disso Hugo Weasley tinha certeza, vivia uma vida nostálgica desde que começou a se reconhecer e reconhecer o mundo em volta. Não sabia que sentia falta de tudo e ao mesmo tempo de nada.

Como se tivesse um idoso em sua alma, o que explicava um de seus melhores amigos ser seu avô. Tinham algo saudosista interiorizado em ambos.

Agora sentia saudade com vivência, sabia o que era ter e o que não era. Sabia como era se permitir gargalhar com piadas horríveis, sabia como se sentia no meio do pó e no meio das tintas. Sabia o quanto o cheiro de graxa trazia uma montanha de lembranças.  Gostava especialmente de senti-lo nas manhãs de domingo, enquanto o mundo todo dormia, às vezes conseguia escutar o trabalhar das ferramentas, conseguia sentir o olhar por cimas dos óculos pendendo na ponta do nariz.

Também sabia o que era esperar por uma pergunta e ela não vir. Nem todo mundo insiste por anos na questão do “qual a função de um patinho de borracha?” poucos permanecem com a essência mesmo com o passar dos anos.

...E querer viver tudo novamente, cometer os mesmos erros, vivenciar as mesmas experiências, aprender com sua sabedoria...

Depositou a carta em cima dos dizeres da lápide cinza: “Aqui jaz Arthur Weasley, amante dos trouxas, dos filhos, da mulher e dos netos”.

Erguendo-se respirou profundamente. Limpou as folhagens da roupa, tocou na lápide cinza. Teve a certeza definitiva.

— Só enquanto eu respirar, vou me lembrar de você!

...Sinto sua falta todos os dias, só me arrependo de um dia dizer adeus. Prometo que só enquanto respirar, só enquanto eu respirar, vou lembrar de tudo...

De seu neto Hugo Arthur Weasley.”

— Vovô, vovô! – Hugo ouviu seu filho de cabelos ruivos chamar por seu pai.

Ambos caminhavam de mãos dadas pelos campos verdes, observavam a natureza e o céu mudando de cor. Seus olhos de criança brilhavam, os olhos de Rony cansados, também brilhavam. Pensou consigo que a vida continuava apesar de tudo.

Mais tarde, ao colocá-lo para dormir. Sussurrou em seu ouvido a verdade que sabia.

— Aproveite, só está no começo.


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Notas finais do capítulo

Obrigada a você que leu, comentários? :*