—Eu vou morrer de tédio!

    Hermione pode ouvir a voz de Rony ao lado dela dizer isso, mesmo que ela não estivesse prestando atenção. E, ao virar para olha-lo, viu o amigo sentado no chão.

    -Por favor, escreva na minha lápide. – Ele disse. – Ronald Billius Weasley, morto por excesso de tédio.

    Hermione apenas revirou os olhos. Rony estava sendo dramático, estavam apenas há uma hora da primeira ronda noturna deles como monitores. Tudo bem que realmente não tinha muita coisa acontecendo e eles só tinham que ficar olhando para os corredores. Mas era uma tarefa importante e Hermione se sentia orgulhosa de poder cumpri-la.

    -Levanta daí, Rony. – Ela disse olhando severamente para o amigo. – A gente precisa ficar em pé.

    -Mione, nenhum aluno vai aparecer. – Ele disse ignorando a fala dela e continuando sentado. – Eles estão todos dormindo. E nós não vamos ver ninguém passeando pelos corredores de Hogwarts de madrugada. Sabe por que?

    Ela o encarou. Rony tinha as sobrancelhas erguidas e um olhar sarcástico, como se a desafiasse a perguntar o porquê.

    -Por quê? – Ela perguntou já se amaldiçoando por dar a ele essa pontinha de satisfação.

    Mas Rony sorriu muito orgulhoso consigo mesmo:

    -Por que nós somos os alunos que passeiam de madrugada pelos corredores.

    Hermione revirou os olhos.

    -Você sabe que é verdade. – Ele disse, mas pelo menos se levantou e chegou mais perto dela, cruzando os braços. – Eu, você e Harry. Os únicos alunos que passeiam pelos corredores de madrugada quebrando as regras. E como nós dois estamos aqui, a única pessoa que você poderia impedir é o Harry e você não iria fazer isso.

    -Claro que iria! – Hermione exclamou. – Não importa se Harry é meu amigo, se ele está quebrando as regras eu vou impedi-lo.

    -E você tem tido tanto sucesso nesse trabalho nos últimos cinco anos. – Rony riu.

    Hermione apenas revirou os olhos e decidiu ignora-lo, se virando para o corredor a sua frente, mas pelo barulho vindo pelas suas costas, pode perceber que Rony se sentara no chão novamente.

    -Harry não vai vir, ele está no nosso dormitório, provavelmente dormindo. – Rony falou. – Assim como toda a Grifinória. E a Lufa-Lufa. E a Corvinal. E a Sonserina também. Nossa, até mesmo Filch está no quarto dele, isso é surpreendente.

    -Como você... – Hermione se virou para perguntar como ele sabia quando viu o que estava nas mãos do amigo: o Mapa do Maroto. – Rony! Você roubou isso do Harry?

    -Eu peguei emprestado. – Ele respondeu se a olhar, ainda encarando o mapa.

    -Não podemos usar o mapa! Temos que vigiar os corredores. Usar o mapa é como trapacear.

    -Trapacear? Isso não é um jogo. – Ele falou rindo e a encarando. – A gente tem uma tarefa e o mapa deixa essa tarefa mais fácil, sendo assim fazemos ela melhor.

    Hermione respirou fundo. Ele estava certo.

    -Ok, acho que você tem um ponto. – Ela deu de ombros.

    -Eu sempre tenho. – Ele sorriu.

    Ela revirou os olhos, mas segurando um risinho que queria escapar pelos seus lábios. Havia algo sobre discutir com Rony... Ele a desafiava e isso fazia o coração dela acelerar. Ela pensava que essa era a diferença que ela sentia quando falava com Rony e Viktor, a quem ela ainda escrevia cartas semanalmente e dizia sempre estar com saudades dela. Quando Hermione afirmava algo, a tendência de Viktor era concordar com ela (isso a lembrava de Harry), enquanto Rony cruzaria os braços na frente dela e perguntaria “por quê?”.

    Rony então se levantou.

    -Já volto. – Ele disse e saiu andando.

    -Onde você vai? – Hermione perguntou.

    Ele virou de costas e a encarou.

    -Não vou te contar porque você vai tentar me impedir.

    -Se você acha que eu vou tentar te impedir é porque você vai fazer algo de errado! – Ela bateu o pé, com raiva e andou até ele. – Onde você vai?

    -Olha, Mione, eu estou com fome. Vou só na cozinha rapidinho, eu ia trazer algo pra você.

    -Mas... A gente não pode ir pra cozinha, Rony! – Hermione disse, seguindo ele pelos corredores.

    -É só a gente ir em silêncio, não vamos incomodar ninguém, nem mesmo os elfos domésticos.

    Rony desceu as escadas em direção a cozinha e Hermione o seguiu, bufando. Ele parou no final da escada e a olhou: 

    -Eu preciso de energia se vou aguentar o resto dessa ronda sem dormir.

    -Somos monitores, não podemos descumprir as regras, temos que dar exemplo. – Hermione retrucou e quando viu eles estavam andando novamente.

    -O conselho de descumprir as regras está uns anos atrasados. E não tem ninguém nos vendo. Eu prometo não contar para ninguém que você descumpriu as regras. Nem mesmo pro Harry.

    Eles estavam parados em frente ao quadro que dava entrada para a cozinha, Rony ergueu o braço para fazer cocegas nele, para ele se abrir, mas Hermione segurou o braço dele o impedindo.

    -Você jura? – Ela pergunta, sentindo uma onda de eletricidade percorrer o corpo dela enquanto seus dedos seguravam o antebraço de Rony. – Que não vai contar para ninguém?

    -Claro que juro. – Ele respondeu com um sorriso torto. – Minha imagem de monitor está em perigo também.

    Ela assentiu e então soltou o braço dele. Rony fez cocegas no quadro que se abriu revelando a cozinha.

    Não havia nenhum elfo domestico, Hermione já esperava isso, eles estavam todos dormindo. As mesas compridas estavam cheias de potes fechados.

    -Acho que são sobras do jantar de hoje. – Disse Rony, seu rosto se iluminando vendo as possibilidades.

    Ele pegou dois pratos na prateleira e também pegou talheres, se sentou na mesa e abriu um dos potes com o resto do frango assado do jantar.

    -Isso parece errado... – Hermione falou nervosa.

    -A gente vai deixar tudo limpo, Mione. – Ele disse comendo um pouco do frango. – Anda, senta aqui, ninguém vai descobrir, eu to vigiando pelo mapa.

    Ela olhou para os lados, nervosa, sentia o coração acelerar ao quebrar as regras dessa maneira... Sentia como se estivesse traindo a confiança que havia sido lhe dada junto com o cargo de monitora.

    Mas ao mesmo tempo, tinha um bolo de limão ao lado de Rony, que ela sabia que estava delicioso no jantar daquela noite...

    E ela sabia que iria dormir pensando nessa sobremesa se não aproveitasse a oportunidade que estava na sua frente naquele exato momento.

    Sem dizer nada, Hermione se sentou ao lado do ruivo e pegou o pote que estava os restos do bolo de limão.

    Rony lhe lançou um sorriso vitorioso, a qual ela só revirou os olhos.

    -Isso nunca aconteceu. – Ela disse enfiando uma colher no bolo e logo depois na boca, uma explosão de sabores invadiu ela, disfarçando totalmente o sabor da culpa que sentia.

    -Viver um pouco é bom, Mione. – Rony disse.

    Ele já havia acabado o prato dele, pegou uma outra colher e enfiou no pote de bolo na frente da amiga.

    -Vai dizer que não é bom quebrar as regras um pouco? – Ele continuou.

    -Talvez... – ela disse. – Mas eu fico com medo de sermos descobertos.

    -Só se você voltar pro salão comunal com a cara toda suja de chantilly. – Ele disse dando mais uma colherada no pote.

    -Meu rosto tá sujo? – Hermione disse largando a colher e levando as duas mãos ao rosto.

    Rony a olhou franzindo o cenho. A boca dele estava cheia de bolo.

    -Um pouco. – Ele murmurou após engolir. Ele levantou a colher e a usou para apontar para o rosto da menina. – Um pouco aqui na bochecha.

    Antes que ela pudesse usar as mãos para limpar, Rony levou a colher em direção a bochecha direita dela e ela sentiu o bolo cobrir seu rosto.

    -Rony! – Ela protestou se levantando, o menino a sua frente apenas ria. – Muito maduro da sua parte. 

    Ela usou a manga das vestes para limpar sua bochecha e já estava caçando sua varinha para usar feitiços limpantes para deixar sua manga limpa novamente.

    -Foi só uma brincadeira, Mione. – Ele falou ainda tentando controlar o riso.

    Ela o encarou com raiva, mas logo a raiva sumiu de seu corpo quando ela viu que ele ria com os olhos fechados, a boca também suja de glacê, o barulho da risada abafada ecoando pela cozinha.

    Ela então pegou a colher que estava na mão dele e passou pelas bochechas dele, sujando um pouco do nariz comprido.

    -Justo. – Ela disse o olhando vitoriosa quando ele também se levantou.

    -Não, você me copiou. – Ele disse.

    -Não foi lá tão original assim.

    Os dois estavam em pé. Com a diferença de altura, Hermione tinha que olhar para cima, mas o encarava desafiadora. Rony olhava para baixo com uma cara séria, como se estivesse bravo com ela.

    Mas ele então começou a rir.

    -Nunca esperei que você fosse passar bolo na minha cara no meio da cozinha de Hogwarts. – Ele disse rindo ainda.

    Hermione começou a rir também.

    -Realmente não estava nos meus planos.

    Hermione tirou a varinha das vestes, murmurou um feitiço de limpeza, tirando assim o bolo do rosto de Rony e organizando toda a bagunça que eles haviam feito na cozinha.

    -Isso é um desperdício de comida, eu poderia ter comido o bolo da minha cara. – Rony falou.

    -Por Merlim, Rony... – Hermione respondeu revirando os olhos.

    Ele sorriu para ela, o que a fez sorrir de volta. Ainda estavam muito perto. Ela sentiu suas bochechas ficarem vermelhas.

    -Acho que já deu a hora da nossa ronda. – Ela disse quebrando o contato visual entre eles e andando em direção a porta da cozinha. – Vamos, senão seremos monitores descumprindo o horário também.

    Ele assentiu com a cabeça. Pegou o pote com o bolo de limão e guardou dentro das vestes.

    -Que foi? – Ele perguntou quando viu o olhar que Hermione o lançou. – Sobrou muito pouco, não vou deixar aqui.

    -Vai ter que dividir comigo. – Ela falou.

    -Eu sei. – Ele falou e abriu o pote enquanto eles saiam da cozinha.

    Caminharam em direção a torre de grifinória dividindo o ultimo pedaço do bolo de limão.